ESCRAVIDÃO, SOCIEDADE E ECONOMIA NA VILLA REAL DE SÃO JOSÉ DO POXIM (1774 A 1854) - Robson Williams Barbosa dos Santos
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS – UFAL
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS, COMUNICAÇÃO E ARTES - ICHCA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA
ROBSON WILLIAMS BARBOSA DOS SANTOS
ESCRAVIDÃO, SOCIEDADE E ECONOMIA NA VILLA REAL DE SÃO JOSÉ
DO POXIM – 1774 A 1854
MACEIÓ – 2019
UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS – UFAL
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS, COMUNICAÇÃO E ARTES - ICHCA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA
ROBSON WILLIAMS BARBOSA DOS SANTOS
ESCRAVIDÃO, SOCIEDADE E ECONOMIA NA VILLA REAL DE SÃO JOSÉ
DO POXIM – 1774 A 1854
Texto apresentado ao programa de Pós-Graduação em
História, Instituto de Ciências Humanas, Comunicação e
Artes da Universidade Federal de Alagoas, como
requisito e obtenção do título de mestre em História.
Orientador: Dr. Gian Carlo de Melo Silva.
MACEIÓ – 2019
Catalogação na fonte
Universidade Federal de Alagoas
Biblioteca Central
Divisão de Tratamento Técnico
Bibliotecário: Marcelino de Carvalho
S237e
Santos, Robson Williams Barbosa dos.
Escravidão, sociedade e economia na Villa Real de São José do Poxim – 1774
a 1854 / Robson Williams Barbosa dos Santos. – 2019.
182 f. : il. color.
Orientador: Gian Carlo de Melo Silva.
Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal de Alagoas.
Instituto de Ciências Humanas, Comunicação e Artes. Programa de Pós-Graduação em
História. Maceió, 2019.
Bibliografia: f. 140-150.
Anexos: f. 151-182.
1. Villa Real de São José do Poxim (Alagoas). 2. Banguê (Usinas de açúcar).
3. Escravidão - Alagoas. I. Título.
CDU: 94(813.5):326
DEDICATÓRIA
À memória de um povo que foi
esquecido no tempo e que traz as suas
narrativas à memória histórica, cultural e
artística de um Poxim que outrora foi
glorioso. Pessoas humildes que buscam
resgatar os valores de um passado
remoto. Mostrando para Alagoas que a
história do Poxim não chegou ao seu
fim, pois seu passado é uma corrente de
força que se prende nos brasões da
história contra o esquecimento. Um
povo que não tem “nem eira nem beira”,
mas que não poupa esforços para saudar
novos tempos com suas histórias e suas
memórias.
AGRADECIMENTOS
À minha esposa, Angela Santana Ursulino, que foi um dos pilares desse trabalho
e sempre esteve de mãos dadas e ao meu lado nesse caminho estranho e repleto de
surpresas chamado de vida. Fazendo a minha história intensa e mágica, presenteandome com duas meninas belíssimas: Sophia e Samia. Todas as três são o meu grande oásis
de sabedoria e o meu grande começo, a força que vai além da física, pois sem elas as
aves dos céus perderiam seu canto e as rosas jamais desabrochariam para o Grande
Arquiteto do Universo. Agradeço à minha mãe, D. Marilene, que deu sua juventude
para que minha irmã e eu entrássemos em uma universidade e nos formássemos.
Não posso deixar de agradecer ao meu orientador, amigo e mestre, Gian Carlo
de Melo Silva, com toda a sua paciência e dedicação aos meus trabalhos, sendo ele o
grande responsável para concretização desse trabalho me levando para trilhas de um
Brasil Colonial e me aventurando no passado de uma Alagoas que ficou na memória.
Agradeço também à Profª. Drª. Suely Creusa Cordeiro de Almeida e ao professor
Douglas Apratto Tenório por aceitarem o convite de fazer parte desse trabalho. Também
não posso deixar de agradecer ao professore José Roberto Santos Lima, o Robertinho,
que foi meu orientador na graduação (grandus primus) e sempre disponível para me
ajudar nos trabalhos. Agradeço ao professor Lemos que iluminou esse trabalho com
novas fontes históricas sobre Alagoas e a professora Carmém Lúcia Dantas, museóloga,
amiga, que desde tempos de Théo Brandão ensinou o quanto é valioso o patrimônio
histórico, seja ele material ou imaterial.
Não podendo deixar de agradecer ao meu eterno e querido amigo Benedito
Ramos Amorim, que mais uma vez fez-se presente, dando a graça de sua imortalidade
neste simples trabalho. O homem que se julga um simples contador de estória não
sabendo ele que suas estórias tornaram-se histórias das quais selaram sua imortalidade
nos corações de seus amigos e leitores.
A todos que fazem parte da minha vida e que sempre contribuíram de alguma
forma na minha formação como um ser social e pessoal (caráter), como é o caso de José
Ademar, que foi a pedra angular nessa caminhada, e junto a ele Cynara Pereira, que
trabalhou conosco na construção do Museu dos Devotos D. Constantino Lüers, do
Poxim. Museu que recebeu o apoio dos professores (Universidade Federal de Alagoas)
José Roberto Santos Lima e Helena de Fátima Cavalcante Passos e da Diocese de
Penedo na pessoa de D. Valério Breda, bispo de Penedo. E aos professores, e amigos,
Célia e Dorgicleiton, que nunca deixaram os meus trabalhos sem às devidas correções
ortográficas.
E, por fim, à professora Gisela Pfau de Carvalho, que com olhar de um lince,
encontrou no meu trabalho autenticidade, dedicação e uma boa história para transformálos em verbete do ABC das Alagoas, algo que só os titãs de Alagoas conseguiram.
Agradeço, também, a Wellington José Gomes da Silva (APA), Kell Lira e Karen
Pitanga (IHGAL), Altina Farias (NESEM) e ao amigo e irmão Heitor de Paula que, por
muitas, vezes financiou esse trabalho por acreditar que Alagoas mereça mais um
capítulo seja reescrito.
“A mente ocidental do século XX congela-se diante do horror de homens
vendendo e comprando seus semelhantes como escravos e espanta-se ainda
mais com a ironia de homens negros servindo de agentes para a escravização
de outros negros pelos brancos. Embora chocante, este comércio humano era
na verdade a representação mais completa do que o modernismo e a expansão
capitalista ocidental significaram para os povos tradicionais. No Novo
Mundo, as pessoas tornaram-se objetos de comércio, seu talento, seu trabalho
e sua produção foram jogados no mercado, onde sua maior esperança era
conseguir um preço decente. A injustiça racial passou despercebida pelos
mercadores africanos, que consideravam estar vendendo gente diferente de si
mesmos. As distinções tribais eram mais reais para eles do que a raça,
conceito que ainda iria ser aprimorado pelos racionalistas ocidentais dos
séculos XIX e XX.”
Nathan Huggins, Black Odissey (Odisseia negra) (1977)
RESUMO
O presente trabalho visa analisar a sociedade, a economia e a escravidão na Vila Real de
São José do Poxim. Inserido no contexto histórico da monocultura da cana-de-açúcar e
do período Pombalino, em que objetivava sanear a deficitária economia de Portugal
com o aumento das atividades econômicas no Brasil, Sebastião Carvalho e Melo, o
Marquês de Pombal, determinou a criação de companhias de comércio como a de
Pernambuco e Paraíba. Dentro desse contexto, em pleno século XVIII, e estendendo-se
a meados do XIX, o povoado do Poxim não foi diferente de tantas outras regiões do
norte brasileiro, cuja formação social e seu contingente humano nasceram em torno dos
engenhos. O Poxim desenvolveu-se em torno do Jenipapo e Porção por volta de 1718,
ambos teriam sido importantes para o comércio transatlântico de escravizados. O
processo de ocupação do vale do rio Poxim e, mais tarde, o de Coruripe, deu-se em
função da criação do gado vacum e depois com a instalação dos primeiros engenhos de
açúcar na região. O local surgiu lá pelos idos de 1600 como ponto de apoio para os
viajantes que saíam de Salvador e seguiam em direção a Penedo, Alagoas do Sul, Porto
Calvo, Recife e Olinda. Esses viajantes percorriam esses locais sobre as “estradas
hídricas” como lagoas, riachos e rios. O rio Poxim era uma dessas “estradas hídricas”,
que interligado com o Rio São Francisco e os demais rios da região, dinamizava o
mercado fornecedor e consumidor de escravos, açúcar, sal, algodão, aguardente, tabaco
e outros gêneros alimentícios na região do vale do São Francisco. Ele também foi muito
utilizado como força motriz da moenda dos engenhos Jenipapo, Porção e demais
engenhos. A Vila Real de São José do Poxim contavam com a presença do africano para
o pesado trabalho nas lavouras de cana e no fabrico do açúcar. O escravo negro, ao
mesmo tempo em que era a mão de obra predominante naquele espaço rural, cercado
pelos canaviais, era também artista anônimo, em que expressava seu dom e talento na
edificação de igrejas, na fabricação de santos e sinos e na melhoria urbana da vila do
Poxim. Com isso, observamos que o trabalho dos escravos não se limitava no campo e
no fabrico do açúcar. Levando em consideração esses aspectos, o estudo da Vila Real de
São José do Poxim está diretamente relacionado à gênese da formação social de
Alagoas.
PALAVRAS-CHAVE: Poxim. Engenho Banguê. Escravo.
ABSTRACT
The present work aims at analyzing society, economy and slavery in Vila Real de São
José do Poxim. Inserted in the historical context of the sugarcane monoculture and the
Pombalino period, in which it aimed to clean up Portugal's deficit economy with the
increase of economic activities in Brazil, Sebastião Carvalho e Melo, Marquês de
Pombal, determined the creation of companies of commerce such as that of
Pernambuco and Paraíba. Within this context, in the middle of the eighteenth century,
and extending to the mid-nineteenth century, the village of Poxim was no different from
many other regions of northern Brazil, whose social formation and human contingent
were born around the mills. The Poxim developed around the Jenipapo and Portion
around 1718, both of which would have been important for the transatlantic trade of
enslaved. The process of occupying the valley of the Poxim River and, later, the one of
Coruripe, was due to the creation of cattle and then to the installation of the first sugar
mills in the region. The place appeared there by the 1600s as a point of support for
travelers leaving Salvador and headed towards Penedo, Alagoas do Sul, Porto Calvo,
Recife and Olinda. These travelers roamed these places on the "waterways" like ponds,
streams and rivers. The Poxim River was one of these "waterways", which, interlinked
with the São Francisco River and other rivers in the region, stimulated the supply and
consumption market for slaves, sugar, salt, cotton, spirits, tobacco and other foodstuffs
in the region. valley of the San Francisco. It was also widely used as the driving force of
the Jenipapo, Portion, and other engenhos mills. The Vila Real de São José do Poxim
counted on the presence of the African for the heavy work in the fields of sugarcane and
sugar cane. The black slave, at the same time as the predominant labor force in that rural
area, surrounded by the cane fields, was also an anonymous artist, expressing his gift
and talent in church-building, in the making of saints and bells, and in urban
improvement of the village of Poxim. With this, we observed that the work of the slaves
was not limited in the making and the manufacture of sugar. Taking these aspects into
account, the study of Vila Real de São José do Poxim is directly related to the genesis of
the social formation of Alagoas.
KEYWORDS: Poxim. Engenho Banguê. Slave.
LISTA DE IMAGENS, PINTURAS, TABELAS, FIGURAS E MAPAS:
FIGURAS
FIGURA 1 – Imagem de Nossa Senhora do Bom Parto.......................................…...pág. 46
FIGURA 2 – Lavabo e pia batismal.………………………………....….………..pág. 59
FIGURA 3 – Igreja de São José, a imagem de São José e a Cruz padrão.................pág. 60
FIGURA 4 – Altar-mor da Igreja de São José do Poxim.……..………………….pág. 61
FIGURA 5 – Sino da Igreja de São José do Poxim….................................................pág. 62
FIGURA 6 – Altar-mor da Igreja de São José do Poxim (detalhes)..........................pág. 65
FIGURA 7 – Nichos da Igreja de São José do Poxim com a imagem Nossa Senhora do
Rosário e São Benedito……………………………………………………….................pág. 66
FIGURA 8 – Detalhe do Engenho de farinha no Poxim e da tela de Post…..…....pág. 133
FIGURA 9 - Mulher segurando um cesto de farinha.................................................pág. 136
FIGURA 10 – A farinha do Poxim...............................................................................pág. 137
MAPAS
MAPA 1 - Carta cartográfica do Coronel Francisco Manuel Martins Ramos em
1820......................................................................................................................................pág. 35
MAPA 2 - Comércio de escravos para América portuguesa, nos séculos XVII e
XVIII....................................................................................................................................pág. 37
MAPA 3 - Vilas e freguesias de Alagoas em 1774......................................................pág. 41
MAPA 4 - Comarca de Alagoas sesmaria do século XVI -1600 a 1630...................pág. 43
MAPA 5 - Sede da Companhia Geral do Comércio de Pernambuco e Paraíba........pág. 88
MAPA 6 - Rotas de circulação mercantil da Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba
1759 a 1780.........................................................................................................................pág. 89
MAPA 7 - Posição da área em que a Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba atuava
no Brasil 1759.....................................................................................................................pág. 92
MAPA 8 - Estrada líquida do rio Moxotó......................................................................pág. 94
MAPA 9 - Rios Coruripe e Poxim e Pontal de Coruripe.............................................pág. 95
MAPA 10 - Mapa da Costa do Brasil do Peba ao Rio Jequiá………….................pág. 110
MAPA 11 - Posição das áreas em que se plantava fumo no Brasil no final do século
XVIII..................................................................................................................................pág. 123
MAPA 12 - Posição das áreas em que se plantava fumo em Alagoas no final do século
XVIII..................................................................................................................................pág. 125
PINTURAS
PINTURA 1 - Detalhe da Oficina de Farinha – Frans Post de 1651.....................pág.133
PINTURA 2 - Albert Eckhout. Imagem da Mandioca (óleo produzido em
tela)......................................................................................................................................pág.134
PINTURA 3 - Detalhe da Oficina de Farinha – Frans Post de 1651........................pág.136
QUADROS
QUADRO 1- Famílias do Poxim e Coruripe ................................................................pág. 33
QUADRO 2 - Mapa Populacional de 1788 ..................................................................pág. 38
QUADRO 3 - Mapa Populacional de 1853...................................................................pág. 39
QUADRO 4 - Requerimento de Carta Patente do Poxim.............................................pág.76
QUADRO 5 - Vilas e freguesias de Alagoas em 1777 ...............................................pág. 96
QUADRO 6 - Vigários da Vila Real de São José do Poxim…...……….................pág. 102
GRÁFICOS
GRÁFICO 1 – Estimativa de desembarque de escravos (1759 - 1780) …...…........pág. 93
GRÁFICO 2 - Número de habitantes da Vila Real de São José do Poxim……......pág. 98
Lista de Abreviaturas
APA – Arquivo Público de Alagoas.
AHU – Arquivo Histórico Ultramarino
Cx. – Caixa.
CGCPPB - Companhia Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba.
D. – Documento.
IHGAL - Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas.
ISS SACRAMENTO – Irmandade do Santíssimo Sacramento.
TABELA DE PESOS E MEDIDAS1
PESOS E MEDIDAS
PESO
1 Arroba @ = 14,7 quilogramas
MEDIDAS DE CAPACIDADE PARA
SECOS
1 Alqueire = 36,3 quilogramas
COMPRIMENTO E ÁREA
1 Légua entre 5555 e 6000 metros
1 Palmo 0,22 metros
1
SCHWARTZ, Stuart B. Segredos Internos. Engenhos e escravos na sociedade colonial. São Paulo:
Companhia das Letras, 1999.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 15
CAPÍTULO I: OS ENGENHOS E O CRESCIMENTO POPULACIONAL DO
POXIM ............................................................................................................................................. 26
1.1 OS ENGENHOS E O CRESCIMENTO POPULACIONAL DO POXIM ................................ 27
1.2 AS IGREJAS DO POXIM: UM TRABALHO DE ARTESÃOS NEGROS ............................. 56
1.3 A IRMANDADE DO POXIM ................................................................................................... 67
CAPÍTULO II: POXIM E A ROTA DA COMPANHIA GERAL DO COMÉRCIO
DE PERNAMBUCO E DA PARAÍBA .......................................................................................... 81
2.1 POXIM E A ROTA DA COMPANHIA .................................................................................... 83
2.2 O PORTO E A CONSTRUÇÃO NAVAL NO POXIM .......................................................... 101
CAPÍTULO III: AS LAVOURAS COMERCIAIS DO POXIM .............................................. 115
3.1 A PRODUÇÃO DE FUMO NO POXIM ................................................................................. 117
3.2 A PRODUÇÃO DE FARINHA DE MANDIOCA NO POXIM ............................................. 126
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................................ 138
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................ 140
FONTES ......................................................................................................................................... 147
ANEXOS ........................................................................................................................................ 151
INTRODUÇÃO
Um dos temas mais recorrentes na historiografia brasileira é o período da
escravidão, que percorreu os séculos XVI, XVII, XVIII e boa parte do XIX,
principalmente no Norte do Brasil, destacando-se a contribuição das mãos escravas na
edificação de povoados, freguesias, vilas, igrejas, engenhos e na formação social do
povo brasileiro.
Ao sul da capitania de Pernambuco não foi diferente: na região mais próxima do
rio São Francisco “surgiram povoados ao longo das rotas do gado do sertão”2, como
exemplo, a freguesia do Curato de São José e Madre de Deus do Poxim que fez do seu
rio, que leva o mesmo nome, uma estrada hídrica para o dinamismo do comércio de
víveres, mantimentos, escravos e de uma longa rede de informação entre a parte mais ao
sul da Capitania de Pernambuco e o comércio triangular entre América do sul, África
Ocidental3 e Portugal.
A escolha do tema e do recorte histórico4 de 1774 a 1854, deu-se em virtude da
carência historiográfica que há a respeito da Vila Real de São José do Poxim, em um
período que coincidiu com o monopólio da Companhia Geral de Comércio de
Pernambuco e Paraíba5, que tinha o controle da compra e venda de produtos e escravos
nas capitanias de Pernambuco e Paraíba e todos seus distritos6, durante vinte anos
contando do dia em que partir a primeira frota por ela despachada7, além disso, o
crescimento populacional na região do Poxim ocasionado por conta do reaquecimento
da indústria açucareira na vila do Poxim com os engenhos Jenipapo e Porção.
2
RUSSELL-WOOD, A.J.R. Centro e periferia no mundo luso-brasileiro, 1500-1808. Revista
Brasileira de História. Vol. 18, n. 36, 1988, p. 187-249.
3
LOPES, Gustavo Acioli. Negócio da Costa da Mina e comércio atlântico: Tabaco, açúcar, ouro e
tráfico de escravos: Pernambuco: (1654-1760). São Paulo: USP, 2008. Tese de Doutorado. p. 10.
4
Segundo Certeu, o recorte histórico e seu objeto são postulados de interpretações. CERTEU, Michel de.
A Escrita da História. Forense Universitária. Rio de Janeiro. 2006. p.10.
5
A Companhia Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba foi criada em 1759 pelo Primeiro-Ministro
de D. José I, O marquês de Pombal, e tinha sede na cidade do Porto e no Recife.
6
Segundo Ribeiro Jr., o raio de ação comercial da Companhia Geral de Comércio de Pernambuco e
Paraíba ia da Europa, África e parte da Ásia. Ver RIBEIRO JÚNIOR, José. Colonização e Monopólio no
Nordeste do Brasileiro. A Companhia Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba. São Paulo:
HUCITEC, 1976. p. 113.
7
CARREIRA, Antônio. As Companhias Pombalinas de Navegação. Comércio e Tráfico de Escravos
entre a Costa Africana e o Nordeste Brasileiro. Editora: Centro de Estudos da Guiné Portuguesa,
porto,1969. p. 251.
16
O governo metropolitano, na figura de Pombal, buscaram novas formas de
controle, que tinham como principal objetivo o redirecionamento do comércio humano
para os portos de Angola8 e Costa da Mina, onde havia um bom fluxo de atividade
negreira, o qual seria de grande importância para Pernambuco e Bahia9, e de fazer
prosperar a agricultura da região de Pernambuco, fornecendo um suprimento regular
de mão-de-obra escrava bem como, atuando na compra e exportação dos produtos
coloniais10. Com a criação da Companhia Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba, a
capitania se torna a mais rentável para a Coroa e o problema com o contrabando
diminuiu consideravelmente, e ao mesmo tempo, saneava a deficitária economia de
Portugal com o aumento das atividades econômicas da Companhia no Brasil.
Por outro lado, a Companhia não agradou a todos, como é o caso dos
comerciantes de Pernambuco, já que a empresa privilegiava os comerciantes lusitanos.
A exemplo temos que antes da empresa o comércio pernambucano com a África era
bastante intenso chegando até 121 viagens entre Angola e Pernambuco, isso nos anos de
1742 e 1760, importando 34.383 escravos adultos11 e na Costa da Mina 16.488 escravos
adultos, somando um total de 50.871 em 64 embarcações. Enquanto isso, após a
presença da Companhia esses números caíram para 41.324 escravos adultos durante o
período do monopólio, que foi de 20 anos. Em outras palavras, a companhia não foi
pensada para os comerciantes Pernambucanos.
Especificamente o ano de 1774, a produção fumageira e açucareira no
Recôncavo Baiano e no termo do Poxim, mostram a importância de ambas às regiões
para Coroa portuguesa. Esses produtos, junto com a produção de farinha de mandioca
no Poxim, fizeram parte da política de incentivo e investimento para extrair os seus
lucros através do exclusivismo metropolitano. Segundo Ana Paula Albuquerque, houve
a tentativa de garantir, através dos aparelhos burocráticos, o cumprimento do pacto
colonial. Sabemos que o monopólio, mesmo tendo sido muitas vezes garantido, foi
8
SOUSA, Jéssica Rocha de. Nas Rotas dos Sertões: Comércio Interno e Contrabando entre as
Capitanias de Pernambuco e Bahia (1759-1780). Recife, 2018, 177 p. Dissertação (Mestrado) –
UFRPE. p. 16.
9
Mesmo a Bahia não fazendo parte da Jurisdição da Companhia Geral de Comércio de Pernambuco e
Paraíba havia uma disputa comercial com Pernambuco pelo comércio da região. Idem, p. 15.
10
Idem. p. 16.
11
RIBEIRO JÚNIOR, José. Colonização e Monopólio no Nordeste do Brasileiro. A Companhia
Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba. São Paulo: HUCITEC, 1976. p. 130.
17
também de diversas maneiras quebrado, tendo sido o contrabando12 o mais eficiente
meio de resistência13.
Já o ano de 1854, nosso marco temporal final da pesquisa, é o momento que
marca o aparecimento de vários engenhos no Poxim, e em seu termo (Coruripe, Pontal
de Coruripe, Lagoa do Pau, Peba, Barra de Jequiá, hoje se chama de Duas Barras, e
Jequiá da Praia), que deram continuidade às atividades açucareiras com uma estimativa
de produção de açúcar de 22.800 arrobas, o que equivale a 335.160 kg, como é o caso
do Engenho Jenipapo, Engenho Porção, Engenho Poxim, Engenho São João da Prata,
Engenho Mocambo, Engenho Miahi, Engenho Lagoa do Pau, Engenho Piauí e, por
último do Engenho Conceição das Bananeiras.
O primeiro capítulo, Os engenhos e o crescimento populacional do Poxim,
desenvolvido nesse trabalho mostra o processo de ocupação do vale do rio Poxim, que
se deu em função da criação do gado inicialmente, e depois veio a instalação dos
primeiros engenhos de açúcar na região, que foram os engenhos Jenipapo e Porção por
volta de 1774, tendo o rio como mola propulsora dessa ocupação. O rio Poxim foi uma
“estrada hídrica” para compor o mercado fornecedor e consumidor de escravos e
produtos usuais da terra14 na região (açúcar, fumo, farinha de mandioca e etc.) do vale
do São Francisco, também foi muito utilizado como força motriz da moenda do
engenho.
A Vila Real de São José do Poxim contava com a presença do negro africano
para o trabalho pesado nas lavouras de cana e no fabrico do açúcar. O escravo negro
além do trabalho do campo e na produção de açúcar, também era responsável por
trabalhos artesanais, móveis, santeiros e oratórios, tendo sido o altar-mor e as pias
batismais do Poxim talhados por escravos da região.
As “estradas líquidas” 15 em Alagoas facilitavam a comunicação comercial entre
colonos e colonizados e serviam para o escoamento dos produtos em sumacas16 rumo ao
12
Ingleses, estadunidense, franceses e dinamarqueses eram os mais interessados no contrabando do
tabaco. SILVA, Ana Paula de Albuquerque. Produção Fumageira: fazendas e lavradores no
recôncavo da Bahia 1774-1830. Salvador: Universidade Federal da Bahia, 2015. Dissertação. p. 33.
13
Idem. p. 35.
14
MATHIAS, Carlos Leonardo Kelmer. As múltiplas faces da escravidão. O espaço econômico do
ouro e sua elite pluriocupacional na formação da sociedade mineira setecentista, c. 1711 – c. 1756.
Rio de Janeiro: Mauad, 2012. p. 121.
15
CARVALHO, Cícero Péricles de. Formação Histórica de Alagoas. Maceió, EDUFAL: 2015. p.26.
16
Navio pequeno, ou pequena embarcação, à vela, geralmente com dois mastros, comum na América do
Sul até o início do Século XX; usado, principalmente, em navegação de cabotagem e muito utilizado para
18
mar, sem colocar em risco os comerciantes e suas mercadorias. É aqui, como Sherlock
Holmes, que buscamos os rastros e vestígios17 para preencher o vazio histórico que há
em relação à Vila Real de São José do Poxim. Aqui, o historiador assume também o
papel de detetive na procura de pistas para revelar a paisagem desse mundo que está
“imóvel” lá no passado.
No decorrer do capítulo, adotaremos como base o contingente humano que viam
do continente africano para os portos de Salvador, Olinda e do Recife e logo em seguida
partiam para trabalhar nos engenhos da região do São Francisco, e consequentemente,
iam para o Poxim por vias fluviais, como tantos outros produtos econômicos. Com o
advento dessa mão de obra escrava na região do Poxim, devido o reaquecimento na
indústria açucareira, tivemos um boom populacional relevante, que se identificarmos às
atividades desempenhadas por essa mão de obra compreenderemos que essas pessoas
não só trabalharam no Poxim, mas tornaram-se produto do meio em que elas viviam e
passaram a transformar a paisagem urbana com a sua contribuição na construção de
igrejas, casas, cadeias, reforma da região e na fabricação de sinos, imagens de santos em
madeira e mobílias.
Esses escravos criaram uma linguagem de um mundo em um tempo que já
passou e que, por outro lado, ele poderá ser estudado através de documentos que
mostram o escravo trabalhando na construção do engenho, nas lavouras de cana-deaçúcar, no comércio local e na região do vale do São Francisco, no transporte das
mercadorias que transitavam no rio, riachos e lagoas do Poxim através da utilização de
seus portos, os quais ficavam em pontos estratégicos para o dinamismo do comércio.
Além das construções urbanísticas, os escravos negros no Poxim também
construíram seu lugar na sociedade colonial e constituíam verdadeiras associações de
classe, reservadas, que tinham por objetivo atender aos interesses de seus associados,
que eram as irmandades e o Regimento da Milícia dos Homens Pardos. Ambas
registradas, no Poxim, a irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, que
o contrabando no Brasil colonial. O tamanho das sumacas variava de 90 a 110 palmos. Seu tamanho era
adequado para singrar nos “rios-do-açúcar”, principalmente o rio Poxim, que era uma grande estrada
líquida para o comércio ilegal. O Poxim foi o maior produtor de sumacas em Alagoas no século XVIII.
17
Ginzburg defende em “Sinais: raízes de um paradigma indiciário” o método “morelliano” em que o
historiador valoriza aquele fato em que ninguém dá valor e que assim como a psicologia é nos gestos
menos vistosos e no inconsciente que revelam o verdadeiro significado das coisas ou até mesmo um
médico que só sabe da doença do paciente através da descrição oral do mesmo para encontrar a razão da
doença. 17 GINZBURG, Carlo. Sinais – raízes de um paradigma indiciário. Mitos, emblemas,
sinais. São Paulo: Companhia das Letras. 1989. p. 144.
19
trabalhou para construção do seu espaço social, um espaço de relativa autonomia negra,
diante da elite religiosa local e os homens de cor, do Regimento da Milícia dos Homens
Pardos, que buscavam estratégias com pretensões de se integrar à sociedade colonial18.
Há também, nesse capítulo, um registro de uma carta de alforria, em que
acompanharemos o fim, gradativo, da escravidão negra no Poxim. Com isso, faremos
uma análise sobre a palavra liberdade e que a mesma não é apenas um dado, mas
dependendo do tempo histórico ela pode ser um “terreno de conflito” 19, já que o
escravo não está livre a partir do momento em que foge do seu senhor ou ganha a
alforria.
Em 1798, registramos no Poxim a alforria de um escravo chamado Domingos,
que foi alforriado pelo seu senhor e pai, Amaro Dantas Barbosa, que reconhecendo a
paternidade do filho ilegítimo deu-lhe a liberdade. A escravidão negra tornou-se uma
“chaga social” 20 na história de Alagoas, mas vai perdendo fôlego no Poxim, com as
alforrias e com o fim gradativo das vendas de escravos na frente das igrejas, por
vigários, e o fim da feira de escravo que havia nas terras de São José.
Adotar a Vila Real de São José do Poxim como objeto de pesquisa possibilitanos trazer essa linguagem do passado, compreendendo que há uma situação histórica
com bases em fontes imagéticas e escritas, apontando uma possibilidade de encará-las
enquanto documentos, “a involuntária e inconsciente autorrevelação de uma atitude de
fundo em relação ao mundo, que é característica em igual medida, do criador enquanto
indivíduo, de cada época, de cada povo, de cada comunidade cultural” 21. Com isso, a
análise em cima da figura do escravo e do rio Poxim não se resume apenas em uma
mera especulação, mas procura compreender o papel que esses dois agentes históricos
tiveram no processo da indústria açucareira no Poxim e em seus termos (regiões
adjacentes).
18
ALVES, Fabianne Nayra Santos. Ser pardo na colônia: hierarquias sociais na Vila de Penedo do
Rio São Francisco. In: África e Brasil: História que cruzam o Atlântico (século XVI-XIX) Maceió.
Editora Edufal, 2017. p. 85.
19
CARVALHO, Marcus J. M. de. Liberdade: rotinas e rupturas do escravismo no Recife, 1822-1850.
Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2010. p. 213 e 214.
20
BASTOS. Aureliano Cândido Tavares. Taváres Bastos (visto por alagoanos). Maceió, Igasa, 1975. p.
14.
21
GINZBURG, Carlo. Sinais – raízes de um paradigma indiciário. Mitos, emblemas, sinais. São
Paulo: Companhia das Letras. 1989. p. 66.
20
“Utilizaremos a obra “Costumes em Comum” – Estudos sobre cultura popular
tradicional” de Thompson, um livro que está em constante diálogo com a antropologia,
o direito e a economia. No livro “Costumes em Comum”, o historiador Edward Palmer
Thompson descreve e analisa algumas práticas sociais peculiares na cultura dos
trabalhadores ingleses nos séculos XVIII e meados XIX. O historiador inglês faz uma
análise comparativa entre os patrícios do mundo romano, na antiguidade, os fazendeiros
da Virgínia e os senhores de engenhos no Brasil Colonial22, já que a terra continuava a
ser o índice de influência, o plinto sobre o qual se erguia o poder23.
Esses dois últimos, no século XVIII, possuem um ponto de semelhança em que
se concentra no campo social, econômico e jurídico. Ao mesmo tempo, que há uma
aproximação entre as três figuras há, também, nelas o termo paternalismo que é comum
a todas as três personas e na gentry24 inglesa, no século XVIII, que foi expresso na
família que “conferia aos homens estabilidade ou movimento, além de influir no status
e na classificação social”,25 já que era a família que garantia o paternalismo através de
uma concentração de autoridade econômica e cultural26.
A abordagem marxista de Thompson privilegia a perspectiva que enxerga os
conflitos de classe em torno dos costumes. Ele argumenta que a distância entre as
classes sociais ou a indiferença de um costume corriqueiro são hipóteses que poderiam
explicar o porquê dos acontecimentos não serem registrados anteriormente. Faremos
semelhante estudo, como forma de registro, com o tema escravidão, sociedade e
economia no Poxim do século XVIII e meados do XIX.
Ao recorreremos à obra “Sinais: raízes de um paradigma indiciário, Mitos,
Emblemas e Sinais” e “O fio e os rastros. Verdadeiro, falso, fictício”, obras de Carlo
Ginzburg27, mostramos a ideia da importância de identificar o modo como em diferentes
lugares e momentos uma realidade é construída, pensada e lida. Com isso, se voltarmos
LARA, Silvia Hunold. “Blowin’ in the Wind”: Thompson e a experiência negra no Brasil. Projeto
História. São Paulo: PUC, n. 12, outubro de 1995, p. 43-56. Disponível em <
https://revistas.pucsp.br/index.php/revph/article/view/11300> Acesso em: 15 mai. 2017.
23
THOMPSON, Edward Palmer. Costumes em comum – Estados sobre cultura popular tradicional.
São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p. 20.
24
Nobreza rural ascendente, ou seja, pequenos e médios proprietários de terras.
25
VAINFAS, Ronaldo & CARDOSO, Ciro Flamarion S. Domínios da história: ensaios de teoria e
metodologia. Rio de Janeiro: Campus, 1997. p. 372.
26
THOMPSON, Edward Palmer. Costumes em comum – Estados sobre cultura popular tradicional.
São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p. 29.
27
Isso não significa que não usaremos outros teóricos.
22
21
os nossos olhos a uma determinada região podemos obter uma nova leitura daquele
local e, junto a isso, as configurações econômicas e sociais da época.
Contudo, o estudo desses dois agentes históricos – o negro e o rio Poxim - estão,
diretamente relacionados a uma análise das Alagoas açucareira, na qual estabeleceremos
uma relação mais próxima com outros saberes multidisciplinares como antropologia,
sociologia, arte, geografia e outros, já que esses saberes ajudam a ter uma visualização
dos aspectos do início da formação da paisagem edificada no Poxim. Por isso, este
trabalho poderá contribuir com a historiografia brasileira e alagoana no momento em
que o escravo negro foi o grande pedestal do sistema econômico e social desse país, ou
como diria Antonil: “Os escravos são as mãos e os pés do senhor do engenho, porque
sem eles no Brasil não é possível fazer, conservar e aumentar fazenda, nem ter engenho
corrente” 28.
Desde a fundação da freguesia do Curato de São José e Madre de Deus do
Poxim em 171829, essa região vem ganhando um volume demográfico expressivo, que
facilitou o crescimento econômico local e da área do vale do São Francisco. Esse fato só
foi possível por conta da estrada fluvial estabelecida no Rio Poxim, a qual circulavam
escravos, víveres, mantimentos e informações das demais regiões de Pernambuco. Essas
mercadorias e informações singravam desde a Capitania da Bahia seguindo para o Rio
São Francisco em Penedo e eram distribuídas nas demais localidades através de rios
menores, como é o caso dos rios Poxim, Coruripe, Jequiá e São Miguel.
No segundo capítulo, Poxim e a Companhia Geral do Comércio de Pernambuco
e Paraíba destacaremos as navegações e o intercâmbio comercial triangular entre a
América Portuguesa, África Ocidental e Portugal, em pleno século XVIII. Mostraremos
o fluxo comercial intenso e ininterrupto e de grande importância para Vila Real de São
José do Poxim, principalmente, nos aspectos econômicos, políticos e sociais, já que o
Poxim possuía vários portos e em seus termos já tinham atividades mercantis antes da
Companhia, foi como um dos principais elos entre a metrópole, África Atlântica e o
contrabando interno entre Pernambuco e Bahia.
A Companhia não conseguia controlar e a fiscalizar os portos do sertão para
taxar os produtos que por eles passavam e nem para inibir o contrabando entre
28
ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil por suas drogas e Minas. 3. ed. Belo
Horizonte: Itatiaia/Edusp, 1982. p. 36.
29
DIEGUES JÚNIOR, Manuel. O bangüê nas Alagoas. Maceió, EDUFAL: 2006. p. 31.
22
Pernambuco e Bahia, já que a praça de Salvador estava repleta de produtos mais
baratos, logo causava grandes prejuízos a Companhia. A empresa tinha como sua
jurisdição a área que compreendia entre o Rio São Francisco e Parnaíba 30, mas não foi
uma atividade fácil, já que os próprios fiscais não sabiam onde começava e terminava
tal jurisdição e por esse motivo surgiam os locais que “irão buscar meios e estratégias
de evasão do controle régio, um desses meios de escape será o contrabando de
mercadorias realizadas através das rotas que uniam Pernambuco e Bahia tanto através
dos sertões e dos caminhos de cabotagem” 31.
No decorrer desse capítulo observamos que ambos os agentes históricos – o
negro e o rio - revelam, ao mesmo tempo, os novos elementos da zona açucareira do
Poxim. A exemplo disso, tem-se a questão dos tipos de produtos que se produziam na
região como açúcar, fumo, mandioca, farinha de mandioca, carne seca, peixe seco,
batata, feijão, algodão, sal e tantos outros que transitavam na freguesia pelas vias
fluviais para abastecer o vale do São Francisco em Penedo.
Observamos, também, que os portos do Poxim eram de grande importância para
o dinamismo econômico da região, pois escoavam todos os produtos que viam da região
norte de Alagoas como Porto Calvo, que já recebia e repassava os produtos vindos de
Pernambuco, e outros que se originavam do porto do Francês, em Santa Maria
Magdalena de Alagoas do sul, para serem distribuídos na região do vale do São
Francisco em Penedo. O mesmo se dava em relação a Penedo que escoavam os produtos
que saíam da Bahia e Sergipe Del Rey e tinham os portos do Poxim como um
referencial para a distribuição comercial.
Outros pontos a serem trabalhados referem-se à criação dos engenhos e a
produção de açúcar na freguesia, através das mãos escravas e a quantidade de negros
que desembarcavam no Poxim e quais eram suas etnias, já que segundo Diégues Júnior,
é nos vales dos rios que se desenvolveu a colonização em Alagoas.
No terceiro e último capítulo, As lavouras comerciais do Poxim, destacaremos as
lavouras de fumo e de mandioca. No período colonial, o fumo foi considerado como
atividade econômica secundária, já que o lastro econômico da colônia estava centrado
30
RIBEIRO JÚNIOR, José. Colonização e Monopólio no Nordeste do Brasileiro. A Companhia
Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba. São Paulo: HUCITEC, 1976. p. 62.
31
SOUSA, Jéssica Rocha de. Nas Rotas dos Sertões: Comércio Interno e Contrabando entre as
Capitanias de Pernambuco e Bahia (1759-1780) . Recife, 2018, 177 p. Dissertação (Mestrado) –
UFRPE. p. 26.
23
no açúcar, mas ao contrário do que se pensa, o cultivo do fumo foi uma atividade
essencial para o Brasil no comércio transatlântico em pleno século XVIII. Unia-se a
qualidade indiscutível como facilidade de plantio e alto valor comercial. Ao longo do
século XVIII favoreceu a elevação de renda dos agricultores baianos e um pequeno
grupo de produtores no Poxim e São Miguel (Alagoas) que mais tarde aplicaria o fumo
e seus capitais nas praças baianas.
O cultivo do tabaco e a produção do fumo encilhavam-se ao plantio da mandioca
e a produção de farinha no Poxim em pleno século XVIII, pois a importância da farinha
de mandioca em terras alagoanas chega ao comércio transatlântico, já que da “farinha de
mandioca estava o sustento de africanos, escravos em trânsito pelo Atlântico,
marinheiros em circulação pelo mundo a partir da era das navegações” 32.
Faremos, também no decorrer do capítulo, uma breve articulação com o presente
e a iconografia33 Engenho34, de 1651, de Frans Post (1612-1680), pintor holandês que
veio ao Brasil em 23 de Janeiro de 1637, na Comitiva Holandesa do Conde João
Maurício de Nassau-Siegen (1604-1679), durante a ocupação holandesa. Apesar de
fugir do nosso recorte temporal vale a pena observar a tela, Engenho, pois Post mostra a
produção de farinha de mandioca e podemos notar que não houve nenhuma, ou quase
nenhuma, mudança no fabrico da farinha nas oficinas do Poxim em pleno século XXI.
Ressaltamos à falta de registros35 históricos sobre a escravidão no Poxim e ao
mesmo tempo preencher as lacunas que algumas obras de autores locais36 não
conseguiram preenchê-las. Com isso, buscamos com a nossa investigação, contribuir
com os registros historiográficos sobre esse tema tão pouco explorado atualmente.
Então, estudar a Vila Real de São José do Poxim irá enriquecer a bibliografia alagoana
sobre a sociedade, a economia e escravidão nessa região a partir de meados do século
32
RODRIGUES, Jaime. “De farinha, bendito seja Deus, estamos por agora muito bem”: uma
história da mandioca em perspectiva atlântica. Rev. Bras. Hist. [online]. 2017, vol.37, n.75, pp.69-95.
Epub Sep 11, 2017. ISSN 0102-0188. http://dx.doi.org/10.1590/1806-93472017v37n75-03. p. 84 e 85.
p. 1.
33
Documentação visual que constitui ou completa obra de referência e/ou de caráter biográfico, histórico,
geográfico, etc.
34
CORRÊA DO LAGO, Pedro e Bia. Frans Post {1612-1680}. Obra Completa. Rio de Janeiro: editora
Capivara, 2006. p. 128 e 129.
35
Sem deixar de falar da ausência de fontes e as poucas que há estão em arquivos particulares, em muitos
casos arquivos inacessíveis.
36
Isso não significa que não usaremos os autores locais para a construção dessa pesquisa.
24
XVIII e meados do XIX, o que é uma lacuna a ser preenchida de modo que se enquadra
nesse vazio histórico.
Um dos primeiros historiadores a trabalhar esse tema foi Craveiro Costa em sua
obra Maceió e Alagoas pela Guerra da Independência, mas ele não vai além da
participação do Poxim apoiando a coroação de D. Pedro I. Outro historiador foi Osman
Loureiro no livro Açúcar, que trata do tema a partir de meados do século XIX, como a
produção de açúcar nos novos engenhos, como também fez Cícero Péricles em
Formação Histórica de Alagoas, esquecendo-se do Poxim que também produzia açúcar
no século anterior. Diégues Jr, em O bangüê nas Alagoas, foi o único que retratou o
Poxim e seus dois principais engenhos – Jenipapo e Porção – no século XVIII, mas não
avança para outra abordagem histórica, como é o caso do contrabando no Poxim e em
seu termo. Essa questão é trabalhada por Félix Lima Júnior em seu livro Escravidão em
Alagoas.
Podemos observar que a maioria das pesquisas publicadas tratou apenas da
questão do açúcar deixando para trás abordagens importantes como o crescimento
populacional, as irmandades, o uso da madeira local para consertos e fabricação de
embarcações, o contrabando, o cotidiano das pessoas que lá viviam, as rotas que
percorriam o açúcar e os demais produtos que eram produzidos no Poxim e na região,
os conflitos interno que havia entre as pessoas que detinham o poder político e as
pessoas que tinham o poder econômico. O único historiador local que aborda alguns
desses temas, de forma rasa, é João Lemos nas obras Coruripe: sua história, sua gente,
suas instituições e Poxim: terra de história e de mitos: Vila Real de São José do Poxim
do Sul (como ficará evidente ao longo do texto).
Faremos um estudo nessa pesquisa para preencher as lacunas deixadas por esses
historiadores a partir dos documentos encontrados no Arquivo Público de Alagoas, nos
Catálogos Manuscritos Avulso do Arquivo37 Histórico Ultramarino, e dos documentos
Manuscritos do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas e, com isso, valemo-nos
dessas fontes que formam o chão do passado por onde pretendemos caminhar. Assim,
teremos a possibilidade de trabalhar com novos objetos de estudo a partir dessas fontes
que tornarão esse trabalho possível diante da construção de um determinado tempo e
37
LEVI. Giovanni. O Trabalho do historiador: pesquisar, resumir, comunicar. Revista Tempo,
Volume
20,
2014.
P.
1.
Acessado
em
29/07/2015,
ás
11:05.
In:
http://www.scielo.br/pdf/tem/v20/pt_1413-7704tem-20-20143606.pdf
25
local, nesse caso, a freguesia do Curato de São José e Madre de Deus do Poxim. Sendo
assim, podemos demonstrar que o processo não estava apenas ligado somente ao
aspecto político e econômico, mas está ligado à questão social.
26
CAPÍTULO I: OS ENGENHOS E O CRESCIMENTO POPULACIOAL DO
POXIM
“Para os que não sabem o que custa a doçura do açúcar a quem o lavra,
o conheçam e sintam menos dar por ele o preço que vale.”
André Antonil38
Nesse primeiro capítulo, mostraremos como se deu o processo de ocupação do
vale do rio Poxim em função da criação do gado inicialmente, e depois veio à instalação
dos primeiros engenhos de açúcar na região, que foram os engenhos Jenipapo e Porção
por volta de 1774. Ambos, os engenhos, eram administrados pela família Carvalho
como mostra o documento do Arquivo Histórico Ultramarino39 do dia 13 de Fevereiro
de 1801, em que o padre Antônio Joaquim de Carvalho e Couto faz um requerimento ao
príncipe regente, D. João, pedindo provisão de insinuação para confirmação da doação
do Engenho Jenipapo para seu irmão, o alferes Francisco Manuel de Carvalho e Couto,
morador no termo40 da Vila Real de São José de Poxim Comarca de Alagoas, ou seja,
em suas mãos estavam os dois principais engenhos do Poxim e de seu termo: o Jenipapo
e o Porção.
Ambos os engenhos favoreceram o processo de ocupação do Poxim e seu termo,
consequentemente foram catalizadores populacionais como mostra os mapas
populacionais do Governador de Pernambuco José César de Menezes e o Bispo do
Recife D. Tomás. Esses mapas registram o número dos fogos e habitantes do Poxim no
século XVIII, e para acrescentar esse desenvolvimento populacional no século seguinte,
temos os relatórios do Estado de Alagoas e Tesouraria da Fazenda no ano de 1853, que
mostra tal crescimento sendo dividido por sexo e cor das pessoas que lá viviam.
No entanto, essa situação que só era vista nos mapas populacionais do século
XVIII, apenas a divisão por sexo e não pela cor. Situação essa, que nos depararmos com
os livros do Cartório de Imóveis de Jorge de Azevedo Castro - Coruripe - Livros II,
em que há uma alforria do escravo Domingos, filho bastado do dono de sua mãe que era
38
ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil por suas drogas e Minas. 3. ed. Belo
Horizonte: Itatiaia/Edusp, 1982. p.26.
39
AHU_ACL_CU_004, Cx. 5, D. 396.
40
A expressão “termo” do Poxim refere-se às outras localidades que pertenciam ao Poxim como é o caso
de Coruripe, Pontal de Coruripe, Lagoa do Pau, Peba e Jequiá da Praia e Barra de Jequiá (hoje se chama
de Duas Barras).
27
de cor parda e das cartas patente Regimento das Milícias do Catálogo Manuscritos
Avulso do Arquivo Histórico Ultramarino. Esses pedidos de carta patente foram feitos
para que o homem de cor se inserisse socialmente naquele espaço colonial, não que isso
fosse regra ou garantisse ao homem de cor sua inserção no espaço de brancos.
O rio Poxim, que foi uma “estrada hídrica” para compor o mercado fornecedor e
consumidor de escravos, e de produtos usuais da terra (açúcar, farinha de mandioca,
fumo, aguardente e etc.) na região do vale do São Francisco, também foi muito utilizado
para força motriz da moenda do engenho. O mesmo rio foi responsável pelo
contrabando de produtos usuais da terra, açúcar e escravos entre Alagoas e Bahia. A
Vila Real de São José do Poxim contavam com a presença do negro africano para o
pesado trabalho nas lavouras de cana e na produção do açúcar.
O negro no Poxim era responsável pelos trabalhos artesanais de móveis,
santeiros e oratórios, tendo sido o altar-mor e a pia batismal da Igreja Matriz de São
José do Poxim, talhados por esses negros da região. Como também era responsável por
trabalhar na melhoria e reforma da vila do Poxim, como mostra o ofício aos Vereadores
e Procurador da Câmara da Vila do Poxim, pedindo informações sobre melhoramentos e
reformas da vila, em 18 ju1ho de 182241.
Por fim, recorremos também aos Ofícios do Presidente da Câmara da Vila do
Poxim, que encontrasse no APA, determinando o cumprimento de Leis referentes aos
impostos sobre os escravos42 e arrematação dos subsídios literário, referente à carne
verde, aguardente, farinha de mandioca, sal, feijão verde e outros.
1. Os engenhos e o crescimento populacional do Poxim
No início do século XVIII, quando Alagoas43 ainda pertencia à Capitania de
Pernambuco, surgiu, no litoral sul de Pernambuco e próximo ao vale do São Francisco,
41
IHGAL. Documento – 00187 – 04 – 03 – 27.
IHGAL. Documento – 00415– 7 – 1 – 4.
43
Vale lembrar que nesse período não havia Alagoas, e sim uma região isolada, ou a periferia, ao sul da
Capitania de Pernambuco que recebeu pouca atenção do governo colonial. AZEVEDO, José Ferreira.
Formação sócio-econômica de Alagoas; o período Holandês (1630 - 1654) – Uma mudança de rumo.
São Paulo: USP, 2002. 111 p. Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação em História, Universidade
de São Paulo, São Paulo, 2002. p.149.
42
28
o povoado do Poxim44, que assim como as principais vilas de Alagoas - Vila45 de Porto
Calvo de Santo Antônio dos Quatros Rios46, Vila de Santa Maria Magdalena de Alagoas
do Sul47, Santa Luzia do Norte e Vila de São Francisco de Penedo48 não foi indiferente
ao plantio da cana-de-açúcar49, como todas as outras regiões de Alagoas, já que “não
parece acreditável que possa existir uma história das Alagoas sem o açúcar”50.
Podemos destacar, dentro do processo açucareiro, em Alagoas, o vale do rio51
Poxim52 com os engenhos Jenipapo e Porção53, sendo o Jenipapo o grande agente
catalizador da expansão industrial açucareira na região e, ao mesmo tempo, grande
44
Em 8 de julho de 1779, o Poxim tem deferido um pedido de elevação da vila pelo ouvidor José
Mendonça de Moreira (1779 - 1797), mas logo a pós esse episódio o Poxim deixa de ser uma vila e é
elevada à categoria de cidade através da deliberação do ouvidor Manuel Joaquim Pereira de Matos
Castelo Branco (1797 - 1805). Mais tarde, foi criada a vila de Coruripe pela Lei nº 484 de 23 de
julho de 1866, para o qual passou a sede do município, com a denominação de Coruripe. Encontra-se no
Anexo I, a Carta do Ouvidor Geral da Comarca de Alagoas comunicando haver deferido o pedido de
elevação de vila da povoação do Poxim, em 8 de junho de 1799. IHGAL. Documento – 0065 – 02 – 02 –
10. Ver, também LIMA, Ivan Fernandes. Ocupação Espacial do Estado de Alagoas. Maceió: SEPLAN,
1992. p. 129.
45
Vila. Povoação, ou cercada, que nem chega à cidade, nem é tão pequena, como aldeia. BLUTEAU,
Raphael. Vocabulario Portuguez e Latino – volume 1. Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin.
Disponível em: http://dicionarios.bbm.usp.br/pt-br/dicionario/1/vila. Acessado em 24/09/2017, às 23: 08
min. Para Silvia Lara, em Fragmentos Setecentistas, as vilas e cidades constituíam-se como unidades
administrativas não a partir de seu núcleo arruado, mas pela jurisdição abrangida pelas Câmaras e que ela
torna-se um elemento na hierarquia que vai da aldeia passando para um povoado chegando a elevação de
vila até chegar à cidade. Em outras palavras, as vilas e cidades marcavam o poder colonial
(metropolitano) sobre as novas terras. p. 240.
46
Atual cidade de Porto Calvo, também era conhecida como Alagoas Borel (Alagoas Pars Boreal).
ALCIDES, Melisa Mota. O Desenho das Primeiras vilas do Território Alagoano. In: ANPUH – XXII
Simpósio de História, 2003. João Pessoa, Paraíba. p. 6.
47
Refere-se à atual cidade de Marechal Deodoro ou a antiga Vila de Santa Magdalena do Norte e do Sul
das Alagoas.
48
Quando estava sobre o domínio holandês a Vila passou a chamar de Maurícia.
49
O Brasil passou a produzir açúcar para o mundo a partir 1580. Ver ALENCASTRO, Luiz Felipe de. O
trato dos viventes: formação do Brasil no Atlântico sul, séculos XVI e XVII. São Paulo: Companhia
das Letras, 2000. p. 33.
50
DIEGUES JÚNIOR, Manuel. O bangüê nas Alagoas. Maceió, EDUFAL. 2006. p.26.
51
As margens desses rios e lagoas, também, eram férteis, através das enchentes, que deixavam o solo
(massapé) fecundo. A fertilidade da região açucareira foi um fator preponderante no cultivo da cana.
Gilberto Freyre destaca bem essa questão quando diz que “nas condições físicas de solo e de
temperatura, Portugal é antes África do que Europa. O chamado “clima português” de Martone, único
na Europa, é um clima aproximado do africano”. Ver FREYRE, Gilberto. Casa Grande & Senzala.
Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1963. p, 49
52
Poxim, do tupi-guarani, literalmente significa: sujinho, ruinzinho ou camarão. Agora Y–Poxim,
significa rio de água escura. Segundo João Lemos, as terras do Poxim foi doação de Antônio de Moura
Castro, a São José, padroeiro do povoado. Ver LEMOS, João Ribeiro. Coruripe: sua história, sua gente,
suas instituições. Maceió. Ed. Do autor, 1999. p. 180.
53
Segundo Lemos, o primeiro engenho no Poxim foi o Engenho Poxim feito de taipa por um nobre
português. Mas não temos documentos que provem a existência desse engenho. Ver LEMOS, João
Ribeiro. Poxim: terra de história e de mitos: Vila Real de São José do Poxim do Sul. Ed. Coruripe,
AL, 2018. p. 13.
29
contribuinte na formação do contingente humano, já que foi no núcleo do engenho54 que
se gerou a base do sustento econômico e demográfico para o espaço açucareiro 55 e por
consequência, o surgimento da família56 como uma organização social57. Segundo
Dieguês Júnior, foi à família58 o elo59, principalmente econômico, entre o núcleo rural e
urbano que foi fortalecendo, à medida que a produção de açúcar aumentava e
estimulava o surgimento de novos núcleos de povoamento nesse caso o Poxim, e sendo
ela o elo econômico da produção de açúcar, a qual aumentava e estimulava o
surgimento de novos núcleos de povoamento e a utilização em larga escala de mão de
obra escravizada60, a qual através do processo de aristocratização social61 possibilita o
contato humano entre o negro e o branco, surgindo à figura do mestiço, de modo que
agilizou o processo de povoamento local.
No decorrer do século XVII que se alastrou o povoamento da região, e
criaram-se para engenhos de açúcar; os vales de Coruripe e do Poxim
prestavam-se para agricultura da cana. E começaram a encher-se de canaviais
de boeiros de engenhos, de casas-grandes; igualmente – e principalmente –
54
AZEVEDO, José Ferreira. Formação sócio-econômica de Alagoas; o período Holandês (1630 1654) – Uma mudança de rumo. São Paulo: USP, 2002. 111 p. Tese (Doutorado) – Programa de PósGraduação em História, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002.
55
No nordeste a colonização se deu através da construção do engenho de açúcar, pois foi o açúcar o
motivador da colonização e o fator que fixou o homem à terra e ao mesmo tempo estabeleceu núcleos
estáveis de pessoas por conta da atividade açucareiro. Ver DIEGUES JÚNIOR, Manuel. População e
Açúcar no Nordeste do Brasil. Maceió: Edufal, 2012. p. 25.
56
Destacamos aqui o modelo da família patriarcal, que tinha como base econômica a terra, as riquezas
agrícolas e o trabalho escravo. Ver FREYRE, Gilberto. Casa Grande & Senzala. Brasília: Editora
Universidade de Brasília, 1963. p. 60.
57
A família existia na figura do senhor de engenho, em que era identificado na colônia como o grupo que
se auto identificava como a nobreza, isso como era na Europa e esses mesmo senhores formaram grupos
centrais (família) para administrar e organizar esses os povoados, as vilas e as cidades. Ver RUSSELLWOOD, A.J.R. Centro e periferia no mundo luso-brasileiro, 1500-1808. Revista Brasileira de História.
Vol. 18, n. 36, 1988, pp. 187-249.
58
Segundo Douglas Apratto, em “Caminhos do Açúcar. Engenhos e Casas-grandes das Alagoas” A
família condicionou o ethos da sociedade alagoana. Ver TENÓRIO, Douglas Apratto; DANTAS,
Carmem Lúcia. Caminhos do Açúcar: Engenhos e Casas Grandes das Alagoas. 2ª ed. Maceió:
SEBRAE/AL, s. d.
59
DIEGUES JÚNIOR, Manuel. População e Açúcar no Nordeste do Brasil. Maceió: Edufal, 2012. p.
39.
60
Por falta de documentos, não se tem uma noção de quais eram os tipos étnicos de negros que vinham
para Alagoas, já que os primeiros vinham diretamente de Olinda, mas se sabe que muitos eram os “negros
da nação”, “cabra roxo”, “pardo”, “mulato claro” e que era raro serem da Guiné ou Angola, isso no século
XIX. Sabe-se, que no período holandês, em Alagoas, os escravos eram bantus e saídos dos portos de
Angola e Congo, uma das formas que foram identificados foi pela linguística usadas no folclore dessas
regiões. Por outro lado, sabe-se, que a partir da conquista de São Paulo de Luanda, na África, em 24 anos
de dominação os holandeses trouxeram para o nordeste cerca de 26.000 escravos. DIEGUES JÚNIOR,
Manuel. População e Açúcar no Nordeste do Brasil. Maceió: Edufal, 2012. p. 52.
61
Com a expansão dos engenhos de açúcar houve também a ampliação das atividades açucareiras e
consequentemente as família, oriundas dessas áreas, multiplicou-se. Ver DIEGUES JÚNIOR, Manuel.
População e Açúcar no Nordeste do Brasil. Maceió: Edufal, 2012. p. 35.
30
negros escravos.62
Foram em núcleos de povoamento como o Poxim que nasceram as principais
famílias 63de Alagoas ou, em outras palavras, foi em núcleos açucareiros que se gerou a
aristocracia alagoana. Essas famílias não fizeram da zona açucareira “apenas um centro
social e demográfico, além do econômico que já era essencialmente; também um centro
político” 64. Segundo Diégues Júnior, em O Bangüe das Alagoas, sem essa organização
chamada família não haveria todo o desenvolvimento da indústria açucareira. Podemos
observar a importância da família para o desenvolvimento da monocultura latifundiária
e escravocrata com Gilberto Freyre em Casa Grande & Senzala.
A família, não o indivíduo, nem tampouco o Estado nem nenhuma
companhia de comércio, é desde o século XVI o grande fator colonizador no
Brasil, a unidade produtiva, o capital que desbrava o solo, instala as fazendas,
compra escravos, bois, ferramentas, a força social que se desdobra em
política, constituindo-se na aristocracia colonial mais poderosa da América.65
A família66 liga o núcleo rural67 ao urbano, fortalecendo à medida que a
produção de açúcar aumentava e estimulava o surgimento de novos núcleos de
povoamento. Tomaremos como exemplo à família Carvalho que esteve sempre à frente
dos dois primeiros engenhos (Jenipapo e Porção) que havia na região do Poxim, no
século XVIII, ambos eram administrados pelo chefe68 da família – o senhor de engenho
62
DIEGUES JÚNIOR, Manuel. O bangüê nas Alagoas. Maceió, EDUFAL. 2006.p. 84.
Não era necessariamente a família consanguínea, mas a família que dar estabilidade para o patriarca e
garantia o status quo na pirâmide social dentro do espaço político açucareiro. Ver FARIA, Sheila de
Castro. A Colônia em movimento. Fortuna e Família no Cotidiano Colonial. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1998. p. 21.
64
Idem. p. 90.
63
65
FREYRE, Gilberto. Casa Grande & Senzala. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1963. p.81.
Segundo Gian Carlo, no século XVIII não havia o termo família, ele só vem aparecer na segunda
metade do XIX, mas não significava que “não existissem, mas sim que eram tratadas por outras
denominações, entre elas o termo parentes”. Esses parentes seriam afilhados, filhos ilegítimos agregados,
serviçais, escravos e outros. SILVA, Carlo de Melo. Alguns Caminhos para entender a “família” no
período colonial. In: De que estamos falando? Antigos conceitos e modernos anacronismos – escravidão
e mestiçagens. Rio de Janeiro, Editora, Garamond, 2016. p. 133.
67
No momento da dominação holandesa em Alagoas, não havia uma interferência direta dos invasores na
zona rural, já que os batavos limitava-se a ocupação dos centros urbanos litorâneos. Esse, também, é um
dos motivos da forte dominação das famílias nas regiões rurais, onde estavam muitos engenhos.
68
Segundo o historiador Gian Carlo, a figura do pai tinha força em toda a comunidade, já que era algo
facilitado pela própria estrutura latifundiária e escravocrata por conta da ausência da administração do
Estado lusitano. SILVA, Carlo de Melo. Alguns Caminhos para entender a “família” no período
colonial. In: De que estamos falando? Antigos conceitos e modernos anacronismos – escravidão e
mestiçagens. Rio de Janeiro, Editora, Garamond, 2016. p. 123.
66
31
(pater-familias omnipotente) e moendo pela força dos escravos, que viviam no sistema
patriarcalista69, já que
no Brasil, onde imperou, desde tempos remotos, o tipo primitivo da família
patriarcal, o desenvolvimento da urbanização — que não resulta unicamente
do crescimento das cidades, mas também do crescimento dos meios de
comunicação, atraindo vastas áreas rurais para a esfera de influência das
cidades.70
O escravo veio para os engenhos nas áreas71 mais longínquas da Capitania de
Pernambuco para empregar a sua força e, consequentemente, aumentou a população que
gira em torno da zona açucareira, não só com sua presença, mas também com a
miscigenação que naquela região do litoral sul da Capitania de Pernambuco, hoje sul de
Alagoas, foi palco como afirma Diegues Júnior:
Para lavoura da cana é que eles se dirigiam. Os engenhos, os canaviais, os
carros de bois foram atraindo a população negra cujo crescimento não se fez
esperar. É justamente na área canavieira que se vai concentrando o elemento
africano, importado como escravo para a exploração monocultura da terra. 72
A tabela abaixo mostra algumas das grandes famílias que predominavam na Vila
Real de São José do Poxim e Coruripe e sua importância para o desenvolvimento local,
já que em sua maioria está ligada à cultura da cana-de-açúcar. Destacamos os
Carvalhos, que assim como os Castros sempre estiveram ligados ao fabrico do açúcar,
ou seja, ambas as famílias relacionada à fertilidade da terra, desde que chegaram à
região, deram origem ao Poxim com a influência da figura do escravo negro.
69
Uma das características mais marcante do período colonial brasileiro foi à família patriarcal.
Essa denominação remete à antiguidade, quando a sociedade se organiza em grandes clãs, ou
famílias, dirigidas pelo patriarca, que geralmente estava centrada na figura do homem mais
velho do clã e tinha o poder inquestionável. O patriarca do período colonial brasileiro era o
dono e senhor de todas as pessoas que viviam sobre seu teto e suas terras, dispunha da vida de
todos da mesma forma que de seus bens materiais. AQUINO, Rubim Santos Leão. História das
sociedades - das comunidades primitivas as sociedades medievais. Rio de Janeiro, Editora: Ao Livro
Técnico, 1984. p. 227.
70
HOLANDA, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil. 5º edição. José Olympio, São Paulo, 1969. p.105.
71
Os escravos, geralmente, quando chegavam ao Brasil iam trabalhar nas zonas rurais, onde estavam os
engenhos. Esses negros passaram a receber os nomes de escravos do eito. DIEGUES JÚNIOR, Manuel.
População e Açúcar no Nordeste do Brasil. Maceió: Edufal, 2012. p. 140.
72
DIEGUES JÚNIOR, Manuel. O bangüê nas Alagoas. Maceió, EDUFAL. 2006.p.164.
32
QUADRO 1 - FAMÍLIAS DO POXIM E CORURIPE73
FAMÍLIA
TRONCO DA FAMÍLIA
CASTROS,
ANTÔNIO MOURA
CARVALHO,
DOM BARTOLOMEU DE
COUTINHOS,
DOM VASCO
PACHECOS,
DOM FERNÃO JEREMIAS
RAMALHOS,
DOM GONÇALO ANES
SIQUEIRAS,
DIEGO DE SIQUEIRA
BARRETOS
GOMES MENDES
BAETAS,
DOM ARNALDO
FERREIRAS74,
DOM ÁLVARES RODRIGES
FIALHOS,
JOÃO DE FIALHO
GAMAS,
ÁLVARO ANES
LESSA,
D. PEDRO I E INÊS DE CASTRO
LEMOS,
DOM BERMUNDO ORNODES
REIS,
JOÃO JOSÉ
FONTE: LEMOS, 1999. p. 73, 74, 75, 76, 77 E 78.
73
LEMOS, João Ribeiro. Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições. Maceió. Ed. Do autor,
1999.
74
Foram os primeiros a habitar a região do Poxim, São Miguel e Jequiá da Praia. LEMOS, João Ribeiro.
Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições. Maceió. Ed. Do autor, 1999. p. 73, 74, 75, 76, 77 E
78. Essas famílias são de origem lusitana e hispânica e todas estão ligadas à monocultura da cana-deaçúcar.
33
A família75, como podemos notar, foi à mola propulsora para o desenvolvimento
produtivo da cana-de-açúcar, a formação demográfica do local e a formação do centro
político e social da região canavieira, principalmente em Alagoas, já que “coube à
família, na organização social brasileira, constituir-se não apenas a unidade étnica,
mas ainda, e principalmente, o centro de produção, o núcleo cultural, e o bloco
político” 76 de onde emanavam as decisões sobre o ser, o fazer e o produzir.
Contudo, não podemos perder de vista o fato que no início do século XVIII, o
ponto mais alto dessas aristocracias estava concentrado na hierarquia social colonial77,
em que todo prestígio estava na elite agrária expressa na figura da família. Uma elite
voltada ao comércio do Atlântico com negociantes de escravos e redes comerciais78 e ao
mesmo tempo, uma elite que luta para consolidar sua condição política, econômica e
social.
No ano de 1774, havia dois engenhos no termo do Poxim - Jenipapo79 e o Porção
-, que eram administrados pela família Carvalho, como já falamos. A registro histórico
temos a carta topográfica da Capitânia de Alagoas em 1820 (MAPA 1), a pedido do
Coronel Francisco Manuel Martins Ramos. Nela podemos identificar os dois engenhos,
e outros mais, e junto a eles todo o termo do Poxim. Ambos produziam arrobas e mais
arrobas de açúcar moído pelo trabalho árduo dos escravos80, pois aquelas terras, “por
suas condições geográficas, foram, aliás, um fator de importância no facilitar a
implantação dos canaviais, e com eles a fixação dos grupos humanos”81, e ao mesmo
75
Para Sheila Faria, em A colônia em Movimento, a família não era apenas aquela que estava ligada ao
laço de sangue, mas era uma organização além do consanguíneo ou matrimonial. FARIA, Sheila de
Castro. A Colônia em movimento. Fortuna e Família no Cotidiano Colonial. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1998. p. 385.
76
DIEGUES JÚNIOR, Manuel. População e Açúcar no Nordeste do Brasil. Maceió: Edufal, 2012. p.
49.
77
MATHIAS, Carlos Leonardo Kelmer. As múltiplas faces da escravidão. O espaço econômico do
ouro e sua elite pluriocupacional na formação da sociedade mineira setecentista, c. 1711 – c. 1756.
Rio de Janeiro: Mauad, 2012. p.119.
78
Idem. p. 129.
79
Na verdade o Engenho Jenipapo e Porção ficavam, na época, onde hoje é Coruripe, mas no período
tudo era Poxim e seu termo.
80
A relação do trabalho escravo está tracejada em um movimento constante de luta de classe através dos
conflitos sociais entre o senhor e escravo, que estão entrelaçados em uma relação pessoal de dominação e
exploração. THOMPSON, Edward Palmer. Costumes em comum – Estados sobre cultura popular
tradicional. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p. 304.
81
DIEGUES JÚNIOR, Manuel. População e Açúcar no Nordeste do Brasil. Maceió: Edufal, 2012. p.
27.
34
tempo um ponto de extrema importância na articulação do mercado interno e de coleta
de impostos e dízimos82.
MAPA 1 - CARTA CARTOGRÁFICA DO CORONEL FRANCISCO MANUEL
MARTINS RAMOS EM 1820
FONTE: Carta topográfica da capitania das Alagoas: que á pedido do ilustríssimo Senhor
Coronel Francisco Manuel Martins Ramos, comandante dos distritos, das villas de Penedo e do
Poxim, trasladou José da Silva Pinto, na Villa de Maceyó, 1820. https://www.bn.gov.br/.
Acesso em: 23 jan. 2019.
O escravo83 é um elemento desses grupos humanos, já que com o crescimento
dos canaviais, a população branca reduzia-se e a mestiça84 crescia, dando volume
populacional expressivo. Os escravos negros que vieram da África85, prioritariamente,
82
RUSSELL-WOOD, A.J.R. Centro e periferia no mundo luso-brasileiro, 1500-1808. Revista
Brasileira de História. Vol. 18, n. 36, 1988, pp. 187-249.
83
Silvia Lara chama a atenção para os termos “negros” e “pretos”, em que o negro era designado a cor e o
preto equivale a condição de escravo. Nós usaremos, para fácil compreensão, o termo negro para designar
o escravo, já que as fontes trabalhadas nessa pesquisa utilizam o termo negro para designar a mão de obra
africana. Fragmentos setecentistas. Escravidão, cultura e poder na América portuguesa, p. 132 e 135.
84
DIEGUES JÚNIOR, Manuel. População e Açúcar no Nordeste do Brasil. Maceió: Edufal, 2012. p.
91.
85
A venda do açúcar, da safra anterior, possibilitava a compra de mais negros africanos para trabalhar no
nos engenhos. Ver ALENCASTRO, Luiz Felipe de. O trato dos viventes: formação do Brasil no
Atlântico sul, séculos XVI e XVII. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. p. 36.
35
para trabalhar nos engenhos da região86 do Poxim já eram resultados lucrativos da
produção anterior desses dois engenhos, e atracavam nos portos da Capitania
pernambucana e eram distribuídos para todos os seus distritos fluindo para “os portos
do sertão, Alagoa, e Rio São Francisco do Sul” 87 e baiana, pois
os lucros potenciais das fazendas e engenhos servem de garantias para a
compra de novos fatores de produção (escravos), o excedente é investido
produtivamente: os escravos representam um quinto do investimento num
engenho de açúcar e metade do investimento dos lavradores de cana.88
Nem todos os escravos que vinham de Angola e da Costa da Mina iam para
Pernambuco, eles não ficavam somente na Capitania pernambucana. Eles eram
distribuídos por toda a colônia em locais como Bahia89, Rio de Janeiro90, Maranhão e
Paraíba, cuja distribuição servia para suprir por instante a carência de mão de obra no
mercado interno. Não é à toa que, nos anos de 1782 a 1783, Pernambuco importou de
Angola 2.436 escravos adultos e 7 crias91. Anos antes, entre 1722 a 1731, esse número
de escravos trazidos para Pernambuco da Costa da Mina92 era cerca de 22.270 escravos.
O mapa abaixo mostra o trato negreiro entre Brasil, África Atlântica e Portugal.
Com isso, observamos o fluxo comercial intenso e ininterrupto de cativos que saíam dos
portos de Guiné, Costa da Mina, São Tomé, Benguela, Reino de Loango e Angola.
86
Segundo Diégues Jr. Os bantus foram os maiores contingentes de negro que chegaram aqui no nordeste
e estavam divididos em dois grupos: os angola-congos e os negros da Contra Costa. DIEGUES JÚNIOR,
Manuel. População e Açúcar no Nordeste do Brasil. Maceió: Edufal, 2012. p. 43.
87
CARREIRA, Antônio. As Companhias Pombalinas de Navegação. Comércio e Tráfico de Escravos
entre a Costa Africana e o Nordeste Brasileiro. Editora: Centro de Estudos da Guiné Portuguesa,
porto,1969. p. 251.
88
ALENCASTRO, Luiz Felipe de. O trato dos viventes: formação do Brasil no Atlântico sul, séculos
XVI e XVII. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. p. 38.
89
Segundo Alencastro alguns escravos foram obtidos através da troca com a mandioca, que os jesuítas
exportavam da Bahia para os missionários em Angola. Idem. p. 91.
90
CARREIRA, Antônio. As Companhias Pombalinas de Navegação. Comércio e Tráfico de Escravos
entre a Costa Africana e o Nordeste Brasileiro. Editora: Centro de Estudos da Guiné Portuguesa, porto,
1969. p. 91.
91
Idem. p. 262.
92
FRAGOSO, João e GOUVÊA, Maria de Fátima. (Orgs.) Na trama das redes: política e negócio no
império português, séculos XVI-XVIII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010. p. 209.
36
MAPA 2 - COMÉRCIO DE ESCRAVOS PARA A AMÉRICA PORTUGUESA, NOS
SÉCULOS XVII E XVIII, DECORRE DE COMÉRCIO BILATERAL93
FONTE: ALENCASTRO, 2000, p. 250.
Com o crescimento populacional, a Vila Real de São José do Poxim passa a ter
1.682 pessoas no ano de 177494, segundo o relatório do governador da capitania de
Pernambuco, José César de Menezes (1774 a 1787). Já no ano seguinte, José César de
Menezes95 descreve o número de habitantes na vila e mostra que houve um boom
populacional, contendo 294 crianças de 7 anos completos, 248 homens (sic) de 45 anos,
496 homens de idade de 60 anos, homens até 60 e velhos acima de 60, e dois velhos
com 90 anos, totalizando 1.082 do sexo masculino, 284 crianças de até 7 anos, 202
raparigas de até 14 anos, 545 de mulheres até 50 anos, 113 velhas acima de 50 anos, e 7
velhas acima de 90 anos, totalizando 1.144 e na soma de ambos os sexos temos o valor
2.226 da população do Poxim.
Esse boom populacional ocorreu em toda a América portuguesa ao logo do
século XVIII, essa explosão populacional era própria do desenvolvimento da economia
93
ALENCASTRO. Luiz Felipe de. O trato dos viventes: formação do Brasil no Atlântico sul, séculos
XVI e XVII. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
p. 250.
94
ANAIS DA BIBLIOTECA NACIONAL, Rio de Janeiro, v.40: 1918 (1923).
95
AHU_ACL_CU_015, Cx. 120, D. 9193.
37
escravista96, essa explosão populacional teve seu crescimento com a exploração do ouro
nas minas, pois o ouro incorpora “várias regiões do interior ao circuito exportador, a
expansão da produção açucareira em novas áreas, e o consequente aumento do volume
do tráfico negreiro” 97.
Com o passar do tempo, a região tem um crescimento populacional significativo,
tanto que chegamos ao ano de 1788, com o número de habitantes superior aos
apresentados por José César de Menezes. De acordo com o mapa populacional de D.
Tomás da Encarnação Costa e Lima (1787 a 1798)98, bispo de Recife e Olinda, houve
um crescimento populacional expressivo de 1775 a 1788. A tabela abaixo nos mostra tal
volume populacional na região do Poxim e nos acrescenta que a contagem estava
baseada pela faixa etária99, e não pela cor, a partir de maiores e menores de sete anos de
idade em um total de três divisões.
QUADRO 2 - MAPA POPULACIONAL DE 1788
MAPA POPULACIONAL DE D. TOMÁS JOSÉ DE MELO - 1788
CRIANÇAS DE TAMANHO COMPLETO
405
RAPAZ DE 15 ANOS
265
HOMENS NA IDADE DE 60
853
HOMENS ACIMA DE 60
72
VELHOS COM 90 ANOS
6
TOTAL DO SEXO MASCULINO
1.595
CRIANÇAS DE ATÉ 7 ANOS
350
RAPARIGAS DE ATÉ 14 ANOS
247
96
Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro foram os principais articuladores desse espaço através do
comércio atlântico de escravos. Ver CARREIRA, Antônio. As Companhias Pombalinas de Navegação.
Comércio e Tráfico de Escravos entre a Costa Africana e o Nordeste Brasileiro. Editora: Centro de
Estudos da Guiné Portuguesa, porto, 1969.
97
LARA, Silvia Hunold. Fragmentos setecentistas. Escravidão, cultura e poder na América
portuguesa. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. p. 128.
98
AHU_ACL_CU_015, Cx. 178, D. 12472.
99
LARA, Silvia Hunold. Fragmentos setecentistas. Escravidão, cultura e poder na América
portuguesa. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. p. 129.
38
MULHERES ATÉ 50 ANOS
637
VELHAS ACIMA DE 50 ANOS
156
VELHAS ACIMA QUE PASSA OS 90 ANOS
5
TOTAL
1.387
SOMA DE AMBOS OS SEXOS
2.982
FONTE: AHU_ACL_CU_015, Cx. 178, D. 12472.
Cinquenta e cinco anos depois, em 7 de janeiro de 1853, registramos um mapa
populacional do Poxim sendo destinado ao chefe de polícia de Maceió, Francisco
Xavier Paes Barretto100. Neste mapa continha o número de homens e mulheres livres,
escravos e estrangeiros, coisa que os mapas apresentados do século XVIII não
registravam a condição social de cada homem ou mulher na vila do Poxim, obtendo
assim a soma de 6.552 pessoas. Através do mapa temos uma noção do número de
escravos no Poxim tanto homens quanto mulheres e é visível que o número de homens
escravos era bem maior. Vejamos o quadro abaixo.
QUADRO 3 - MAPA POPULACIONAL DE 1853101
MAPPA DA POPULAÇÃO DO TERMO DA VILLA DE SÃO JOSE DO POXIM
2452
2775
722
598
5
,,
Total da população
Homens Mulhere Homens Mulhere Homens Mulheres
s
s
Total dos Extrangeiros (sic)
Freguezia
do
mesmo
nome
Extrangeiros (sic)
Total dos Escravos
Villa do
Poxim
Escravos
Total de Livres
Livres
5227
1320
5
----
CAIXA 1038 - DOCUMENTO: Estado de alagoas – Tesouraria da Fazenda assunto: Mapa
populacional do Poxim ano: 1853. APA. Anexo II.
101
Idem.
100
39
,,
,,
,,
,,
,,
,,
,,
,,
,,
,,
-----
-----
-----
-----
-----
-----
-----
-----
-----
6552
Soma
FONTE: CAIXA 1038 - DOCUMENTO: Estado de Alagoas – Tesouraria da Fazenda
assunto: Mapa populacional do Poxim ano: 1853. APA.
Desde a elevação do povoado102 à freguesia103 do Curato104 de São José e Madre
de Deus do Poxim em 1718105, a região ganha volume demográfico algo que facilitou o
crescimento econômico local106, fazendo surgir outros núcleos de povoamento na área
do vale do São Francisco107. Tal avanço demográfico só foi possível por conta da
produção açucareira e do intenso comércio que ocorria no rio Poxim108, tanto ao sul de
102
Convém salientar que o povoado do Poxim primitivamente cresceu mais do que Coruripe, tanto que
em 1718 o bispo de Olinda, Dom Manuel Álvares da Costa (1710-1715), criou a paróquia e, em 1801, o
ouvidor Manoel Joaquim Castelo Branco instalou oficialmente a vila, construindo um pelourinho a uns 40
metros da Igreja e um quartel militar, marcando a jurisdição efetiva dos poderes locais. O Poxim passa a
ser denominado de Vila Real de São José do Poxim, ou seja, o Poxim ganhou Status de núcleo por
interesse colonial, em que favorecia a estabilidade da administração colonial. Ver RUSSELL-WOOD,
A.J.R. Centro e periferia no mundo luso-brasileiro, 1500-1808. Revista Brasileira de História. Vol. 18,
n. 36, 1988, pp. 187-249.
103
A igreja Paroquial. O lugar da cidade ou do campo em que vive os fregueses. Vocabulário Portuguez
e Latino – volume 1. Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin. Disponível em:
http://dicionarios.bbm.usp.br/pt-br/dicionario/1/vila. Acessado em 24/09/2017, às 23: 08 min. Para Silvia
Lara, em Fragmentos Setecentistas, as freguesias eram o lugar para circulação espacial usada por
moradores das vilas e cidades para frequentar as igrejas paroquiais da localidade mais próxima.
104
Curato, curató. Igreja da cúria. Paróquia. Vocabulario Portuguez e Latino – volume 1. Biblioteca
Brasiliana
Guita
e
José
Mindlin.
Disponível
em:
http://dicionarios.bbm.usp.br/ptbr/dicionario/1/CURATO.
105
DIEGUES JÚNIOR, Manuel. O bangüê nas Alagoas. Maceió, EDUFAL. 2006. p. 31.
106
THOMPSON, Edward Palmer. Costumes em comum – Estados sobre cultura popular tradicional.
São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p. 304.
107
Segundo Esdras, em Rio dos currais: paisagem material e rede urbana do rio São Francisco nas
capitanias da Bahia e Pernambuco, o rio São Francisco foi antes de tudo um fio de condução para o
povoamento dos sertões, em que os assentamentos humanos de diferentes níveis e perfis se beneficiaram
político, econômico e socialmente por estarem localizados em suas margens. O que de certa maneira, o
curso fluvial do rio garantia facilidade de comunicação e diminuição da dispersão latente em que viviam
os moradores mais interioranos. ARRAES, Esdras. Rio dos currais: paisagem material e rede urbana
do rio São Francisco nas capitanias da Bahia e Pernambuco. <http://dx.doi.org/10.1590/S010147142013000200003 > Acesso em 07 de mai. 2014, 03:13.
108
Esses rios conseguiam penetrar no interior das zonas açucareiras para fazer a distribuição do açúcar em
várias partes da capitania. SANTANA, Moacir Medeiros de. Contribuição à história do Açúcar em
Alagoas. Recife: Museu do Açúcar. 1970. p.52.
40
Alagoas quanto ao norte, as embarcações109 traziam escravos, víveres, mantimentos das
capitanias baiana e pernambucana e serviam de rede de comunicação para ambas.
No mapa abaixo de 1774, observamos os curatos, as freguesias e vilas, da região
sul de Alagoas, o que nos permite deduzir que essas áreas eram relativamente povoadas
como afirma Manuel Correia de Andrade em Os rios-do-açúcar no nordeste Oriental
IV110.
MAPA 3 - VILAS E FREGUESIAS DE ALAGOAS EM 1774111
FONTE: ANDRADE, 1997. p.32.
Ao sul da capitania, vinham de Sergipe e Salvador e demais portos da Bahia,
esses escravos e mercadorias, que singravam do Rio São Francisco em direção a Vila de
Penedo. Em Penedo eram distribuídas em rios menores, como é o caso do rio Poxim,
Coruripe, Jequiá, São Miguel e outros para o abastecimento das zonas açucareiras.
Não fossem as nossas vias naturais de transporte, como as lagoas Mundaú e
Manguaba, rios Coruripe, São Miguel, Santo Antônio Grande, Santo Antônio
Mirim, Camaragibe e Manguaba, naquela época navegável em boa parte do
percurso, estariam os agricultores e Senhores de Engenho alagoanos em
situação pior para levarem seus produtos às barcaças que os transportariam
para Maceió e Recife.112
109
RIBEIRO JÚNIOR, José. Colonização e Monopólio no Nordeste brasileiro: a Companhia Geral
de Pernambuco e Paraíba, 1759-1780. São Paulo, HUCITEC, 1976.
110
ANDRADE, Manuel Correia de. Usinas e Destilarias. Uma contribuição ao estudo da produção do
espaço. Maceió, EDUFAL. 1997. p.32.
111
Idem. 1997. p. 50.
112
SANTANA, Moacir Medeiros de. Contribuição à história do Açúcar em Alagoas. Recife: Museu do
Açúcar. 1970. p. 311.
41
O rio São Francisco era a principal rota, pois além de ligar a região do vale do
São Francisco à Salvador e Sergipe, ele também fazia a ligação com a região
mineradora. Segundo Francisco Vidal Luna e Herbert S. Klein, a coroa portuguesa
tentou impedir o comércio com os mineiros113, pois temia que toda a mão de obra dos
engenhos saísse para a região mineradora, deixando as freguesias e vilas do açúcar
estagnadas por falta de gente para o trabalho.
Segundo Diegues Júnior, em O bangüê nas Alagoas, as distribuições dos
produtos usuais da terra, açúcar e escravos também ocorriam vindas do Porto do
Francês, na parte norte da comarca de Alagoas, margeando o Oceano Atlântico, nas
Vilas de Alagoas do Norte (Santa Luzia do Norte) e Santa Maria Magdalena de Alagoas
do Sul (hoje Marechal Deodoro), e vinham sendo repassadas da mesma forma até o
Poxim e as outras áreas como Penedo114. Percebemos o mesmo movimento comercial
com Moacir Medeiros de Santana, em Contribuição à história do Açúcar em Alagoas;
Situados em sua maioria à margem da lagoa Manguaba e, alguns, pouco
distantes dela, os engenhos do antigo município das Alagoas, atual Marechal
Deodoro, transportavam o açúcar de seu fabrico em barcaças que singravam
as águas de três rios que desembocavam naquela lagoa: Salgado, Paraíba e
Sumaúma, "sendo que neste último com grande dificuldade por estar quase
inavegável em consequência da muita balsa e grandes paus que embaraçam a
sua corrente e o tornam pantanoso”.115
Os mesmos trajetos eram feitos para o escoamento do açúcar, que saíam dos
engenhos da região, no ano de 1854116, só no Poxim, sob mãos escravas, produziam-se
81 arrobas de açúcar, equivalente a 1.190,7 kg, por escravo117 para serem transportadas
nas águas do rio Poxim, que era largo e profundo e sobre ele deslizavam as sumacas,
com as mercadorias118 que saíam rapidamente de locais distantes e de difícil acesso,
para chegar à Europa, via Atlântico, já que
113
LUNA, Francisco Vidal; KLEIN, Herbert S. Escravismo no Brasil. São Paulo: EDUSP/Imprensa
Oficial do Estado de São Paulo, 2010. p. 63.
114
DIEGUES JÚNIOR, Manuel. O bangüê nas Alagoas. Maceió, EDUFAL. 2006. p. 45.
115
SANTANA, Moacir Medeiros de. Contribuição à história do Açúcar em Alagoas. Recife: Museu do
Açúcar. 1970. p. 311.
116
Segundo Moacir Santana é “no ano de 1854, no antigo município de Alagoas, existiam 35 engenhos,
que safrejavam uma média de 86.750 arrobas de açúcar; (…); Poxim, com 10 engenhos moentes e 2 de
fogo morto e mais 3 engenhocas de produção insignificante, safrejando os primeiros 22.800 arrobas (…)”.
Ver. Contribuição à história do Açúcar em Alagoas. Recife: Museu do Açúcar. 1970. p. 112.
117
Idem. p. 151.
118
Destacamos, mais adiante, a participação da Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba que foi uma
empresa criada no ano de 1759, com a função de desenvolver o comércio do Nordeste do Brasil. A
Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba estava diretamente ligada às necessidades do mercado
42
a criação da geografia do Atlântico deveria priorizar áreas acessíveis de
transporte por água, por isso alteraria outras considerações sobre o espaço e
distância, ligados as regiões distantes com mais facilidade do que regiões
situadas próximas uma das outras.119
O primeiro relato sobre a presença do escravo no Poxim e na utilização do rio
Poxim, como vias fluviais de transportes de escravos120 e mercadorias coloniais, foi no
final do século XVI e início do século XVII, quando o Poxim ainda era um povoado da
sesmaria de João da Rocha Vicente121 nos idos de 1600. Anos mais tarde, quando a
sesmaria foi doada para Antônio Moura Castro122, seu território foi redefinido e agora
estava situado entre o porto do rio São Miguel e o rio Coruripe.
MAPA 4 - COMARCA DE ALAGOAS SESMARIA – SÉCULO XVII123 -1600 A 1630124
FONTE: LIMA, 1992. p. 129.
colonial. Ver RIBEIRO JÚNIOR, José. Colonização e Monopólio no Nordeste brasileiro: a
Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba, 1759-1780. São Paulo, HUCITEC, 1976.
119
THORNTON, John Kelly. A África e os africanos na formação do Mundo Atlântico 1400 – 1800.
Tradução de Marisa Rocha Mota. Rio de Janeiro; Elsevier, 2004. p. 55.
120
Segundo Diégues Júnior, a presença do negro ao sul da Capitania de Pernambuco já estava presente
nas expedições de Jerônimo de Albuquerque e Cristóvão Lins. DIEGUES JÚNIOR, Manuel. População e
Açúcar no Nordeste do Brasil. Maceió: Edufal. p. 83.
121
Idem. p. 83.
122
Antônio Moura Castro doa para São José, padroeiro do Poxim, às terras que hoje é povoado, sendo que
toda a parte da administração como cobrança de impostos, concessões e outros ficou à cabo da Igreja
Católica. Ver LEMOS, João Ribeiro. Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições. Maceió. Ed.
Do autor, 1999. p. 180.
123 LIMA, Ivan Fernandes. Ocupação Espacial do Estado de Alagoas. Maceió SEPLAN 1992. p. 129.
124
Observaram-se bem no recorte do mapa, notamos que há uma residência de escravos na região que
corresponde hoje o que é o Poxim. A residência dos escravos ou casa dos escravos foi criada, de início,
em Lisboa no século XV, exclusivamente para operar o tráfico. Ver SCHWARTZ, Stuart B. Segredos
Internos. Engenhos e escravos na sociedade colonial. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. p. 23.
43
Cortada por um vasto sistema hidrográfico, essa sesmaria deu origem ao Curato
de São José e Madre de Deus do Poxim e a Coruripe125, considerando as águas do rio126 o
meio de transporte mais natural, fácil e viável ao escoamento de produtos, seja legal ou
ilegal e da produção do açúcar, já que
a cultura da cana procura sempre as proximidades das regiões de rios ou
riachos, e não se distanciou, por interesses comerciais, do mar. É nas águas
dos rios, dos pequenos rios, que o senhor de engenho encontrar o melhor
colaborador para a organização econômica. 127
O rio Poxim facilitou a comunicação comercial entre colonos e colonizados e
serviu para o escoamento dos produtos usuais da terra em barcos menores rumo ao mar,
muitas vezes colocando em risco os colonizadores e suas mercadorias por conta das
atividades ilegais, visto que o rio era utilizado para contrabando128 de madeira que havia
na região, pois
o incipiente comércio dos primórdios da Capitania das Alagoas era
constantemente embaraçado pelos corsários. No dia 4 de setembro de 1819 a
sumaca "São João Diligente", comandada pelo mestre João Batista Pereira e
de propriedade de Antônio José Teixeira, da Praça da Bahia, foi abordada nas
costas alagoanas, entre o Peba e Coruripe (Poxim), por uma escuna com
bandeira norte-americana, armada com duas peças calibre seis, duas pequenas
coronadas de pião à proa e quinze homens de tripulação. Da equipagem e
passageiros da sumaca foi tomada toda a roupa e dinheiro, além dos
mantimentos, inclusive uma caixa de açúcar, e lançados ao mar seis sacos de
algodão.129
A prática do contrabando no Brasil é registrada desde os primeiros invasores
estrangeiros com a extração do pau-brasil: a exemplo disso, temos um episódio que
ocorreu no Brasil em 1516 com Cristóvão Jacques (1480-1530), que foi enviado pelo
125
LEMOS, João Ribeiro. Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições. Maceió. Ed. Do autor,
1999. p. 31.
126
O rio São Francisco tornou-se o meio de transporte importante para migração seguindo a direção de
Minas Gerais e ao oeste da colônia. RUSSELL-WOOD, A.J.R. Centro e periferia no mundo lusobrasileiro, 1500-1808. Revista Brasileira de História. Vol. 18, n. 36, 1988, pp. 187-249.
127
DIEGUES JÚNIOR, Manuel. O bangüê nas Alagoas. Maceió, EDUFAL. 2006. p. 112.
128
Havia muitos contrabandistas de madeira local, principalmente de pau-brasil. Os franceses foram os
primeiros a investir nesse contrabando e começaram a fazer incursões em alagoanas, principalmente na
região costeira, com a finalidade, puramente comercial, do tráfico de pau-brasil e o Poxim registra a
expulsão definitiva dos estrangeiros, franceses, em terras alagoanas em 1808. Segundo Cícero Péricles,
os franceses foram os primeiros brancos a se estabelecerem, ou visitarem com maior frequência o litoral
alagoano, principalmente na região de Coruripe. Ver CARVALHO, Cícero Péricles de. Formação
Histórica de Alagoas. Maceió, EDUFAL: 2015. p. 13 e 14.
129
SANTANA, Moacir Medeiros de. Contribuição à história do Açúcar em Alagoas. Recife: Museu do
Açúcar. 1970. p. 29 e 30.
44
El’Rei D. Manuel para colocar um fim na extração de pau-brasil no litoral brasileiro
pelos franceses, que estavam fazendo do Brasil uma serralharia. Assim foi feito, Jacques
acabou com o contrabando dos franceses e bateu tanto neles que gerou um conflito
diplomático entre Portugal de D. Manuel e a França de Francisco I. A situação foi tão
chata que Francisco I pediu a D. Manuel o documento em que Adão teria lhe dado à
posse das terras brasileiras130.
Os descaminhos e as ilicitudes no Brasil já estavam presentes na própria
organização jurídica131, econômica e social da colônia, pois os interesses particulares
eram diversos, logo abriam as portas para às práticas ilícitas. O descaminho e a ilicitude
na colônia seguiam por muitas vezes uma mão dupla, eles estavam no comércio legal e
ilegal, em que hora tinham o apoio da Coroa através da omissão, como é o caso da
propina, praticado pelos funcionários régios e ao mesmo tempo eram condenados pela
mesma Coroa, quando os comerciantes a praticavam132 e passaram a compor o comércio
clandestino, e não pagavam o imposto para o Erário. A corrupção na colônia tornou-se a
base das relações comerciais, mas
o fato é que o termo “corrupção” quanto o termo “contrabando”, corresponde
à época, não incidem sobre a frequência ou a tolerância às práticas que
designam, mas apenas caracterizam determinadas modalidades de
transgressão.133
Na Comarca de Alagoas, os negociantes e colonos viram no contrabando uma
saída para fugir dos altos impostos taxados pela coroa. Lembramos também, que nas
Minas Gerais e no Poxim nem os santos134 se salvaram da corrupção e do contrabando,
tornaram-se veículos para o comércio ilegal. Não importavam os riscos.
Segundo a tradição oral da região havia também os furtos que eram praticados
de todas as formas e uma delas está registrada no uso de imagens sacras para levar joias
de alto valor comercial, de outras imagens religiosas. A exemplo disso, temos a imagem
130
BUENO, Eduardo. Brasil. Uma História. Cinco séculos de um país em construção. Rio de Janeiro,
Editora Leya, 2012. p. 38.
131
ROMEIRO, Adriana. Corrupção e poder. Uma história, séculos XVI a XVIII. Belo Horizonte:
Autêntica Editora, 2017. p. 53.
132
É bom deixar claro, que havia certa tolerância sobre o crime de contrabando de acordo com a classe
social do praticante. Idem. p. 54.
133
Idem. p. 54.
134
Estamos nos referindo aos santos do pau-oco. Levanto aqui a hipótese, através das narrativas
populares, de que imagens como essa era utilizada para esses pequenos delitos como o furto, já que ela é
oca por dentro.
45
de nossa Senhora do Bom Parto, que segundo as narrativas das pessoas mais velhas do
Poxim, as imagens de santos eram utilizadas para esconder as joias que eram roubadas
de outras imagens, já que as imagens maiores possuíam colares e brincos de diamante
ou pérola. Segundo Lemos, no passado eram construídos túneis135 na Vila do Poxim
próximo ao rio que seguiam em direção ao mar136, tais túneis eram rotas de fuga para
roubos e contrabandos de diversos produtos e objetos, principalmente os sacros, já que a
Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos ficava a 500 metros do rio, servindo de
esconderijo para aqueles que cometiam o crime e se sentiam seguros para sair ilesos de
qualquer punição.
FIGURA 1 – IMAGEM DE NOSSA DO BOM PARTO (SANTO DO PAU-OCO)
FONTE: ROBSON WILLIAMS BARBOSA, SET. 2006.
O contrabando sempre foi um recurso muito utilizado em todos os centros
comerciais desde a antiguidade. Na colônia não foi diferente, já que os negociantes e até
alguns senhores de engenhos recorreram a tal recurso como forma de burlar137 e fugir
dos impostos, ou até de cobranças indevidas. Em Alagoas, um dos registros que temos
135
LEMOS, João Ribeiro. Poxim: terra de história e de mitos: Vila Real de São José do Poxim do
Sul. Ed. Coruripe, AL, 2018. p. 16.
136
O programa “Terra e Mar” da TV Gazeta faz o percurso do rio Poxim em direção ao mar.
https://www.youtube.com/watch?v=WNTqLa0sL3s. Acessado: 20 de Janeiro de 2017. 12h00min horas.
137
ROMEIRO, Adriana. Corrupção e poder. Uma história, séculos XVI a XVIII. Belo Horizonte:
Autêntica Editora, 2017. p. 35.
46
no século XVIII foi do governador da Capitania de Pernambuco José César de Meneses,
em maio de 1779, no qual ele pede a Martinho de Melo e Castro, então Secretário de
Estado da Marinha e Ultramar, providências para acabar com o comércio ilegal na
região, pois
o contrabando, e igualmente os extravios e exportações dos efeitos desta
Capitania para Bahia. Também Vossa excelência terá visto as dificuldades,
que nas ditas cartas ponderava sobre produzirem aquelas providencias, (…)
efeito, enfim agiremos em caminhada, para esta Capitania huma
dilatadissima extenção de costa toda aberta, e pela soltura comigo os
sumangueiros da Bahia entrava nestes portos.138
Segundo Luana Ventura139, as conexões entre as capitânias são ativas no período
colonial muitos produtos escoavam dos nossos portos para Bahia, palavras do Ouvidor
das Alagoas, José Mendonça de Moreira, em 26 de abril de 1779. Aqui, podemos
perceber que muitos dos produtos entravam ou saíam da Bahia. A Capitania baiana era
esse comércio fornecedor de mercadorias mais baratas para serem vendidas no comércio
ilícito, já que
a saída dos efeitos para a cidade da Bahia é inevitável, sem novas
providencias, uma nova legislação, que contenha os senhores de engenho na
falsidade de com que vendem as suas safras inteiras conhecidam a
contrabandistas: era melhor que este grande, e inútil trabalho que sentem em
guardar sessenta légoas de praia, se tivesse em pedir contas aos senhores de
engenho das suas respectivas safras.140
Essa conexão entre as duas capitânias, a qual o Ouvidor José Mendonça de
Moreira fala foi registrada na carta de Bento Bandeira de Melo a D. Rodrigo de Sousa
Coutinho, o conde de Linhares, sobre a geografia, navegação, comércio e produções de
Alagoas, em 08 de dezembro de 1797, na Barra de Coruripe, Termo do Poxim, em que
Bento Bandeira de Melo informa que Alagoas tem várias Barras e que uma delas é a
“Barra de Cururipe, que fica ao Sul das Alagoas; e três léguas ao Norte desta barra há
outra chamada de São Miguel, onde entram grandes sumacas”141; e que a maior parte
dos gêneros produzidos em Alagoas, seja açúcar, algodão, madeira e outros produtos
138
AHU_ACL_CU_015, Cx. 133, d. 10012.
VENTURA, Luana Maria. A Alfândega de Pernambuco: História, Conflitos e Tributação no
Porto do Recife (1711-1738). Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal Rural de
Pernambuco. Pernambuco, 2016. p. 249.
140
AHU_ACL_CU_015, Cx. 133, d. 10012.
141
AHU, Cx. 3, Documento 265. Anexo III
139
47
usuais da terra eram “carregados, e vendidos na Cidade da Bahia de Todos os Santos
com grande risco, e prejuízo dos seus Agricultores; e poderá vir a ser muito florente, e
de grande comercio, e vantagem para o Estado.”142
A coroa portuguesa, ao institucionalizar e decretar em ordem régia os
impostos143, sempre teve a intenção de arrecadar, não importava o motivo; e se aqueles
que estavam sendo cobrados podiam pagar, se seu agente que iria fazer a cobrança agia
de forma correta ou se havia cobrança além do que estava para ser pago causavam
conflitos, pois é daí que temos uma das motivações para o contrabando na colônia.
No Brasil do século XVII e XVIII, a prática da cobrança de impostos indevidos
passava antes de tudo por um costume praticado pelos agentes públicos144 com a
chamada propina145, que seria uma forma de aumentar o salário desses agentes. Segundo
Vera Lúcia Costa Acioli em Jurisdição e Conflitos: “é errôneo tratar a propina como
corrução administrativa. Não era propriamente um “provimento ilegal”. Parece mais
um direito consuetudinário”146 “associado aos cargos públicos do Brasil colônia”.147
Posteriormente é que a coroa passa a considerar a propina como “um abuso introduzido
em todas as câmaras”148 e que a mesma acabasse149. Em Pernambuco, no ano de 1689,
o governador150 e os agentes públicos praticavam esse tipo de comércio ilícito151 como
142
Idem.
Segundo Vera Lúcia Costa Acioli em Jurisdição e Conflitos, os impostos eram tantos cobrados pela
Coroa portuguesa que podemos citá-los agora. Seriam eles; dízima, redizíma, vintena, finta, subsídio,
quinta, pedágio, derrama, sisa, donativo, portagem, porção e etc. ACIOLI, Vera Lúcia Costa. Jurisdição
e conflitos: aspectos da administração colonial. Recife: Edufpe, 1997. p. 63.
144
ROMEIRO, Adriana. Corrupção e poder. Uma história, séculos XVI a XVIII. Belo Horizonte:
Autêntica Editora, 2017. p. 64 e 65.
145
Sem deixar de citar, que a primeira forma de corrupção na colônia estava nos privilégio como
nepotismo, suborno, extorsão e outros. Idem. 59.
146
A corrupção tornou-se um costume que foi desenvolvido pelos grupos sociais em defesa de sua
posição social. THOMPSON, Edward Palmer. Costumes em comum – Estados sobre cultura popular
tradicional. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
147
ACIOLI, Vera Lúcia Costa. Jurisdição e conflitos: aspectos da administração colonial. Recife:
Edufpe, 1997. p. 64.
148
Idem. p. 64.
149
Aqui notamos que aquilo que era praticado era conveniente à Coroa em um determinado momento, já
em outro não fazia mais parte, já que a “relação a um poder estabelecido em outra parte, domínio das
técnicas concernentes às estratégias sociais.” Ver ROMEIRO, Adriana. Corrupção e poder. Uma
143
história, séculos XVI a XVIII. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017. p. 54.
150
A propina não era praticada por funcionários bem remunerados como é o caso dos vice-reis, o que
difere dos funcionários de cargos menores. ROMEIRO, Adriana. Corrupção e poder. Uma história,
séculos XVI a XVIII. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017. p. 65.
151
ROMEIRO, Adriana. Corrupção e poder. Uma história, séculos XVI a XVIII. Belo Horizonte:
Autêntica Editora, 2017. p. 65.
48
forma de aumentar o salário, como já foi citado anteriormente, e não faziam sozinhos, já
que toda atividade ilegal era feito em nomes dos agentes das grandes casas
comerciais152 locais ou europeu.
Além dessas cobranças excessivas e indevidas nesse período, foi feito o Tratado
de Paz entre Portugal, Inglaterra e a Holanda, em que proibia navios estrangeiros entrar
nos portos153 do Brasil, sem pedir devidamente autorização ao rei, a não ser no caso de
consertos urgentes e para compra de mantimentos com o tempo limitado. Assim, foram
estabelecidas as frotas, isso ocorria duas vezes ao ano, o que obrigava os senhores,
comerciantes e negociantes a buscarem os mascates e ambulantes para comprarem seus
produtos de luxo, os quais eram vendidos por preços altíssimos. Segundo Vera Lúcia
Acioli, eles recorriam ao contrabando, já que os contrabandistas tinham um preço de
mercado mais baixo e próximo da realidade dos compradores.
O contrabando foi um dos problemas enfrentados pelo governo de Pombal e o
grande concorrente ao comércio legal de mercadorias, porém agentes não tinham
capacidades para efetuar uma vigilância capaz de parar o contrabando, ou seja, não via
disposição nos poderes locais154 para mandar efetuar as prisões, prender as embarcações
e instalar as devassas necessárias a fim de coibir tal prática. Sem se falar que havia uma
infinidade de pequenas vias fluviais que desembocavam em portos naturais e enseadas
capazes de oferecer possibilidades independentes de embarque, principalmente na
região das Alagoas. Outro fator que apoiava o comércio ilegal era o parentesco entre os
contrabandistas, diretores e funcionários da direção da Companhia. Esse apoio ao
contrabando também era uma forma das elites mostrarem sua oposição ao monopólio da
CGCPPB.
No período que corresponde ao monopólio Companhia Geral de Comércio de
Pernambuco e Paraíba (1759 a 1780), nem todos teriam acesso aos produtos de luxo
europeus, escravos na África e especiarias da Índia, o acesso a tais produtos eram
restritos, apenas os produtos que eram autorizados pela Companhia chegariam as
freguesias e vilas de Pernambuco. A Companhia de Pernambuco e Paraíba tinha o
152
É claro que a corrupção no funcionalismo da Coroa, também estava inserida na mentalidade dos
mesmos. Idem. p. 72.
153
NOVAIS, Fernando A. Portugal e Brasil na Crise do Antigo Sistema Colonial (1777-1808). São
Paulo: HUCITEC, 1978. p. 58 e 59.
154
ROMEIRO, Adriana. Corrupção e poder. Uma história, séculos XVI a XVIII. Belo Horizonte:
Autêntica Editora, 2017. p. 43.
49
monopólio de importar produtos advindos da metrópole, com isso, vinham também os
produtos de luxo como seda, galões de ouro e prata, pentes de Marfim, Chapéus, fitas
sortidas155, que foram encomendados durante os anos de 1760 a 1776 a Real Fábrica das
Sedas156.
O contrabando envolve uma situação efetivamente mais complexa, mas,
quanto a nós, confirmadora ainda assim, da análise que apresentamos. É de
todo óbvio que o contrabando envolvia sempre sérios riscos: prisão, confisco
das mercadorias e navios, etc. Ora, o que podia não obstante mover os
mercadores a correr tais riscos e se empenharem no comércio ilegal sendo a
perspectiva dos super-lucros coloniais? O contrabando, portanto, também
pressupõe o mecanismo básico em vez de negá-lo. É certo que o
contrabandista devia, para encontrar campo para suas atividades, oferecer
preços um tanto melhores pelos produtos coloniais, bem como oferecer
produtos europeus a preços mais baixos do que os mercadores
metropolitanos.157
Lembramos aqui que, pela posição geográfica, o contrabando que saía da Bahia
passava pelos rios, riachos e lagoas de Penedo, Coruripe, Poxim, São Miguel, Alagoas
do Sul e Porto Calvo até chegar às praças do Recife e Olinda. Esse tipo de prática
em primeiro lugar, ela nos deixa a nítida impressão, que os outros dados
recolhidos corroboram, de que o contrabando vai num crescendo até
arrombar as portas em 1808. Por outro lado, cumpre pôr em destaque a
pertinácia inamovível do funcionário; que ela afigura-se-nos com expressão
da própria posição específica da metrópole, que não podia abrir mão do
sistema. E finalmente, constatação de que os colonos, ou pelo menos deles
aderiam ao contrabando, propiciando sua expansão.158
Alguns dos gêneros produzidos na região do Poxim como açúcar, farinha de
mandioca159, fumo, batata, carne seca e salgada, aguardente, sal, feijão, milho, peixe
seco, algodão, carne verde, víveres, água potável, navegavam por estradas fluviais para
155
VENTURA, Luana Maria. A Alfândega de Pernambuco: História, Conflitos e Tributação no
Porto do Recife (1711-1738). Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal Rural de
Pernambuco. Pernambuco, 2016. p. 249.
156
AHU_ACL_CU_015, Cx.126 D. 9623 – 27/06/1777- Cd PE
157
NOVAIS, Fernando A. Portugal e Brasil na Crise do Antigo Sistema Colonial (1777-1808). São
Paulo: HUCITEC, 1978. p.91.
158
Idem. p.187.
159
Segundo Ribeiro Júnior, o governador de Pernambuco, Luís Diogo Lobo da Silva, em um edital de 3
de maio de 1762, informa ao Conde de Oeira, futuro marquês de Pombal, que precisava de um estoque de
farinha de mandioca para 50 mil homens que defendiam o território. Ver RIBEIRO JÚNIOR, José.
Colonização e Monopólio no Nordeste brasileiro: a Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba,
1759-1780. São Paulo, HUCITEC, 1976. p. 104.
50
serem distribuídos em outras capitanias como é o caso do fumo alagoano que era
escoado para Salvador e os demais portos da Bahia160.
Mas nada substituiu a cana-de-açúcar, visto que no ano de 1776 o número de
engenhos161 em toda Alagoas aumentou devido à expansão das lavouras da cana e
consequentemente, a necessidade de mais mão de obra escrava no vale do rio162 Poxim.
Assim, toda a estrutura açucareira, como o engenho, casa-grande, casa mais simples
para os comerciantes locais, igrejas e senzala, estavam estabelecidas, “pois foi o açúcar
o motivador da colonização e o fator a prender o elemento humano à terra”163.
O Jenipapo passa pelo ano de 1749, com 1 capela, 2 clérigos, 248 casas e 884
habitantes aumentando para 2.572 em 1782 e passou para 2.978 no ano de 1788164 e 25
ano depois, no ano de 1774, havia uma igreja165, duas capelas, quatorze fazendas e dois
engenhos, um deles é o Jenipapo, com 402 fogos e 1.682 habitantes166. Com isso nessa
época, o engenho Jenipapo crescia em relação aos outros engenhos que havia na
região167, como é o caso do Engenho Cerquinha “com 1.800 arrobas e 16 escravos que
alcançara a maior média de produção: 111 arrobas por escravo, contra 56 do João de
Deus que, possuindo 25 escravos, apenas safrejara 1.400 arrobas”
168
, em
Piaçabuçu169.
160
Segundo Gustavo Acioli a Bahia pagava 400 a 80 réis pelo rolo de fumo Alagoano, coisa que Recife e
Olinda não pagavam. LOPES, Gustavo Acioli. Negócio da Costa da Mina e comércio atlântico:
Tabaco, açúcar, ouro e tráfico de escravos: Pernambuco: (1654-1760). São Paulo: USP, 2008. Tese
de Doutorado. p. 119.
161
CARVALHO, Cícero Péricles de. Formação Histórica de Alagoas. Maceió, EDUFAL: 2015. p.116.
162
A água em abundância foi um elemento geográfico importante para os engenhos, já que a água servia
de força motriz para a moenda dos engenhos, já que o “engenho honrou água, não se limitou a servir-se
dela”. Assinala Gilberto Freyre.
163
DIEGUES JÚNIOR, Manuel. População e açúcar no nordeste do Brasil. Maceió: Edufal, 2012. p.
25.
164
CARVALHO, Cícero Péricles de. Formação Histórica de Alagoas. Maceió, EDUFAL: 2015. p. 312
e 313.
165
A origem da construção da Igreja de São José do Poxim está situada à segunda metade do século
XVIII, segundo uma data registrada em um lavabo na sacristia que diz 1762. Não há registro preciso
sobre esta data: sendo assim, esta passaria a corresponder ao ano de 1717, pois, no seguinte ano, 1718,
seria proclamada sede da paróquia, segundo consta no livro de tombo, pelo bispo de Olinda. LEMOS,
João Ribeiro. Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições. Maceió. Ed. Do autor, 1999. p. 175.
166
ANAIS DA BIBLIOTECA NACIONAL, Rio de Janeiro, v.40: 1918 (1923).
167
DIEGUES JÚNIOR, Manuel. O bangüê nas Alagoas. Maceió, EDUFAL. 2006. p. 85.
168
SANTANA, Moacir Medeiros de. Contribuição à história do Açúcar em Alagoas. Recife: Museu do
Açúcar. 1970. p. 152.
169
Piaçabuçu desligou-se de Penedo para assumir à condição de vila por Lei Provincial de 31 de maio de
1882.
51
No século seguinte, no ano de 1849, surgiram outros engenhos que deram
continuidade às atividades açucareira, passando pelo ano de 1854, com uma estimativa
de produção de açúcar de 22.800 arrobas170, equivalente a 335.160 kg, como é o caso do
Engenho Porção171, pertencente a Francisco Manoel de Carvalho, do Engenho São João
da Prata de João da Ressurreição Lima Lessa, do Engenho Mocambo172 de Francisco
das Chagas Lima Lessa, do Engenho Miahi de José Marcelino dos Santos, do Engenho
Lagoa do Pau de Antônio Manoel de Azevedo, do Engenho Piauí de Manoel Felipe de
Araújo e, por último do Engenho Conceição das Bananeiras do Padre João de Araújo e
Silva. Todos esses engenhos sugiram em meados do século XIX, com exceção do
Porção, que surgiu concomitante ao Jenipapo, que na época estava sobre administração
de Dona Maria Cleofa de Carvalho173.
O Engenho Jenipapo, o primeiro da região do Poxim, foi um grande braço
articulador da produção açucareira para Penedo, já que, desde os tempos de Nassau,
Penedo não tinha muitos engenhos, exceto para a fabricação de rapadura e aguardente
para consumo interno. Vejamos na descrição de Verdonck, no período holandês, em que
há um povoado de poucos habitantes e nas imediações 5 ou 6 engenhos, mas
fazem pouco açúcar e anos há em que alguns não moem; ainda nesse lugar
existe grande quantidade de bois e vacas, por causa do excelente pasto, de
sorte que por esse motivo os moradores possuem muito gado, que é a sua
principal riqueza e constitui a melhor mercadoria destas terras e com a qual
mais se ganha devido à sua rápida multiplicação (...).174
Em 1801, o engenho Jenipapo encontrava-se em posse do padre António
Joaquim de Carvalho e Couto, o qual passa a posse do engenho para seu irmão, o alferes
170
LEMOS, João Ribeiro. Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições. Maceió. Ed. Do autor,
1999. p. 150.
171
No ano de 1842 pertencia Dona Maria Cleofa de Carvalho. SANTANA, Moacir Medeiros de.
Contribuição à história do Açúcar em Alagoas. Recife: Museu do Açúcar. 1970. p. 358.
172
Esse engenho produzia 1.100 pães de açúcar, mas não temos maiores informações. Podemos
identifica-lo no Mapa 1. https://www.bn.gov.br/. Acesso em: 23 jan. 2019.
173
Essa senhora passa a administrar o engenho no início do século XIX, pois ficou viúva pelos idos de
1822, herdando o engenho tornando-se a “cabeça de casal”, obtendo 45 escravos no ano de 1827. Dona
Maria Cleofa de Carvalho também é citada na obra de Moacir Santana com Dona Maria Cleofa de Jesus.
Idem. p. 357.
174
VERDONCK, Adrian. Descrição das capitanias de Pernambuco, Itamaracá, Paraíba e Rio
Grande. Memória apresentado ao conselho político do Brasil por Adriano Verdonck, em 20 de
maio de 1630. In: MELLO, José Antônio Gonçalves de. Fontes para o Brasil Holandês – a economia
açucareira. Recife: Companhia Editora de Pernambuco, 1981. p. 36.
52
Francisco Manuel de Carvalho e Couto175, através de um documento de insinuação para
confirmação da doação, incluindo a escritura e, junto a ela, o valor de
trezentos mil reis em terras e (…) do engenho Genipapo, de que he senhor a
seu irmão suplicante Antonio Joaquim de Carvalho e Couto, para não (…), e
em duzentos mil reis mais, que (…) paterna em (…) engenho (…)
patrimonio, com que se pretendese ordenar de clerigo e fazendo avalias o
referendo engenho em seu terreno por estarem pro (…) ao doador lhe fez
dado pelo lavrado valor o de (…) conto de reis. He o que posso informar a
Vossa Alteza, que Mandará; o que fez (…) Villa Real de São José do Poxim
4 de novembro de 1801.176
Com esse documento de insinuação, o padre António Joaquim de Carvalho e
Couto garante a posse do engenho para à família Carvalho afirmando que seu irmão
o Alferes Francisco Monoel de carvalho e Couto, marador das terras da Villa
Real de São José do Poxim, comarca de Alagoas, Capitania de Pernambuco,
lhe fez a descrição incerta na (…) incluza para cuja maior validade, pede
Vossa alteza Real a graça delle conceder provizão de insinuação na forma do
estilo (…).177
Mais tarde, no ano de 1854, havia 9 engenhos178 no Poxim, todos movidos por
força das águas ou tração animal179 e em plena atividade. Juntos produziam, em média,
22.800 arrobas de açúcar, equivalente a 335.160 kg, sobre as mãos de 279 escravos.
Em Poxim, para exemplificar, existiam em 1854 9 engenhos moentes: Poção,
Jenipapo, Bomfim, Glória, Liberal, Conceição, São João, Mato Grosso e São
José, além do Pau Ferro, de fogo morto, e outro na Lagoa do Pau, quase à
beira mar, e mais 3 engenhocas na margem direita do rio Coruripe. Eram
movidos pela força d'água, boi ou cavalo. Na "Relação dos engenhos de
açúcar, seu proprietários no termo do Poxim" vem discriminada a qualidade
das terras, por engenho, que eram de areia e de brejo, além da produção anual
175
Francisco Manuel de Carvalho e Couto, agora capitão, em 1806 pede a D. João a propriedade dos
ofícios de tabelião e de escrivão dos órfãos em Penedo que se encontrava vaga. Aqui observamos o
domínio da família Carvalho. AHU_ACL_CU_004, Cx. 6, D. 445.
176
No dia de Fevereiro 13 de 1801, o padre Antonio Joaquim de Carvalho e Couto faz um requerimento
ao príncipe regente [D. João] a pedir provisão de insinuação para confirmação da doação para seu
patrimônio que lhe fez seu irmão, o alferes Francisco Manuel de Carvalho e Couto morador no termo da
Vila Real de São José de Poxim, comarca de Alagoas, de quantia referida trezentos mil reis ao engenho
Genipapo, ou seja, em suas mãos estavam dois engenhos o Jenipapo e Porção. AHU-PERNAMBUCO.
AHU_ACL_CU_004, Cx. 4, D. 300. Anexo IV.
177
Idem.
178
Acrescento mais dois engenhos, no Poxim, nesse ano que eram; Riachão de Joaquim da Costa Nunes e
Poxim Grande de Ananias da Costa Nunes, que ambos produziam entre 900 a 1000 pães de açúcar.
179
Havia 374 bois para a moenda nos 9 engenhos de açúcar no Poxim. Ver SANTANA, Moacir Medeiros
de. Contribuição à história do Açúcar em Alagoas. Recife: Museu do Açúcar. 1970. p.10.
53
de cada um, o número de escravos e bois, que totalizavam, respectivamente,
22.800 arrobas de açúcar, 279 escravos e 374 bois.180
Temos registro do mesmo ano de mais dois engenhos com o nome de Poxim
Grande, que pertencia a Joaquim da Costa Nunes. Esse engenho produzia 900 a 1000
pães de açúcar, a mesma produção do engenho Riachão, que pertencia a Ananias da
Costa Nunes, ambos administrados pela família Nunes. Mas o fato que chama mais a
atenção é que Ananias da Costa Nunes era coletor da Vila do Poxim e era ele quem
entregava os rendimentos dos engenhos da região à Tesouraria da Fazenda das Alagoas.
Encontramos um desses rendimentos181 do ano de 1845 a 1846, datado em 28 de
novembro de 1846, cujo rendimento dos impostos sobre os escravos no Poxim em um
ano variava de 56$000 a 42$000 em seu valor líquido, e os bens de raiz rendiam 1$800
a 1$350 valor líquido por ano, já o valor líquido arrecado de uma das fazendas consta
20$850000. Esse montante corresponde a
importância dos 25 por centos a mim (Ananias da Costa Nunes), e a meu,
escrivão (José Simplício Santiago), pela arrecadação que fizemos de diversos
impostos pertecentes ao anno financeiro disso de 1845 a 1846, e de como
recebi passei o presente. Colletoria da Villa do Poxim 28 de novembro de
1846. Ananias da Costa Nunes. Registro Geral 3º livro entre 1845 – 1846.
Em 30 de novembro de 1846.182
Verificamos o rendimento dos impostos sobre os escravos, que variava de
56$000 a 42$000 mil réis, em seu valor líquido, registrado por Ananias da Costa Nunes,
e identificamos que essas variações eram uma constante no Poxim devido aos acertos
entre os negociantes e os compradores dos escravos na feira do Poxim, em que se
vendia
uma banda183 de um escravo por 400$000, o escravo todo iria para 800$000 –
três escravos, vendidos em lote, 1.500$000 – uma escrava de doze anos
600$000 – uma de 8 anos 500$000 – uma banda de escrava com cria de dois
meses, tendo a escrava o valor de 500$000 e a cria 500$000.184
180
SANTANA, Moacir Medeiros de. Contribuição à história do Açúcar em Alagoas. Recife: Museu do
Açúcar. 1970. p. 236.
181
CAIXA 4918 - DOCUMENTO: Estado de alagoas – Tesouraria da Fazenda assunto: livro de
despesa e receita / substituições de notas / coletoria das alagoas / coletoria de Poxim ano: 1845-1846 /
1850 / 1867 / 1884. APA. Anexo V.
182
Idem.
183
Aqui temos o escravo coartado. A coartação refere-se a uma forma de alforria conhecida no Brasil
colônia, em que o senhor fazia um acordo com seu escravo para que a alforria fosse paga de forma
parcelada. Com isso, o escravo tinha como prestar serviços para outros senhores gerando um pecúlio para
o pagamento da sua alforria de forma integral.
184
Cartório de Imóveis de Coruripe. Livros I, e II. p. 55 e 56.
54
Havia uma oscilação no preço do escravo, segundo o livro de registro do
Cartório de Imóveis de Coruripe, já que dependia muito da fração que era vendido o
escravo, temos mais um exemplo, além do que citamos anteriormente, como foi o caso
da escrava Cathariana que “uma banda sua foi vendida por quatrocentos mil réis”185 a
Francisco das Chargas Reys Lessa.
O preço do imposto sobre o escravo era muito alto e ficava mais caro com a
manutenção do engenho. O preço médio de um escravo sadio no Poxim chegava a
beirar os 700 mil réis, “para a negra jovem e parideira, chegava a um conto de réis,
para uma criança o preço era de 50 mil conto de réis a cento e cinquenta”186. Os
rendimentos dos impostos sobre escravos eram cobrados anualmente sobre pena para
aqueles que não cumprissem. Temos como baliza o Ofício do Presidente da Câmara da
Vila do Poxim em que determina o cumprimento da lei referente aos impostos sobre os
escravos no ano de 1834, em que o Presidente da Comarca Municipal da Vila do Poxim,
Vicente Pires Camargo diz, que
fai se necessario que vós mercês cumprirão com a maior brevidade que ser
fassa o artigo 4 das Instruções de 13 de dezembro proximo processado
ultimamente remettidas a essa comarca para a execução do § 5º do artigo 5º
da lei de 8 de outubro do mesmo anno na arrecadação na taxa de 12 mil reis
sobre os escravos enviados a este Governo o preciso documento dos limites
que marcaram para o lançamento e cobrança da referida taxa nos termos do
citado artigo. Palacio do Governo das Alagôas em porto Calvo 20 de março
de 1834.187
Mas essa região do Poxim não tinha apenas a produção do açúcar e fabrico de
embarcações, também havia a produção de outros produtos e gêneros alimentícios188
para serem comercializados, garantindo toda a estrutura colonial da antiga Capitania de
Pernambuco, como é o caso da carne do boi189, vendida para suprir a feira do Poxim e
185
Idem. p. 9.
Idem. p. 55 e 56.
187
Ofício do Presidente da Câmara da Vila do Poxim determinando o cumprimento de Leis referentes aos
impostos sobre os escravos. Alagoas 20 de março de 1822. IHGAL. Documento – 00415 – 7 – 1 – 4.
Anexo VI.
188
Por sua situação hidrográfica o Poxim era abundante em peixe. Ver ANAIS DA BIBLIOTECA
NACIONAL, Rio de Janeiro, v.40: 1918 (1923).
189
Já havia, antes da Companhia, o comércio de carnes entre Pernambuco e Bahia feito nos sertões que
interligavam as duas praças e que margeavam o Rio de São Francisco. Ver SOUSA, Jéssica Rocha de.
Nas Rotas dos Sertões: Comércio Interno e Contrabando entre as Capitanias de Pernambuco e
Bahia (1759-1780) . Recife, 2018, 177 p. Dissertação (Mestrado) – UFRPE. p. 40.
186
55
farinha de mandioca190, aguardente, carne verde, batata, sal, algodão, peixe seco, feijão,
milho, víveres, mantimentos e tantos outros gêneros alimentícios. Vejamos o
documento do final do século XVIII, relatando alguns dos produtos de primeira
necessidade mais consumidos no Poxim, no ano de 1800, que foi recebido pela Junta
Real da Fazenda de Alagoas.
Nessa Junta da real da fazenda arrematou José Alemão de Sismeiros os
subsidios literários de hum real por cada libra de carne de Vaca, ou boi fresco
que se consome, não se determinndo, pessoas, a excepção da que consome os
credores dos gados; o de dez reis por cada canada de agua ardente, que se
fabrica ou entra de fora, sem mostrar que pagou o mesmo subsidio donde
sahira; e tendo fé obrigado esta junta, em nome do Princípe Rgente Nosso
senhor a presta-lhe todo o auxílio, e favor licito, para so verificar a exata
cobrança dos referidos subsidios Reais, applicados para hum objecto de tanto
interesse dos povos desta capitania, qual he a sua instrução e para que os dias
constados não tinha motivo de queixa, antes se amine (…), (…) no dito
contrato, e a subir de preço nas seguintes arrematação (…) por tanto esta
junta recomenda vossa mêrces que preste sobredito contratados auxílios e
providencias que lhe requeres; a bem de hu’a (…) arrecadação dos
mencionados subsidios em caso que seoffereça algum obstaculo q’ não
popa’s remover, o participem desta junta, para ella setomarem suas medidas
que forem mais efficazes: afim o espera essa junta do seo zelo pele Real
serviço bem publico.191
Nas diversidades desses produtos, surgiu o sal192 nos arredores dos engenhos na
região do Poxim que contribuiu, também, para o aumento demográfico da região. Ele
passou a ser comercializado na região desde final do século XVIII e tinha seu controle
pela Coroa Portuguesa. Em 1854, havia 12 salinas no Poxim, cada uma com “701
coalhadores, produzindo cada uma 4 alqueires de sal, totalizando 2.804 alqueires”193.
já existiam salinas em Poxim, município do qual Coruripe era um simples
distrito. A 28 de maio fundeava no porto de Jaraguá, procedente do Poxim, a
barcaça “Santa Luzia do Norte”, com “90 alqueires de sal nacional”,
consignados à firma maceioense Andrade & Azevedo, quantidade aquela
190
Mandioca, farinha de mandioca, peixe seco, feijão, batatas, couro, algodão, fumo, pau-brasil, âmbar e
diversos víveres alimentícios da própria região.
191
Ofício ao presidente da Câmara da Vila do Poxim comunicando haver José Alemão de Sismeiros,
arrematado o subsídio literário, referente a carne verde e aguardente (...), em 10 de maio de 1800.
IHGAL. Documento – 0066 – 02 – 03 – 1. Anexo VII.
192
Criação dos ofícios de juiz de fora para Olinda e de Ouvidor para Alagoas e Rio de São Francisco
como forma de garantir a administração dos produtos que circulavam na região sul de Pernambuco e na
melhor arrecadação do tabaco e do salitre (este último produzido nas minas dos sertões do Rio São
Francisco), devendo o Ouvidor-Geral ter 300 mil réis de ordenado, pagos pelas câmaras de Porto Calvo,
Alagoas do Sul e Penedo com os subsídios do comércio de tabacos, gado e salitre com o Recife e com a
Bahia, fazendo sua residência na vila de Alagoas do Sul. AHU, Pernambuco Avulsos. Cx. 18, D. 1827.
193
SANTANA, Moacir Medeiros de. Contribuição à história do Açúcar em Alagoas. Recife: Museu do
Açúcar. 1970. p. 49 e 50.
56
equivalia a 390 alqueires, medida do Rio de Janeiro, conforme consta do
despacho da aludida mercadoria.194
Esses produtos partiam do rio Poxim que ligava as povoações de mais difícil
acesso, e penetrando no interior da capitania seguindo para o vale do rio São Francisco e
as demais áreas açucareiras através de lagoas e rios menores auxiliando e garantindo as
relações comerciais e o desenvolvimento demográfico e social da área, por meio da
venda do açúcar, escravos195 e produtos produzidos em seu território para abastecer o
comércio colonial sobre a mão do colonizador. Contudo, era o senhor e proprietário da
área açucareira e consequentemente dos meios de produção e do escravo que trabalhava
nos engenhos, que naturalmente tornou-se a base do desenvolvimento dessa área.
Tendo em vista os aspectos observados, notamos que os homens que fizeram do
Poxim um grande polo açucareiro não o fizeram assim com a missão de povoá-lo e
transformá-lo em uma colônia de povoamento, mas o fizeram com a ambição do
colonizador em desenvolver o local em um apêndice comercial da Vila de Penedo,
tendo em vista o lucro do comércio colonial que transitava entre o norte e sul da
Capitania pernambucana.
1.2 AS IGREJAS DO POXIM: UM TRABALHO DE ARTESÃOS NEGROS
A participação dos escravos negros na colônia aconteceu a partir do momento
em que a experiência colonial portuguesa estabeleceu a necessidade de um grande
contingente de trabalhadores para ocuparem, em princípio, as fazendas produtoras de
cana-de-açúcar. Em Alagoas o negro “foi um dos maiores elementos de civilização”196,
além disso, o trabalho escravo negro não se limitava no eito197 e na produção do açúcar,
sua mão de obra e seu talento ia transformar a paisagem local com seu trabalho de
pedreiro, escultor, santeiro, sapateiro, tecelões, entalhadores, seleiros, ourives, sineiros,
construtores de embarcações, artesãos, calçadores198 e etc, ou seja, era uma verdadeira
194
Idem. p. 49.
Os escravos que viam, para o Poxim, eram da Costa do Marfim, Costa da Mina e Guiné. Os escravos
desembarcavam na praia do Poxim e seguiam rio adentro até chegar aos engenhos.
196
BRANDÃO, Alfredo de Barros Loureiro. Os negros na história de Alagoas. Maceió. Ed. Ediculte,
1988. p. 41.
197
DIEGUES JÚNIOR, Manuel. População e açúcar no nordeste do Brasil. Maceió: Edufal, 2012. p.
140.
198
IHGAL. Documento – 00187 – 04 – 03 – 27. Anexo VIII.
195
57
oficina mecânica199 mostrando que o braço escravo não era apenas “o esteio da lavoura
no nordeste e da mineração do sul”200 era, também, o autor da transformação da
paisagem rural e urbana local.
Na Europa do século XVI, a transformação da paisagem urbana deu-se através
do desenvolvimento da arte barroca, na Itália, como um veículo de propagação e
influência da Igreja Católica para conter o avanço da Reforma Protestante. Artistas
como Caravaggio e Bernini deram uma nova feição à Europa Moderna201.
A arte barroca não tardou para cruzar o Atlântico e chegou à América
portuguesa no século XVIII através dos europeus. São diversas igrejas construídas sobre
os padrões barroco em áreas ricas pela a economia açucareira, como é o caso do Norte e
na região das Minas pela mineração. Mas não havia apenas igrejas construídas sobre os
moldes da arte barroca havia também muitos edifícios civis – como cadeias, câmaras
municipais, moradias de pessoas ilustres – e chafariz202. Porém, ao contrário da Europa,
o barroco brasileiro não teve pessoas letradas ou “bem nascidas”, e nem o mármore. As
igrejas e seus altares foram esculpidos por escravos, mulatos e mestiços, em um meio de
opressão, transformaram madeira e barro em obras translúcidas e belas. Esses escravos
tornavam-se os “Bernini dos trópicos”.203
Segundo Lemos, no Poxim, escravos, negros e mulatos foram responsáveis pela
fabricação de objetos destinados tanto para lavoura (como almanjarras, foices, carros de
bois, enxadas, estrovengas) quanto para a área urbana (como é o caso de fechaduras,
dobradiças, mobílias finas, mesas e cadeiras)204. Já no âmbito religioso, esses escravos e
199
Os escravos que sabiam um ofício eram chamados de mecânicos. Segundo Antonil os negros de
Angola, criados em Luanda, são os melhores para aprender um ofícios mecânicos. Ver ANTONIL, André
João. Cultura e opulência do Brasil por suas drogas e Minas. 3. ed. Belo Horizonte : Itatiaia/Edusp,
1982. p. 36.
200
DUARTE, Abelardo. Episódios do contrabando de africanos nas Alagoas. Maceió. Ed. Ediculte,
1988. p. 69.
201
CLARK, Kenneth. Civilização. São Paulo. Ed. Martins Fontes. 1980. p. 202.
202
PROENÇA, Graça. Descobrindo a história da arte, São Paulo: Ática 2007. p. 196.
203
JORGE, Fernando. O Aleijadinho: Sua vida, sua obra, sua época, seu gênio. São Paulo. Ed. Martins
Fontes. 2006. p. 49.
204
LEMOS, João Ribeiro. Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições. Maceió. Ed. Do autor,
1999. p. 72.
58
mulatos edificaram obras barrocas magníficas (como é o caso do altar-mor205, do
lavabo, a cruz206, os sinos207 e da pia batismal da Igreja de São José do Poxim).
FIGURA 2 – LAVABO E PIA BATISMAL IGREJA DE SÃO JOSÉ DO POXIM
FONTE: ROBSON WILLIAMS BARBOSA, SETEMBRO, 2006.
A Igreja tem sua data de inauguração no ano de 1717 208, como podemos
perceber no lavabo (FIGURA 2), ou seja, um ano antes da elevação do Poxim de Curato
para freguesia em 1718, sendo ampliada no ano de 1762209. Segundo a narrativa210 oral
205
Altar-mor entalhado em cedro, dois altares laterais e uma capela. A pintura imita mármore e a tijoleira
foi substituída por mosaico.
206
A Cruz-Padrão fica de frente a igreja, não sabemos a datação. Ela marca a presença do poder político e
religioso do período colonial.
207
LEMOS, João Ribeiro. Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições. Maceió. Ed. Do autor,
1999. p. 112.
208
Nos registros do IGHAL, em documentos avulsos, sobre o Tomo em Coruripe encontra-se uma nota de
1632, em que diz que a capela do Poxim pertencia à Paróquia de São Lourenço da Mata, em Pernambuco,
ou seja, a datação corresponde a segunda invasão holandesa (1630-1654). LEMOS, João Ribeiro. Poxim:
terra de história e de mitos: Vila Real de São José do Poxim do Sul. Ed. Coruripe, AL, 2018. p, 12.
209
Na reforma de 2006, foi construído no pavimento superior da Igreja de São José o Museu dos Devotos
D. Constantino Lüers, que recebeu um financiamento após um concurso intitulado: "Fonte da Nossa
História", patrocinado pelo banco do Nordeste. O museu foi idealizado pelos historiadores Cynara Pereira
da Silva (UFAL) e Robson Williams Barbosa, que recebeu o apoio dos professores (Universidade Federal
de Alagoas) José Roberto Santos Lima e Helena de Fátima Cavalcante Passos e da Diocese de Penedo na
pessoa de D. Valério Breda, bispo de Penedo, que fez doações com peças e artigos religiosos de D.
Constantino Lüers, seu antecessor. O museu possuindo um acervo diversificado como: peças de arte sacra
em estilo barroco; uma coleção de ex-votos, o que demonstra a forte religiosidade e devoção do povo para
com seu padroeiro, São José, e peças de antropologia cultural como: instrumentos de pesca e cerâmicas.
210
GINZBURG, Carlo. Mitos, Emblemas e Sinais: morfologia e história. Ed. São Paulo. Companhia
das Letras, 2003. p. 18. O historiador deve ser dinâmico para trilhar o caminho da langue para a parole
59
dos moradores mais antigos, a Igreja de São José foi construída sobre uma antiga
capelinha no ano de 1632, em que foi encontrada por uma criança de uma família
portuguesa que morava na região, uma pequena imagem de São José em um pé de
ouricuri (Syagrus coronata)211 e todas às vezes que guardava a imagem no dia seguinte
ela desaparecia e aparecia no mesmo local do pé de ouricuri.
FIGURA 3 – IGREJA DE SÃO JOSÉ DO POXIM, A IMAGEM DE SÃO JOSÉ E A
CRUZ PADRÃO
FONTE: ROBSON WILLIAMS BARBOSA, SETEMBRO, 2006.
A Igreja Matriz de São José do Poxim (à esquerda) possui um estilo
arquitetônico com traços do barroco tardio (rococó) e seu altar-mor feito de “madeira de
lei” e talhado por mãos escravas212. Ela possui relíquias religiosas como as imagens dos
santos e entre elas a lendária imagem de São José do Poxim (no centro) encontrada no
para entender a linguagem de um determinado local. Ver, também POCOCK, J.G.A. Linguagens do
Ideário Político. Tradução de Flávio Fernandez. São Paulo: EDUSP, 2003, p. 66.
211
Palmeira típica da região que depois de extraída coloca-se para secar e são organizadas em moios para
a fabricação de vassouras.
212
Não temos os nomes desses artesãos, pois não encontramos nenhum documento referindo-se a tais
trabalhos a não ser o as informações do livro Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições.
LEMOS, João Ribeiro. Poxim: terra de história e de mitos: Vila Real de São José do Poxim do Sul.
Ed. Coruripe, AL, 2018. p. 27.
60
pé de ouricuri213 e a cruz padrão representando a aliança entre o poder lusitano, não é à
toa que a sua base tem um formato de uma coroa, e o poder temporal da Igreja.
FIGURA 4 – ALTAR-MOR DA IGREJA DE SÃO JOSÉ DO POXIM
FONTE: ROBSON WILLIAMS BARBOSA, SETEMBRO, 2006.
No caso dos sinos da Igreja de São José foram fundidos por escravos que
trabalhavam e moravam em Coruripe. Não é à toa que o antigo sino da igreja, que foi
substituído pelo atual rachou e nele há duas inscrições latinas; “Nicolao de Oliveira
Silva e es para S.Iose en Senhora (Nicolao de Oliveira Silva da arte se prepara para
S.José e Nossa Senhora) – Coruripe 25 de março de 1848 madre de deos matris da Vila
do Poxim”214.
213
Idem. p. 40.
O sino traz o nome de seu fundidor Nicolau de Oliveira Silva, também conhecido como Nicolau
Azeiteiro. Essa fundição de sinos fazia grandes sinos para Maceió, Santa Maria Magdalena da Lagoa do
Sul, Penedo, Piaçabuçu, Coruripe e São Miguel. Ver LEMOS, João Ribeiro. Poxim: terra de história e
de mitos: Vila Real de São José do Poxim do Sul. Ed. Coruripe, AL, 2018. p. 38.
214
61
FIGURA 5 – SINO DA IGREJA DE SÃO JOSÉ DO POXIM
FONTE: ROBSON WILLIAMS BARBOSA, SETEMBRO, 2006.
O sino era tocado por outros escravos que moravam no Poxim e esse toque
diferenciava às situações como por exemplo, o toque215 para o nascimento de uma
criança, além de outro para quem acabava de partir216. Esse costume217 iniciou no Poxim
colonial e se perdura até hoje, cujos moradores repetem como forma de garantir a
tradição histórica local.
Passaram-se 300 anos da inauguração da Igreja de São José e todos os seus
registros ficaram perdidos218 no tempo ou em arquivos particulares, como é o caso da
Igreja Nossa Senhora do Rosário do Poxim ou dos Pretos219. No que se refere à Igreja
215
REIS, João José. A morte é uma festa: ritos fúnebres e revolta popular no Brasil do século XIX.
São Paulo, Cia. das Letras, 1991.p. 13.
216
Os cultos fúnebres eram a ocasião e lugar de prestígio para os membros da Irmandade de Nossa
Senhora do Rosário dos Pretos, pois está presente no enterro era um ato de solidariedade dos vivos em
favor daquele que partia. Ver BORGES, Célia Maia. Escravos e Libertos nas Irmandades do Rosário:
devoção e solidariedade em Minas Gerais: séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: editora da UFJF, 2005.
p. 165.
217
De acordo com o dicionário Aurélio a tradição revela um conjunto de costumes, crenças, práticas,
doutrinas, leis, que são transmitidos de geração em geração e que permitem a continuidade de uma cultura
ou de um sistema social. THOMPSON, Edward Palmer. Costumes em comum – Estados sobre cultura
popular tradicional. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
218
Quase todos os seus registros, exceto os documentos existentes no IHGAl e no APA foram perdidos
ou desaparecidos ou até quem sabe podem estar em algum arquivo particular de usufruto de seu
proprietário.
219
Segundo as pessoas mais velhas, como o seu Floro de 96 anos, em entrevista, essa igreja era própria
para os negros irem às missas e dispensar os sacramentos.
62
Nossa Senhora do Rosário do Poxim220 temos poucas ou quase nada de informações ou
registros, então estamos em busca dos pormenores221 para fazer esse registro e não
deixá-la perdida nos arquivos do esquecimento.
À princípio, essa igreja na verdade era uma capela construída pouco tempo
depois da inauguração da matriz em 1717 por escravos e para negros alforriados. Temos
como seu primeiro registro em 1749, quando o Poxim tinha como Vigário o padre
Manuel Diniz Barbosa222, que celebrava as missas também na Igreja de Nossa Senhora
do Rosário do Poxim. O segundo registro, consiste em o padre Darcy no início do
século XX, afirma que os vigários do Poxim eram enterrados223 no interior da Igreja do
Rosário dos Pretos.
Ele faz o registro de 4 padres que foram enterrados na igreja, são eles: padres
José de Arcanjo Medeiro, em 1837, o padre Antônio Rego, em 1841, o padre José
Machado, esse foi presidente da Província de Alagoas e por fim o padre Francisco
Marquês, em 1862. Não é para menos que na década de 40, do século XX, quando a
igreja foi demolida e foram construir o grupo escolar encontraram ossos humanos no
local224. O terceiro registro está na pessoa do padre Vital da Silva, que vendia uma
escrava com o nome de Anastácia na porta da igreja do Rosário a um senhor de nome
José Vitoriano de Castro225.
Outro registro foi o relatório do Governador José César de Menezes em 1774 e
do bispo de Pernambuco D. Tomás da Encarnação em que ambos afirmam que no
“anno de mil sete centos e setenta e quatro uma lgreja: duas Capelas: dois Engenhos:
quatorze fasendas: quatro centos setenta e dois fogos: e mil seis centas oitenta e duas
pessoas”.226 Mas o registro mais próximo a nós está no final do século XIX, com a
220
Entre os moradores está Manoel Marquez dos Santos, afirmam que havia outra igreja com o oragos de
São Benedito.
221
GINZBURG, Carlo. Mitos, Emblemas e Sinais: morfologia e história. Ed. São Paulo. Companhia
das Letras, 2003. p. 144.
222
LEMOS, João Ribeiro. Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições. Maceió. Ed. Do autor,
1999. p. 108.
223
Segundo Reis tanto branco quanto negro poderiam seres enterrados nas igrejas. REIS, João José. A
morte é uma festa: ritos fúnebres e revolta popular no Brasil do século XIX. São Paulo, Cia. das
Letras, 1991. p. 23.
224
Há quem diga que o local era um cemitério de escravos e que a igreja de Nossa Senhora do Rosário
dos Pretos foi construída por cima dele. Ver LEMOS, João Ribeiro. Poxim: terra de história e de mitos:
Vila Real de São José do Poxim do Sul. Ed. Coruripe, AL, 2018. p. 51.
225
Idem. 54.
226
ANAIS DA BIBLIOTECA NACIONAL, Rio de Janeiro, v.40: 1918 (1923). p. 60.
63
criação do bispado de Alagoas em 1900, porém com o registro de fevereiro de 1901,
escrito por Francisco Izidoro, o autor descreve que há 32 paróquias ou freguesias, sendo
que as paróquias de Piranhas, Poxim, Capela, ainda não foram elevadas a condição de
matriz. O texto começa pela paróquia de
Maceió, Jaraguá, IPioca, Norte, Alagoas, S. Miguel, Pilar, Atalaia, Muricy,
União, Viçosa, Quebrangulo, Palmeira, Anadia, Porto Calvo, S. Bento
(Maragogy), Porto de Pedras, Passo de Camaragibe, Coruripe, Penedo,
Paissabussú, regida pelo Parocho de Penedo, Traipú, Santa Anna do Ipanema,
Porto Real do Collegio, Limoeiro, Pão de Assucar, Matta. Grande, Agua
Branca, Sao Jose da Lase, Bello Monte, São Braz, Egreja Nova. As Parochias
de Piranhas, Poxim, Parahyba ou Capella, não foram ainda providas
convenientemente227.
Mais adiante, no ano de 1901, Francisco Izidoro, em Descrição geographica,
estatística e histórica dos Municípios do Estado de Alagoas fez o seguinte registro da
Igreja de Nossa Senhora do Rosário do Poxim dos Pretos;
O orago da freguezia é N. S. da Conceição. Ignora-se a data da edificação da
Egreja que serve de matriz, mas, sabe-se que a 14 de Julho de 1773 o capitão
Pedro Leite Sampaio e sua mulher Paula Pereira de Castro assignaram
escriptura de patrimônio no cartório do tabelião Felix da Costa Amaral na
cidade de Penedo. Em 7 de outubro de 1864 foi a Egreja destruída por
pavoroso incêndio. Reconstruída, foi ella inaugurada solemnemente, pelo
Rvm. Frei Cassiano de comacchio a 20 de junho de 1887. Tem a freguezia,
alem da matriz, as seguintes capellas: Santa Cruz da Graça, na rua do mesmo
nome; Santa Cruz das Vassouras no arrabalde do mesmo nome; Bom Jesus
dos Navegantes no povodo do Pontal; N. S. da Conceição do engenho
Genipapo; N. S. da Divina Pastora no engenho Primavera; S. Luzia no
povoado d’Agua dos Meninos; S. José e N. S. do Rosário na villa do Poxim e
S. João Baptista no povoado França.228
Por outro lado temos outro tipo de registro da existência da Igreja de Nossa
Senhora do Rosário do Poxim, baseando-se no estilo artístico da época: o barroco
tardio, que passa a ser moldado com outros elementos do espaço colonial e a partir daí
passa a representar a irmandade229. Ou seja, buscaremos respostas em uma outra forma
227
COSTA, Francisco Izidoro Rodrigues. Divisão Eclesiástica de Alagoas desde épocas remotas até a
atualidade. Revista do IHGAL. Maceió, v. 3, n. 2, [p.137], 1901.
228
COSTA, Francisco Izidoro Rodrigues. Descrição geographica, estatística e histórica dos Municípios
do
Estado
de
Alagoas.
Coruripe.
Disponível
<http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Relatorio_atividades_parte_2_PNPI(1).pdf
Acessado: 15 de maio de 2018.
229
BORGES, Célia Maia. Escravos e Libertos nas Irmandades do Rosário: devoção e solidariedade
em Minas Gerais: séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: editora da UFJF, 2005. p. 139.
64
de registro histórico230. Se tirarmos as vendas dos olhos observaremos que os nichos das
laterais da Igreja de São José são diferentes, o que mostra que o nicho da parte superior
da esquerda é de uma outra igreja, provavelmente a de Nossa Senhora do Rosário dos
Pretos do Poxim.
Nesses nichos temos as imagens de Nossa Senhora do Rosário e de São
Benedito, ambos pertenciam a igreja demolida. O local onde estão as imagens é que
chama atenção, pois isso seria algo incoerênte, já que a imagem de Nossa Senhora do
Rosário não estaria na lateral de um altar, mas estaria no centro231 respeitando uma
hierarquia religiosa. O espaço pictórico era um “primado do visual”232 da arte barroca e
dizia muito para as irmandades e confrarias233, pois esse espaço é responsável por uma
linguagem artística repleta de símbolos234 que estavam associados à condição do espaço
social da irmandade e ao mesmo tempo ter uma igreja própria, significava ter uma certa
autonomia235 diante dos grupos dominantes e para isso eles investiram na ornamentação
da igreja, ou seja, eles faziam da igreja um lócus236, um ambiente sagrado que só eles
poderiam entrar.
FIGURA 6 – ALTAR-MOR DA IGREJA DE SÃO JOSÉ DO POXIM (DETALHES)
GINZBURG, Carlo. Sinais – raízes de um paradigma indiciário. Mitos, emblemas, sinais. São
Paulo: Companhia das Letras. 1989.
231
BORGES, Célia Maia. Escravos e Libertos nas Irmandades do Rosário: devoção e solidariedade
em Minas Gerais: séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: editora da UFJF, 2005. p. 153.
232
Idem. 147.
233
REIS, João José. A morte é uma festa: ritos fúnebres e revolta popular no Brasil do século XIX.
São Paulo, Cia. das Letras, 1991. p. 49.
234
BORGES, Célia Maia. Escravos e Libertos nas Irmandades do Rosário: devoção e solidariedade
em Minas Gerais: séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: editora da UFJF, 2005. p. 146.
235
Idem. 146.
236
Idem. 150.
230
65
FONTE: ROBSON WILLIAMS BARBOSA, SETEMBRO, 2006.
Observando com mais detalhe as imagens de Nossa Senhora do Rosário e de São
Benedito que estão à esquerda do altar-mor da Igreja de São José, notamos as diferenças
artísticas que há em ambos os nichos e nos frontões altos. O nicho de cima (Nossa
Senhora do Rosário) é formado por um movimento ondulatório do arco e sobre ele
apresenta um vaso em seu centro envolto a uma vegetação tímida e coberto de duas
colunas de madeira. Já o nicho de baixo (São Benedito) possui quase todas as
características, se tirarmos a venda dos olhos nota-se que na parte superior, do nicho de
São Benedito, na parte superior central não é um vaso repleto de uma vegetação tímida,
mas um óculo237 e o mesmo se dar com os outros dois nichos do altar da lateral da
direita.
FIGURA 7 – NICHOS DA IGREJA DE SÃO JOSÉ COM A IMAGEM DE NOSSA
SENHORA DO ROSÁRIO DO POXIM E SÃO BENEDITO
FONTE: ROBSON WILLIAMS BARBOSA, SETEMBRO, 2006.
À princípio, essa Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Preto era na verdade uma
capela construída pouco tempo depois da inauguração da Igreja Matriz de São José do
237
Em arquitetura religiosa ou civil, é uma abertura ou janela circular ou elíptica, destinada à passagem
de ar ou de luz. Por vezes, assume formas variadas para efeitos também decorativos.
66
Poxim em 1717, com o pecúlio da Irmandade às custas238 dos pretos, mulatos e escravos
alforriados, mas que só teve seu término no ano de 1835 com a doação do bispo de
Pernambuco Dom João da Purificação Marques Perdigão, que no ano de 1833 em visita
pastoral aos limites da diocese faz uma doação de 30$000 reis para a conclusão da
igreja.
Dia 21. Celebrei publicamente, e depois crismei mais de 500 pessoas, com
um longo discurso no fim. De tarde fui vêr a capella de Nossa Senhora do
Rozario, feita de pedra e cal, porém não acabada, e para promover o seu
acabamento dei uma esmola de 30$000 reis, e logo depois me dirigi á matriz,
onde crismei mais de 100 pesoas, com pratica no fim tendente aos bons
costumes e detestação dos vicios. Dia e at 22. Crismei mais de 50 pessoas.239
A explicação que encontramos para o fato de o altar-mor ter nichos diferentes
está na narrativa popular em afirmar que a igreja Nossa Senhora do Rosário do Poxim
foi destruída240 e que as imagens dos santos, paramentos e outros artefatos religiosos da
Igreja Nossa Senhora do Rosário foram para a igreja de São José, já que ambas eram
bem próximas uma da outra, e eram “as duas igrejas do Poxim (…) são as igreja de
São José do Poxim e de Nossa Senhora do Rosário do Poxim”241, isso no ano de 1799.
Em virtudes dos fatos mencionados, não sabemos as motivações que levaram a
destruição da Igreja Nossa Senhora do Rosário do Poxim dos Pretos, até conhecermos
seus agentes242, mas lamentamos tal atrocidade que se caracteriza como uma imensa
relação de dominação e força243 e tudo que se refere à igreja temos poucas ou quase
nada de informação ou registro sobre a Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos,
então estamos em busca dos pormenores244 para fazer esse registro e não deixá-la
238
A Igreja da conceição da Praia, na Bahia ergue-se também, às custa dos pretos de Angola e criolo da
terra. Ver REGINALDO, Lucilene. Os Rosários dos Angolas. Irmandades de africanos e crioulos na
Bahia Setecentista. São Paulo: Alameda, 2011. p. 167.
239
LEMOS, João Ribeiro. Poxim: terra de história e de mitos: Vila Real de São José do Poxim do
Sul. Ed. Coruripe, AL, 2018. p. 34.
240
Segundo os moradores mais antigos, havia a Igreja de São Benedito, que também foi destruída junto
com a de Nossa Senhora do Rosário e que as imagens de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito
estão nos nichos laterais da igreja de São José, ou seja, ambas as igrejas destruídas.
241
LEMOS, João Ribeiro. Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições. Maceió. Ed. Do autor,
1999. p.180. Na página 106, ele chama a igreja de Nossa Senhora do Rosário do Poxim de capela.
242
Segundo Lemos, a Igreja do Rosário dos Pretos foi demolida pelo prefeito Francisco Azevedo.
LEMOS, João Ribeiro. Poxim: terra de história e de mitos: Vila Real de São José do Poxim do Sul.
Ed. Coruripe, AL, 2018. p. 20.
243
CERTEU, Michel de. A Invenção do Cotidiano. 1 As artes de fazer. Vozes. Petrópolis, Rio de
Janeiro. 2006. p. 46.
244
GINZBURG, Carlo. Sinais – raízes de um paradigma indiciário. Mitos, emblemas, sinais. São
Paulo: Companhia das Letras. 1989.
67
perdida nos arquivos do esquecimento245.
1.3 A IRMANDADE DO POXIM
As confrarias são organizações que se estruturam dentro da igreja246, a depender
de cada santo (a) ou padroeiro (a) seja ele ou ela de sua Irmandade de branco, pardos ou
de negros escravizados247 ou negros alforriados, eles desempenharam, junto a igreja
durante séculos, a intermediação de sua ação pastoral junto aos fiéis. Em Alagoas, Félix
Lima Jr registra a Irmandade Nossa Senhora do Amparo, que foi a primeira irmandade
de “moços pardos” 248 em Alagoas em 1685, na de Vila de Santa Maria Magdalena de
Alagoas do Sul.
No afastado ano de 1683 os moços pardos daquela vila (Santa Maria
Madalena de Alagoas do Sul), reunidos na igreja matriz do lugar, fundavam a
irmandade de Nossa Senhora do Amparo. A base do compromisso daquela
confraria dos homens pardos foi firmada em abril de 1685, na matriz da vila,
com a assistência do Vigário licenciado Joseph Nunes de Souza.249
As irmandades e confrarias existiam no Brasil desde o século XVII. Podemos
observar alguns pontos significativos na existência dessas irmandades no Poxim. O
primeiro deles foi a grande influência que a Igreja tinha sobre as nações africanas e
também o impacto cultural que o catolicismo causou sobre os povos africanos nas
regiões açucareira e mineradora250. A religião católica foi o ponto de partida entre
brancos e negros, ela era o lastro de comunicação que havia dentro desse processo de
interferência cultural, política, social e econômica.
“As irmandades foram um dos lugares mais importantes de concretização do
desejo dos homens de cor, escravos e libertos”251 e tinha como objetivo conseguir
245
Idem. 1990.
REIS, João José. A morte é uma festa: ritos fúnebres e revolta popular no Brasil do século XIX.
São Paulo, Cia. das Letras, 1991. p. 49.
247
Idem. p. 53.
248
Em Maceió o primeiro registro está no ano de 1778, com SS Sacramento de Santo Antônio do Meirim
e as outras irmandades com Nossa Senhora dos Prazeres em 1825, do Livramento em 1825 e Rosário em
1837, ou seja, todas no século XIX. Ver LIMA JÚNIOR, Félix. Irmandades. Maceió. Secretaria da
Educação e cultura do Estado de Alagoas. 1970. p. 5.
249
Idem.
250
O principal mecanismo de controle de suas atividades, durante o período colonial, consistia na
conferência de sua administração financeira e controle social. Ver FALCON, Francisco. A “Época
Pombalina” no Mundo Luso-Brasileiro. Rio de Janeiro. Editora; FGV, 2015. p. 350.
251
REGINALDO, Lucilene. Os Rosários dos Angolas. Irmandades de africanos e crioulos na Bahia
Setecentista. São Paulo: Alameda, 2011. p. 241.
246
68
prestígio social - um status quo252- em seu meio político e social. Negros, mulatos e
pardos não podiam frequentar a igreja dos brancos253 eram proibidos por conta da cor e
esse foi um dos motivos dos surgimentos das irmandades254. Em busca de
reconhecimento social255 e visando sua inserção no meio social em que viviam os
escravos, mulatos e pardos viram essa possibilidade dentro da fé católica. Buscava nos
santos católicos uma porta para essa inserção tornando-os padroeiros de sua irmandade
ou confraria como é o caso de Nossa Senhora do Rosário, São Benedito, Santa Efigênia
e Santo Antônio de Categeró e ao mesmo tempo tornaram-se patrocinadores das festas
de seus respectivos padroeiros e de alforrias, batizados e enterros de outros escravos.
A catequese dos “homens de cor” 256 tinha, também, como função dentro do
espaço colonial equilibrar, ou garantir certa isonomia nas hierarquias sociais e o
caminho seguido para isso foi à promoção de um santo negro, pois ajudariam na
integração257 dos pretos, escravos, mulatos e pardos à nova fé dentro do contexto social
colonial. Elas reforçavam a integração social e criou um espaço relativo de autonomia
negra construindo identidades sociais vivenciadas no interior de uma sociedade
opressora. Em outras palavras, a Igreja Católica formou uma pedagogia missionária258
para que houvesse um nivelamento social entre brancos e negros, garantido assim a ação
do Estado sobre os negros. Não é à toa que as irmandades obedeciam a regras
sancionadas pela Igreja e tinham as suas contas verificadas anualmente por um
dignitário religioso259.
Segundo Falcon, no período Pombalino, as irmandades e confrarias em Minas
252
A posição de cada membro da Irmandade envolvia a garantia de certo “status” social frente à
sociedade colonial no seu tempo e local geográfico, onde essas variáveis eram estabelecidas.
253
REGINALDO, Lucilene. Os Rosários dos Angolas. Irmandades de africanos e crioulos na Bahia
Setecentista. São Paulo: Alameda, 2011. p. 161.
254
Os membros da irmandade tinham direito a assistência financeira, em caso de necessidade, médica e
jurídica e a um enterro decente. Ver REIS, João José. A morte é uma festa: ritos fúnebres e revolta
popular no Brasil do século XIX. São Paulo, Cia. das Letras, 1991. p. 50.
255
REGINALDO, Lucilene. Os Rosários dos Angolas. Irmandades de africanos e crioulos na Bahia
Setecentista. São Paulo: Alameda, 2011. p. 197.
256
OLIVEIRA, Anderson J. M. de. Devoção Negra: Santos Pretos e Catequese no Brasil Colonial. Rio
de Janeiro: Quartet: Faperj, 2008. p. 89.
257
BORGES, Célia Maia. Escravos e Libertos nas Irmandades do Rosário: devoção e solidariedade
em Minas Gerais: séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: editora da UFJF, 2005. p. 157.
258
Idem. p. 153.
259
FALCON, Francisco. A “Época Pombalina” no Mundo Luso-Brasileiro. Rio de Janeiro. Editora;
FGV, 2015. p. 350.
69
Gerais passaram para jurisdição do Estado260, sendo as mesmas fiscalizadas por
autoridades eclesiásticas e seculares do local, através da provisão de 20 de julho de
1752, principalmente a Irmandade do Santíssimo Sacramento, representando os mais
abastados. Na concepção política de Carvalho e Melo as irmandades e confrarias tinham
que passar por uma reforma e isso era um desafio para sua administração,
pois se por um dado prisma elas representavam uma face do poder religioso
que tanto se queria domesticar e submeter ao Estado, por outro viés elas
poderiam se transformar em grandes aliadas no processo de modernização
que se almejava, além de se colocarem como um importante contrapeso a
influencia de certas instâncias do poder eclesiástico. Nesse sentido, além das
ações do Estado, era também importante distanciar as irmandades de uma
concepção de catolicismo que discordava das reformas empreendidas,
aproximando-as ou procurando influenciá-las por setores do poder
eclesiástico que se afinavam com a gestão pombalina. Parece-me que, diante
dessa questão, o papel de segmentos do episcopado deve ser considerado para
uma melhor compreensão da complexidade do projeto desenhado para as
irmandades.261
Todos os santos adotados pela irmandade eram negros? Para responder a tal
pergunta e obtermos maiores informações consultaremos a hagiologia262, que é um
conjunto de obras que fala sobre a vida dos santos. Começaremos pelo santo mais
conhecido e cultuado que é São Benedito, o mouro263, como era conhecido, nascido na
Sicília, Itália, no século XVI e faleceu em Parlemo, Itália. Observamos aqui, o adjetivo
mouro em referência a cor do santo e ao seu passado, já que provavelmente ele teria
sido filho de escravos e isso facilitava o apego das irmandades a esse santo. Sem deixar
de mencionar que tanto a cor quanto a sua origem traz, para os membros da irmandade,
uma lembrança dos seus ancestrais familiares264 e de sua terra natal.
Outro santo negro pouco conhecido por populares religiosos é Santo Antônio de
260
Idem.
BORGES, Célia Maia. Escravos e Libertos nas Irmandades do Rosário: devoção e solidariedade em
Minas Gerais: séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: editora da UFJF, 2005. p. 161.
261
FALCON, Francisco; CLAUDIA, Rodrigues (orgs.). A “Época Pombalina” no mundo lusobrasileiro. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2015. p. 361
262
OLIVEIRA, Anderson J. M. de. Devoção Negra: Santos Pretos e Catequese no Brasil Colonial. Rio
de Janeiro: Quartet: Faperj, 2008. p. 90.
263
Mouro palavra latina que significa “o mais escuro”. Os Mouros eram árabes de religião islâmica e
berberes, nativos do norte da África, que ocuparam a Península Ibérica no século IX d. C.
264
BORGES, Célia Maia. Escravos e Libertos nas Irmandades do Rosário: devoção e solidariedade
em Minas Gerais: séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: editora da UFJF, 2005. p. 130.
70
Categeró ou Santo Antônio de Cartago265. Santo Antônio além de ter a cor negra foi
escravo nas galeras266 na Sicília267. Já os outros dois próximos santos são Santa Efigênia
e São Elesbão, ambos eram negros, mas não tinham um passado nas correntes da
escravidão eles faziam parte da nobreza. Santa Efigênia era princesa da Núbia, reino
africano, e ele, nascido na Etiópia, era 46° neto do rei Salomão e da rainha de Sabá268.
Ela converteu-se ao cristianismo através de São Matheus em missão na África e ele
abdicou da linha de sucessão ao trono e passou a viver como um missionário expandido
o cristianismo em toda Etiópia, isso no século VI d.C.
Já a devoção a Nossa Senhora do Rosário teve seu início quando os missionários
dominicanos foram catequisar na África e lá passaram a impor seu culto aos negros e
quando eles chegaram ao Brasil no século XVI, deram continuidade ao culto à santa.
Com isso, o Papa Gregório XIII no final do século XVI, determinou que toda irmandade
ou confraria no Brasil que tivesse Nossa Senhora do Rosário como padroeira celebrasse
o seu dia em todo 1° domingo do mês de outubro269.
A Irmandade do SS Sacramento270 era composta por homens271 brancos, mas
não excluía pretos nem pardos, e tinha como finalidade arcar com o culto ao divino, ao
litúrgico, a festas do orago São José. Essa irmandade funcionava nos consistórios272 da
Igreja de São José e realizava caridades, ou seja, possuía uma função pública que ia
além da devoção
prestando ajuda material e espiritual: enterravam mortos, rezavam missas
pelas almas dos irmãos, assistiam os doentes, ofereciam apoio em casos
legais, emprestavam dinheiro em várias ocasiões, inclusive como forma de
265
Aqui toma como referência o local de nascimento do santo que foi na Cirenáica, uma região do norte
da África. O local na antiguidade era um entreposto comercial fenício.
266
Tipo de barco a remo que existe desde a Antiguidade Clássica, com os gregos e Romanos, para
batalhas no Mediterrâneo.
267
BORGES, Célia Maia. Escravos e Libertos nas Irmandades do Rosário: devoção e solidariedade
em Minas Gerais: séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: editora da UFJF, 2005. p. 156.
268
OLIVEIRA, Anderson J. M. de. Devoção Negra: Santos Pretos e Catequese no Brasil Colonial. Rio
de Janeiro: Quartet: Faperj, 2008. p. 99.
269
BORGES, Célia Maia. Escravos e Libertos nas Irmandades do Rosário: devoção e solidariedade
em Minas Gerais: séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: editora da UFJF, 2005. p. 173.
270
Foi aprovada pelo presidente da Província de Alagoas e pelo bispo de Olinda. Ver LEMOS, João
Ribeiro. Poxim : terra de história e de mitos : Vila Real de São José do Poxim do Sul. Ed. Coruripe,
AL, 2018. p. 14.
271
Havia, também, a Irmandade de Nossa Senhora da Conceição que ficava em Coruripe. Ver LEMOS,
João Ribeiro. Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições. Maceió. Ed. Do autor, 1999. p.133.
272
No caso na igreja de São José hoje funciona o Museu dos Devotos Dom Constantino Lüers.
71
auxílio na compra de alforria para os irmãos escravos.273
Segundo Lemos, a SS Sacramento saia em procissão, nas ruas ensolaradas do
Poxim com os seus membros, que eram chamados de Irmãos das Almas, de opas274
brancas com lugares devidamente definidos no cortejo cerimonial de acordo com o
prestígio275 que aquele irmão tinha na ordem, enquanto outros membros levavam o pálio
para cobrir o vigário com a hóstia.
A Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos do Poxim, demorou em ser
construída por falta de recursos financeiros276, já que dependia muito das coletas de
esmola277, festas, quermesses ou bingos. Essas coletas também serviam para emprestar
o dinheiro para o irmão da irmandade que queria comprar sua alforria278 e para a festa
do padroeiro que gastava muito e havia um gasto excessivo na festa do orago, pois era
“uma espécie de válvula de escape, uma exaltação do lazer permitindo no duro
cotidiano da escravidão e do trabalho contínuo.” 279 Então, por isso que demorou muito
para o término da igreja.
A festa do padroeiro era um compromisso da irmandade e dinamizava280 os
membros da irmandade para uma organização econômica solidária281 de vários grupos
como dentro da irmandade ou nas portas pedindo esmolas. Esse dinamismo era notório
publicamente, já que a irmandade negra rivalizava com a irmandade de brancos282.
273
LARA, Silvia Hunold. Fragmentos setecentistas. Escravidão, cultura e poder na América
portuguesa. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. p. 207.
274
As opas brancas eram um estilo de túnicas em que os membros da irmandade usavam para saírem no
enterro de um irmão falecido. BORGES, Célia Maia. Escravos e Libertos nas Irmandades do Rosário:
devoção e solidariedade em Minas Gerais: séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: editora da UFJF, 2005.
p. 166. Ver também REIS, João José. A morte é uma festa: ritos fúnebres e revolta popular no Brasil
do século XIX. São Paulo, Cia. das Letras, 1991. p. 14.
275
Idem. 163. Ver também REGINALDO, Lucilene. Os Rosários dos Angolas. Irmandades de
africanos e crioulos na Bahia Setecentista. São Paulo: Alameda, 2011. p. 199.
276
REIS, João José. A morte é uma festa: ritos fúnebres e revolta popular no Brasil do século XIX.
São Paulo, Cia. das Letras, 1991. p. 50.
277
REGINALDO, Lucilene. Os Rosários dos Angolas. Irmandades de africanos e crioulos na Bahia
Setecentista. São Paulo: Alameda, 2011.
278
Idem. 339, 341 e 342.
279
Idem. 196.
280
Todos podiam participar da festa do padroeiro, se o negro não fosse alforriado ele perderia
autorização ao senhor. Ver BORGES, Célia Maia. Escravos e Libertos nas Irmandades do Rosário:
devoção e solidariedade em Minas Gerais: séculos XVIII e XIX. Juiz de Fora: editora da UFJF, 2005.
p.182.
281
A festa era um dos compromissos da irmandade, por esse motivo eles mostravam capacidade de
organização. Idem. p. 181.
282
REGINALDO, Lucilene. Os Rosários dos Angolas. Irmandades de africanos e crioulos na Bahia
Setecentista. São Paulo: Alameda, 2011. p. 186.
72
Claro que também havia as rivalidades internas dos irmãos para ter o melhor lugar no
meio social e dos festejos, pois cada um sabia qual era o significado da ausência 283 na
festa do padroeiro.
"(...) A festa se faz no interior de um território lúdico onde se exprimem
igualmente as frustrações, revanches e reivindicações dos vários grupos que
compõem uma sociedade (...)"284
A festa do Rosário no Poxim tinha como rivalidade a festa de São José, no dia
19 de março, enquanto a do Rosário seria no 1° domingo do mês de outubro, então a
irmandade de negros, mulatos e pardos teriam sete meses para superar a grandeza da
festa patrocinada pela SS sacramento. Por isso, negros, mulatos e pardos tinham o maior
cuidado com a organização285, principalmente na escolha do vigário286, pois tinha que
ser um padre que tivesse uma oratória287 de acordo com o sermão288 voltado ao interesse
da irmandade. Todas as irmandades e confrarias firmavam seus compromissos que eram
avaliado e aprovado pela comunidade Eclesiástica da Província. Não encontramos o
compromisso de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos do Poxim.
As Igrejas da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, São Benedito
ou Santa Efigênia, geralmente, apresentavam os seus templos religiosos com uma
arquitetura um pouco mais simples ou modesta sem tanta satisfação dos seus elementos
decorativos, tanto na parte interna incluindo o seu altar-mor, assim como na sua
fachada, mesmo que ela seja do estilo barroco, pois a decoração da igreja com
características da arte barroca inseria-se dentro do processo de assimilação cultural289
dos negros com a irmandade no meio social.
Esta simplicidade decorativa está geralmente associada ao baixo poder aquisitivo
dos seus associados de ascendência africana liberta ou forros, cujo poder de compra
poderia ser irrisório, ficando a depender da coleta de esmola, festas, quermesses ou
bingas direcionadas para custear as despesas da referida irmandade, cuja sua
283
Idem. p. 198.
PRIORE, Mary Del. Festas e Utopias no Brasil Colonial. São Paulo, Brasiliense, 2000. p. 9.
285
REGINALDO, Lucilene. Os Rosários dos Angolas. Irmandades de africanos e crioulos na Bahia
Setecentista. São Paulo: Alameda, 2011. Idem. p.188 e 201.
286
Esses atos litúrgicos custavam caros. Idem. p. 189.
287
BLACKBURN, Robin. A Construção do Escravismo no Novo Mundo, 1492-1800. (Trad.). Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. p. 255.
288
Em sua sociedade iletrada a palavra era algo muito importante. Ver REGINALDO, Lucilene. Os
Rosários dos Angolas. Irmandades de africanos e crioulos na Bahia Setecentista. São Paulo:
Alameda, 2011. p. 188.
289
REGINALDO, Lucilene. Os Rosários dos Angolas. Irmandades de africanos e crioulos na Bahia
Setecentista. São Paulo: Alameda, 2011. p. 148 e 149.
284
73
administração geralmente era feita por algum branco290 ou mulato com certo grau de
escolaridade e que soubesse um pouco de administração e contabilidade, porque ele
deveria prestar contas dos recursos da Irmandade aos seus sócios.
Assim com a Irmandade de São Gonçalo Garcia de Penedo291, alguns pardos da
Irmandade do SS Sacramento e do Rosário viram na entrada no corpo miliciano como
uma forma de gerir sua inserção social ou até como uma forma de distinção social292. O
Regimento de Milícias dos Homens Pardos tinha o apoio da Coroa portuguesa, já que
esse corpo militar faria o trabalho de vigilância de forma gratuita e não mexeria com o
Erário. Em outras palavras, o corpo miliciano de pardo servia ao poder local e os soldos
não eram pagos pela Coroa portuguesa. Para outros negros, o trabalho militar era uma
forma de ter certa mobilidade social através das promoções (as patentes) e de outras
vantagens293 inerentes às funções que exerciam dentro da sociedade escravista e com a
reforma pombalina294 o papel das instituições militares ganhou nova impulsão, pois
essas instituições passaram a ser o instrumento principal da metrópole para o controle
social da população.
Para Caio Prado Jr., não havia uma mobilidade social295 na colônia, já que esse
recrutamento para as tropas durante a fase do Brasil colônia representava um grande
trauma para a população pela falta de critérios e pelo autoritarismo dos recrutadores o
que levava a prática de arbitrariedades por essas autoridades. Por outro lado, todos os
290
Geralmente o branco era, dentro da irmandade ou confraria, o procurador, tesoureiro e escrivão. Idem.
343.
291
ALVES, Fabianne Nayra Santos. Ser pardo na colônia: hierarquias sociais na Vila de Penedo do
Rio São Francisco. Maceió. Editora Edufal, 2017. p. 85.
292
REGINALDO, Lucilene. Os Rosários dos Angolas. Irmandades de africanos e crioulos na Bahia
Setecentista. São Paulo: Alameda, 2011. p. 345.
293
Os interesses políticos e sociais dos homens de cor combinavam com os interesses locais e de poder
administrativo. Ver FRAGOSO, João e GOUVÊA, Maria de Fátima. (orgs.) Na trama das redes:
política e negócio no império português, séculos XVI-XVIII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2010. p. 67 e 69.
294
A estrutura da organização militar no Brasil colônia reflete, inicialmente, a transposição do modelo
ibérico para a América Portuguesa. O modelo organizacional militar luso-brasileiro seria formado pelo
tripé: Tropa Regular, Regimento Auxiliares ou Milícias e Ordenanças. No período pombalino, a política
defensiva visava estabelecer um sistema militar que articulasse harmonicamente esses três tipos de tropas.
Ver SILVA, Waldemar Marins da. Mobilidade Social: Pardos nas Forças Militares na Capitania de
São Paulo ( final do século XVIII e inicio do século XIX). Disponível em <file://
/waldemar_marins_silva.pdf> Acesso em: 14 mai. 2018.
295
PRADO Jr., C. Formação do Brasil Contemporâneo: colônia. 7ª ed. São Paulo: Companhia das
Letras, 2017.
74
pobres sendo eles brancos, negros libertos, mulatos ou escravos alforriados, que não
trabalhavam ou não tinham um emprego público iria trabalhar nas tropas milicianas296.
Esses corpos de mestiços e negros vinham se organizando desde as guerras
holandesa, onde os homens de cor, a serviço dos grandes senhores das terras
de açúcar, se revelaram tão bons soldados: ótimos Para as guerrilhas, dado o
seu conhecimento íntimo dos canaviais. A especialização militar resultava
Para eles em prestígio social. Junto com os corpos militares, formaram-se
desde anos remotos, nas cidades do Nordeste, irmandades, como a do
Rosário, todas de negros e administradas por negros - às vezes só os
tesoureiros brancos, com prejuízo para os interesses dos associados – e
parece que não admitido senão negros, com para imitar as do Santíssimo
Sacramento que, segundo se diz, não admitiam senão brancos. Embora o
exclusivismo não significasse antagonismo aos brancos, não deixava de
indicar uma situação diversa da dos negros de engenho, melhor acomodados
ao sistema dos senhores e participando das suas devoções, debaixo da telhavã das mesmas capelas patriarcais.297
O Regimento de Milícias dos Homens Pardos era comandado por um capitãomor branco e esse geralmente era uma pessoa poderosa e que tinha um forte cabedal
econômico. O capitão representava um canal de centralização para o funcionamento da
máquina política e deveria “assegurar a eficiência dos elos hierárquicos existentes
entre as diversas camadas do sistema burocrático”298, por isso não poderia ser um
homem de cor.
Havia muita resistência da autoridade contra esses oficiais de cor. Não é à toa
que existia uma ação contrária para que os oficiais de cor não conseguissem subir de
posto na hierarquia militar, enquanto isso nos postos subalternos não tinha resistência.
Esta tolerância com os postos mais subalternos se justifica, já que nos recrutamentos299
não se levava muito em conta a cor do recrutado, uma vez que esses recrutamentos eram
feitos quando havia necessidade urgente de homens para criar contingentes para missões
que normalmente demandavam urgência, portanto, não se fazia muita distinção entre as
pessoas: eram recrutados todos aqueles que tivessem condição de combater: pretos
forros, criminosos, indígenas, vadios, escravos, isso ocorria em toda a colônia.
296
LARA, Silvia Hunold. Fragmentos setecentistas. Escravidão, cultura e poder na América
portuguesa. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. p. 169.
297
FREYRE, Gilberto. Nordeste: aspectos da influência da cana sobre a vida e a paisagem do
Nordeste do Brasil. 6ª Edição. Rio de Janeiro: Record, 1989. p. 123.
298
FRAGOSO, João e GOUVÊA, Maria de Fátima. (orgs.) Na trama das redes: política e negócio no
império português, séculos XVI-XVIII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010. p. 59 e 60.
299
Idem. p. 62.
75
Desde 1742300 existia no Poxim um Regimento de Milícias dos Homens Pardos
listaremos abaixo no raio de 65 anos alguns requerimentos de pedidos de mudança de
patente militar. Todos esses homens faziam a parte do Regimento de Milícias dos
homens Pardos e solicitaram, com exceção de João Correia da Nóvoa, ao príncipe, D.
João, a confirmação da carta patente ao posto de capitão e todos os pedidos foram feitos
pelo capitão-mor António José de Vasconcelos Falcão. Acompanhe a tabela abaixo;
QUADRO 4 - REQUERIMENTO DE CARTA PATENTE DO POXIM
REQUERIMENTO DE CARTA PATENTE DO POXIM DO REGIMENTO DE
MILÍCIAS DOS HOMENS PARDOS
NOME
MÊS E DIA
ANO
PATENTE
JOÃO CORREIA DA
NÓVOA
8 JANEIRO
1742
CAPITÃO
JOSÉ CARLOS
PEREIRA CAMPOS
8 JULHO
1794
CAPITÃO
JOÃO DE DEUS DE
VASCONCELOS
26 DE
JUNHO
1801
CAPITÃO
AFONSO PINTO DE
MOURA
17 DE
JANEIRO
1803
CAPITÃO
MANUEL ANTÔNIO301
DE SANTANA
FERRARA
26 DE
NOVEMBRO
1807
CAPITÃO
FONTE: AHU-PERNAMBUCO. CX. 2, 3, 4 e 5.
Esses mesmo requerimentos aconteciam para a Infantaria da Ordenança302 da
Vila Real de São José do Poxim, só que havia uma diferença de hierarquia militar, havia
300
Esse registro é o mais antigo que encontramos.
Aqui, refere-se a uma denúncia que Francisco Manuel Martins Ramos faz ao príncipe regente D. João,
em que ele alega que o requerente é um criminoso e que já era acusado de crimes na Bahia desde de 1799
e por insultar um oficial na Vila de Penedo e lá mesmo ficou preso por algum tempo e depois foi morar
no Poxim, mas não são citados os crimes cometidos por ele na Bahia. AHU_ACL._CU_.004, Cx. 6, D.
467.
302
A Infantaria da Ordenança protegia as capitanias-mores, tendo como base a constituição das capitanias
da terra que eram; Curatos, freguesia, vila e cidade. O capitão-mor eleito pelas jurisdições de cada terra
que tanto podiam ser do rei, ou de senhores, nobres ou eclesiásticos. Ver SILVA, Waldemar Marins da.
Mobilidade Social: Pardos nas Forças Militares na Capitania de São Paulo ( final do século XVIII e
inicio do século XIX). Disponível em <file:// /waldemar_marins_silva.pdf> Acesso em: 14 mai. 2018.
301
76
um teto para os solicitantes do Regimento de Milícias dos Homens Pardos303, em que
eles só chegariam a capitão enquanto na Infantaria da Ordenança o teto era capitão-mor.
A inserção de uma pessoa de cor no serviço militar não era do agrado da elite colonial, a
situação piorava com as promoções, pois um branco não queria que “homens de cor”
encontrassem nas promoções militares uma isonomia social, e por isso barrava-se as
promoções mais altas deixando para os “homens de cor” as patentes abaixo da deles.
Em outras palavras, o negro, o mulato, o preto ou pardo que entrasse no corpo miliciano
só alcançaria os postos subalternos304.
Tendo em vista os aspectos observados, percebemos que a igualdade social entre
brancos e pretos estava longe, mesmo com inserção de pretos e pardos nas irmandades e
confrarias para tentar suavizar essa diferença, se por um lado, as irmandades e
confrarias, ajudavam nas obras públicas, comércio local, no culto divino, ritualístico e
nas festas religiosas as organizações sociais brancas foram capazes de mostrar o falso
conceito de irmandade e igualdade social, principalmente no Poxim que tinha uma
Irmandade organizada por brancos.
Por outro lado, havia outra forma para ex-escravos e homens de cor conseguir de
forma parcial a inserção no mundo dos brancos, seria a carta de alforria305, que a partir
do século XVIII os escravos passaram a ter acesso a sua liberdade através dela, que era
na verdade um documento dado ou vendido a um escravo pelo seu proprietário
abdicando do seu direito sobre a propriedade em questão, nesse caso, o escravo. Para
França Paiva a carta de alforria era na verdade “um instrumento da maior importância
na vida de um ex-escravo”306. As alforrias307 eram sempre negociadas entre escravos e
303
A primeira guarnição de Alagoas foi de Porto Calvo, a segunda em Penedo, a terceira Santa Maria
Magdalena do Sul de Alagoas a quarta e última do Poxim. Toda a segurança da costa e vigilância sobre as
rotas de navegação, na região sul de Alagoas, era dos cuidados militares do Regimento de Milícias dos
Homens Pardos de Penedo e Poxim. Ver LEMOS, João Ribeiro. Poxim: terra de história e de mitos:
Vila Real de São José do Poxim do Sul. Ed. Coruripe, AL, 2018. p. 61.
304
Segundo, Sheila de Castro Faria, em A colônia em Movimento, dificilmente em terras d’além-mar
poder-se-ia encontrar um homem “preto” com o título de “coronel ou “capitão”. FARIA, Sheila de
Castro. A Colônia em movimento. Fortuna e Família no Cotidiano Colonial. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1998. p. 113.
305
É bom frisar que a carta de Alforria concedida aos escravos não garantia a inserção social, ela abria
caminhos para tal, mas nunca inserir um escravo em um mundo dos brancos.
306
PAIVA, Eduardo França. Escravos e Libertos nas Minas Gerais do século XVIII: Estratégias de
Resistência Através dos Testamentos. São Paulo: Annablume; Belo Horizonte: PPGH-UFMG, 2009. p.
105.
307
Segundo França Paiva o termo alforria vem do árabe que significa “libertar”. Ver SCHWARCZ, Lilia
Moritz; GOMES, Flávio dos Santos. (Orgs). Dicionário da Escravidão e Liberdade. 50 textos críticos.
São Paulo: Companhia das Letras, 2018. p. 93.
77
senhores e essas negociações ocorrem de várias formas, compradas, gratuitas, ligadas
em testamento, prometidas sob condições, como recompensa e coartadas.308
Alguns escravos tiveram acesso a liberdade através da compra da alforria com o
pecúlio que iam juntando através de trabalhos extras que eram feitos por eles através do
comércio309 que havia nos centros urbanos, possibilitando uma mobilidade social310
entre esses cativos. Por outro lado, havia também, as alforrias na pia batismal311 que
serviam como documento atestando a condição de liberdade e o mesmo acontecia com
as alforrias testamentárias (inventário post-mortem)312, já que a
alforria significava, sem dúvida, um ganho não desprezível para homens e
mulheres cativas. Resultado, muitas vezes, de anos de trabalho duro pra
poupar o equivalente a seu preço ou tempo de “dedicação ao senhor” e de
“bons serviços prestados”; na realidade, o ganho mais evidente era o
exercício da liberdade de movimento. As condições materiais de vida, em
geral, não se modificaram, assim como a constante referência social a seu
passado escravo313.
No final do século XVIII, em primeiro de junho de 1798, temos registrado, no
Poxim, a carta de alforria escrita pelo Senhor Amaro Dantas Barbosa, a próprio punho,
em favor do escravo chamado Domingos. Na verdade Domingos, era seu filho através
de uma relação extraconjugal314 com a mãe de Domingos, uma escrava de nome
Thereza315. Na carta de alforria o Senhor Amaro Dantas Barbosa reconhecendo a
paternidade de Domingos diz que
por fragilidade humana tive em huma escrava minha parda de nome Thereza,
hum filho que mandei batizar, pondo-lhe o nome de Domingos. O qual não
reconheci logo por temer as contas que devo dar ao Nosso Senhor Jesus
Cristo e ainda por não ter a certeza da paternidade e por respeito aos meus
parentes. Agora que me vejo entrando em annos, para desembargo de minha
308
SCHWARCZ, Lilia Moritz; GOMES, Flávio dos Santos. (Orgs). Dicionário da Escravidão e
Liberdade. 50 textos críticos. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. p. 95.
309
PRIORE, Mary Del. Histórias da Gente Brasileira. Colônia. São Paulo, Leya, 2016. p. 125.
310
PAIVA, Eduardo França. Escravos e Libertos nas Minas Gerais do século XVIII: Estratégias de
Resistência Através dos Testamentos. São Paulo: Annablume; Belo Horizonte: PPGH-UFMG, 2009. p.
106. Ver também PRIORE, Mary Del. Histórias da Gente Brasileira. Colônia. São Paulo, Leya, 2016.
p. 110.
311
FARIA, Sheila de Castro. A Colônia em movimento. Fortuna e Família no Cotidiano Colonial. Rio
de Janeiro: Nova Fronteira, 1998. p. 58.
312
FARIA, Sheila de Castro. A Colônia em movimento. Fortuna e Família no Cotidiano Colonial. Rio
de Janeiro: Nova Fronteira, 1998. p. 107 e 108.
313
Idem. p. 135.
314
PAIVA, Eduardo França. Escravos e Libertos nas Minas Gerais do século XVIII:
Estratégias de Resistência Através dos Testamentos. São Paulo: Annablume; Belo Horizonte:
PPGH-UFMG, 2009. p. 108.
315
Apenas Domingos foi alforriado, enquanto sua mãe continuou cativa.
78
consciência, faço este papel de libertação de meu próprio filho, impedindo
que outra pessoa queira provar o contrário e queira ter direito a minha
fazenda316.
Notamos que Amaro Dantas Barbosa não reconheceu a paternidade logo, já que
segundo ele não tinha a certeza que era ou não seu filho, mas não podemos deixar de
lembrar que “para os mais ricos, esconder filhos naturais ou adulterinos poderia
significar manter a herança dentro da legalidade e da moral católica”317, pois assumir
um filho ilegítimo e filho de uma escrava representava alguns problemas para os
homens brancos e livres como dar abertura para ataques políticos para adversário, então
era mais fácil ignorar a paternidade e comprar o silêncio da mãe.318
Amaro Dantas Barbosa não deixou de registrar a cor da escrava que era parda e
segundo Marcus de Carvalho os pardos319 tinham um percentual maior de alcançarem a
alforria aos demais pela questão da cor e que os mesmos pardos juntos aos criolos se
fossem crianças tinham mais chances de obtê-la, sendo que, os pardos alcançavam a
liberdade mais cedo do que os criolos ou negros. Isso mostra que a cor da pele era mais
definitiva para alcançar a liberdade do que a questão jurídica.
É tempo de distinguir o que se abrangeu até agora por conveniência sob o
termo de “pessoas livres de cor”. Essa categoria não era certamente pensada
como homogênea, pelo menos na primeira metade do século XIX. Três
dimensões intervinham para classificar internamente essa população: a cor, a
nacionalidade e a condição legal. A cor era negra ou parda: as gradações
intermediárias, usadas eventualmente para descrever um indivíduo, não
pareciam ser usadas para classificá-lo numa subclasse. Quanto à
nacionalidade, era-se africano (com subdivisões não necessariamente usadas)
ou crioulo, isto é, nascido no Brasil. Quando à condição legal, enfim, era-se
forro — isto é, liberto — ou ingênuo — isto é, nascido livre. Se a isso
adicionarmos os escravos, veremos que a população de cor como um todo era
no mínimo subdividida em nove categorias ao longo dessas três dimensões.
Nove e não mais, porque algumas combinações eram impossíveis (por
exemplo, pardo africano).320
316
Cartório de Imóveis de Jorge de Azevedo Castro - Coruripe - Livros II.
FARIA, Sheila de Castro. A Colônia em movimento. Fortuna e Família no Cotidiano Colonial. Rio
de Janeiro: Nova Fronteira, 1998. p. 71.
318
PAIVA, Eduardo França. Escravos e Libertos nas Minas Gerais do século XVIII: Estratégias de
Resistência Através dos Testamentos. São Paulo: Annablume; Belo Horizonte: PPGH-UFMG, 2009. p.
110 e 111.
319
CARVALHO, Marcus J. M. de. Liberdade: rotinas e rupturas do escravismo no Recife, 18221850. Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2010.
320
CUNHA, Manuela Carneiro da. Negros, estrangeiros: os escravos libertos e sua volta à África. São
Paulo: Companhia das Letras, 2005. p. 38.
317
79
Segundo o historiador Gian Carlo, o espaço colonial passou a dar possibilidades
para o surgimento de estratégias sociais como é o caso da alforria e mudança de cor
criadas pelos os ditos pardos321 e toda a gente de cor 322 para alcançarem a liberdade e
inserção no contexto social da colônia. Tais estratégias tiveram maior volume no século
XVIII, com o aumento da população parda na busca por uma inserção social afasta-se
de um passado de escravidão, já que quanto mais escuro mais próximo do cativeiro eles
estavam. Então, mudar de cor seria uma estratégia para uma mudança de estamento em
que de acordo com a situação “transformava um pardo em branco, um branco em
pardo, um pardo em um negro”323. Por outro lado, a cor também servia para
desqualificar um indivíduo, pois chama-lo de negro, cafuzo, pardos, pretos e crioulos
era uma forma de afastá-los dos brancos324 e do mundo colonial o qual eles pretendiam
ascender.
A morte também trazia liberdade aos escravos, principalmente a morte do
senhor, segundo Gilberto Freyre “raro o senhor de engenho que morreu sem deixar
alforriados no testamento, negros e mulatas de sua fábrica.”325. Ter uma “boa
morte”326 representava encaminha bem a alma e está em paz com a consciência, ou seja,
as alforrias testamentárias (inventário post-mortem) representavam para aqueles que
partiram um degrau para a salvação da alma.
Aqui temos o caso registrado não apenas de um senhor, mas de um padre, no
Poxim em 1825, o padre Bonifácio Bezerra Mello327 que alforriou em seu testamento
dois escravos de nomes João e Rita, essa última era conhecida como Ritinha. O padre
321
Segundo Sheila Faria, o termo “pardo” representava uma condição social. FARIA, Sheila de Castro. A
Colônia em movimento. Fortuna e Família no Cotidiano Colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1998. p. 307
322
SILVA, Gian Carlo de Melo. Na cor da pele, o negro: Conceitos, Regras, Compadrio e Sociedade
escravista na Vila do Recife (1790-1810). Recife. Tese (doutorado), Programa de Pós-graduação em
História da UFPE, 2014. p. 16.
323
Idem. p. 25.
324
Idem. p. 26.
325
FREYRE, Gilberto. Casa Grande & Senzala. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1963. p,
525.
326
FARIA, Sheila de Castro. A Colônia em movimento. Fortuna e Família no Cotidiano Colonial. Rio
de Janeiro: Nova Fronteira, 1998. p. 265 e 266.
327
Cartório de Imóveis de Jorge de Azevedo Castro - Coruripe - Livros I.
80
Bonifácio deixou o valor de 9$920 para o enterro e 46$230 para custeio médico,
enquanto vida ele tivesse e outra parte para igreja.328
O sistema escravista no Brasil mostrava que a liberdade era algo difícil e frágil
de ser alcançado por isso que muitos senhores permitiam suas danças, músicas,
brincadeiras para tornar o cativeiro mais brando evitando fugas, revoltas e conflitos
internos. Quando a liberdade era adquirida muitos dos alforriados viviam sobre o olhar
do sistema caso ele nada fizesse para merecer essa liberdade voltava a ser cativo. Por
outro lado, mostrava para os escravos que eles estavam vivos socialmente e inseridos
ainda na sua cultura e sinalizava a qual grupo ele pertenciam.
Dessa forma o sonho de liberdade não deixava de existir, não é à toa que muitos
viviam juntado dinheiro para consegui-la e até as tinha, mas a qualquer vacilo como
alcoolismo, vagabundagem, mostrava que a liberdade para ele não lhe fazia bem e que
ele não sabia usufruir dessa liberdade. Viviam em coartação329. Algumas vezes o
próprio senhor tomava o seu dinheiro alegando ser dele tirando o direito à liberdade o
que antes não acontecia em que o negro era iludido a trabalhar mais em troca dessa
liberdade.
328
Idem.
CUNHA, Manuela Carneiro da. Negros, estrangeiros: os escravos libertos e sua volta à África. São
Paulo: Companhia das Letras, 2005. p. 59 e 94.
329
81
CAPÍTULO II - POXIM E A COMPANHIA GERAL DO COMÉRCIO DE
PERNAMBUCO E PARAÍBA
“A liberdade feria fundo, os interesses dos traficantes abastados
e que detinham nas mãos os privilégios do comércio de negros.”330
António Carreira
As navegações e o intercâmbio comercial triangular entre a América Portuguesa,
África Atlântica e Portugal em pleno século XVIII, mostram um fluxo comercial
intenso e ininterrupto e de grande importância para Pernambuco, e consequentemente
para região sul da Comarca de Alagoas, principalmente, nos aspectos econômicos,
políticos e sociais, já que ao sul da Comarca de Alagoas havia vários portos como um
dos principais elos entre a metrópole e a África Atlântica.
Nesse período, Sebastião Carvalho e Melo, Marquês de Pombal, determinou a
criação de companhias de comércio como a Companhia Geral de Comércio de
Pernambuco e Paraíba331, em que objetivava sanear a deficitária economia de Portugal
com o aumento das atividades econômicas no Brasil, através do monopólio da
Companhia, que passou a utilizar os portos das freguesias e vilas do açúcar,
dinamizando o comércio transatlântico de escravizados e de produtos usuais da terra
como açúcar, farinha e fumo.
As vilas e freguesias do açúcar além de terem a função religiosa elas serviam
como referências para a contagem da população332, para passar as informações físicas,
políticas e econômicas da região, para poder combater o contrabando e descaminhos,
sonegação de impostos e os maus procedimentos dos seus fregueses em relação à
330
CARREIRA, Antônio. As Companhias Pombalinas de Navegação. Comércio e Tráfico de
Escravos entre a Costa Africana e o Nordeste Brasileiro. Editora: Centro de Estudos da Guiné
Portuguesa, porto,1969. p. 244.
331
Lembramos aqui que a criação da Companhia Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba não foi
bem aceita pela aristocracia rural e os comerciantes locais. Ambos grupos alegava que a Companhia
Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba só se preocupava com seus próprios interesses, além de que
todo o prejuízo caía nos ombros dos compradores da capitania e não nos deputados e nem nos membros
da companhia e com isso eles passam a pedindo a extinção da companhia, tendo em vista o estado
miserável em que se encontra a capitania de Pernambuco. HU, PE, CX. 127, D. 9656 AHU_ACL_CU_015, cx.133, D.10009.
332
SANTOS, Gustavo Augusto Mendonça. Transgressão e cotidiano: a vida dos clérigos do
hábito de São Pedro nas freguesias do açúcar em Pernambuco na segunda metade do século XVIII.
Recife: Universidade Federal Rural de Pernambuco, 2013. Dissertação. p. 39.
82
política pombalina e quem fazia esse censo populacional e passavam as informações era
o clero secular.
Ao sul da Comarca de Alagoas tinha algumas vilas que faziam a articulação do
comércio transatlântico de escravizados e de produtos usuais da terra como a Capitania
da Bahia, como é o caso da vila de Penedo, que tanto articulava o comércio legal e
ilegal com a Bahia chegando até as minas; e essa leitura podemos ter com a carta de
Bento Bandeira de Melo, em 08 de dezembro de 1797, onde ele escreve que a vila de
Penedo “fica a borda do grande Rio de São Francisco, que é assaz rica, e de grande
comercio pela comunicação que tem pelo mesmo Rio com os habitantes dos Sertões, e
com as Minas.” 333 Não é à toa que em agosto de 1756, a Câmara de Penedo escreve
uma carta ao rei D. José I sobre o cumprimento da ordem que regula o comércio de
gêneros, particularmente, com a Bahia e Pernambuco334, “pois maior parte dos efeitos,
e dos gêneros desta Capitania são carregados, e vendidos na Cidade da Bahia de
Todos os Santos” 335.
O Poxim era o braço articulador de Penedo ao sul da Comarca que escoava
escravos e produtos para a vila de Penedo, tanto entrando quanto saindo, para Capitania
da Bahia e ao norte da Comarca articulava com a vila de Alagoas com a saída e entrada
de escravos e produtos que viam do Recife e Olinda. Mas toda essa articulação só foi
possível por conta dos portos que existiam no Poxim e em seus termos, principalmente
os Portos de Coruripe, Pituba, Jequiá e Betel. Esses três últimos tiveram uma
movimentação intensa no século XIX.
Os portos na região do Poxim e Coruripe336, na época Coruripe pertenciam ao
termo do Poxim, Jaraguá, Porto Calvo, Santo Antônio da Barra Grande aparecem
constantemente envolvidas no contrabando337, como é o caso de escravos da Costa da
333
AHU, Cx. 3, Documento 265.
ACL_CU_004, Cx. 2, D. 161.
335
AHU, Cx. 3, Documento 265.
336
AHU – PE Cx. 127, D. 9670 - AHU – PE Cx. 108, D. 8371.
337
Segundo Erika Dias, redução do tráfego portuário, o aumento do contrabando e a diminuição na
exportação dos principais produtos de Portugal para o mercado europeu - como o açúcar e o tabaco demonstravam a situação que o Marquês de Pombal procurou debelar com as medidas econômicas que
desenvolveu. DIAS, Érika Simone de Almeida Carlos. “As pessoas mais distintas em qualidade e
negócio”: a Companhia de Comércio e as relações políticas entre Pernambuco e a Coroa no último
quartel de Setecentos. Lisboa, Portugal. 2014. 587 p. Tese (Doutorado) em História, especialidade em
História dos Descobrimentos e da Expansão Portuguesa. Lisboa, Portugal. 2014. p. 72.
334
83
Mina que desembarcaram na Barra de Coruripe338 em um navio holandês, de produtos
usuais da terra, principalmente o açúcar, que era produzido nos engenhos da região que
ficavam próximos aos rios que se interligavam pela estrada líquida do rio Moxotó em
Pernambuco, e com isso o fácil acesso aos demais rios, riachos e lagoas da região, o que
dinamizava o escoamento da produção canavieira que singravam nas sumacas para os
portos baianos e no movimento contrário aos portos pernambucanos.
Dentre os produtos usuais da terra destacaremos a extração de madeiras para
construção de engenhos, embarcações e consertos de ambos. Daí a necessidade da
criação do cargo de Juiz Conservador das Matas339 que foi criando em 30 de setembro
de 1796, sobre a necessidade e vantagens de se estabelecer um ministro superintendente
para acautelar e conservar as matas da Comarca da vila de Alagoas, pois a extração
dessa madeira seria destinada para a construção naval na Bahia, Pernambuco e Arsenal
de Lisboa, fazendo a inspeção e demarcação delas para o serviço real e para a
agricultura e subsistência dos povos da comarca. Com a criação do cargo de Juiz
Conservador das Matas Alagoas evitava assim o contrabando de pau-brasil que era
escoado da região do Poxim, através dos rios, para o Porto do Francês340, o qual servia
de trampolim para invasores, já que Alagoas só ficará livre das invasões francesa em
dezembro de 1808341.
Por fim, finalizaremos esse capítulo com o conflito interno, que acontece entre
Francisco António de Sousa, negociante e natural de Pernambuco e residente na barra
de Jequiá da Praia, termo da Vila Real de São José do Poxim e o ex-Ouvidor-geral da
Comarca de Alagoas Manuel Joaquim Pereira de Matos Castelo Branco, que mesmo
fora do cargo pede o pagamento de uma dívida aos comerciantes que se recusa a pagar.
2.1 POXIM E A ROTA DA COMPANHIA
No final do século XVII, após a expulsão dos holandeses, a produção açucareira
no Brasil enfrentou uma séria crise devido à prosperidade dos engenhos de açúcar nas
338
AHU_ACL_CU_004, Cx. 3, D. 199.
AHU-Pernambuco - AHU_ACL_CU_004, cx.3, D.250.
340
IHGAL. Documento – 00260 – 05 – 01 – 07.
341
IHGAL. Documento – 0087 – 03 – 01 – 09.
339
84
colônias holandesas, com o açúcar antilhiano342, somados ao açúcar das colônias
francesas e inglesas na América Central. Só no final dos idos de 1700 é que os engenhos
da região sul de Pernambuco retomaram a produção açucareira343 e passaram a retomar
suas atividades econômicas no século seguinte de forma mais lenta344. Também não
podemos deixar de mencionar que a crise que afetou o setor açucareiro no Brasil afetava
diretamente a metrópole, que já estava vivendo uma crise econômica e fiscal que
estagnou a economia lusitana345 e, junto a isso, o surgimento das áreas mineradoras, que
quebrou a continuidade do crescimento do Norte açucareiro346 com a mudança do eixo
econômico para a área de mineração, já que
a riqueza a partir de então produzida atraiu não só uma grande massa de
imigrantes reinóis quanto de africanos trazidos cativos. A autêntica
exploração das rotas de comércio e principalmente as crescentes torrentes de
ouro que chegavam não só ao Reino como também ao restante do império
tornavam o Brasil simplesmente essencial para a própria sobrevivência de
Portugal.347
Na verdade esse crescimento populacional do século XVIII, foi na verdade uma
continuidade do século anterior e o fluxo aumentou com a descoberta das minas. Não
podemos deixar de destacar que na metade do século XVIII, esse crescimento
populacional era expressivo por conta das imigrações das pessoas do reino e, também,
devido a exportação da mão de obra escrava africana. Nesse período houve uma
estimativa de pessoas vindo de Portugal de 500% e 220% no número de africanos.348
342
LUNA, Francisco Vidal; KLEIN, Herbert S. Escravismo no Brasil. São Paulo: EDUSP/Imprensa
Oficial do Estado de São Paulo, 2010. p. 46.
343
No ano de 1760, o Brasil era o terceiro maior exportador de açúcar do mundo tem 17% da produção
mundial perdendo apenas para as Antilhas Britânicas e Francesas. Idem. p. 46.
344
Mas, João Lemos diz que a cultura da cana teve um aumento significativo na região sul de Alagoas no
século XIX, incluindo o vale do rio São Francisco e o vale do rio Coruripe e suas adjacências (Poxim era
uma delas).
345
A situação financeira de Portugal não era das melhores entre os anos de 1762 a 1779. Ver. NOVAIS,
Fernando A. Portugal e Brasil na Crise do Antigo Sistema Colonial (1777-1808). São Paulo:
HUCITEC, 1978.
346
No ano de 1621, os Estados da América portuguesa foram divididos em dois Grão-Pará e Brasil, e
nesse período não havia essa denominação para região do nordeste, mas era conhecida como região norte.
Ver ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. A invenção do Nordeste e outras artes. 4ª ed.
Recife: FJN; Ed. Massangana; São Paulo: Cortez, 2009.
347
FALCON, Francisco; CLAUDIA, Rodrigues (orgs.). A “Época Pombalina” no mundo lusobrasileiro. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2015. p. 34.
348
PRIORE, Mary Del. Histórias da Gente Brasileira. Colônia. São Paulo, Leya, 2016. p. 125.
85
Na região sul do São Francisco, os “rios do açúcar”349 que eram pequenos em
volume de água, aumentavam a navegação entre o litoral e o sertão 350, facilitando e
dinamizando a economia açucareira e o comércio com as freguesias e vilas351 do açúcar
próximas de Penedo. E entre essas freguesias temos a freguesia de São José e Madre de
Deus do Poxim, a qual é desmembrada da Vila de Penedo em 1718352, tornando-se Vila
Real de São José do Poxim pela Ordem Régia assinada pelo bispo 353 Dom Manuel
Álvares da Costa (1710-1715).
Na região da vila do Poxim, segundo Manuel Correia Andrade, vivia em 1774
uma população de 2.572 almas354 que estava sobre o labor dos engenhos Jenipapo e
Porção. O que diverge do relatório do governador da Capitania de Pernambuco, José
César de Menezes (1774 a 1787)355 em relação aos números de pessoas356 que lá viviam,
isso apresentado no mesmo ano de 1774. Esse relatório dizia que
esta Freguesia foi erecta no anno de mil sete centos e desoito, desmembrada
da Villa do Penedo: fica ao Norte da dita Villa desoito legoas: tem de costa
cinco, e de fundo as mesmas: confina pelo Norte com a de Sao Miguel e pelo
Sul com a do Penedo: está cituada em huma amena planicie distante do Mar
tres quartos de legoa, abundante de agua e de peixe, tanto por fiar Visinha do
Mar, como por estar nas margens do Rio Poxim: tem na sua visinhança huma
dilatada lagoa que recolhe em si muita abundancia delle. Tom Cura
amovivel, e pelo rol da desobriga do anno de mil sete centos setenta e quatro
349
SANTANA, Moacir Medeiros de. Contribuição à história do Açúcar em Alagoas. Recife: Museu do
Açúcar. 1970. p. 52.
350
Como o sertão não é o objeto estudado sugerimos a leitura do livro Nas solidões vastas e
assustadoras: a conquista do sertão de Pernambuco pelas vilas açucareiras nos séculos XVII e
XVIII de Kalina Vanderlei Silva. SILVA, Kalina Vanderlei. livro Nas solidões vastas e assustadoras: a
conquista do sertão de Pernambuco pelas vilas açucareiras nos séculos XVII e XVIII. Recife: Cepe,
2010.
351
Não queremos aqui copiar ou criar termos, apenas estamos usando tais termos para facilitar o
entendimento de que as freguesias e, mais tarde, a vila do Poxim tinha sua importância dentro do
processor político e econômico no século XVIII, através do dinamismo colonial que o açúcar deu para
essa região.
352
ANAIS DA BIBLIOTECA NACIONAL, Rio de Janeiro, v.40: 1918 (1923).
353
Em 1718 a 1749, o Padre da Vila de São José do Poxim era Manoel Diniz Barbosa. O vigário,
também, trabalhava nas matrizes Nossa Senhora do Rosário do Poxim, Poxim, e Nossa Senhora da
Conceição, Coruripe. LEMOS, João Ribeiro. Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições.
Maceió. Ed. Do autor, 1999. p. 108.
354
ANDRADE. Manuel Correia de. Os rios-do-açúcar no nordeste Oriental IV: os rios Coruripe,
Jequiá e São Miguel. Recife: Instituição Joaquim Nabuco de pesquisas sociais, 1959. p. 50.
355
ANAIS DA BIBLIOTECA NACIONAL, Rio de Janeiro, v.40: 1918 (1923). p. 60.
356
Na verdade esse crescimento populacional do século XVIII foi uma continuidade do século anterior e
o fluxo aumentou com a descoberta das minas de ouro. Não podemos deixar de destacar que na metade do
século XVIII, esse crescimento populacional era expressivo por conta das imigrações das pessoas do
reino e, também, devido à exportação da mão de obra escrava africana, ou seja, o ouro reforça a “vocação
Atlântica” daqueles que se aventurava em busca de riquezas. Ver MATHIAS, Carlos Leonardo Kelmer.
As múltiplas faces da escravidão. O espaço econômico do ouro e sua elite pluriocupacional na
formação da sociedade mineira setecentista, c. 1711 – c. 1756. Rio de Janeiro: Mauad, 2012. p. 106.
86
uma lgreja: duas Capelas: dois Engenhos: quatorze fasendas: quatro centos
setenta e dois fogos: e mil seis centas oitenta e duas pessoas.357
Podemos observar que no relatório José César de Menezes358 menciona os
engenhos Jenipapo e Porção e faz um censo do povoamento que há nessa área; junto a
isso há uma descrição geográfica do local, que nasceu como uma periferia359 ou uma
nova área de integração360 de Penedo para servir aos interesses coloniais361 através da
produção de produtos coloniais (açúcar, tabaco, farinha de mandioca, e etc.) e o
comércio de escravos. Essa descrição geográfica era de extrema importância para o
desenvolvimento comercial e marítimo da colônia, pois sua produção estava voltada
para o mercado externo, como toda a colônia de exploração362, e nas mãos dos homens
de negócio e da nobreza da terra. E sem deixar de lembrar que “os preços sobem pouco
na colônia, a elevação é acentuada na metrópole, isto é, geram-se lucros excedentes –
lucros monopolistas – que se acumulam entre os empresários metropolitanos”363. Mas,
tudo mudaria em 30 de julho de 1759, com a criação da Companhia Geral de Comércio
de Pernambuco e Paraíba364 (CGCPPB), que passou a funcionar através do Alvará de 13
de Agosto do mesmo ano.
A Companhia Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba foi criada pelo
Marquês de Pombal365 em 1759366, como “parte intrínseca do sistema colonial367,
357
ANAIS DA BIBLIOTECA NACIONAL, Rio de Janeiro, v.40: 1918 (1923). p. 60.
Érika Dias, em “As pessoas mais distintas em qualidade e negócio”: a Companhia de Comércio e
as relações políticas entre Pernambuco e a Coroa no último quartel de Setecentos, afirma que no ano
de 1774 foi escolhido como início da presente análise, por ser a data em que José César de Meneses nomeado governador da capitania durante o reinado josefino -, foi enviado para Pernambuco, tomando
posse a 31 de agosto de 1774. Filho de um vice-rei do Estado do Brasil, Vasco César de Meneses, era um
homem instruído, como demonstram as suas cartas às Secretarias de Estado. Foi nomeado para a capitania
num período crítico: segmentos das elites locais ligados ao açúcar afrontavam a companhia pombalina,
chegando ao ponto de intentarem um motim. (DIAS, Apud, 2014, p.39).
359
NOVAIS, Fernando A. Portugal e Brasil na Crise do Antigo Sistema Colonial (1777-1808). São
Paulo: HUCITEC, 1978. p. 72 e 73.
360
RIBEIRO JÚNIOR, José. Colonização e Monopólio no Nordeste do Brasileiro. A Companhia
Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba. São Paulo: HUCITEC, 1976. p. 2.
361
É de extrema importância que separamos aqui, que os interesses dos colonos eram bem diferentes da
Coroa Portuguesa. Ver. NOVAIS, Fernando A. Portugal e Brasil na Crise do Antigo Sistema Colonial
(1777-1808). São Paulo: HUCITEC, 1978. p. 149.
362
Idem. 1978. p. 71.
363
Idem. 1978. p. 80.
364
Alvará de 30 de julho de 1759, assinado pelo Conde de Oeiras, Sebastião de Melo Carvalho, o futuro
marquês de Pombal. No dia 13 de agosto de 1759, teve um alvará de confirmação.
365
No dia 6 de maio de 1756, Pombal assumia a Secretária de Estado dos Negócios do Reino.
366
NOVAIS, Fernando A. Portugal e Brasil na Crise do Antigo Sistema Colonial (1777-1808). São
Paulo: HUCITEC, 1978. p.189 e 190 e CARREIRA, Antônio. As Companhias Pombalinas de
358
87
quando ele era primeiro-ministro de Portugal (1750 a 1777) no governo de D. José I
(1714 a 1777). Esse período também ficou conhecido supostamente como “Época
Pombalina situada no Setecentos português, entre 1750 e 1777”368, quando o papel da
Companhia Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba era formular um plano
colonial369 administrado pela Coroa portuguesa, cujas atividades da empresa
caminhavam junto com a diplomacia e a legislação e, de uma certa forma, sua criação
torna-se uma continuidade do mercantilismo, já que garantia o monopólio do comércio
colonial nas áreas açucareiras, levando o lucro para uma pequena parte de comerciantes
e seus acionistas.
MAPA 5 – SEDE DA COMPANHIA GERAL DO COMÉRCIO DE PERNAMBUCO E
PARAÍBA370
Navegação. Comércio e Tráfico de Escravos entre a Costa Africana e o Nordeste Brasileiro. Editora:
Centro de Estudos da Guiné Portuguesa, porto, 1969.
367
RIBEIRO JÚNIOR, José. Colonização e Monopólio no Nordeste do Brasileiro. A Companhia
Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba. São Paulo: HUCITEC, 1976. p. 12.
368
FALCON, Francisco; CLAUDIA, Rodrigues (orgs.). A “Época Pombalina” no mundo lusobrasileiro. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2015. p. 12.
369
A Companhia Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba foi um instrumento das políticas Régias
formuladas por Sebastião José de Carvalho e Melo para limitar a liberdade dos comerciantes abastados de
Pernambuco e Bahia.
370
OLIVEIRA, Luana Maria Ventura. A Alfândega de Pernambuco: História, Conflitos e Tributação
no Porto do Recife (1711-1738). Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal Rural de
Pernambuco. Pernambuco, 2016.
88
FONTE: Mapa do Cais do Porto do Recife: APEJE: Iconografia, Arquivo Permanente. Sem
datação, porém pelas descrições do documento, são do segundo metade do século XVIII. Sem
nome. APEJE, arquivo Permanente, Iconografia, Fac-similis. (OLIVEIRA, Apud, 2016,
p.105).
A Companhia Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba tinha o monopólio
do comércio interno e do açúcar das duas capitanias e também o comércio de escravos
da Costa da África371 no prazo de 20 anos. Esse domínio foi tão grande que em 1762, a
companhia exportou das Capitanias do Norte, em média, 9.200372 caixas de açúcar.
Levando em consideração que só a capitania de Pernambuco e suas adjacências haviam
produzido e exportado mais açúcar que a Bahia nesse ano.
MAPA 6 - ROTAS DE CIRCULAÇÃO MERCANTIL DA COMPANHIA GERAL DE
PERNAMBUCO E PARAÍBA 1759 - 1780373
371
CARREIRA, Antônio. As Companhias Pombalinas de Navegação. Comércio e Tráfico de
Escravos entre a Costa Africana e o Nordeste Brasileiro. Editora: Centro de Estudos da Guiné
Portuguesa, Porto,1969. p. 89.
372
SCHWARTZ, Stuart B. Segredos Internos. Engenhos e escravos na sociedade colonial. São Paulo:
Companhia das Letras, 1999. p. 247. p. 347.
373
RIBEIRO JÚNIOR, José. Colonização e Monopólio no Nordeste do Brasileiro. A Companhia
Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba. São Paulo: HUCITEC, 1976. p. 112.
89
FONTE: RIBEIRO JÚNIOR, 1976. p. 112.
Segundo Carreira, a Companhia consegue entre os anos de 1761 374 e 1785, o
controle de parte de Angola e da Costa da Mina375 e realizava transporte de 49.344 de
escravos376 para Pernambuco e para o Rio de Janeiro, sendo “48.836 adultos e
adolescentes377, e 508 crias de pé e de peito”378. Esse controle da Companhia causou
um mal-estar na Câmara do Recife, no ano de 1778, contra o insuportável jugo379 da
Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba. Podemos observar essa questão com
Carreira quando,
tratando porém do merecimento destas queixas, consistem elas:
primeiramente em diferentes representações de algumas Câmaras Capitanias
de Pernambuco, e Paraíba, em que a Companhia, e seus Administradores tem
vexado, e oprimido os habitantes daquelas colônias, com diferentes abusos e
gravames: E quando a estas queixas, como S. Majestade tem mandado ouvir
a Companhia de Pernambuco sobre outras semelhantes, que tem chegado à
374
Refere-se ao ano em que se iniciou as suas atividades depois da aprovação do estatuto de sua criação, o
que corresponde aos primeiros carregamentos de escravos da África para Pernambuco, correspondendo a
2.270 peças, entre esse número temos 28 crias. Havia uma distinção das faixas etárias como crias de pé,
refere-se as crianças que já sabiam anda e cria de peito, refere-se aos bebês. Ver. CARREIRA, Antônio.
As Companhias Pombalinas de Navegação. Comércio e Tráfico de Escravos entre a Costa Africana
e o Nordeste Brasileiro. Editora: Centro de Estudos da Guiné Portuguesa, porto,1969. p. 252.
375
Podemos ter uma noção da origem dos escravos que viam da África para o Poxim no livro Coruripe –
Sua história sua gente suas instituições, na página 90, do professor Lemos, em que ele fala de um
escravo chamado Adão de Angola de vinte e cinco anos e uma negra chamada Maria Criola da Costa de
Marfim na faixa etária de 30 anos que foram comprados no valor de um conto e quinhentos mil réis.
376
O advento dos braços africanos só foi possível graças às receitas advindo do açúcar que era exportado
para o velho continente não é à toa que 1600, os braços indígenas, na América, foram substituídos pelos
africanos em grande parte da faixa litorânea, em destaque aqui o nordeste açucareiro. Ver LUNA,
Francisco Vidal; KLEIN, Herbert S. Escravismo no Brasil. São Paulo: EDUSP/Imprensa Oficial do
Estado de São Paulo, 2010. p. 32.
377
Deixando claro que durante a primeira metade do século XVIII, houve um aumento significativo da
população escrava, em que esse aumento se deu devido à porcentagem dos escravos que estavam
nascendo no Brasil, ou seja, estava havendo um aumento de crianças cativas, principalmente em Minas
Gerais. Esse fato fica mais forte lá pelos idos de 1850, em que se concretizava cada vez mais o comércio
de cativos nascido no Brasil. O que temos aqui é um aumento da natalidade da escravaria contradizendo
a ideia que a exploração através do modelo do plantation estaria ligado a baixa expectativa de vida. Sem
deixar de destacar que o comércio interno entre o Norte açucareiro e Minas Gerais movimentava um
número significativo de escravos e não podemos deixar de destacar que os cativos nascidos gerou uma
nova dinâmica para as condições de oferta internamente na colônia, pois criava uma fonte de escravo
independente do comércio do Atlântico. Ver LUNA, Francisco Vidal; KLEIN, Herbert S. Escravismo no
Brasil. São Paulo: EDUSP/Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2010. p. 141.
378
CARREIRA, Antônio. As Companhias Pombalinas de Navegação. Comércio e Tráfico de
Escravos entre a Costa Africana e o Nordeste Brasileiro. Editora: Centro de Estudos da Guiné
Portuguesa, porto,1969. p. 89.
379
Em 12 maio de 1779, a vila do Recife, escreve à rainha, D. Maria I, pedindo a extinção da Companhia
Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba, tendo em vista o estado miserável em que se encontra a
capitania de Pernambuco. AHU_ACL_CU_015, cx.133, D.10009.
90
sua Real presença, parece que se deve esperar a resposta da dita Companhia,
para à vista dela, se tratar desta matéria. 380
Durante sua existência, a Companhia conseguiu aumentar a quantidade de mão
de obra, a malha do sistema381, canalizar vultosa quantia de capitais para as regiões em
que ela atuava e conseguiu um aumento da exportação do açúcar e do tabaco alagoano,
o que desagradou os colonos e sofreu duras críticas de muitos deles e até de pessoas da
coroa e uma dessas pessoas era o já então mencionado José César de Menezes382, o qual
dizia que a Companhia estava falindo os colonos383 com seus preços384 altos e
abusivos385, ou seja, aquele monopólio estava atrapalhando os negócios e isso abria as
portas para o contrabando. Essa mesma queixa foi um dos motivos de não aceitação de
Salvador para a implantação de uma companhia de comércio, que fez com que “O grupo
de pressão”386 dos fazendeiros baianos conseguisse frustrar os plano de Pombal em seus
domínios.
Segundo Jéssica Rocha, no ano de 1761, o governador Luís Diogo Lobo da Silva
(1756 a 1765) tentou inúmeras vezes convencer a elite colonial pernambucana a se
tornar acionista da Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba, mas todas em vão. O
governador afirma que não há motivos por mais fortes nem evidências de maior
380
CARREIRA, Antônio. As Companhias Pombalinas de Navegação. Comércio e Tráfico de
Escravos entre a Costa Africana e o Nordeste Brasileiro. Editora: Centro de Estudos da Guiné
Portuguesa, porto,1969. p. 432.
381
NOVAIS, Fernando A. Portugal e Brasil na Crise do Antigo Sistema Colonial (1777-1808). São
Paulo: HUCITEC, 1978. p. 103.
382
O governador defendeu o interesse das elites - especialmente as relacionadas com a produção de
açúcar e tabaco -, criticando as práticas comerciais da Companhia. Contudo, César de Meneses defendia
também a restante população livre, que nas suas missivas define como os moradores. Isto é, para além das
elites, que estavam no topo da pirâmide social, havia uma massa de população livre, composta por
funcionários subalternos, soldados, pequenos comerciantes, taberneiros, vendeiros e artesãos. Também
estes - que estavam no meio da estrutura social em Pernambuco -, precisavam da Companhia para
comprarem géneros «secos» e «molhados», vindos do Reino, nas embarcações da empresa comercial.
Não apenas as elites ficaram a dever grandes somas à companhia pombalina, também esta faixa da
população livre consta nas listas de devedores da empresa comercial no final de Setecentos. (DIAS,
Apud, 2014, p.25).
383
Idem. p. 189, 190 e 191.
384
Em 23 abril de 1777, Olinda escreve ao rei, D. José I, que a Companhia Geral de Pernambuco e
Paraíba não estar promovendo a agricultura adequadamente, culminando com o declínio do comércio do
açúcar. AHU_ACL_CU_015, cx.126, D.9577.
385
Segundo Érika Dias, os senhores de engenho, lavradores de açúcar e de tabaco, mercadores, militares,
grupo esse que conseguiu da Coroa o fim do monopólio comercial para esse fim, aqueles segmentos das
elites alegavam que a empresa comercial tolhia os privilégios e os lucros dos vassalos, pernambucanos,
com o tráfico de escravos e com o comércio de açúcar e tabaco, e principalmente, reduzia as rendas da
Fazenda Real. (DIAS, Apud, 2014, p. 18)
386
RUSSELL-WOOD, A.J.R. Centro e periferia no mundo luso-brasileiro, 1500-1808. Revista
Brasileira de História. Vol. 18, n. 36, 1988, p. 10.
91
demonstração que possam convencê-los a apostarem da sua vida os poucos cabedais
que logram387. Deixando clara a resistência em não aderir ao projeto metropolitano e
primando pela liberdade de comércio da região.
Os limites da Companhia Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba foram
garantidos pelos artigos 25 e 26 do regimento da Companhia388, em que garantia a
mesma o exclusivismo do comércio e da navegação em todo o território da Capitania de
Pernambuco, Paraíba e os portos do sertão de Alagoas e todo o sul do São Francisco e
seus distritos, como poderemos observar no mapa 7. Esses artigos também garantiam o
exclusivismo da navegação de navios saindo de Pernambuco e Paraíba para os portos da
costa da África, como poderemos observar no mapa 6.
MAPA 7 - POSIÇÃO DA ÁREA EM QUE A COMPANHIA ATUAVA NO BRASIL
1759389
387
SOUSA, Jéssica Rocha de. Nas Rotas dos Sertões: Comércio Interno e Contrabando entre as
Capitanias de Pernambuco e Bahia (1759-1780) . Recife, 2018, 177 p. Dissertação (Mestrado) –
UFRPE. p. 22.
388
CARREIRA, Antônio. As Companhias Pombalinas de Navegação. Comércio e Tráfico de
Escravos entre a Costa Africana e o Nordeste Brasileiro. Editora: Centro de Estudos da Guiné
Portuguesa, porto,1969. p. 358.
389
RIBEIRO JÚNIOR, José. Colonização e Monopólio no Nordeste do Brasileiro. A Companhia
Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba. São Paulo: HUCITEC, 1976. p. 66.
92
FONTE: RIBEIRO JÚNIOR, 1976. p. 66.
A Bahia importou 157.781 escravos e Pernambuco390 54.944 escravos, como
mostra o mapa abaixo, isso no período do monopólio da Companhia, junta as duas
capitanias exportavam 212.725 escravos no total, ou seja, no raio de 20 anos
desembarcaram uma considerável quantidade de mão de obra nos portos da Bahia e
Pernambuco391. Nesse mesmo período a Bahia conseguiu articular um comércio
clandestino duplo, que servia tanto para o contrabando do fumo, que saía de solo baiano
e alagoano (São Miguel e Poxim), quanto para o ouro das minas392.
GRÁFICO 1 – ESTIMATIVAS DE DESMBARQUE DE ESCRAVOS (1759 - 1780)
FONTE: http://www.slavevoyages.org/voyage/search.
A coroa criou vários obstáculos e medidas restritivas para que a Bahia não
tivesse acesso ao comércio da Costa da Mina, e isso abriu as portas para ilegalidade, ou
seja, foi a partir disso que os comerciantes baianos viram uma forma de burlar a lei e
para isso eles contavam com a ganância dos próprios deputados e controladores de
preço dos gêneros da Companhia Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba, que
eram os instrumentos da ilegalidade, cujas pessoas certas que faziam os produtos
entravam e saíram sem problema algum.
390
Verificamos que a evolução demográfica dos principais centros urbanos no período Pombalino foi um
crescimento populacional com expressões regionais muito diversificadas. O Recife registou o aumento
demográfico mais significativo desse período.
391
Entre os anos de 1718 a 1774, correspondentes à elevação do Poxim em Vila e o auge da
produção açucareira, na região sul de Alagoas, desembarcaram nos portos da Capitania de
Pernambuco, 12.384 escravos. Ver http://www.slavevoyages.org/voyage/search.
392
FRAGOSO, João e GOUVÊA, Maria de Fátima. (Orgs.) Na trama das redes: política e negócio no
império português, séculos XVI-XVIII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010. p. 221.
93
É claro que esses deputados e membros da Companhia criavam estratagemas
para a obtenção de mais lucros: um deles era o contrabando. Não à toa que, em 17 de
setembro de 1777, a Câmara de Olinda393 queixa-se à rainha, D. Maria I, que a
Companhia Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba só se preocupava com seus
próprios interesses, além de que todo o prejuízo caía nos ombros dos compradores da
capitania e não nos deputados e nem nos membros da companhia. Em resumo, quem
tinha o papel de coibir relaxava e inclinava-se aos seus próprios interesses.
Na região de Coruripe394, na época era termo do Poxim, Jaraguá, Porto Calvo,
Santo
Antônio
da
Barra
Grande
aparecem
constantemente
envolvidas
no
contrabando395, de produtos usuais da terra, principalmente o açúcar, que eram
produzidos pelos engenhos Jenipapo ou Porção que ficavam próximo aos rios Coruripe
e Poxim, ambos, os rios, interligavam-se pela estrada líquida do rio Moxotó em
Pernambuco, e com isso o fácil acesso aos demais rios, riachos e lagoas da região,
dinamizavam o escoamento da produção canavieira que singravam nas sumacas para os
portos baianos e no movimento contrário aos portos pernambucano.
MAPA 8 – ESTRADA LÍGUIDA DO RIO MOXOTÓ
393
AHU, PE, CX. 127, D. 9656.
AHU – PE Cx. 127, D. 9670 - AHU – PE Cx. 108, D. 8371.
395
SOUSA, Jéssica Rocha de. Nas Rotas dos Sertões: Comércio Interno e Contrabando entre as
Capitanias de Pernambuco e Bahia (1759-1780) . Recife, 2018, 177 p. Dissertação (Mestrado) –
UFRPE. p. 65.
394
94
FONTE: https://www.google.com.br – Acesso: 04/11/2018
O rio Moxotó banha hoje os estados de Alagoas e Pernambuco e no período
colonial era parte da Capitania de Pernambuco. Ele nasce no município de Sertânia
próximo à divisa entre os estados de Pernambuco e Paraíba e sua foz é no Rio São
Francisco, ou seja, ao sul ele segue o caminho de Alagoas (através dos rios Coruripe e
Poxim), Sergipe e Bahia, de comércio abundante, e ao norte ele segue para Pernambuco
(pelo caminho do Ipojuca396) e, é claro, Paraíba.
De acordo com Jéssica Rocha Souza, havia uma segunda rota que era usada no
comércio ilegal para embarque e desembarque, de mercadorias e escravos, para fugir do
fisco régio, que seria via costa marítima entre Bahia e Pernambuco. Nessa rota havia
diversas praias como era o caso da praia do Pontal de Coruripe, que na época pertencia
ao Poxim, então
esse tipo de roteiro, que já aparece bem descrito em um manual de pilotagem
e navegação do século XVII, ficava restrito as embarcações maiores, dada as
condições de navegabilidade da região. Segundo o manual a distância entre
Bahia e Pernambuco era de cerca de 100 léguas, “corre a costa até o Rio de
São Francisco de Nordeste, sudoeste, e há na derrota 50 léguas e do Rio de
São Francisco ao Cabo de Santo Agostinho há 50 léguas e corre a costa
nordeste, sudoeste”. Advertia ainda aos pilotos que tomassem cuidado, pois,
ao norte do Rio de São Francisco, por volta de 5 léguas existia um arrecife
perigoso, conhecido como “Baixio de Dom Rodrigo”.397
MAPA 9 – RIOS CORURIPE E POXIM E PONTAL DE CORURIPE
396
Idem. p. 49.
Refere-se a Dom Rodrigo de Acuanã, comandante da nau de São Gabriel, que largou de Corunha,
Espanha, em junho de 1525 em direção às Molucas. Sua frota foi desbaratada e Dom Rodrigo, com
apenas trinta homens, resolveu retornar à Espanha carregado de Pau-Brasil. Idem. p. 71.
397
95
FONTE: https://www.google.com.br – Acesso: 04/11/2018
Como já vimos antes, em Alagoas a Companhia atuava na região sul do São
Francisco com ajuda das construções de portos, tanto no sertão quanto no litoral e na
região mais ao norte, indo em direção à Vila de Santa Magdalena, o que era bem
compreensível, já que essa região do vale do São Francisco era produtora de mandioca,
tabaco398 e de criação de gado399. Consequentemente, necessitava de mão de obra
escrava. Um desses portos ficava na freguesia do Poxim, que segundo Ribeiro Júnior,
D. Tomás da Encarnação Costa e Lima (1774-1784)400, bispo de Pernambuco401, envia à
Secretaria dos Negócios do Reino, em 19 de fevereiro de 1777, a lista de povoados402,
vilas e freguesias com suas capelas, paróquias, padres e fogos. Vejamos essa lista, com
as vilas e freguesias de Alagoas, relatada pelo bispo e em seguida mostraremos no
quadro o crescimento populacional do Poxim nos idos de 1774 e 1777.
QUADRO 5 - VILAS E FREGUESIAS DE ALAGOAS EM 1777
N. SR.a DA
APRESENTAÇÃO
DA VILA DE
LÉGUAS
CAPELAS
FOGOS
HABITANTES
RELIGIOSOS
13
44
726
2679
6
398
LOPES, Gustavo Acioli. Negócio da Costa da Mina e comércio atlântico: Tabaco, açúcar, ouro e
tráfico de escravos: Pernambuco: (1654-1760). São Paulo: USP, 2008. Tese de Doutorado.
399
O gado era o Vacum (bois, bezerros, vacas, vitelas, touros e novilhos) exige para sua criação grandes
áreas, pastos amplíssimos. Disponível em:
http://dicionarios.bbm.usp.br/pt-br/dicionario/1/vacum.
Acessado em 17/05/2018, às 9: 43 min. Segundo Diegues Júnior, o gado chegou a Alagoas vindo de
Olinda e Salvador, via rio São Francisco (o “rio dos currais”), até chegar a Penedo e daí foi expandindo
para as demais regiões. DIEGUES JÚNIOR, Manuel. População e açúcar no nordeste do Brasil.
Maceió: Edufal, 2012. p. 127.
400
“Relação de Todas as Igrejas Parochiaes que Pertencem ao Bispado de Pernambuco dividido em
Capitanias: as Distâncias das Freguesias, suas Capellas alem das Matrizes, o Número de Sacerdotes, que
nellas existem, além dos parochos, seos fogos e as pessoas de dezobriga, por mandato de El Rey Nosso
senhor. D. Thomaz, Bispo de Olinda, 19 de Fevereiro de 1777. AHU_ACL_CU_015, Cx.126, D. 9545.
p. 4 a 6.
401
O Bispado de Pernambuco ia até ao Ceará e os governadores deste prestavam contas aos de
Pernambuco.
402
É bom lembrar que nesse período não havia nenhum órgão da Coroa Portuguesa que fazia um censo.
Então, isso ficaria a cargo da Igreja, já que os bispos exigiam os registros do livro de tombo e dos livros
de batismo e casamentos. Os livros de batistérios eram considerados, na época, como documento válido,
em que se encontravam informações sobre assentamento dos escravos com seus donos e a paróquia em
que ele se encontrava.
96
PORTO CALVO
SENHOR BOM
JESUS DE
CAMARAGIBE
10
4
1012
3200
3
SANTA LUZIA
DO NORTE
14
10
948
3400
1
N. SR.a DA
CONCEIÇÃO DA
VILA DAS
ALAGOAS
10
40
1365
4594
7
SÃO MIGUEL
DAS ALAGOAS
10
6
978
3210
3
N. SRa DO
ROSÁRIO DA
VILA DO
PENEDO
12
9
1388
5034
2
N. SRa DO Ó DO
12
6
424
1923
0
80
1
702
2760
1
12
0
338
986
0
9
0
385
1384
0404
PORTO DA
FOLHA403
N. SR.a DA
CONCEIÇÃO DO
CABRABÓ
N. SR.a DO Ó DE
MEIRIM
N. SR.a DA
MADRE DE
DEUS DO POXIM
FONTE: CARTA do Bispo de Pernambuco, D. Tomás [da Encarnação Costa e Lima], ao rei [D. José I],
remetendo uma relação de todas as freguesias, capelas, ermidas e oratórios que tem o dito Bispado, e o
número de clérigos seculares que existem em cada uma das freguesias. (1777). AHU_ACL_CU_015,
Cx.126, D. 9545.
403
Hoje, Porto da folha é o município de Traipu. No século XIX Porto da folha produzia, além do açúcar,
arroz e algodão. SANTANA, Moacir Medeiros de. Contribuição à história do Açúcar em Alagoas.
Recife: Museu do Açúcar. 1970. p. 111.
404
No relatório fala que não há nenhum vigário na vila do Poxim. Por outro lado, no mesmo relatório ele
fala de um padre chamado Antonio do Rozário de Oliveira.
97
É possível notarmos, no quadro 5 que D. Tomás da Encarnação Costa e Lima diz
que não há capela e nem padres405 em outras localidades, incluindo o Poxim, por isso no
dia 12 de fevereiro406 de 1777, ele manda uma carta a D. José I para que o cargo de
vigário seja preenchido. Por outro lado, desde 1718 existiam duas capelas no Poxim,
como descreve governador da capitania de Pernambuco José César de Menezes, no ano
de 1774407, em seu relatório enviado ao rei D. José I, e com o vigário Manoel Diniz
Barbosa respondendo pela Vila Real de São José do Poxim.
GRÁFICO 2 - NÚMERO DE HABITANTES DA VILA REAL DE SÃO JOSÉ DO
POXIM
Observamos no gráfico 2, divergências nos números de habitantes citados no
relatório do governador César de Menezes e Manuel Correia Andrade no ano de
1774408. Aqui percebemos que houve uma diminuição de 890 habitantes no Poxim e
esse número populacional cai um pouco mais se fizermos as contas entre Manuel
Correia Andrade e o bispo de Olinda D. Tomás da Encarnação Costa e Lima, no ano de
405
AHU_ACL_CU_015, CX.126, D. 9540.
Dias antes do falecimento de D. José I. O rei faleceu no dia 24 de fevereiro de 1777.
407
ANAIS DA BIBLIOTECA NACIONAL, Rio de Janeiro, v.40: 1918 (1923). p. 60.
408
O número de falecimento nesse ano corresponde a 264 para ambos os sexos. Revista do Instituto
Histórico e Geográfico de Alagoas – IGHAL – Vol. XII, Nº 13, 1927. p. 228.
406
98
1777, em que essa subtração se alarga em apenas 3 anos e essa diferença de três anos
passa a ser de 1.188 habitantes a menos no Poxim, ou seja, no período de 3 anos houve
uma redução de 46,18% no número de habitantes409. Acreditamos que o decréscimo
populacional local, deu-se por conta das áreas auríferas410 em que absorvia toda a mão
de obra para trabalhar nas minas411 de ouro e com isso, as pessoas saíam das mais
diversas áreas locais412 e do Norte do Brasil, para tentar o enriquecimento rápido413
através da extração do ouro pois o ouro garantia um enriquecimento meteórico.
A mão de obra escrava que saía dos portos da costa da África para o Rio de
Janeiro, e seguia para área aurífera, já saía inflacionada por conta da alta demanda
mineira gerava assim um custo414 muito alto no preço do escravo. Então o escravo que
estava em Pernambuco, na região Norte da colônia, era vendido mais barato para
trabalhar no garimpo e com isso gerou uma concorrência415 entre os comerciantes de
escravos de Pernambuco com os do Rio de Janeiro pelo controle do mercado escravista
nas minas.
Não é à toa, que quando a inflação do preço do escravo do Rio de Janeiro416
chega às minas, os compradores das minas preferem negociar com comerciantes de
Pernambuco, o que gerou um declínio nas vendas para os traficantes cariocas de
409
No Brasil na época de Pombal havia 3.000.000 pessoas. Claro que isso é uma estimativa. Ver
TEIXEIRA SOARES, Álvaro. O Marquês de Pombal. Brasília. Ed. Universidade de Brasília, 1983. p,
173.
410
A região Sudeste desenvolveu-se muito, enquanto o Norte açucareiro começou a entrar em crise.
Schwartz lembra que em 1720, o valor do açúcar despenca de forma incontrolável e exacerbada, e
consequentemente o valor do escravo extrapola 200 mil réis. No ano seguinte houve falência de 23
engenhos de açúcar preocupando os senhores de engenhos, já que na década anterior a Bahia conseguia
produzir 18 mil caixas de açúcar, enquanto nesse ano só conseguia produzir de 5 a 8 mil caixas.
411
Em 1721, nas Minas Gerais, um navio com uma carga de 800 escravos demorou apenas dois dias para
vender as “peças”. FRAGOSO, João e GOUVÊA, Maria de Fátima. (Orgs.) Na trama das redes:
política e negócio no império português, séculos XVI-XVIII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2010. p. 209.
412
Não temos informações referentes à migração de pessoas da região de Penedo, Coruripe, Poxim ou
São Miguel para as áreas auríferas.
413
Até mesmo portugueses, passaram a migrar para as regiões auríferas.
414
FRAGOSO, João e GOUVÊA, Maria de Fátima. (Orgs.) Na trama das redes: política e negócio no
império português, séculos XVI-XVIII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010. p. 213.
415
CARREIRA, Antônio. As Companhias Pombalinas de Navegação. Comércio e Tráfico de
Escravos entre a Costa Africana e o Nordeste Brasileiro. Editora: Centro de Estudos da Guiné
Portuguesa, porto,1969. p. 263.
416
Os traficantes de escravos do Rio de Janeiro tinha uma relação econômica muito estreita com os
comerciantes do Norte com o intuito de preencher o mercado econômico do ouro. MATHIAS, Carlos
Leonardo Kelmer. As múltiplas faces da escravidão. O espaço econômico do ouro e sua elite
pluriocupacional na formação da sociedade mineira setecentista, c. 1711 – c. 1756. Rio de Janeiro:
Mauad, 2012. p. 129.
99
escravos. A reação foi imediata, os comerciantes cariocas se recusavam a comparar os
escravos que eram provenientes do Norte açucareiro para suprir a demanda aurífera,
como fazia antes e deixaram de comprar os escravos mais baratos para revender nas
minas, para poderem barrar o avanço do comércio negreiro pernambucano.
O interesse do rei D. José I e de seu primeiro-ministro, o Marquês de Pombal,
nas vilas e freguesias da Capitania de Pernambuco (dando ênfase aqui a vila de Penedo
e da freguesia do Poxim) intensificou-se após a criação da Companhia, já que após a
criação da empresa houve muita resistência dos colonos pernambucanos, como vimos
anteriormente. Trata-se não apenas do comércio periferia-centro417, ou seja, de soberano
e súdito, pois “quaisquer que sejam as vicissitudes que frequentemente caracterizavam
o conturbado relacionamento entre portugueses e brasileiros, entre metrópole e
colônia, entre centro e periferia, os brasileiros eram inabaláveis em sua lealdade para
com a Coroa”418.
Então para configurar uma visão mais direcionada da política pombalina, a
Coroa passou a testar a lealdade desses colonos e no intuito de garantir o dinamismo do
comércio de escravos e de produtos usuais da terra que saía da periferia-centro,
colocando a Igreja para fiscalizar toda a movimentação política e econômica das
freguesias e vilas. Pombal passou a terceirizar a fiscalização nas mãos de uma das
figuras mais próxima dos colonos: o clero secular419.
Assim para que não houvesse sonegação dos impostos, combater o contrabando
através das denúncias que eram realizadas por eles para Coroa, e a realização das
dízimas eclesiásticas e até mesmo o fim e as interferências estrangeiras (Inglaterra,
França e Holanda)420. Com isso, traria para o erário Real uma rentável soma que
417
RUSSELL-WOOD, A.J.R. Centro e periferia no mundo luso-brasileiro, 1500-1808. Revista
Brasileira de História. Vol. 18, n. 36, 1988, p. 12.
418
Idem. p. 9.
419
Segundo Gustavo Augusto Mendonça dos Santos, o clero secular estava inserido na
sociedade da América portuguesa e interagia com ela, principalmente nos setores
socioeconômicos das freguesias do açúcar na capitania de Pernambuco na segunda metade do
século XVIII. SANTOS, Gustavo Augusto Mendonça. Transgressão e cotidiano: a vida dos
clérigos do hábito de São Pedro nas freguesias do açúcar em Pernambuco na segunda metade do
século XVIII. Recife: Universidade Federal Rural de Pernambuco, 2013. Dissertação.
420
TEIXEIRA SOARES, Álvaro. O Marquês de Pombal. Brasília. Ed. Universidade de Brasília, 1983.
p, 96.
100
seguraria os cofres portugueses até em tempos de crise; como foi o caso do declínio do
ouro que a Coroa se segurou com as exportações de tabaco.
Também era de interesse de Pombal saber o que os religiosos pensavam
politicamente sobre sua forma de governar, já que havia boa parte do clero lusitano que
não apoiava sua administração. Pombal e D. José I pretendiam reforçar a secularização
do Estado, claro que mantendo o catolicismo. Ambos colocavam a Igreja a serviço do
Estado421, como se a Igreja fosse um braço auxiliar para os planos da coroa. Aqui
podemos perceber o pensamento político e religioso do século XVIII, em que reis, e até
por parte dos bispos que foram figuras indispensáveis na adesão da secularização do
Estado, contestava a política canônica do poder temporal da Igreja e do Papa.
D. Tomás da Encarnação Costa e Lima dava provas da adesão do regalismo
pombalino. O bispo de Pernambuco remete ao rei D. José I uma relação de todas as
freguesias, capelas, ermidas e oratórios e o número de clérigos422 seculares que existem
em cada uma delas, mostrado no quadro 5. Nessa relação notamos o papel do clero
secular, já que às informações da relação citada foram realizadas a partir dos dados
fornecidos pelos padres, “uma vez que essa região era uma grande produtora de açúcar
e tinha um considerável potencial demográfico. Utilizamos dados demográficos para
tornar visível o crescimento populacional”423 das freguesias do açúcar, destacaremos
aqui Penedo e Poxim, pois ambas estavam próximas do litoral e tinham vários engenhos
moendo açúcar. Daí o interesse da Coroa, pois a região era de grande importância
econômica para o Erário Real. Por esse motivo, desenvolvemos uma tabela
correspondente aos vigários que foram nomeados para o Poxim no século XVIII, que
estavam dentro do processo político de Pombal.
421
Idem. p. 14.
Não podemos deixar de mencionar que as atividades dos clérigos dependiam dos dízimos que eram
retirados de cada freguesia, e isso era um ponto importante na vida desses religiosos, para poder exercer a
função designada pela Coroa, mas nem sempre a Coroa pagava o soldo do mês e muitas vezes esses
padres dependiam dos senhores de engenho locais ou de seus moradores. Em alguns casos o padre era
filho ou parente do senhor de engenho como é o caso do primeiro padre do Poxim, Antônio de Moura
Castro, filho do patriarca da família Castro, D. Antônio de Moura Castro, pois “ter padre na família era
por assim dizer provar limpeza de sangue.” SANTOS, Gustavo Augusto Mendonça. Transgressão e
cotidiano: a vida dos clérigos do hábito de São Pedro nas freguesias do açúcar em Pernambuco na
segunda metade do século XVIII. Recife: Universidade Federal Rural de Pernambuco, 2013.
Dissertação. p. 59.
423
Idem. p. 28.
422
101
QUADRO 6 - VIGÁRIOS DA VILA REAL DE SÃO JOSÉ DO POXIM
VIGÁRIOS DO POXIM A PARTIR DA CRIAÇÃO DA FREGUESIA
ANO
VIGÁRIOS
1718
PADRE MANUEL DINIZ BARBOSA
1777
PADRE ANTONIO DE OLIVEIRA
1799
PADRE JOSÉ DE ARAÚJO MEDEIROS
FONTE: LEMOS, 1999.
Em virtudes dos fatos mencionados podemos observar aqui que as principais
vilas e freguesias de Alagoas estão na rota da Companhia desde o sul do São Francisco
a Porto Calvo. Mas é o Poxim que articulando o comércio para a vila de Penedo, e
consequentemente para a Bahia, e ao norte com a Vila de Alagoas do Sul, que por sua
vez com Pernambuco, dinamizou as relações comerciais entre ambas as capitanias.
Claro que a Capitania da Bahia está mais próxima da vila de Penedo, consequentemente
da vila do Poxim, trilhando uma ponte comercial entre ambas as capitanias, com a vila
de Penedo424, já falado.
Levando-se em consideração esses aspectos, notamos que o escoando desses
produtos coloniais como açúcar, escravos, farinha e o fumo, principalmente o fumo que
era produzido nas terras do Poxim e em São Miguel, passava primeiro por Penedo e
posteriormente seguia para Salvador passando por Sergipe425, isso ao sul; o mesmo
acontecia com os produtos que vinham das vilas do Norte da capitania, como Recife,
Olinda, Porto Calvo e Alagoas do Sul.
424
Em agosto de 1756, a Câmara de Penedo escreve uma carta ao rei D. José I sobre o cumprimento da
ordem que regula o comércio de gêneros, particularmente, com a Bahia e Pernambuco. ACL_CU_004,
Cx. 2, D. 161.
425
Em 1805, o capitão Jerônimo da Costa Guizado, morador da Vila Real do Poxim, solicita ao escrivão
da Provedoria da comarca que lhe desse o direito de uma certidão de arrematação de um escravo chamado
André que foi comprado em Itabaiana, em Sergipe D’El Rei. Aqui temos a comprovação das estreitas
ligações comerciais que havia entre o Poxim e Sergipe, ou seja, o Poxim estava na rota para Salvador, e
por consequência a Companhia Geral do Comércio de Pernambuco e da Paraíba, já que comerciantes
baianos relutaram a instalação de uma companhia pombalina alegando que teriam prejuízos.
102
2.2 - O PORTO E A CONSTRUÇÃO NAVAL NO POXIM
Com o desenvolvimento econômico e populacional, a elevação da freguesia do
Poxim para a Villa Real de São José do Poxim e a localização geográfica favorável para
o desenvolvimento naval, surgiram novos elementos para dinamizar o escoamento de
escravos e produtos usuais da terra, como açúcar, farinha de mandioca e fumo.
Destacamos aqui, a construção de portos e estaleiros para consertos e fabricação de
embarcações de pequeno e médio porte na região do Poxim, tanto para embarque e
desembarque dos gêneros produzidos, mantimentos e tantos outros gêneros
alimentícios, e junto a isso, escravos como relatam as autoridades policiais do Poxim
em
que na noite de 26 do Corrente huma pequena Sumaca, que nesse dia
appareceu neste mar, desembarcára nestas praias huma porção de Escravos
Africanos, e julga-se, que passará outra porção para uma Lanxinha, que de
manhã se fazia ao mar, quando ja não apparecia a dita Sumaca ignorando-se
o destino dos Escravos desembarcados426.
Esses portos e estaleiros serviam tanto para as construções de embarcações de
menores e de médio porte, como também serviam para consertos das mesmas e um
lugar para abastecer depois de um caminho longo e árduo saindo ou entrando no
Atlântico, já que as maiores embarcações não singravam por rios e lagoas menores, pois
encalhavam, ou seja, não tinham acesso ao interior da colônia. Essa função ficou para as
sumacas e outras embarcações menores, já que entre
esses rios está o Poxim, de pequeno curso; nasce nos tabuleiros próximos à
fazenda Pau de Descanso e rasga seu vale até a lagoa Escuna. Logo depois,
recebe vários braços de outras lagoas da área do Poxim e tem na margem
esquerda a vila deste nome. Por um vale baixo, entulhado por depósitos
marinhos, coleando, chega ao mar, em parte barrado por recifes, formando
um ancoradouro natural e de bom porte à economia local. 427
pois, também,
as lagoas valorizam e enriquecem as terras adjacentes. Com seus peixes,
representam uma forte subsistência da população lacuste. A lagoa de Jequiá
serve de limites entre os municípios de Coruripe e São Miguel dos Campos.
Além do rio Jequiá, existem outros tributários menores em formação deve-se
ao entulhamento por terraço flúvio-marinhos que se liga com o mar por meio
de um rio-canal que se origina em sua extremidade sul, onde se localiza, em
CAIXA 2323 - DOCUMENTO: Estado de alagoas – assunto: Diplomático - Contrabando em
Alagoas ano: 1836. APA. Anexo IX.
427
LEMOS, João Ribeiro. Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições. Maceió. Ed. Do autor,
1999. p. 52 e 53.
426
103
ambas as margens, as partes da vila de Jequiá da Praia, hoje elevado à
categoriade cidade. As lagoas da vila do Poxim são lagoas menores,
formandas por entulhamentos de terraço flúvio-marinhos numa área onde
desaguavam vários riachos e que depois de serem tapados, uniram-se por
meio de canais que formaram a continuação do rio Poxim. O Poxim banha a
vila de igual nome e chega ao mar entre os depósitos que entulham a ampla
foz. Começa na parte norte desta área, temos as lagoas: Timbó (pequenina),
Escura, Tabuleiro, Guaxuma, Patos (pequenina), Vermelha, em forma de “Y”
e do Pau à povoação do mesmo nome.428
A abundância de madeira no Poxim era usada para diversos fins, além do
conserto, reparo e fabrico de embarcações429 de todos os portes e para as atividades do
engenho. Por outro lado, o corte de madeira estava comprometido, já que a Coroa cria o
Regimento das Reais Matas no ano de 1797430, e nomeia para o cargo de Juiz
Conservador das Matas José de Mendonça de Matos Moreira431 para impedir, aqui em
Alagoas, o corte indiscriminado de madeira principalmente as madeiras de construção,
tornando propriedade da Coroa todas as matas e árvores “de lei” da costa próximas aos
rios que tivessem seu curso para o mar. Mas permitia aos habitantes usufruiírem das
madeiras de matas excluídas pela Coroa para a construção de casas, engenhos,
fabricação e consertos de embarcações, que mais tarde deram origem a estaleiros
particulares muito comuns na região do litoral sul de Alagoas, principalmente,
no termo da vila do Poxim funcionavam então dois estaleiros, onde se
fabricavam sumacas. O primeiro deles, o melhor, localizava-se na Barra de
Jequiá, de onde se largavam ao mar sumacas de até 110 palmos; o outro, o do
porto do Batel, tinha capacidade limitada a embarcações de 90 palmos. Neste
termo trabalhavam 46 carpinteiros de machado, dos quais 12 eram oficiais,
15 mancebos e 19 ajudantes432. Quanto a calafates, apenas 1 oficial e 1
mancebo.433
428
Idem. 54 e 55.
Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas – IGHAL – Vol. II, Nº 13, 1880, p. 98.
430
Em 5 de novembro de 1796, o governador da capitania de Pernambuco, D. Tomás José de Melo,
manda um ofício para o secretário de estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra e interino da Marinha
e Ultramar, Luís Pinto de Sousa Coutinho, informando sobre a situação de ruína em que se encontram as
matas das Alagoas, a necessidade de se criar o lugar de superintendente das Matas da comarca das
Alagoas, e indicando para o dito lugar o ouvidor daquela comarca, José de Mendonça de Matos Moreira.
AHU_CU_015, Cx. 195, D. 13420.
431
O cargo de Juiz Conservador das Matas foi criando em 30 de setembro de 1796, sobre a necessidade e
vantagens de se estabelecer um ministro superintendente, para acautelar a conservação das matas da
comarca da vila de Alagoas, de madeiras para a construção naval na Bahia, Pernambuco e Arsenal de
Lisboa, fazendo a inspeção e demarcação delas para o serviço real e para a agricultura e subsistência dos
povos da comarca. AHU-Pernambuco - AHU_ACL_CU_004, cx.3, D.250.
432
Não identificamos se esses mancebos, oficiais e ajudantes eram todos negros, mulatos ou escravos.
433
SANTANA, Moacir Medeiros de. Contribuição à história do Açúcar em Alagoas. Recife: Museu do
Açúcar. 1970. p. 73.
429
104
A indústria naval era de total interesse da Coroa Portuguesa, já que a construção
e os consertos dessas embarcações movimentavam o comércio local, principalmente no
século XVIII. Segundo Ribeiro Jr., as condições para a construção de navios na colônia
era bastante favorável, pois havia matéria-prima em abundância434. As atividades de
conserto e produção de embarcações cresceram com o passar dos tempos mas ganhou
maiores dimensões nos
fins do século XVIII e no decorrer do século XIX, nela existiam estaleiros
que fabricavam até navios de alto bordo, utilizando madeiras de suas próprias
matas, que também forneciam a matéria-prima para a calafetagem: embiras,
que existiam de vários tipos, superiores mesmo às estopas, pois não
apodreciam na água e nela inchavam, fixando melhor, e uma resina extraída
do camaçari, pegajosa a ponto de somente largar das mãos com óleo quente.
Na construção de uma embarcação de certo porte eram empregadas diversas
espécies de madeira.435
O Juiz Conservador das Matas, José de Mendonça de Matos Moreira em 1798,
destinava o corte de madeira à marinha mercantil para construção e conserto de navios.
Com isso, estava liberado o corte da madeira das matas desde a Barra do rio Coruripe
passado pela barra do rio Poxim, ao norte, barra do rio Jequiá até a barra do rio São
Miguel destacando a barra do rio Poxim, já que fica próximo da Villa de São José do
Poxim,
distante dez leguas da sua capital: poderá chegar a população desta villa a mil
e trezentos fogos; quando as produções do terreno e generos de seu
commercio, são grande abundancia de madeira, muitos gados e não pouco
algodão. (…) Quatro ou cinco leguas para o norte faz barra no mar a Lagoa
Jequiá, areada também, e guarnecida de recife não pequeno: tem esta lagoa
de quatro para cinco leguas de comprido e para menos de uma de largura. É o
seu canal para o mar em extremo tortuoso, e forma algumas ilhas, nas suas
cabeceiras para a parte do sul as mattas chamadas de Jequiá de baixo, e pelo
norte posto que mais concentradas ficão as Jequiá de cima, quando ao norte
destas correm as mattas de S. Miguel, de quo já fiz menção e mais para
dentro correm pelas cabeceiras das mattas de Cururipe e as chamadas do
Riacho-secco e a terra das de Jequiá de baixo correm as mattas de Páo-Brazil
destruidas. A' distancia não pequena da Lagoa de Jequiá desaguá no mar o rio
de S. Miguel, que tendo sua origem poucas leguas ao sul da serra do Troipú
bastante concentrada, pelo sertão d'ali desce tomando rumos diversos até que
vem fazer barra no mar, ficando situada na sua margem septenatrional a
povoação d'aquelle nome.436
434
RIBEIRO JÚNIOR, José. Colonização e Monopólio no Nordeste do Brasileiro. A Companhia
Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba. São Paulo: HUCITEC, 1976. p. 118.
435
SANTANA, Moacir Medeiros de. Contribuição à história do Açúcar em Alagoas. Recife: Museu do
Açúcar. 1970. p. 71.
436
Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas – IGHAL – Vol. II, Nº 13, 1880. p. 98.
105
Vinte e oito anos depois da criação do cargo, em 31 de março de 1834, o Juiz
Conservador das Matas, José de Mello Correia, agora na responsabilidade do cargo, está
sendo pressionado pela Câmara de Alagoas a prestar contas de seu trabalho, e que o
mesmo informasse, no prazo de 8 dias, se sua administração servia bem ao seu emprego
ou se descuidava dos seus deveres, pois a mesma alegava que José de Mello Correia
“tinha que fixar sua atenção aos interesses e necessidades dos diferentes
municípios”437 e com descrições detalhadas sobre as necessidades vitais das matas de
cada área.
As matas no Poxim, a exemplo, tinha uma imensa variedades de espécies que
facilitavam as construções e consertos de casas, móveis e, principalmente, para
construção naval. Essas matas foram protegidas pela Coroa portuguesa até 1859 e
passaram a ser denominadas como “Madeiras de lei”438. A conservação dessas matas
representava a extração de madeira destinada a construções e consertos de embarcações
nos portos de Alagoas.
É possível que esses portos que existiam na região, e no termo439 do Poxim
tivessem sido feitorias francesas para extração de pau-brasil, que era abundante na
região, já que foram eles os primeiros navegadores na região de Coruripe440, Poxim e
Santa Marial Magdalena do Sul441. Os franceses foram expulsos, definitivamente, da
região do Poxim, no início do século XIX, isso no ano de 1808. A Câmara da Vila do
Poxim442 comunica, em 09 de dezembro, ao príncipe D. João estavam livres da presença
francesa. Segundo João Lemos, os franceses “construíram feitorias que foram os
437
Junta do Governo Provincial da Vila das Alagoas, Ofício do Governador das Alagoas á Câmara do
Poxim para que informasse, no prazo de 8 dias, se o administrador das matas, José de Mello Correia,
servia bem ao seu emprego ou se descuidava dos seus deveres. 31 Mar. 1824. 02F. Obs: Oferta do Dr.
João Guilherme Pitta. IGHAL. 00263 - 05 - 01 – 10.
438
CARVALHO, Cícero Péricles de. Formação Histórica de Alagoas. Maceió, EDUFAL: 2015. p. 33 e
34.
439
Essa expressão “TERMO” é muito utilizada nos documentos encontrados. Refere-se ao Poxim,
principalmente quando se fala de Jequiá da Praia, que antes de virar vila era jurisdição do Poxim.
440
Na época Coruripe existia como um povoado de menor expressão econômica e populacional, então no
caso o mais adequado era Poxim e não Coruripe. No mesmo período havia um porto chamado de Pituba,
que ainda existe até os dias atuais, em que os franceses usavam para a extração do pau-brasil.
441
O Porto do Francês, o qual servia no passado para contrabando de pau-brasil foi um
trampolim para invasores e na primeira metade do século XIX, tornou-se Alfândega da
Capitania de Alagoas. IHGAL. Documento – 00260 – 05 – 01 - 07 – Ofício à Câmara do Poxim
acerca da mudança da casa da Alfândega para o Porto do Francês. 21 de maio de 1823. Anexo X.
IHGAL. Documento – 0087 – 03 – 01 - 09 – Ofício ao Presidente da Câmara da Vila de São José do
Poxim, comunicando que Portugal achava-se livre da invasão Francesa. Recife, 09 de dezembro de 1808.
01 F. Anexo XI.
442
106
primeiros núcleos de atividade econômica da região. É possível que espanhóis e
holandeses tenham também construídos feitorias na região de Coruripe sobretudo às
margens da Lagoa de Jequiá”443. Para Moacir Santana,
os franceses desde cedo, muito antes da sua primeira tentativa de fixação no
território brasileiro, nos fins de 1555, começaram a fazer incursões às plagas
alagoanas, principalmente na região costeira, com a finalidade, puramente
comercial, do tráfico de pau-brasil. Warden, ao discorrer acerca de três
irmãos franceses, chamados Parmentier, que em 1520 vieram em um navio a
Pernambuco carregar aquela madeira de tinturaria, acrescenta que essas
incursões já naquela época eram muito comuns. Historiadores há, como
Alfredo Brandão, que chegam aconjeturar ter sido a cidade de Penedo
originada de um entreposto francês de comércio do pau-brasil. E a passagem
dos franceses pelo território alagoano ficou assinalada na denominação do
porto que serviu, durante o período colonial, para o escoamento das
mercadorias da região da lagoa Manguaba — o porto do Francês (ou dos
Franceses) —, localizado a uns 12 quilómetros de Maceió, e que se acha
consignado como "Pto. Francese" no chamado Mapa de Barléu, mas de
autoria de George Marcgrave, da parte meridional da Capitania de
Pernambuco, e que data de 1643. Entretanto, na costa alagoana não existiu
apenas este porto com a denominação dos franceses. Gabriel Soares de
Sousa, em sua descrição do Brasil no ano de 1587, consigna três com aquele
nome: "Porto Velho dos Franceses", quatro léguas antes do rio São Miguel, e
que ainda hoje é conhecido como Porto do Francês; "Porto Novo dos
Franceses", duas léguas adiante da foz daquele rio, na barra do rio Jequiá e,
finalmente, o "Porto dos Franceses", protegido pelos Baixos de D.
Rodrigo444, próximo à enseada formada pelo rio Coruripe.445
As devastações das matas em busca de madeiras e de pau-brasil em abundância
da região facilitou não apenas para as construções dos engenhos, mas também para o
desenvolvimento vocacional dessa indústria naval que cresceu no Poxim. A mata
foi praticamente o sustentáculo dos engenhos. Dela retirava-se não só a lenha
para as fornalhas, como o madeiramento para a construção da casa-grande,
fábrica e senzalas; para o carro-de-bois, barcaças e canoa empregadas no
transporte; para a confecção de caixas, fechos, cunhetes e barricas para
acondicionamento do açúcar.446
As matas do Poxim também foram alvo do contrabando de escravos africanos
como aponta o chefe de policia interino, Herculano Antonio Pereira da Cunha, em uma
443
LEMOS, João Ribeiro. Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições. Maceió. Ed. Do autor,
1999. p. 53 e 54.
444
Refere-se a Dom Rodrigo de Acuanã, comandante da nau de São Gabriel, que largou de Corunha,
Espanha, em junho de 1525 em direção às Molucas. Sua frota foi desbaratada e Dom Rodrigo, com
apenas trinta homens, resolveu retornar à Espanha carregado de Pau-Brasil. SOUSA, Jéssica Rocha de.
Nas Rotas dos Sertões: Comércio Interno e Contrabando entre as Capitanias de Pernambuco e
Bahia (1759-1780) . Recife, 2018, 177 p. Dissertação (Mestrado) – UFRPE. p. 71.
445
SANTANA, Moacir Medeiros de. Contribuição à história do Açúcar em Alagoas. Recife: Museu do
Açúcar. 1970. p. 76.
446
Idem. 1970. p. 230 e 231.
107
carta para o vice-presidente da província a, Doutor Manoel Sobral Pinto, em 26 de
junho de 1851, em que o chefe de policia organiza uma exploração na mata do PoximGrande:
Ontem me veio as mãos o officio de Vossa Excelência datado de 23 do
corrente, e fico sciente do quanto nelle Vossa Excelência me recommenda.
Convindo de mais perto providenciar sobre a exploração das mattas onde se
suppõe ainda que e existe parte do contrabando de Africanos, derigir me a
esta Villa, e para aqui marchou parte da Força que estava na Villa do Poxim,
reunindo-a com a que aqui se achava, devidi-a; parte para explorar as mattas
das Alagôas, e parte para as do Engenho da Ilha, deixando na Villa do Poxim
16 praças sob o commando do Alferes Acacio para explorar as mattas do
Poxim-Grande, que se estendem até as do Engenho da Ilha. Devendo contar
com a coadjuvação de pessoas praticas, que já estavão de antemão dispostas
para servir de guia, e auxiliaram a exploração, constame pelas
communicações que levo a prezença de Vossa Excelência, que se evadirão,
deixando a força sem pratico: o mesmo quase fizerão dous guias que
acompanharão447.
Mais adiante na mesma carta é citado a quantidade de escravos e para aonde iam
esses escravos
hoje estou informado, que não sendo possivel conservar-se reunido o
contrabado, foi retirado das mattas do Engenho da Ilha, e nos taboleiros de
Anadia, proximos ao Engenho Ferrado, foi devidido pelos compradores, que
tinhão sido convidados, sendo estes de diversos lugares da Provincia,
seguindo uma porção de cem á duzentos Africanos para o sertão de
Pernambuco, outra de menor numero para as Alagôas, repartindo-se o resto
por diversas pessoas, tocando a uns 20 a outros 16448.
Não podemos deixar de citar a presença estrangeira que foi um fator
preponderante no controle dos portos449 e estaleiros, principalmente no século XVIII,
em que o Marquês de Pombal450, na pessoa de Vossa Alteza, o Rei D. José I, proibia o
comércio estrangeiro nos portos do Brasil e quem “quisessem comerciar ainda a que
forem a troco de dinheiro e pagando todos os direitos pertencentes à Fazenda Real. A
CAIXA 2323 - DOCUMENTO: Estado de alagoas – assunto: Diplomático - Contrabando em
Alagoas ano: 1851. APA Anexo XII.
448
Idem.
449
Na década de 1760, houve uma diminuição na construção dos portos, na colônia, e por consequência
da construção das embarcações por conta da crise aurífera. Ver FALCON, Francisco; CLAUDIA,
Rodrigues (orgs.). A “Época Pombalina” no mundo luso-brasileiro. Rio de Janeiro: Editora FGV,
2015. p. 37.
450
Segundo Falcon, Pombal baseava-se nos Atos de Navegação inglesa em sua estadia em Londres, pois
havia uma grande preocupação para Pombal, que era defender seu projeto de controle do comércio
português, tanto dentro da colônia quanto fora por isso que há uma reforma na Marinha de Guerra em
Portugal e ao mesmo tempo estímulos à profissionalização dos militares, junto à construção naval nas
mais diversas áreas do império português, e em especial o Brasil. Idem, 2015. p. 37.
447
108
colônia, era, pois, a “conservação” e o “remédio” de Portugal, que se arrunaria sem
ela”451. Isso vinha desde a Ordem Régia de 8 de fevereiro de 1711 452, em que
estabelecia que os navios estrangeiros só pudessem vir nas frotas oficiais ou em caso de
arribada forçada, prescrevendo rigorosas penas aos infratores. O exemplo dessa
presença de navios estrangeiros tem um pedido de investigação da presença de um
navio holandês em Coruripe, termo do Poxim, do governador e capitão-general de
Pernambuco Manuel da Cunha e Meneses, em 12 outubro de 1770, em que ele pede
o exame e devassa acerca da arribada à barra de Coroípe de um navio
holandês chamado Princesa do Brasil, de que é proprietário João Manuel da
cidade de Amesterdão, capitão o holandes Jacob Blawn, fretado por
Domingos Luís da Costa para a Costa da Mina 453.
Um desses portos situava-se no termo de Jequiá da Praia, onde se produziam as
sumacas para escoamento de produtos coloniais. Esse porto pertencia ao Sr. Francisco
da Veiga Silva454 que no ano de 1788, conseguiu expandir um tímido porto de conserto
de pequenas embarcações em um grande estaleiro. Segundo João Lemos, essas
embarcações eram construídas por escravos e um desses escravos455 fugiu para o
estaleiro mais próximo em Piaçabuçu que pertencia a Joaquim das Neves.
No século XIX, os portos do Poxim também foram um braço articulador do
contrabando negreiro a exemplo temos o porto da Pituba que junto com o porto do Peba
(Piaçabuçu) atraía a atenção de traficantes e não davam trégua para a fiscalização. O
governo da Província de Alagoas estendeu a vigilância da barra do São Francisco, em
Penedo, passando pelas Barras de Coruripe, Poxim, Jequiá da Praia, São Miguel até a
enseada de Jaraguá (Maceió) formando a 1º divisão geográfica de fiscalização.
Sabia-se que a geografia de Alagoas ajudava para o contrabando tanto de
escravos quanto de produtos comerciais, já que os contrabandistas usavam as estradas
líquidas existentes na região. Com isso, a fiscalização criou a 2º divisão da área
451
NOVAIS, Fernando A. Portugal e Brasil na Crise do Antigo Sistema Colonial (1777-1808). São
Paulo: HUCITEC, 1978. p. 176.
452
Segundo Fernando Novais, a Ordem Régia de 8 de fevereiro de 1711, dizia que os navios estrangeiros
(permitidos nos tratados) só pudessem vir nas frotas oficiais ou em caso de arribada forçada,
prescrevendo rigorosas penas aos infratores. (NOVAIS, Apud, 1978, p. 82)
453
AHU_ACL_CU_004, Cx. 3, D. 199.
454
LEMOS, João Ribeiro. Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições. Maceió. Ed. Do autor,
1999. p. 162.
455
Idem. p. 162. O autor não identifica o nome do escravo e nem sua origem.
109
geográfica que ia do ancoradouro do Batel, Porto de Pedras, Barra de Camaragibe,
enseada de Pajuçara (Maceió) e ancoradouro do Francês456. E para facilitar essa
vigilância o Governo da província de Alagoas criou os “pontos”457, que foram 6 postos
militares, mas que tomaremos apenas 4 para a nossa pesquisa, que foram os
1 - Ponto do Batel – Correspondia a barra de Coruripe.
2 - Ponto do Francês – Correspondia Marechal Deodoro.
3 - Ponto do Peba – Correspondia ao ancoradouro em Piaçabuçu.
4 - Ponto da Pituba – Correspondia a enseada da Pituba na foz do rio Poxim,
sendo o melhor ancoradouro depois do de Jaraguá.458 Vejamos abaixo 3 desses 4 portos
apontados.
MAPA 10 – MAPA DA COSTA DO BRASIL DO PEBA AO RIO JEQUIÁ
FONTE: Mapa da Costa do Brasil do Peba ao Rio Jequiá, em 1833. https://www.bn.gov.br/.
Acesso em: 23 jan. 2019.
456
DUARTE, Abelardo. Episódios do contrabando de africanos em Alagoas. Maceió: Comissão
Estadual do Centenário da Abolição, 1988. p. 33.
457
Cada um desses portos tinha um comandante. Às vezes um comandante ficava responsável por dois ou
três portos como é o caso do 2º Tenente Comandante Luiz Francisco Teixeira, que era responsável pelos
portos do Peba, Pituba e Batel. Ver CAIXA 2323 - DOCUMENTO: Estado de alagoas – assunto:
Diplomático - Contrabando em Alagoas ano: 1851. APA
458
Idem. p. 34.
110
O presidente da província, o juiz de Direito Antonio Luiz Dantas de Barros
Leite, recebe notícias do secretário de polícia Francisco Manuel Martins Ramos, do
desembarque de escravos africanos no Pontal de Coruripe, onde fica o Ponto do Batel,
em 28 de setembro de 1836, em que esses escravos viam da Bahia para serem vendidos
na região do Poxim. O secretário de polícia informa que
sahi da Villa do Poxim as 8 horas da noute do dia 10 do corrente, pelos
motivos que espendí a Vossa Excelência em o outro officio, e cheguei a
Povoação de Coruripe a meia noute, e ahi me demorei té o dia 12, por me ter
requisitado o Delegado, toda a minha força para capturar uns individuos no
lugar denominado Batel, e desta deligencia rezultou a prizão de dous que
concorrerão para o desembarque dos Africanos que ultimamente chegarão.
No dia 12 fiz seguir o Senhor Cadete João Joaquim de Almeida Pinto, com as
quinze praças para o ponto do Peba, e eu segui para o Batel, e vi que o lugar
não era proprio para o fim a que veio este destacamente, pois que d’ahi não
se avista um só ponto do mar, e para nos collocarmos na praia fronteira que
dista mais de um quarto de legua, ficavamos expostos ao tempo; por isso me
derigi para o Pontal de Coruripe, que fica meia legua ao norte do Batel, não
só por ter junto a praia onde nos abrigar, como por ser porto de muitas
jangadas, e (…) ahi se avistar toda a costa para o Sul até o Pontal Merim, que
tam bem é visto pelo destacamento do Peba. Não se tendo ainda concluido a
barraca para o destacamento de Pituba, por isso ainda se conserva na Barra
do Jequiá o destacamento, e em Pituba uma Guarda de quatro homens. No
ponto em que me acho nada tem occorrido, a não ser a entrada de um Hiate
neste porto no dia 16 do corrente, que foi immediatamente visitado, e não se
encontrou Africanos nem indicios de se empregar no trafico delles. Pela parte
dada pelo commandante do ponto de Pituba, consta ter ahi fundeado um
Hiate no dia 13 do corrente que foi por elle e mais quatro praças, vizitada
immediatamente e nada encontrarão, que indicasse andar no trafico de
Africanos, e do officio que ultimamente recebo datado de 17 do corrente,
consta ainda estar o dito Hiate fundeado, e descarregando generos de
commercio, e que passara ao largo uma Sumaca no dia 16 do Sul para o
Norte, o qual tambem passou nesse mesmo dia pelo ponto e suponho ser o
Brigue de Guerra que por aqui cruza. Da parte dada pelo Commandante do
ponto do Peba, consta ter por ali aparecido ao amanhecer do dia 1 do corrente
uma embarcação de trez mastro, a qual dezaparecia pelas trez horas da
tarde.459
O governador da Província de Alagoas, Dr. Manoel Sobral Pinto, recebeu um
ofício do Ministério de Negócios Estrangeiros datado de 11 de julho de 1851, em que
dizia que havia um navio sardo460 “Sylphilde” que desembarcou no porto da Pituba, na
enseada de Coruripe (Poxim) com 600 negros africanos que foram negociados e
CAIXA 2323 - DOCUMENTO: Estado de Alagoas – assunto: Diplomático - Contrabando em
Alagoas ano: 1836. APA. Anexo XIII.
460
Refere-se na Ilha da Sardenha, Itália.
459
111
distribuídos na região e esse mesmo navio foi visto antes na Bahia, pois o mesmo
acabara de chegar da Costa da África, na enseada de Benin, no Golfo da Guiné461.
Contrabista (...) de Escravos a porta (...) das rigorozas averiguações que
procedéra aos Passaportes, as (...) não obstante ter entrado em lastro, não se
achou com tudo materia para procedimento Judicial seja me pormettido levar
igualmente à consideração de Vossa Excelencia, que sendo vós publica que
os mencionados Escravos foram disembarcados de bordo d'este Brigue, na
altura da Bahia, para aquella Sumaca, hé este facto poderoza materia para
hum legal procedimento judicial; pois do Contrario se infringem as Leis, que
tanto me cumpre pugnar pela sua religiosa observancia, na qualidade de
Empregado Publico, que dizem respeito à Nação Britanica, quanto a Vossa
Excelencia em as fazer cumprir.462
Temos outro registro de contrabando na região de Alagoas em 5 de dezembro de
1850463, com a escuna “Inocência” que foi detida com 162 negros em que
consta que no mês passado fora aprisionado pelo Comandante do brigue
Legalidade uma escuna denominada Inocente, que se achava no rio São
Francisco, em altura do Brejo Grande, tendo há pouco despejado africanos
nas praias de Poxim, no sul desta capital; assim como que esta embarcação
perdeu-se em um dos bancos da Barra ao sair do rio conduzida por gente do
brigue. Também se diz que o brigue veio Para cruzar na costa desta
província, requisitado pelo Exmo. Sr. Presidente e que S. Excia ordenara ao
comandante que fosse ao dito rio São Francisco fazer aquele aprisionamento.
É para sentir-se que seja real a perda de um navio que já pertencia ao Estado,
pois consta terem-se achado todos os indícios de uma boa presa464.
Esses portos no período colonial representaram a alma do comércio
mercantilista, no caso dos portos e estaleiros do Poxim intermediaram as relações entre
a freguesia do Poxim e seus engenhos de açúcar, as fazendas de gado e gêneros
alimentícios e o comércio de escravos africano e os interesses metropolitanos.
Na segunda metade do século XVIII, durante o período do monopólio da
Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba a empresa fez uso de 26 navios no
transporte de escravos e produtos usuais da terra em 125 viagens465 de ida à África. A
461
DUARTE, Abelardo. Episódios do contrabando de africanos em Alagoas. Maceió: Comissão
Estadual do Centenário da Abolição, 1988. p. 55.
462
CAIXA 1038 - DOCUMENTO: Estado de alagoas – assunto: Diplomático - Contrabando em
Alagoas ano: 1831. APA. Anexo XIV.
463
É bom lembrar que nessa época havia um convênio Anglo-Brasileiro de 23 de novembro de 1826, que
logo depois virou lei em 7 de novembro de 1831, em que o imperador D. Pedro II declara livre o escravo
que desembarcasse no Brasil.
464
LIMA JR., Félix. Escravidão em Alagoas. Maceió: SERGASA, 1975. p. 74 e 75.
465
CARREIRA, Antônio. As Companhias Pombalinas de Navegação. Comércio e Tráfico de
Escravos entre a Costa Africana e o Nordeste Brasileiro. Editora: Centro de Estudos da Guiné
Portuguesa, porto,1969. p. 252.
112
Companhia Geral de Pernambuco e Paraíba, no ano de 1774 construiu 5 novos navios
com os nomes de Olinda, Netuno, S. José, Postilhão 374 e Voador e teve a construção
da corveta Bom Sucesso em 1775466 para o dinamismo comercial da empresa no
Atlântico. Segundo Carreira, o circuito desses navios, no transporte de escravo seguia a
seguinte normativa:
1 – Pernambuco – Rio de Janeiro – Costa da Mina – Pernambuco.467
2 – Pernambuco – Rio de Janeiro (ou não) – Angola ou Benguela – Pernambuco.
3 – Pernambuco – Lisboa – Costa da Mina ou Angola – Pernambuco, por vezes
Rio de Janeiro.
Os portos que existiam no Poxim fixavam um dos pontos da dominação
administrativa portuguesa, cujo local estava destinado sobretudo como ponto de apoio a
navegação468 e, também, a posse do colonizador. Em um contexto geral, o Poxim e seus
portos constituíam-se em um local para várias dominações coloniais, que se articulavam
causando uma rede de intrigas e conflitos domésticos como cobranças indevidas de
impostos e o uso arbitrário da força através do cargo, por muitas vezes recorrendo a
violência física. Com isso, trago aqui um desses conflitos que envolvia Francisco
Antônio de Sousa (sic), negociante natural de Pernambuco e residente na barra de
Jequiá da Praia, termo da Vila Real de São José do Poxim e o ex-ouvidor-geral da
Comarca de Alagoas, Manuel Joaquim Pereira de Matos Castelo Branco469.
O negociante alegou na carta a D. João, em 18 de julho de 1804, que o exouvidor-geral, já fora do cargo470 e das atribulações que ele pedia, estava penhorando e
arrematando seus bens e cobrando impostos das embarcações471 e quilhas que entravam
no estaleiro onde são feitas as construções de navios para o seu comércio e para venda
466
Idem. p. 253 e 254.
Idem. p. 255.
468
LARA, Silvia Hunold. Fragmentos setecentistas. Escravidão, cultura e poder na América
portuguesa. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. p. 30.
469
Ambos os sujeitos, tanto o ex-Ouvidor e o comerciante, usaram todas as armas para superar o poder de
um do outro dentro de suas condições políticas e econômicas. CERTEU, Michel de. A Escrita da
História. Forense Universitária. Rio de Janeiro. 2006.
470
É bom deixar claro que as reações aconteciam, quase sempre, por contas dos abusos de autoridades
dos funcionários da Coroa.
471
Anos mais tarde, em 12 de junho de 1822, os negociantes e moradores da Vila de Penedo envia uma
solicitação, a D. Pedro, para o fim dos impostos relativos às lojas, vendas e embarcações, aplicado para os
fundos do Banco do Brasil. AHU_ACL_CU_004, Cx. 7, D. 515.
467
113
nos portos da Bahia, Rio de Janeiro e Pernambuco. Com isso, diz Francisco António de
Sousa que,
a fim de fazer alli Commércio de embarcações tanto para a navegação do seu
commércio quanto para arrumador vender nos Portos da Bahia, Rio de
Janeiro, e Pernambuco, bem, e (…) modo que entrou negociantes fazem por
ser aquelle lugar muito accomodado para a sahida das embarcações sucedêo
quando o ouvidor da Comarca Manoel Joaquim Pereira de matos Castello
Branco sem mais autoridade quando o fez simples arbitrio entrasse a exigir
de cada huma das embarcações, que ião carregar ao Porto a quantia de 4$000
réis; e por cada huma quilha que sepunha no estaleiro para se construir no
mesmo porto a quantia de 6ø400 réis. Quanto os primeiro imposto, hé certo,
quando queixando-se aos donos das embarcações do competente Governo,
fôrrão por este providenciados expedindo-se ordem á Camara, para mais não
exigir simples imposto. Quanto os primeiro imposto, hé certo, quando
queixando-se aos donos das embarcações do competente Governo, fôrrão por
este providenciados expedindo-se ordem á Camara, para mais não exigir
simples imposto472
O negociante vai mais além ao dizer que o sucessor de Manuel Joaquim Pereira
de Matos Castelo Branco, José dos Santos Pinheiro Matos, não cobrou tal imposto
Quanto porêm os segundo, bem quanto o Supperior oppussesse, e mesmo
procurasse tão bem recorrer, todavia não chegou a fazer; porque antevendo
isso mesmo o ex-Ouvidor evitou no mesmo recurso dando ordem para que o
imposto se não cobrasse coactivamente de pessoa alguma, mas somente
aquelles que por mais (…) amigaveis quizesem satisfazer; o que porêm não
practicou o teu sucessor José dos Santos Pinheiro Matos, que apenas tomou
pose do lugar entrou a mando (…) e mais constructores que queirão pagar, e
com tal violencia evexame que nem lhes admitia requerimento algum
supperior, entre tanto os (…) estivessem em remessas, e o dinheiro recolhido
ao cofre e ameaçando compromisso assim a todos que copperasse como disse
ao proprio Comandante da Villa Pedro José de Matos (…) hé (…) até lhe
infformava todos os recursos porque se alguma advogado se proponha
defende-lo, o tractado mal de palavra, suprendia, e até prendia como fez ao
advogado da Villa do Penedo Antonio de Mello Paes, e a propria parte
estando em autoridade geral e não menos a outro advogado da mesma Villa
na segunda comunicação que for (…), (…) hé contrario a todas as Leis,
Direito, Razão, porque impôs novo tributo hé proprio da Suprema Real
autoridade, e não dos Ministros, aos que hé só concedido o executado as leis
e as faze-las accrescendo so aquelle imposto prejudicial ao commércio, e por
consequencia ao estado e á Real Corôa hé pois por tudo isso que o Suppremo
recorre a Vossa Alteza Real para que se diga dão lhe aprovidencia, que o
caso pede, mandando informar (…) do exposto; e achando (…) que não se
(…) do mais por fim o imposto, senão que se faça repôr ao Suppremo tudo
quanto, indevidam se lhe houver extorquido pelo os titulo ou multando se
472
AHU_ACL_CU_004, Cx. 5, D. 396. Anexo XV.
114
aprenheram e rematação indevidam (…) restituindo-se (…) os bens
arremataodos. Portanto.473
Esse conflito mostra que Manuel Joaquim Pereira de Matos Castelo Branco não
garantia a função jurídica de seu cargo, nem no momento que era ouvidor-geral, nem
após, pois “entre o poder central e o poder local havia uma densa rede de relações”, o
que fez o exercício do poder, por parte da Coroa, depende do apoio dos grupos locais,
implicando”474, segundo ele, “o florescimento de clientelas e de redes de
intermediários sociais”475. A função da ouvidoria era garantir a aplicação da lei e a
manutenção da paz no seu local de trabalho para todos os que lá viviam e fiscalizar
todos os representantes da coroa, evitando abusos de poder e outras mazelas que
oferece; acima de tudo evitar e eliminar conflitos, mas não foi o que houve pelo que
vimos: Manuel Joaquim Pereira de Matos Castelo Branco atormentou a vida dos
moradores e comerciantes do Poxim com a prática de cobranças indevidas e de abuso de
poder através do cargo exercido por ele. Por outro lado, às práticas abusivas e a
corrupção “fazia parte do sistema, pois cumpriu uma função política importante ao
facilitar o equilíbrio de interesses entre a metrópole e as sociedades coloniais já
formadas em princípios do século XVII”476.
Em vista dos argumentos apresentados, atrevo-me aqui em dizer que esse tipo
de postura dos membros da coroa foi também um dos fatores que abriram as portas ao
contrabando, tendo em vista que “os conflitos de jurisdição, que persistiram por
décadas, foram fundamentais na formação de “uma consciência política” e de “noção
de direitos e prerrogativas”477.
473
Idem.
ROMEIRO, Adriana. Corrupção e poder. Uma história, séculos XVI a XVIII. Belo Horizonte:
Autêntica Editora, 2017. p. 43
475
Idem.
476
Idem. p. 73.
477
ACIOLI, Vera Lúcia Costa. Jurisdição e conflitos: aspectos da administração colonial. Recife:
Edufpe, 1997.
474
115
CAPÍTULO III - AS LAVOURAS COMERCIAIS DO POXIM
“Ainda que se saiba a tarefa da cana que um negro há de plantar em um dia, e a que há de cortar, quantas
covas de mandioca há de fazer e arrancar e que medida de lenha há de dar, como se dirá em seu lugar”
André Antonil478
No período colonial, o fumo foi considerado como atividade econômica
secundária, já que o lastro econômico da colônia estava centrado no açúcar, mas o
cultivo do fumo foi uma atividade essencial para o Brasil no comércio transatlântico de
escravos em pleno século XVIII. Unia-se a qualidade indiscutível como facilidade de
plantio e o alto valor comercial479. Segundo Ana Emilia Staben, “a produção de tabaco
na Capitania de Pernambuco estava diretamente relacionada ao comércio de escravos
com a Costa da Mina”480. A Costa da Mina foi o principal destino de grande parte do
tabaco produzido na Bahia e Pernambuco durante o período colonial.
Ao longo do século XVIII, o fumo favoreceu a elevação de renda dos
agricultores baianos e um pequeno grupo de produtores na região do Baixo São
Francisco, incluindo aqui as vilas do Poxim e São Miguel (Alagoas) que mais tarde
aplicariam o fumo e seus capitais nas praças baianas gerando um desconforto político e
econômico entre os comerciantes das praças de Recife e Salvador481.
O cultivo do tabaco e produção de fumo encilhava-se ao plantio da mandioca
(Manihot utilissima) e a produção de farinha no Poxim no século XVIII, pois a
importância da farinha de mandioca em terras alagoanas chega ao comércio
transatlântico, já que da “farinha de mandioca estava o sustento de africanos, escravos
478
ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil por suas drogas e Minas. 3. ed. Belo
Horizonte: Itatiaia/Edusp, 1982. p. 34.
479
STABEN. Ana Emilia. Negócios de escravos. O comércio de cativos entre a Costa da Mina e a
Capitania de Pernambuco (1701 - 1759). Curitiba, 2008. Recife, 121 p. Dissertação (Mestrado) –
UFPR. p. 45.
480
STABEN. Ana Emilia. Negócios de escravos. O comércio de cativos entre a Costa da Mina e a
Capitania de Pernambuco (1701 - 1759). Curitiba, 2008. Recife, 121 p. Dissertação (Mestrado) –
UFPR. p. 45.
481
Idem. p. 50.
116
em trânsito pelo Atlântico, marinheiros em circulação pelo mundo a partir da era das
navegações”482.
A farinha de mandioca foi a base de sustentação de tropas militares em Alagoas,
Pernambuco e Bahia como mostra o ofício483 da Câmara do Penedo a Câmara do
Poxim, pedindo autorização à Câmara do Poxim para retirar a quantia de “duzentos
alqueires de farinha desta embarcação que se acha ancorada no Porto de Coruripe”,
em 12 de abril de 1817. Considerada gênero de primeira necessidade pública pela
Câmara Municipal de Maceió, em 27 de fevereiro de 1845484, já que a população
(habitantes mais pobres, homens livres e escravos) dependiam do “pão do Brasil”485
(como era conhecida a farinha) se alimentarem.
A mesma farinha que alimentava também foi a motivação para o conflito que
ocorreu no ano de 1727, em São Miguel (termo do Poxim), entre o alferes Bento Rebelo
Pereira e ex-Ouvidor-Geral de Alagoas João Vilela do Amaral. Tudo começou quando o
alferes Bento Rebelo Pereira condenou Antônio Silva e outras 6 pessoas por desvio de
farinha e peixe e que as mesmas pessoas tinham o apoio do ex-Ouvidor-Geral.
Notamos a importância da mandioca “que durante milênios foi domesticado
pelos índios da América do Sul”486 e vem sendo consumido desde do século XVI pelos
europeus no processo de colonização das novas terras conquistadas. Segundo Jayme
Rodrigues, a farinha de mandioca era “comida de índios selvagens e de escravos negros
no Brasil, acabou por fazer a viagem inversa, e ir alimentar em África os pais dos
futuros escravos que a comeriam na sua América de origem”487.
Contudo, o consumo de farinhas, raízes e tubérculos cozidos como a mandioca
tornou-se a base alimentar da dieta na colônia, pois a farinha de mandioca substituía o
482
RODRIGUES, Jaime. “De farinha, bendito seja Deus, estamos por agora muito bem”: uma
história da mandioca em perspectiva atlântica. Rev. Bras. Hist. [online]. 2017, vol.37, n.75, pp.69-95.
Epub Sep 11, 2017. ISSN 0102-0188. http://dx.doi.org/10.1590/1806-93472017v37n75-03. p. 84 e 85.
p. 1.
IHGAL. Documento – 001676 – 21 – 03 – 22.
IHGAL. Documento – 01313 – 018 – 01 – 11.
485
SILVA, Paula Pinto e. Farinha, feijão e carne-seca. Um tripé no Brasil colonial. Editora Senac, São
Paulo, 2005. p. 85.
486
RODRIGUES, Jaime. “De farinha, bendito seja Deus, estamos por agora muito bem”: uma
história da mandioca em perspectiva atlântica. Rev. Bras. Hist. [online]. 2017, vol.37, n.75, pp.69-95.
Epub Sep 11, 2017. ISSN 0102-0188. http://dx.doi.org/10.1590/1806-93472017v37n75-03. p. 84 e 85.
483
484
p. 71.
487
Idem. p. 1.
117
pão de trigo488, que os portugueses estavam acostumados a consumir. Percebe-se que a
base alimentar da colônia foi fortemente influenciado pelo modo de produção
econômico de monocultura da cana-de-açúcar, que trouxe os elementos branco, negro e
índio.
3.1 – A PRODUÇÃO DE FUMO NO POXIM
O fumo começou a ser plantado no Brasil lá pelos idos de 1570, apenas para
consumo local e não era necessário uma estrutura econômica complexa para plantar o
tabaco e produzir o fumo, era preciso apenas a limpeza do terreno em volta. Com isso,
as pessoas mais simples, com acesso à terra, tinham a facilidade do cultivo do fumo sem
possuir um investimento econômico grande para plantá-lo, e teriam um produto de valor
em sua horta no quintal de casa, diferente do açúcar. Segundo Antonil, o início da
plantação do tabaco já ocorria no século XVI, pois
até que, imitado por vizinhos, que com ambição a plantaram e enviaram em
maior quantidade, e, depois, de grande parte dos moradores dos campos, que
chamam da Cachoeira, e de outros do sertão da Bahia, passou pouco a pouco
a ser um dos gêneros de maior estimação que, hoje saem desta América
meridional para o Reino de Portugal e para os outros reinos e repúblicas de
nações estranhas. E, desta sorte, uma folha antes desprezada, e quase
desconhecida, tem dado e dá atualmente grandes cabedais aos moradores do
Brasil e incríveis emolumentos aos erários dos príncipes.489
A plantação da “erva santa”490 foi proibida em 5 de fevereiro de 1639 pelo então
governador do Brasil, D. Fernando Mascarenhas, o Conde da Torre, alegando que as
pessoas deixariam de plantar gêneros alimentícios de primeira necessidade para colônia.
Nos arredores da cidade de Salvador, o tabaco que saía da Bahia com destino à África
cortava os rios caudalosos como Paraguassú, Sergipe, Jaguaripe, Matuim, Paranamerim
e Pirajá,
488
SILVA, Paula Pinto e. Farinha, feijão e carne-seca. Um tripé no Brasil colonial. Editora Senac,
São Paulo, 2005. p. 41.
489
ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil por suas drogas e Minas. 3. ed. Belo
Horizonte : Itatiaia/Edusp, 1982. p. 51.
490
Expressão utilizada por Sebastião Rocha Pita. Ver PITA, Sebastião da Rocha. História da América
Portuguesa. Ed. Senado Federal. Brasília, 2001. p. 38.
118
que de muito longe vem cortando e dividindo as terras do recôncavo, e dão
comodidade a grandes povoações, as quais pelas máquinas dos engenhos,
casas dos lavradores e dos que senhoreara aquellas propriedades, ou vivem ao
beneficio delas, parecem vilas; sendo navegáveis e cursados de tantos barcos,
que conduzindo mantimentos e todo o gênero de regalos à cidade, se veem
nas suas praias cada dia mais de oitocentos, sendo quase dois mil os que
cursam a sua carreira, alguns tão possantes que carregam sessenta e mais
caixas de açúcar, trezentos e mais rolos de tabaco.491
O desembargador Belchior da Cunha Brochado em 1698, apontou Pernambuco
como maior produtor de fumo além da Bahia. A Capitania de Pernambuco tinha
lavradores que produziam do “Rio de S. Francisco, Rio de S. Miguel, (rio) Santo
Antonio grande Alagoas, Porto do Calvo, Serinhaem, Barra Grande, Rio Fermozo, e
Guayana (Goiana)”492, de onde o tabaco era levado “em sumacas” para os portos
baianos e ao norte seguia para Paraíba através do descaminho e contrabando, exigindo
maior fiscalização da Mesa de Inspeção do Açúcar e Tabaco493, que segundo Idelma
Aparecida Ferreira Novais, em 1799 foram apreendidas
caixas de açúcar pertencentes ao comerciante da Bahia e proprietário do
navio onde se encontrava a mercadoria é um dos exemplos de irregularidades
em que o Ouvidor Geral das Alagoas Francisco Nunes da Costa relata em
seus ofícios ao Secretário de Estado Martinho de Melo e Castro. Segundo
informa, foram apreendidas aproximadamente 100 caixas de açúcar.494
Mais adiante, Francisco Nunes da Costa afirma que era impossível fiscalizar a
região do contrabando, enquanto os senhores de engenho da região participasse desse
comércio ilegal, devido a “facilidade com que vendem as suas safras inteiras
conhecidamente a contrabandistas”495.
491
PITA, Sebastião da Rocha. História da América Portuguesa. Ed. Senado Federal. Brasília, 2001. p.
70.
492
LOPES, Gustavo Acioli. Negócio da Costa da Mina e comércio atlântico: Tabaco, açúcar, ouro e
tráfico de escravos: Pernambuco: (1654-1760). São Paulo: USP, 2008. Tese de Doutorado. p. 119.
493
A Mesa de Inspeção estava regulamentada tanto pelo seu próprio Regimento de 1º de abril de 1751
como também pelo novo Regimento da Alfândega do Tabaco de 16 de janeiro de 1751 além de ser
amparado por decretos e alvarás aprovados entre os meses de janeiro a agosto de 1751. NOVAIS, Idelma
Aparecida Ferreira. A Mesa de Inspeção do Açúcar e do Tabaco da Bahia, 1751-1808. São Paulo:
USP, 2016. Tese de Doutorado. p. 27.
494
Idem. p. 115.
495
Idem. p. 116.
119
Segundo Gustavo Acioli Lopes, a Capitania de Pernambuco (e suas adjacências;
Alagoas era uma delas) era a segunda maior produtora de tabaco do Brasil496, ficando
atrás apenas da Bahia497. Por outro lado, o tabaco produzido em Alagoas era um dos
melhores. Vejamos em sua descrição:
das ditas localidades, umas aparecem com freqüência apontadas como
fumicultoras nas missivas oficiais. É o caso de Alagoas, onde, segundo um
dos superintendentes do tabaco de Pernambuco, “naquella p.te se cultivava a
maior quantidade do melhor tabaco, q nesta Capitania se fabrica”. 498
A região citada que produzia o fumo corresponde ao norte de Penedo, vila de
São Miguel e áreas circunvizinhas499, então se acredita que desde o século XVIII até o
XIX, o Poxim era essa área que também produzia o tabaco 500, já que a lavoura
fumageira sempre estava ligada a outras lavouras como é o caso da mandioca501 e o
Poxim era o maior produtor de mandioca também plantada pelos escravos da região sul
de Alagoas no século XVIII. Observando a descrição de Rocha Pita, notamos que era
comum no espaço que se produzia açúcar ter o labor da produção de mandioca e tabaco,
onde
há muitas casas de coser os meles para os açúcares batidos, outras para os
reduzir a aguardentes. Descobrem-se dilatados campos plantados de tabaco,
vários silios occupados de mandioca, outros cultos com pomares e jardins. 502
496
O novo regimento do tabaco, decretado por Pombal, de 16 de janeiro de 1751, aliviou as dificuldades
dos produtores de fumo. TEIXEIRA SOARES, Álvaro. O Marquês de Pombal. Brasília. Ed.
Universidade de Brasília, 1983. p. 173.
497
A vila de Cachoeira, na Bahia, era a maior produtora de fumo no Brasil. Produzia em média
170 mil arrobas anuais. MATHIAS, Carlos Leonardo Kelmer. As múltiplas faces da escravidão. O
espaço econômico do ouro e sua elite pluriocupacional na formação da sociedade mineira
setecentista, c. 1711 – c. 1756. Rio de Janeiro: Mauad, 2012. p. 141.
498
LOPES, Gustavo Acioli. Negócio da Costa da Mina e comércio atlântico: Tabaco, açúcar, ouro e
tráfico de escravos: Pernambuco: (1654-1760). São Paulo: USP, 2008. Tese de Doutorado. p. 119
499
Essa área refere-se ao Poxim. O limite entre o Poxim e São Miguel nessa época é a lagoa de
Jequiá, que na época pertencia ao Poxim. Ver LIMA, Ivan Fernandes. Ocupação Espacial do
Estado de Alagoas. Governo do Estado de Alagoas. Maceió: SEPLAN, 1992. p. 55.
500
Lançamento de imposto de fumo nos anos na primeira metade do XIX; 1843-44/1851-52/1847-48/
1872-73/1880-81/1896/ 1840-41. Caixa 5048. Arquivo Público de Alagoas - APA.
501
No período de dominação holandesa, no século XVII, conforme citado por Nardi, Adrian Verdonck
fala que “perto do rio São Francisco existe um lugar chamado Alagoas […] há poucos habitantes […] os
moradores plantam ali grande quantidade se mandioca, e a maior parte da farinha vem para Pernambuco
que é desta procedência: outrossim planta-se neste lugar muito fumo e prepara-se considerável porção de
peixe seco que toda é trazida para aqui e prontamente vendida”. (Apud,1996, p. 42). NARDI, Jean
Baptiste. O fumo brasileiro no período colonial. Lavoura, Comércio e Administração. São Paulo:
Brasiliense, 1996.
502
PITA, Sebastião da Rocha. História da América Portuguesa. Ed. Senado Federal. Brasília, 2001. p.
76.
120
O tabaco não dependia da mão de obra compulsória e era incentivado por braços
familiares, ou seja, pelos pequenos produtores503 “era, de certa forma, uma luta entre a
lavoura dos homens livres”504, já o açúcar e a mandioca dependia de braços escravos.
Segundo Jean Baptiste Nardi, em sua obra O fumo brasileiro no período colonial.
Lavoura, Comércio e Administração, a estrutura política de um lavrador505 de fumo, no
final do século XVIII, organizava-se mais ou menos assim; “lavrador livre, branco,
casado, família de sete pessoas, rendeiro, quatro escravos, 4,3 tarefas cultivadas, solo
de areia ou salão, sem uso de esterco de gado, produção de 232 arrobas de fumo”.506
No auge da produção fumageira, surgiram grandes produtores como Francisco
Álvares Camelo, sargento-mor de São Miguel, que era um grande produtor do gênero e
tinha mão de obra escrava, ou seja, era um homem de posses que em 1722 vendia sua
produção de tabaco em Pernambuco e mantinha duas lavouras comerciais – mandioca e
tabaco - para serem exportadas. As arrobas de tabaco seguiam o caminho de Salvador e
de lá iam para o reino, África e, por fim, a Índia507, servindo como moeda, como foi “o
uso do tabaco como mercadoria-moeda508 no tráfico de escravos em Pernambuco509 foi
503
Segundo Lopes, esses produtores eram as pessoas mais pobres da região. Isso desde início do plantio
do tabaco em Alagoas lá pelos idos do final do século XVII. Um prova das condições sociais desses
produtores, ainda em Lopes, é a resposta a Ordem Régia do governador de Pernambuco Francisco
Martins Mascarenhas referente à cobrança de impostos dessas pessoas, em que ele diz; “Lavradores deste
gênero morão vinte e sincoenta Legoas em distancia do Recife, e que são os mais pobres do Brazil”.
Apud. 2008, p.103. Situação diferente do Francisco Álvares Camelo.
504
Faço aqui, uma alusão à obra de Schwartz quando ela fala da plantação de açúcar e do trigo que eram
produzidos juntos na Ilha da Madeira. Ver. SCHWARTZ, Stuart B. Segredos Internos. Engenhos e
escravos na sociedade colonial. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. p. 25.
505
Segundo Schwartz, o termo lavrador era destinado a qualquer pessoa que exercia à prática agrícola e
que no século XVIII, era usada para se referir aos mais humildes agricultores. Ver SCHWARTZ, Stuart
B. Segredos Internos. Engenhos e escravos na sociedade colonial. São Paulo: Companhia das Letras,
1999. p. 247.
506
NARDI, Jean Baptiste. O fumo brasileiro no período colonial. Lavoura, Comércio e Administração.
São Paulo: Brasiliense, 1996. p. 69.
507
Segundo Roquinaldo Ferreira, as embarcações partiam de Salvador com o tabaco fino, muitas vezes
contrabandeado para Índia, que depois eram devolvidos com panos indianos para serem vendidos nas
praças de Salvador e no comércio ilegal. FRAGOSO, João e GOUVÊA, Maria de Fátima. (Orgs.) Na
trama das redes: política e negócio no império português, séculos XVI-XVIII. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2010. p. 219 e 220.
508
Em Angola o tabaco servia até de preço de resgate dos escravos. No ano de 1780 um negro na África
correspondia por 4 rolos de tabaco baiano e 12 pernambucano. Por essa diferença, que os comerciantes
pernambucanos quando iam comprar as “peças” eles faziam negócio como tabaco que vinha da Bahia.
NARDI, Jean Baptiste. O fumo brasileiro no período colonial. Lavoura, Comércio e Administração.
São Paulo: Brasiliense, 1996. p. 220 e 221.
509
Com a Costa da Mina. É bom ressaltar, que o mais importante para Pernambuco não era a exportação
do fumo, mas a importação dos escravos. Ver. CARREIRA, Antônio. AS Companhias Pombalinas de
Navegação. Comércio e Tráfico de Escravos entre a Costa Africana e o Nordeste Brasileiro. Editora:
Centro de Estudos da Guiné Portuguesa, porto,1969.
121
favorável a que o setor açucareiro, assim como na Bahia, suportasse a inflação no
mercado de mão-de-obra”.510
Saem da nossa América portuguesa para todos os portos do reino em cada um
ano cem navios, umas vezes com maior, outras com menos carga, mas
sempre com tanta, que comutando a de uma com a de outra frota, carregam
vinte e quatro mil caixas de açúcar de mais de trinta arrobas cada uma; mais
de três mil feixos de seis e de oito, e de duas mil caras de arroba; dezoito mil
rolos de tabaco de oito até dez arrobas (…)511
Lopes afirma que boa parte desse tabaco que saía dessa região ia em direção a
Salvador, para ser levado para comércio na Costa da Mina, já que Salvador era a melhor
praça512 para a venda do produto. Já a outra parte do tabaco seguia rumo ao porto do
Recife513. Além de ter uma praça melhor em Salvador, os produtores de tabaco em
Alagoas fugiam de impostos altos sobre o produto em Recife e Olinda, com isso havia
uma quantidade maior do fumo do Poxim e São Miguel na Bahia, pois
naquella parte se cultivava a maior quantidade do melhor tabaco, q nesta
Capitania se fabrica, vendo que a este Recife se não condusia quantidade
alguma sendo-lhe facil a conduçam por mar, e inquirindo a rasam desta falta
achei que como cada arroba de tabaco pague neste Recife 160 rs. para o
contrato da imposiçam do subcidio, e na Bahia pague a mesma quantia cada
rolo os levam os Lavradores antes aquella Cidade, ainda que fique em
dobrada distancia porq vem a lucrar a diminuiçam do tributo [...] [e,
completou,] para tambem o poderem-no mais facilmente descaminhar [...].514
O mapa abaixo mostra, segundo Jean Baptiste Nardi, em sua obra O fumo
brasileiro no período colonial, as áreas de cultivo do tabaco. Observando melhor,
510
LOPES, Gustavo Acioli. Negócio da Costa da Mina e comércio atlântico: Tabaco, açúcar, ouro e
tráfico de escravos: Pernambuco: (1654-1760). São Paulo: USP, 2008. Tese de Doutorado. p. 208.
511
PITA, Sebastião da Rocha. História da América Portuguesa. Ed. Senado Federal. Brasília, 2001. p.
111.
512
Segundo Érika Dias, em “As pessoas mais distintas em qualidade e negócio”: a Companhia de
Comércio e as relações políticas entre Pernambuco e a Coroa no último quartel de Setecentos, A praça
era já então a comunidade mercantil da cidade. Na primeira metade de Setecentos, o homem de negócio
era um comerciante interessado no negócio por grosso à longa distância, enquanto os “negociantes” eram
aqueles que vendiam por miúdo. (Apud, 2014, p.10). DIAS, Érika Simone de Almeida Carlos. “As
pessoas mais distintas em qualidade e negócio”: a Companhia de Comércio e as relações políticas
entre Pernambuco e a Coroa no último quartel de Setecentos. Lisboa, Portugal. 2014. 587 p. Tese
(Doutorado) em História, especialidade em História dos Descobrimentos e da Expansão Portuguesa.
Lisboa, Portugal. 2014.
513
A falta de recursos políticos e financeiros foram dois de alguns motivos da precariedade de
Pernambuco, incluí Alagoas, já que boa parte da renda das Superintendências provinha das taxas que
vinham do fumo, e havia muito imposto sobre ele em Pernambuco, por isso que a produção era deficiente.
Com isso, os fumageiros de São Miguel e Poxim vendiam as arrobas de tabaco para Bahia, já que o
Poxim está na rota do caminho real para Salvador.
514
LOPES, Gustavo Acioli. Negócio da Costa da Mina e comércio atlântico: Tabaco, açúcar, ouro e
tráfico de escravos: Pernambuco: (1654-1760). São Paulo: USP, 2008. Tese de Doutorado. p. 221.
122
notamos a grande extensão da plantação da “erva santa” entre Pernambuco e Alagoas,
onde boa parte da produção da Capitania de Pernambuco está na Comarca de Alagoas, e
Bahia.
MAPA 11 - POSIÇÃO DAS ÁREAS EM QUE SE PLANTAVA FUMO NO BRASIL NO
FINAL DO SÉCULO XVIII515
FONTE: NARDI, 1996. p. 49.
Com o tabaco geralmente se fazia troca ou resgate por escravos sem a figura de
moeda. Esses escravos que chegavam de Salvador seguiam rumo as Minas Gerais para o
trabalho na extração do ouro516 e outra parte do contingente humano era distribuída para
Penedo, Poxim, Jequiá da Praia, Alagoas do Sul, Porto Calvo, Recife e Paraíba. A
515
NARDI, Jean Baptiste. O fumo brasileiro no período colonial. Lavoura, Comércio e Administração.
São Paulo: Brasiliense, 1996. p. 49.
516
Com a queda da produção aurífera, lá por volta de 1757, o fumo ampliou-se nas Minas Gerais e
passou a sustentar a economia mineira. Ver NARDI, Jean Baptiste. O fumo brasileiro no período
colonial. Lavoura, Comércio e Administração. São Paulo: Brasiliense, 1996. p. 46.
123
mesma dinâmica se dava com o tabaco e o açúcar que saíam de Alagoas até chegar à
Paraíba para fazer negócio com a Costa da Mina e Angola.
fornecerem maior comercio, consumo, e preço, e menos gravame de
subcidios [...]. Emquanto a distançia não sem duvida ser muito mais perto da
dita Vila a Pernambuco do que a esta Cidade para onde há de Verão melhor
monção a resp.o dos Ventos e agoas que Correm para o Sul, de alguns annos
a esta parte se conserva reciproco tracto entre os homens de negocio desta
praça, e os moradores daquela Villa com a dependencia de Largas Contas
[...].517
A parte da produção do tabaco que seguia ao Recife518 através das sumacas
percorria os “rios do açúcar”, arrobas e mais arrobas do tabaco e tudo era registrado
assim com as embarcações, os comerciantes, o destino e a quantidade da carga que
saíam da região de Penedo, Vila Real de São José do Poxim, Vila de São Miguel e a
Vila de Santa Maria Magdalena da Alagoas do Sul. Como nos registros de 1717, em que
dizia que
neste Armazem519 onde se costuma recolher [o tabaco], entrarão somente
[4.500 arroba], q a mayor parte dellas mandarão vir os homens de negocio q
tem embarcaçõens para Costa da Mina, de fora desta Capita.nia, como foy de
Sam Miguel Villa das Alagoas e do Rio de Sam Francisco [...].520
Olinda e Recife não estavam satisfeitas com a perda do tabaco que saía de
Alagoas521 para Salvador e Paraíba, já que os produtores de Alagoas passaram a ter
autorização522 através de uma concessão Régia523 de mandar o produto sem seu
517
LOPES, Gustavo Acioli. Negócio da Costa da Mina e comércio atlântico: Tabaco, açúcar, ouro e
tráfico de escravos: Pernambuco: (1654-1760). 2008, p. 142.
518
As arrobas de fumo eram destinadas, tanto à Costa da Mina quanto a Lisboa. Ver. NARDI, Jean
Baptiste. O fumo brasileiro no período colonial. Lavoura, Comércio e Administração. São Paulo:
Brasiliense, 1996. p. 49.
519
Segundo Nardi, em O fumo brasileiro no período colonial. Lavoura, Comércio e Administração,
antes do fumo seguir o destino de seus compradores eles ficavam em trapiches, no caso do fumo
fabricado em São Miguel e Poxim ficavam em um próximo ao Rio São Francisco, de mesmo nome, mas
não conseguimos identificar esse local. p. 97.
520
LOPES, Gustavo Acioli. Negócio da Costa da Mina e comércio atlântico: Tabaco, açúcar, ouro e
tráfico de escravos: Pernambuco: (1654-1760). 2008, p. 147.
521
Desde do fim do século XVII, o tabaco que era produzido em Penedo, São Miguel e adjacências, aqui
temos o Poxim, enviava o produto para Pernambuco para ser comercializado nas grandes casas
comerciais em Portugal. Com isso, em 1662 Olinda passa a taxar o produto que saía de Alagoas, o que
causou problemas econômicos para esses produtores e foi a partir daí que o tabaco alagoano passou a ser
vendidos para Salvador.
522
Segundo Lopes, os produtores de Alagoas receberam autorização para mandarem seu tabaco para a
Bahia, sem precisar enviá-lo ao Recife. DO OUVID.or Geral de Pernambuco. Pernambuco, 20 de maio de
1714. TT, JT, Maço 97-A, Caixa 85. Apud. LOPES, Gustavo Acioli. Negócio da Costa da Mina e
124
consentimento em 20 de maio de 1714. Para os comerciantes nas vilas de São Miguel e
freguesia do Poxim, Salvador era o melhor destino do tabaco produzido em suas áreas,
pois além dos preços serem menores, como já foi citado, era mais perto, e o custo do
frete dos produtos sairia mais barato. Nesse sentido, o mapa abaixo identifica os três
maiores produtores de fumo de Alagoas. Fumo esse que seguia rumo a Bahia para ser
vendido no comércio europeu, africano e asiático na Carreira da Índia524.
MAPA 12 - POSIÇÃO DAS ÁREAS EM QUE SE PLANTAVA FUMO EM ALAGOAS
NO FINAL DO SÉCULO XVIII525
FONTE: RIBEIRO JÚNIOR, 1976. p. 64 e 65.
comércio atlântico: Tabaco, açúcar, ouro e tráfico de escravos: Pernambuco: (1654-1760). 2008, p.
123.
523
Os produtores de Alagoas receberam autorização para mandarem seu tabaco para a Bahia, sem
precisar enviá-lo ao Recife. DO OUVID.or Geral de Pernambuco. Pernambuco, 20 de maio de 1714. TT,
JT, Maço 97-A, Caixa 85. (Apud, 2008, p. 123). LOPES, Gustavo Acioli. Negócio da Costa da Mina e
comércio atlântico: Tabaco, açúcar, ouro e tráfico de escravos: Pernambuco: (1654-1760). 2008.
524
Segundo Roberto Lapa, o porto de Salvador era ponto de parada dos navios que se dirigiam ao Oriente
a partir do século XVI, e parte dessas paradas seriam feitas de formas ilegais, e esse comércio ilegal só
era possível graças a seu bom ancoradouro e seu fácil acesso, para abastecimento e refresco dos navios.
Lapa passa a chamar o porto da Bahia de pulmão do Brasil. LAPA, José Roberto do Amaral. A Bahia e a
Carreira da Índia. Ed. Facsimiliada. Soa Paulo: Hucitec; Unicamp, 2000. p. 2.
525
RIBEIRO JÚNIOR, José. Colonização e Monopólio no Nordeste do Brasileiro. A Companhia
Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba. São Paulo: HUCITEC, 1976. p. 46, 47 e 68.
125
Segundo Ribeiro Júnior526, o alvará de 20 de novembro de 1753527 reforça vários
parágrafos referentes ao frete dos dois produtos – açúcar e tabaco528 - como mola
propulsora da economia de exportação do Brasil, e não é à toa que os navios carregados
de fumo529 tinham prioridades para seu embarque e desembarque nos portos e translado
dos produtos, tanto na colônia quanto na metrópole. Três anos depois em 1756530, a
Provisão Régia de 30 de março autorizava eleições de 2 profissionais avaliadores de
ambos os produtos, que eram eleitos em uma assembleia de 12 comerciantes (6 de
açúcar e 6 de tabaco) para verificar a qualidade dos produtos e depois fixarem os preços.
Essa verificação ajudava na conclusão do valor do escravo e o que nos permite
concluir: 1) o preço do escravo africano estava fixado por provisão régia em
160$000 réis cada; 2) chegado um carregamento da Costa da Mina (em 1702)
os lavadores e criadores de gado, recusaram-se a comprá-los por aquele
preço; 3) a Câmara, para não causar transtornos e embaraços ao tráfico,
ordenou a venda dos escravos em hasta pública 531 e através dela sucessivos
lances, atingiram o preço de 180$000. Em presença do facto o Rei considerou
razoável, e manteve, o preço, de 160$000.532
Segundo Lemos, na segunda metade do século XIX, já no Segundo Reinado, o
valor médio do escravo no Poxim e Coruripe, em 1850, era de “600 mil réis, variando
526
Idem. 1976. p. 47.
TEIXEIRA SOARES, Álvaro. O Marquês de Pombal. Brasília. Ed. Universidade de Brasília, 1983.
p, 171.
528
Segundo Ana Emilia Stanben, a Capitania de Pernambuco cultivava fumo em quase todos os lugares,
principalmente em Alagoas na região do Baixo São Francisco (destacamos aqui o Poxim e São Miguel) e
nas povoações de Porto Calvo, Una, Serinhaém, Cabo de Santo Agostinho. Como podemos notar no
mapa acima. STABEN. Ana Emilia. Negócios de escravos. O comércio de cativos entre a Costa da
Mina e a Capitania de Pernambuco (1701 - 1759). Curitiba, 2008. Recife, 121 p. Dissertação
(Mestrado) – UFPR. p. 45.
527
529
Os mesmos navios que saíam com o tabaco voltavam com escravos africanos. Mais tarde, a
Companhia Geral de Comércio de Pernambuco e Paraíba passa a controlar esse comércio, em que a
remuneração correspondia 18 até 40% do capital em cima do produto. Por outro lado, antes da criação da
Companhia já havia um interesse da Coroa em limitar os números de navios para Costa da Mina, isso em
1743. Havia até sorteios de navios para efeito de largada em turno. Ver CARREIRA, Antônio. AS
Companhias Pombalinas de Navegação. Comércio e Tráfico de Escravos entre a Costa Africana e o
Nordeste Brasileiro. Editora: Centro de Estudos da Guiné Portuguesa, porto,1969. p. 243, 244 e 248.
530
Em 15 de julho de 1756, o conde dos Arcos, D. Marcos de Noronha, vice-rei e governador-geral do
Estado do Brasil, escreve ao rei, D. José, sobre o registo na Mesa da Inspeção, nos da Mesa dos Negócios
e do Senado da Câmara da ordem para cassar e anular quaisquer compras e vendas e arrematações de
açúcares e tabacos por preços menores. A Mesa também tinha poder de fiscalização e de controle de
qualidade, pesos dos rolos, carregamento e agilidade no envio do fumo. AHU-Bahia, cx.136, doc.40.
AHU_ACL_CU_005, cx.128, D.10019.
531
THOMPSON, Edward Palmer. Costumes em comum – Estados sobre cultura popular tradicional.
São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
532
CARREIRA, Antônio. As Companhias Pombalinas de Navegação. Comércio e Tráfico de
Escravos entre a Costa Africana e o Nordeste Brasileiro. Editora: Centro de Estudos da Guiné
Portuguesa, porto,1969. p. 246.
126
entre 1.300$000 a 200$000, com crianças de um seis meses pelo preço de 50$000
chegando até 100$000” 533. Mas graças ao “fumo e a Costa da Mina recebemos 24,1%
dos escravos do Brasil entre os quais 21,5% introduzidos pela Bahia e 2,6% por
Pernambuco, isso entre os anos de 1701 a 1800”534.
Levando-se em consideração esses aspectos, concluímos e concordamos com
Schwartz em que os produtos tropicais, como o tabaco, eram responsáveis por um
número expressivo dentro do superávit colonial, que variava de 36% a 50%535. Esses
números nos possibilitam ter o conhecimento do comércio do fumo que havia entre a
colônia a Costa da Mina e das reformas pombalinas e suas funções econômicas, ou seja,
aqui alcançamos os princípios políticos e econômicos desse período.
3.2 A PRODUÇÃO DE FARINHA DE MANDIOCA NO POXIM
A farinha de mandioca536 foi o grande produto a ser exportado do Poxim, a qual
mantinha grande parte da produção colonial, uma vez que quase toda a farinha 537 que
circulava em Alagoas, parte de Pernambuco e Bahia era produzida na vila de São José.
Até mesmo na vila de Penedo que necessitava de um grande contingente de pessoas
para trabalhar com o gado e manter tropas militares na região à serviço da coroa,
recorria-se a farinha de mandioca produzida no Poxim, “por ser de fácil
armazenamento e conservar-se bem durante longo período de tempo”538.
Segundo Caio Prado, desde longas datas que havia uma preocupação com a
533
LEMOS, João Ribeiro. Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições. Maceió. Ed. Do autor,
1999. p. 88.
534
NARDI, Jean Baptiste. O fumo brasileiro no período colonial. Lavoura, Comércio e Administração.
São Paulo: Brasiliense, 1996. p. 39.
535
Contudo, mesmo com a exportação desses produtos e da exploração do ouro, o açúcar sempre foi o
lastro econômico do Brasil colonial. Ver. SCHWARTZ, Stuart B. Segredos Internos. Engenhos e
escravos na sociedade colonial. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. p. 167.
536
A farinha de mandioca não era considerada como produto comercial e sim como um mantimento
(alimento básico de marinheiros, homens livre e da escravaria). Ela era conhecida no Brasil como “pau da
terra” em Portugal “de pau”. Ressalto aqui, que na segunda metade do século XVII já havia registros de
plantações de mandioca ao longo das estradas percorridas pelas caravanas de escravos do interior de
Angola até os portos do litoral. SOARES, Mariza de Carvalho. Engenho sim, de açúcar não. O engenho
de farinha de Frans Post. Belo Horizonte, vol. 25, n 1, p. 61-83, jan /jun 2009.
537
Ofício que dirigiu a Câmara do Penedo a Câmara do Poxim, comunicando que força estacionada em
Vila Nova apreendera toda farinha, e um oficial comissionado pelo Governo Interino das Alagoas. 15 de
abril de 1817. IHGAL. Documento – 001680 – 21 – 03 – 26. Anexo XVI.
538
SILVA, Paula Pinto e. Farinha, feijão e carne-seca. Um tripé no Brasil colonial. Editora Senac, São
Paulo, 2005. p. 85.
127
cultura alimentar da colônia não é à toa que o alvará de 25 de fevereiro de 1688
mandava que os lavradores de cana plantassem pelo menos quinhentas cova de
mandioca para cada escravo de serviço539. O mesmo autor relata que em 1701, os
comerciantes de escravos540, tinham suas próprias roças para sua tripulação. A
importância desse tubérculo vem desde tempo dos holandeses. Barléus destaca bem a
importância desse produto quando escreve que
“o alimento dos naturais é a farinha, frutos vários e hortaliças. Preparam
aquela com as raízes da mandioca. Esta apresenta ramos de nove folhas
alternas, semelhantes ao cinco-em-rama ou pentafilão, à maneira de dedos.
Não dá flores nem sementes. O caule lenhoso deita varas lenhosas. Em
montezinhos de terra de 3 ou 4 pés de diâmetro, metem-se três ou quatro
pedaços destas varas, deixando-se fora da terra até o meio. Formam-se e
distribuem-se esses montinhos por espaçosíssimos campos. Estas varas
lançam raízes debaixo do solo, das quais nascem e se multiplicam
ramificações subterrâneas e radiciformes, da grossura de um braço, e às vezes
de um côvado de comprimento conforme a qualidade do terreno. As raízes
que os holandeses chamam doces, posto de grossura diferente da mandioca,
botam, fora da terra, em 2 ou 3 rebentos, os quais, tornando-se lenhosos no
oitavo, décimo ou duodécimo mês, servem de semente. A mandioca difere
das nossas plantas só nisto: nada sai do fruto da mandioca para a sua
propagação, e nas nossas o fruto é que gera as sementes, pelas quais se
reproduzem. É a mandioca um alimento bastante forte e mais agradável do
que o pão para os portugueses, índios e negros e até para os nossos
soldados”.541
No momento da dominação holandesa no século XVII, Nassau acreditava que
era necessário combinar o cultivo da cana-de-açúcar com essa atividade agrícola – a
farinha de mandioca542 ou “farinha de guerra”543 - que “servia de sustento aos cativos,
539
PRADO Jr., C. Formação do Brasil Contemporâneo: colônia. 7ª ed. São Paulo: Companhia das
Letras, 2017. p. 171.
540
Segundo Jayme Rodrigues, a presença da farinha era essencial no tráfico de escravos e na subsistência
das populações africanas ao sul do Saara e também nas longas viagens marítimas entre os domínios
portugueses, sendo encontrada inclusive nos navios da Carreira da Índia. Ver RODRIGUES, Jaime. “De
farinha, bendito seja Deus, estamos por agora muito bem”: uma história da mandioca em
perspectiva atlântica. Rev. Bras. Hist. [online]. 2017, vol.37, n.75, pp.69-95. Epub Sep 11, 2017. ISSN
0102-0188. http://dx.doi.org/10.1590/1806-93472017v37n75-03. p. 84 e 85.
541
BARLAEUS, Gaspar. História dos feitos recentemente praticados durante oito anos no Brasil.
Prefácio de José Antônio Gonsalves de Mello. Tradução Cláudio Brandão. Recife: Editora Fundação de
Cultura do Recife,1980. p.162.
542
DIEGUES JÚNIOR, Manuel. População e açúcar no nordeste do Brasil. Maceió: Edufal, 2012. p.
130 e 131.
543
ALENCASTRO, Luiz Felipe de. O trato dos viventes: formação do Brasil no Atlântico sul, séculos
XVI e XVII. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. p. 92.
128
aos soldados e ao tráfico544 terrestre, fluvial e marítimo”545. Esse fato mostra a
importância econômica e social do Poxim para a região do vale do São Francisco e
manutenção dos conflitos bélicos na colônia546. Vejamos no documento abaixo;
Ilustríssimos Senhores, membros do nobre Senado da Vila real de São José
do Poxim. No dia 11 do presente mês, acabamos de receber uns editais
mandados pelo ilustríssimo Govenador da Bahia que nos informa que as
tropas da mesma cidade do Salvador passarão por esta Vila do Poxim com a
finalidade de firmar as bases do domínio e poder por essas vias e caminhos
do nosso Augusto Soberano para estabelecer a soberania real nessa região do
Sr. Dom Joao VI. É de nosso dever procurar fornecer com todo empenho
possível ao comando e ás tropas o alojamento e alimentação para essas
tropas. Sabemos da necessidade publica em que encontra esta Vila do Poxim
por falta de farinha e demais mantimentos. Rogamos a Vossa Magnificência
que em nome de sua Majestade, fidelíssimo Dom Joao VI.547
Em outras palavras, o Poxim e o vale do seu rio muito próspero produziram além
do açúcar outros produtos comercializados na época, e bem conhecidos na atualidade,
como é o caso da farinha de mandioca, que tanto sustentava a população548, tropas
militares, como já foi citado anteriormente quanto “os fazendeiros como seus escravos
comiam a mesma comida, da mesma maneira: o feijão cozido e servido com seu caldo
ralo, umedecendo a farinha”549, já que era na hora das refeições em que as classes
sociais distintas “se igualavam, e somente nesse sentido, branco, índios e negros”550
tornavam-se próximos. A exemplo disso, temos o oficio da Câmara de Penedo551
pedindo autorização à Câmara do Poxim para retirar a quantia de
RODRIGUES, Jaime. “De farinha, bendito seja Deus, estamos por agora muito bem”: uma
história da mandioca em perspectiva atlântica. Rev. Bras. Hist. [online]. 2017, vol.37, n.75, pp.69-95.
Epub Sep 11, 2017. ISSN 0102-0188. http://dx.doi.org/10.1590/1806-93472017v37n75-03. p. 69.
545
Idem. p. 94.
546
NASSAU, Maurício et. al. Breve discurso sobre o Estado das quatro capitanias conquistadas, de
Pernambuco, Itamaracá, Paraíba e Rio Grande, situadas na parte setentrional do Brasil. (1638).
In.: MELLO, José Antônio Gonçalves de. Fontes para o Brasil Holandês – a economia açucareira.
Recife: Companhia Editora de Pernambuco, 1981. p. 81.
547
IHGAL. Documento – 939 – 21 – 03 - 22 - Auto de Veneração em que houve adjuntamente das
repúblicas desta Vila, do Penedo, de 12 de abril de 1817. Anexo XVII.
548
DIEGUES JÚNIOR, Manuel. População e açúcar no nordeste do Brasil. Maceió: Edufal, 2012. p.
127.
549
SILVA, Paula Pinto e. Farinha, feijão e carne-seca. Um tripé no Brasil colonial. Editora Senac, São
Paulo, 2005. p. 32.
550
SILVA, Paula Pinto e. Farinha, feijão e carne-seca. Um tripé no Brasil colonial. Editora Senac, São
Paulo, 2005. p. 56.
551
Ofício que dirigiu a Câmara do Penedo a Câmara do Poxim, pedindo-lhe farinha para as tropas. 12 de
abril de 1817. IHGAL. Documento – 001676 – 21 – 03 – 22. Anexo XVIII.
544
129
duzentos alqueires de farinha desta embarcação que se acha ancorada no
Porto de Coruripe. Este Senado do Poxim fica sendo obrigado a responder
pelos impostos da mesma farinha ao fisco real. Para este fim, o alferes
Manoel Jose Gomes irá tratar das condições fiscais dessa mesma farinha.
Esperamos que pela fidelidade de Vossa Magnificência ao nosso Augusto
Soberano, não pouparão meio algum de prestar atendimento para o bom êxito
deste presente objeto.552
Essa quantidade de farinha553 era para poder manter a Tropa Real, que vinha da
Bahia e iria ficar alojada no Poxim. A Vila Real de São José do Poxim foi um celeiro de
desenvolvimento de tal produto e um grande engenho de açúcar e, consequentemente
toda a estrutura comercial necessária da época.
A produção de farinha de mandioca no Brasil em larga escala para a época teve
início com os jesuítas dentro das catequeses indígenas. A farinha de mandioca é um dos
produtos mais consumido no Brasil554 e foi a base alimentar da massa (habitantes mais
pobres, homens livres e escravos) no Brasil colonial, enquanto os mais ricos comiam o
trigo importado da Europa555, ela era sinal de distinção social556, porque era o alimento
que se podia plantar no quintal de casa por pessoas simples. Esse mantimento que não
tinha um valor comercial nos centros comerciais europeus só tinha valor para colônia, já
que era o alimento mais próximo da realidade econômica do povo. Antonil escreveu em
Cultura e Opulência do Brasil, que
alguns senhores dar aos escravos um dia em cada semana, para plantarem
para si, mandando algumas vezes com eles o feitor, para que se não
descuidem; e isto serve para que não padeçam fome nem cerquem cada dia a
casa de seu senhor, pedindo-lhe a ração de farinha. Porém, não lhes dar
farinha, nem dia para a plantarem, e querer que sirvam de sol a sol no partido,
de dia, e de noite com pouco descanso no engenho 557.
552
Idem.
Segundo Diegues Júnior, a importação da farinha sempre foi um comércio externo que havia entre as
capitanias. Ver DIEGUES JÚNIOR, Manuel. População e açúcar no nordeste do Brasil. Maceió:
Edufal, 2012. p. 127.
554
Segundo dados do Sebrae em 2012, apontam o Nordeste sendo o maior produtor (mais de 8 milhões
de toneladas e área colhida de 815 mil ha) de farinha de mandioca; em segundo lugar está a região Norte
(6,8 milhões de toneladas e área colhida de 468 milha). Em seguida estão as regiões Sul (5,9 milhões de
toneladas e área colhida de 283 mil ha), Sudeste (2,4 milhões de toneladas e área colhida de 135 milha) e
Centro-Oeste (1,4
milhões de toneladas e
área colhida de 84 milha). Ver
http://www.bibliotecas.sebrae.com.br/chronus/ARQUIVOS_CHRONUS/bds/bds.nsf/5936f2d444ba1079c
3aca02800150259/$File/4247.pdf
555
RODRIGUES, Jaime. “De farinha, bendito seja Deus, estamos por agora muito bem”: uma
história da mandioca em perspectiva atlântica. Rev. Bras. Hist. [online]. 2017, vol.37, n.75, pp.69-95.
Epub Sep 11, 2017. ISSN 0102-0188. http://dx.doi.org/10.1590/1806-93472017v37n75-03. p. 77 e 88.
556
Idem. p. 88.
557
ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil por suas drogas e Minas. 3. ed. Belo
Horizonte: Itatiaia/Edusp, 1982. p. 37.
553
130
Sabemos que a farinha de mandioca era sinal de distinção social, como já foi
citado, e também foi motivo de intriga entre o alferes Bento Rebelo Pereira e o exouvidor-geral de Alagoas João Vilela do Amaral (1717 a 1721) em maio de 1727. O
alferes, que também servia de almotação558, pedia que se tirasse a nova devassa contra
ele para averiguação e confirmação da sua inocência relativa ao conflito com o exouvidor-geral, e o mesmo seja posto em liberdade. O pedido foi registrado pelo
Conselho Ultramarino, em que a
informação do Ouvidor das Alagoas sefaz nottoria a inimizade que João
Villela do Amaral tinha como Suplicantepois dandose aque (…) contra outras
pessoas, o pronunciou a elle. Nem (…) ta para Vossa Magestade lhe negar a
graça que pretende o haver tirado a devaça o Juiz ordinário, e não o ditto
Ministro, porque sendo manifestado a inimizade, que com elle tinha
facilmente poderia conseguir que o Juiz ordinário continuas sea oppressão a
que elle havia dado principio. Persuadindo também muito o supplicante a sua
inocencia por se haver metido voluntariamente na prizão para mais
justamente procurar socorro na justiça de Vossa Magestade pelo que se faz
digno de que (…) que se sirva de ordenar ao Ouvidor das Alagoas, que tire
nova devaça deste cazo, e (…) a remeto à Relação da Bahia donde se acha o
livramento, e o (…) para ser por ella sentenceado, e quehavendo (…)
culpados proceda contra eles, na forma da Ley. Lisboa occidental 19 de
Mayo de 1727.559
A origem desse conflito ocorreu três anos antes, no ano de 1724, em São Miguel
(termo do Poxim) quando o alferes Bento Rebelo Pereira condenou Antônio Silva e
outras 6 pessoas (não são identificadas em documento) por desvio de farinha e peixe e
que as mesmas tinham o apoio do ex-ouvidor-geral. O documento dizia que,
os officiais da Câmara que servião no anno de 1724 que servindo de
almotação Bento Rebelo Pereira condenou a Antônio Silva e outras mais
pessoas das Povoações de S.Miguel e do Norte porque plantadores das
postulas da Câmaras na quantia de 26 (Unidade de medida) cada hu’ a saber
6 da alçada da Câmara e 20 do capítulo da correção que o Senhor e Doutor
Ouvidor-geral que então servia deixou por provimento e para sim fazerem os
despachos de hu’ que (…) dos autos carece do capítulo que deixou o dito
senhor doutor Ouvidor-geral (…) fiz a cerda das ditas condenações que deve
esta lançado no livro da correção (…) nos livros da Câmara dessa Villa. Por
assim seja servido mandar que o escrivão em cujo poder estiver provimento
lhe der por certidão em (…) dizem os súplicantes que apresentando a petição
ao escrivão da Câmara Ignácio Rabelo sobredito dúvida (…) passa-lhe a dita
certidão dando por desculpas não (…) o que se pede na petição o que
entendem o súplicantes (…) do sobreditos o erro dos súplicantes estes pedem
a Vós mercêr seja servido mandar (…).560
558
Pessoas responsável pela fiscalização de pesos e medidas e da taxação dos preços dos alimento.
AHU_ACL_CU_004, cx.1, D.45. Anexo XIX.
560
IHGAL. Documento – 01313 – 018 – 01 – 11. Anexo XX.
559
131
A produção de farinha de mandioca em Alagoas vem desde século XVII561,
declarando-se “um dos gêneros de primeira necessidade pública”562 pela Câmara
Municipal de Maceió, em 27 de fevereiro de 1845. A plantação de mandioca tornou-se a
principal lavoura no município do Poxim563, sendo plantada na mesma proporção, ao
lado da cana-de-açúcar. Segundo Moacir Santana, um alqueire de 50 litros custava em
média 7$0C0 rs em Alagoas o que se comparando a outros produtos produzidos em
Alagoas como o algodão, o preço médio de uma arroba correspondia a 6$979 rs, ou
seja, eram valores relativamente próximos. Contudo, no ano de 1827 foi realizado um
mapeamento organizado pelo capitão-mor José Leite Silva, sobre as atividades nas casas
de farinha564 de Alagoas para saber o quanto se produzia e quantas pessoas trabalhavam
nessa atividade e quais as condições dessas pessoas, e o
documento dá testemunho da existência de 37 Senhores de Engenho, 1.088
lavradores de mandioca, 348 "lavradores de lavoura", 333 jornaleiros, etc, e
refere-se taxativamente a 141 lavradores de canas, ao que tudo indica homens
livres, como os mencionados jornaleiros, que deviam eventualmente prestar
serviços à agro-indústria do açúcar.565
As casas de farinha também foram registradas566 pelo pintor holandês Frans Post
(1612-1680) em suas iconografias, no período da dominação holandesa no Nordeste
(1630-1654), destacando-se o momento histórico da Pax Nassoviano (1637–1644), no
século XVII. Não encontramos uma representação da mandioca na obra de Post, mas
representaram em tela as casas de farinha em alguns engenhos na região de Olinda e
percebemos a semelhança que há na fabricação da farinha de mandioca registrada por
Post com a fabricação que há no Poxim até os dias atuais. Vejamos as imagens abaixo;
561
Antes da presença portuguesa no Brasil a mandioca era um produto domesticado pelos índios e era
uma das bases alimentares, indispensáveis, para a alimentação indígena e luso-brasileira. SILVA, Paula
Pinto e. Farinha, feijão e carne-seca. Um tripé no Brasil colonial. Editora Senac, São Paulo, 2005. p.
26.
562
SANTANA, Moacir Medeiros de. Contribuição à história do Açúcar em Alagoas. Recife: Museu do
Açúcar. 1970. p. 188 e 189.
563
Idem. p. 111.
564
Segundo Mariza Soares, há uma certa confusão sobre o termo casa de farinha ou engenho de farinha,
já que existia engenhos de açúcar de cachaça e engenhos de farinha e que os senhores de engenho não
gostavam de serem conhecidos como produtores de farinha, mesmo que em muitos engenhos que
produziam o açúcar se produzia a farinha, pois os produtores de farinha não eram considerados parte da
aristocracia açucareira. Ver SOARES, Mariza de Carvalho. Engenho sim, de açúcar não. O engenho de
farinha de Frans Post. Belo Horizonte, vol. 25, n 1, p. 61-83, jan /jun 2009.
565
SANTANA, Moacir Medeiros de. Contribuição à história do Açúcar em Alagoas. Recife: Museu
do Açúcar. 1970. p. 149.
566
Segundo Certeu, cabe no corte histórico interpretações para se construir um presente diante do objeto
trabalhado. CERTEU, Michel de. A Escrita da História. Forense Universitária. Rio de Janeiro. 2006. p.
6.
132
PINTURAS 1 - DETALHE DO ENGENHO DE FARINHA – FRANS POST DE
1651.
FONTE: CORRÊA DO LAGO, 2006, p.128.
FIGURA 8 - DETALHE DO ENGENHO DE FARINHA NO POXIM E DA TELA DE
POST
FONTE: ROBSON WILLIAMS BARBOSA, SETEMBRO, 2006.
Observamos a semelhança que há entre a produção de farinha de mandioca na
iconografia do pintor flamengo para o fabrico de farinha no Poxim do século XX, dando
133
amostras de traços coloniais desde século o XVII. Notamos que não houve mudança no
formato do forno à lenha e, que se mantém circular, feito de barro (argila) e certamente
o produto não era mais feito apenas para a subsistência (o que não eliminou a
subsistência), mas sim produzido em escala comercial567. Atendo-nos um pouco mais,
podemos ver o uso da lenha para o preparo da farinha em ambas as imagens. O fabrico
da farinha no século XVII mostra que o passado é uma ficção do presente 568, e esse
passado está no modo de fazer a farinha no Poxim do século XX. Por outro lado, a
mandioca não foi alvo da atenção de Post, mas ganhou destaque no trabalho de seu
colega Albert Eckhout.
PINTURAS 2 - ALBERT ECKHOUT. ÓLEO REPRODUZINDO IMAGEM DA
MANDIOCA.
Fonte: CORRÊA DO LAGO, 2006, p.37.
RODRIGUES, Jaime. “De farinha, bendito seja Deus, estamos por agora muito bem”: uma
história da mandioca em perspectiva atlântica. Rev. Bras. Hist. [online]. 2017, vol.37, n.75, pp.69-95.
Epub Sep 11, 2017. ISSN 0102-0188. http://dx.doi.org/10.1590/1806-93472017v37n75-03. p. 78.
568
CERTEU, Michel de. A Escrita da História. Forense Universitária. Rio de Janeiro. 2006. p. 12.
567
134
Segundo Mariza Soares569, o trabalho do roçado da mandioca cabia às
mulheres570 e não era de responsabilidade dos homens como observamos na escrava
segurando um cesto na iconografia do pintor batavo e na moradora do Poxim,
segurando um cesto semelhante (imagens da página 130). Apontamos alguns fatores
para essa ausência: o primeiro dele refere-se à própria lavoura da cana, que necessitava
da mão de obra masculina, pois “no trabalho, feito em turmas, predominava o escravo
do sexo masculino”571. Os engenhos do Poxim, os escravos e escravas trabalhavam
juntos, tendo afazeres diferentes como o corte da cana e a moenda. O trabalho pesado
cabia aos homens, enquanto as mulheres amarravam a cana e selecionavam o açúcar e a
limpeza do mesmo. Havia engenhos que necessitavam de 100 escravos para a produção
de “8.000 arrobas (117600 kg); os médios, de 500 arrobas (7350 kg), empregavam 50
negros, e os menores abaixo de 3.000 arrobas, apenas 20 escravos na produção do
açúcar.”572
Segundo Paula Pinto e Silva, há um mito tupi que justifica a presença feminina
no cultivo agrícola da mandioca e na produção da farinha de mandioca. Nesse mito a
índia Maíra não conhece o fogo nem a mandioca. Tupã não somente concede aos
homens a raiz da mandioca, possibilitando a introdução da agricultura entre aqueles que
apenas comiam frutos silvestres, como também lhes apresenta a farinha de mandioca. O
menino prova e gosta, a mãe corre a plantar e a colher as raízes mostram que o roçado
era um trabalho das mulheres da tribo, já que os homens afiavam
o machado e mandam que derrube a mata sozinho. Varas de mandioca eram
amarradas num feixe que por si mesmo se dirigia para a roça. Os Tenetehara
fabricavam cestos de carregar que mandavam às roças para colher e trazer a
mandioca para a aldeia. Era proibido às mulheres ver essas operações. Como
isto lhes despertasse irrefreável curiosidade, várias mulheres combinaram
esconder-se um dia na mata para assistir à passagem dos cestos de carregar.
Quando os cestos passaram junto onde elas se escondiam, a mandioca
derramou-se pelo chão. Tupã lhes apareceu muito zangado e disse-lhes que
doravante as mulheres teriam que carregar a mandioca. deitar as raízes na
água. preparar a massa e torrá-la para fazer a farinha. Foi assim que as
569
SOARES, Mariza de Carvalho. Engenho sim, de açúcar não. O engenho de farinha de Frans Post.
Belo Horizonte, vol. 25, n 1, p. 61-83, jan /jun 2009.
570
Segundo Paula Pinto o cultivo da pelas mulheres mostrava uma aducação social, econômica e cultural
do alimento. SILVA, Paula Pinto e. Farinha, feijão e carne-seca. Um tripé no Brasil colonial. Editora
Senac, São Paulo, 2005. p. 88.
571
FARIA, Sheila de Castro. A Colônia em movimento. Fortuna e Família no Cotidiano Colonial.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998.
572
LEMOS, João Ribeiro. Coruripe: sua história, sua gente, suas instituições. Maceió. Ed. Do autor,
1999. p. 80.
135
mulheres aprenderam e foram obrigadas, desde então, a fabricar farinha para
suas famílias573.
Então, para a autora Paula Pinto e Silva, “a mandioca aparece como alimento de
um tempo mítico, plantada e colhida sozinha, carregada pelos próprios cestos”574
apoiados nas cinturas femininas575, como podemos notar na pintura 3 e na figura 9.
Entretanto, desperta a ira de Tupã que como vingança obriga as mulheres a carregá-la e
transformá-la em farinha.
PINTURA 3 - DETALHE DE OFICINA DE FARINHA (NEGRA SEGURANDO UM
CESTO) – FRANS POST DE 1651 E FIGURA 9 - MULHER SEGURANDO UM CESTO
DE FARINA NO POXIM
.
FONTE: CORRÊA DO
LAGO, 2006, p.128
FONTE: ROBSON
WILLIAMS BARBOSA,
SETEMBRO, 2006.
573
SILVA, Paula Pinto e. Farinha, feijão e carne-seca. Um tripé no Brasil colonial. Editora Senac, São
Paulo, 2005. p. 87.
574
Idem.
575
Segundo Marisa Soares, era impossível consumir a mandioca in natura devido às suas toxinas, então
ela era processada mecanicamente em oficinas onde se produz a chamada farinha de mandioca como
retrata Post na pintura “Engenho de farinha” de 1651, na página 131. Observamos que é uma cena de
escravos numa oficina de beneficiamento de mandioca para preparo de farinha. SOARES, Mariza de
Carvalho. Engenho sim, de açúcar não. O engenho de farinha de Frans Post. Belo Horizonte, vol. 25,
n 1, p. 61-83, jan /jun 2009.
136
Em uma outra descrição mais próxima de nosso tempo no trabalho da produção
de farinha de mandioca temos Manoel Marquez dos Santos, também conhecido como
seu Bé, e sua esposa Tereza (FIGURA 9 – Mulher da Direita) são produtores de farinha.
Ele nos diz576 que, desde criança, trabalha com os irmãos e a mãe na plantação de
mandioca e na produção de farinha de mandioca, imbira577 e na produção de carvão
(fazendo caeira). Manoel Marquez relata que o roçado era pesado e que ele e sua mãe
trabalhavam todos os dias para uns produtores de mandioca. Foi o seu cunhado que o
ensinou a fazer a farinha e a caeira desde garoto e com o dinheiro que recebia comprava
roupa e calçado.
FIGURA 10 – A FARINHA DO POXIM
FONTE: ROBSON WILLIAMS BARBOSA, SETEMBRO, 2006.
Em sua descrição a casa de farinha possuía forno, roda sentada, cuja produção de
mandioca dependia muito do tamanho da terra e da força do trabalhador que ele chama
de tarefas, cuja farinha é moída em Jequiá da Praia em uma casa de farinha de terceiros,
que ele paga R$ 1,5 (um real e cinquenta) por prensa e mais um litro de cada cuia de
576
Em entrevista no dia 7 de setembro de 2006, na Igreja de São José do Poxim, no Poxim, Coruripe.
Palha de imbira serve para fazer artesanato (cordas, cestos, abanador e outros) e muito utilizada até
hoje no Poxim. Ele afirma que conseguia fazer 300 peças de corda por semana trabalhando junto aos
irmãos.
577
137
farinha, que corresponde a 65 cuias de litro de farinha, levando 5 dias seguidos para a
fabricação da farinha. Ele explica que o trabalho era dividido entre ele e a esposa e que
a casa de farinha ficava com três sacas de farinha de 50 kg. Essa saca de farinha de 50
kg é vendida na região mesmo, para os mercadinhos e feiras no valor de 40 reais a saca.
Assim como seu Manoel Marquez dos Santos tinha a preocupação com a
produção da farinha, pois sabe ele que é através da farinha que vem seu sustento, a
Câmara de Alagoas tinha a mesma preocupação e por isso no dia 18 de junho 1828, é
outorgada uma inspeção nas plantações de mandioca de Alagoas
em comprimento da comição de que foi emcarega do no dia 18 do Mes de
Junho sobre as plantaçoins de mandioca; fasso ver a vossas senhorias que no
termo do Engenho Massaguera athe Camuripim e Ilha do porto termo da
minha Jurdição, eszaminando com todo o coudado a chei pouco mais ou
menos eszistirem secenta mil covas de mandiocas comederas e o que
reprezenta o estado dellas he de cre que as secenta mil covas se axão se
podres sem mister com o frio do rigorozo emverno e as cincoentas mil covas
que inda as concidero livre da prudidão contudo poderão pouco mais ou
menos crear (...) oitos sentos Alqueres de farinha visto as plantaçoins novas
das ditas mandiocas de Janeiro athe agora pude reavaliar pello tereno (...) em
que foram (...) em vinte mil covas e estas mesmas não eszistirão vinte mil
covas estas não estão seguras pois as veio muito abatidas pella frieza do
mesmo Inverno he verda deira a mesma Partipação. 578
Levando-se em consideração esses aspectos, notamos a importância da farinha
para o consumo de Alagoas e consequentemente seria uma preocupação de todos que
dependiam das lavouras da mandioca em todo o Brasil. Segundo Jayme Rodrigues, na
farinha de mandioca estava “a cultura de subsistência conjugada à questão da roça
escrava, história da alimentação, tráfico de escravos e história marítima”579 e que
“sobre nenhum outro gênero alimentício, exceto talvez a carne verde, há tanta
documentação”580.
578
Ofício ao Juiz Presidente e Senadores da Câmara da Vila das Alagoas sobre a inspeção da plantação de
mandioca. (…) 03 Jul. 1828. 01F. IGHAL. 00319 - 05 - 03 – 10. Anexo XVII.
579
RODRIGUES, Jaime. “De farinha, bendito seja Deus, estamos por agora muito bem”: uma
história da mandioca em perspectiva atlântica. Rev. Bras. Hist. [online]. 2017, vol.37, n.75, pp.69-95.
Epub Sep 11, 2017. ISSN 0102-0188. http://dx.doi.org/10.1590/1806-93472017v37n75-03. p. 21.
580
Idem.
138
4 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
O início do povoamento do Poxim e região circunvizinha data do século XVI,
deu-se em função da criação do gado vacum e a instalação dos engenhos de açúcar,
Jenipapo e Porção, na região no Poxim. O local surgiu lá pelos idos de 1600, com a
sesmaria de João da Rocha Vicente, como ponto de apoio para os viajantes que saíam de
Salvador e Sergipe Del Rey dinamizando o comércio da região que seguia em direção a
Penedo, Alagoas do Sul, Porto Calvo, Recife e Olinda sobre “os rios do açúcar”. O rio
Poxim era um desses “rio do açúcar” e também uma “estrada hídrica” para compor o
mercado fornecedor e consumidor de escravos, produtos usuais da terra e fonte de água
para o consumo de alimentos.
Mas seus limites geográficos só passou a ser registrado com a doação da
sesmaria, que ia do porto do francês (Marechal Deodoro) ao rio Coruripe, para Antônio
de Moura Castro dando origem ao Curato do Poxim e posteriormente a elevação à
freguesia do açúcar do Poxim junto com a edificação da matriz em 1717. Essa sesmaria
dedicou-se inicialmente ao lucrativo comércio de pau-brasil e mais tarde sofrendo
inúmeras extrações pelos franceses, que fixaram feitorias às margens do rio Coruripe,
Poxim e Jequiá e só foram expulsos de uma só vez da região em 1808.
A igreja de São José do Poxim com traços barroco traz em sua decoração em
madeira a assinatura dos escravos da região do Poxim, já que foram esses escravos que
esculpiram o altar-mor, o lavabo e construíram as casas, engenhos e outras edificações
como a igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, que foi construída com os
recursos financeiros da irmandade de Nossa senhora do Rosário. A origem da igreja de
São José está registrada na segunda metade do século XVIII, segundo uma data
registrada em um lavabo na sacristia que diz 1762. Existem, porém, dúvidas sobre esta
data: sendo assim, essa passaria a corresponder ao ano de 1717, e no seguinte ano, 1718,
seria proclamada sede da paróquia segundo consta no livro de tombo pelo bispo de
Olinda.
Fizemos aqui um breve relato das relações entre os livres, libertos e escravos
através da irmandade do Regimento de Milícias dos Homens Pardos que havia no
Poxim e da carta de alforria de Domingos, o escravo de mãe parda que ganhou a
139
liberdade por ser filho bastardo de seu senhor. Tanto a irmandade quanto o Regimento
de Milícias dos Homens Pardos tentaram se distingui socialmente em seu espaço
colonial, em outras palavras, ambos os grupos tentaram gerir sua inserção social em um
mundo colonial que não favorecia o “homem de cor”.
Como desenvolvimento econômico e populacional do Poxim está inserido no
contexto histórico do período Pombalino, que estava sobre a administração do primeiroministro de D. José I, Sebastião Carvalho e Melo, Marquês de Pombal, em pleno século
XVIII, o déspota esclarecido determinou a criação das Companhias Geral de comércio
de Pernambuco e Paraíba em 1759. Durante esse período, produtos como açúcar,
tabaco, farinha de mandioca e escravo foram produtos que passaram a está no controle
régio para evitar o contrabando e os descaminhos.
Essas mercadorias que circulavam no Poxim enchiam as praças de Recife,
Olinda e Salvador. Essa última tornou-se a melhor praça para o fumo que saia de São
Miguel e do Poxim, pois as taxas de impostos eram mais baratos, o que favorecia ao
contrabando. Todas essas mercadorias fluíam pelas “estradas líquidas” que uniam
Pernambuco e Bahia tanto através dos sertões quanto pelo litoral usando os rios Poxim,
Coruripe, Jequiá e São Miguel de forma legal e ilegal com o apoio dos portos que havia
na região do Poxim, que eram feitos de formas estratégicas e de um jeito que escapasse
do controle régio.
No passado a Vila Real de São José do Poxim, ou simplesmente Poxim, foi lugar
para todos os colonos e colonizados que lá viviam e lá passavam vindos do sul (Bahia) ou
ao norte (Olinda e Recife) do Brasil. Com isso, tentamos aqui nessa pesquisa buscar os
vestígios históricos da vila de São José, já que nenhuma pesquisa histórica conseguiu
desvendar o passado em sua totalidade, mas tentamos aqui preencher o vazio histórico sobre
o Poxim e seu termo.
Por isso, fizemos um levantamento de fontes e tentamos deixar mais claro a história
do Poxim através do cotidiano, das relações conflituosas e crescimento populacional,
comercial, político para entendermos o passado em um momento em que o dinamismo
econômico entre as capitanias de Pernambuco e da Bahia foi o grande pedestal do
sistema econômico, político e social de Alagoas.
140
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IHGAL. Documento – 00263 – 05 – 01 – 10. Junta do Governo Provincial da Vila das
Alagoas, Ofício do Governador das Alagoas à Câmara do Poxim para que informasse,
no prazo de 8 dias, se o administrador das matas, José de Mello Correia, servia
bem ao seu emprego ou se descuidava dos seus deveres. 31 Mar.1824. 02F. Obs: Oferta
do Dr. João Guilherme Pitta.
IGHAL. 00319 - 05 - 03 – 10. Ofício ao Juiz Presidente e Senadores da Câmara da Vila
das Alagoas sobre a inspeção da plantação de mandioca. (…) 03 Jul. 1828. 01F.
IGHAL. 00263 - 05 - 01 – 10. Junta do Governo Provincial da Vila das Alagoas,
Ofício do Governador das Alagoas á Câmara do Poxim para que informasse, no prazo
de 8 dias, se o administrador das matas, José de Mello Correia, servia bem ao seu
emprego ou se descuidava dos seus deveres. 31 Mar. 1824. 02F. Obs: Oferta do Dr.
João Guilherme Pitta.
149
Arquivo Público de Alagoas – APA
CAIXA 5048 - Documento: Tesouraria da Fazenda Em Maceió – Recebedoria desta
Cidade / Coletoria de Porto de Pedras, Poxim, São Miguel, Alagoas e Penedo Assunto:
Lançamento da Décima Adicional / Receita E Despesa/ Emolumentos / Empréstimo De
Órfão / Lançamento De Imposto De Fumo/ Multas/ Despesas Em Geral ANO: 184344/1851-52/1847-48/ 1872-73/1880-81/1896/ 1840-41
CAIXA 4918 - Documento: Estado de Alagoas – Tesouraria da Fazenda Assunto:
Livro de Despesa e Receita / Substituições de Notas / Coletoria das Alagoas / Coletoria
do Poxim Ano: 1845-1846 / 1850 / 1867 / 1884.
CAIXA 1038 - DOCUMENTO: Estado de alagoas – Tesouraria da Fazenda assunto:
Mapa populacional do Poxim ano: 1853. APA.
CAIXA 1038 - DOCUMENTO: Estado de alagoas – assunto: Diplomático Contrabando em Alagoas ano: 1831. APA.
CAIXA 2323 - DOCUMENTO: Estado de alagoas – assunto: Diplomático Contrabando em Alagoas ano: 1836. APA
CAIXA 2323 - DOCUMENTO: Estado de alagoas – assunto: Diplomático Contrabando em Alagoas ano: 1851. APA
Cartório de Imóveis de Jorge de Azevedo Castro - Coruripe
- Livros I e II.
Arquivo Histórico Ultramarino, Projeto Resgate
- Papéis Avulsos de Alagoas
AHU, Alagoas Avulsos, Cx.2, d. 107.
AHU, Alagoas Avulsos, Cx. 1, Documento 22, fl. 4. [16 de março de 1722].
- Papéis Avulsos de Pernambuco
AHU, Pernambuco Avulsos. Cx.18, D. 1792.
AHU-PERNAMBUCO. AHU_ACL_CU_004, Cx. 4, D. 300.
AHU_ACL_CU_004, Cx. 6, D. 445
AHU_ACL_CU_015, cx.133, D.10009.
ACL_CU_004, Cx. 2, D. 161.
150
AHU_ACL_CU_004, Cx. 3, D. 199.
AHU_ACL_CU_004, Cx. 5, D. 396.
AHU_ACL_CU_004, Cx. 7, D. 515.
AHU_ACL_CU_015, cx.126, D.9577.
AHU_ACL_CU_015, Cx.126, D. 9545.
AHU_ACL_CU_015, CX.126, D. 9540.
ACL_CU_004, Cx. 2, D. 161.
AHU, PE, CX. 127, d. 9656
AHU_ACL_CU_015, Cx. 178, D. 12472.
AHU_ACL_CU_004, cx.1, D.45.
AHU – PE Cx. 127, D. 9670.
AHU – PE Cx. 108, D. 8371.
AHU_ACL_CU_004, cx.3, D.250.
- Papéis Avulsos da Bahia
AHU-Bahia, cx.136, doc.40.
AHU_ACL_CU_005, cx.128, D.10019.
151
ANEXOS
ANEXO I
Carta do Ouvidor Geral da Comarca de Alagoas comunicando haver deferido o pedido de elevação de
vila da povoação do Poxim, em 8 de junho de 1799. IHGAL. Documento – 0065 – 02 – 02 – 10.
Senhores da Assembleia Legislativa Provincial Alagoas
Ao (…) de Negócios eclesiásticos Estatística
Os abaixo assignados proprietários, agricultores, negociantes a mais moradores
no município da Vila do Poxim comarca do senhor João de Anadia desta província,
tendo chegado no conhecimento de que alguns moradores da povoação de Coruripe
foram encaminhados a dirigir ou concorrer para que se designer a assembleia desta
província da sede da freguesia desta vista para aquela produção.
Vim muito solenemente protestar perante vós, contra tão injusta quão
devassazeada pretensão, como constaria aos grandes e gerais indesejos da mais
importante parte dos habitantes daquelas localidades. Representando contra uma
semelhante medida que não pode ter apoio na prudência, rectidão a justiça com que
constumas decretar os actos desta assembleia.
A Vila Real de São José do Poxim, senhores criada, desde o anno de 1799, é
freguesia para mais de uma anno, não podia na épocha actual espressar jamais em vez
de grangrear-lhea sua antiguidadea condição favorável, direto de serem atendidos os
veradeiro interesse de seus habitantes, ao contrário se pretendesse preteri-los.
A essas pretendida transferência, senhores appoiarão se a própria localidades do
povoado de Coruripe, para que se pretende lançar os vistos para necessidades mais
ampla da futura, se verá que não pode o dito povoado satisfazer pretensão de
engrandecimento algum por mas, pois que apenas contra com os pequenos recursos da
barra do rio que lhe da o nome, ao posso que Poxim ofference duas barras francas a
qualquer navegação do alto caitade, quais vão as de Jequiá, e principalmente a da
Pituba.
152
Se alguns melhoramentos effemenos offerece do presente o povoado do
Coruripe não só poderá avançar a que seja ellesdevidos senão a condições transitarias
que podemos a qualquer momento desapparecer, condições que não podem influir para
que se transfira a sede da freguesia da Vila do Poxim para aquele povoado.
Acrescer mais, senhores, que o povoado de Coruripe foi sempre muito bem
cusado na parte espositual por um digno sacerdote o reverendo Domingos Fueginoda
Silva Lema no caracter de capelão, e adjunctor da mesma freguesia, donde reverta que
ainda por esse todo não só reverta da pequena distancia do seo parócho.
E se essa necessidade é do ordem tal que se quer phantasear, converia melhor
que só desmembrasse da freguesia o povoado Coruripe, indo o município e freguesia do
Poxim ressarcir a perda dessa parte, mas que sobram a freguesia da cidade de São
Miguel, cujos parochos tem reconhecido lhes ser penoso curar certas extremidades de
território que ficarão a melhor a mais fácil alcance do parocho do Poxim ultimamente,
senhores, sobrão posições enfastiar-nos as prudentes razões o fundamentos que
aconselhão sobre estar infundada reclamação, não sendo devattende-se sufficiencia ao
tempo offerece a antiga Vila do Poxim que conta uma bella, espaçosa matriz, e uma
capella de Nossa Senhora do Rozario, ao passo que, incendiada a igreja de Coruripe,
apenas restam-lhe sua pequenas a quasi incidentes cujas a oração que não estão
proporções decentes de uma matriz.
Espresão, pois, os abaixos assignados dos princípios de justiça o rectirão desta
ilustre assembleia, que sejão tomadas na consideração que o caso pede os objetos da
presente representação que vós trazem.
E.A.A.Mcê
Manuel Lima Rocha Tavares, Francisco Lopes dos Santos Lima, José Tavares
dos Santos, Manoel Lima dos Santos XXX, Rodrigo Gomes, João de Deus Guimarães,
João Lopes dos Santos, Bellamino José Ramalho, José Maria (…), José Antônio (…),
João Manoel Soares, Manoel Soares, Manoel Antonio Soares, José Antonio Soares,
Manoel Antonio Brasílio, Antonio Manuel da Silva, João Baptista de Messias, Antonio
Manuel dos Santos, (…)Dos Santos Lima, Theodoro Soares Pinto, Monoel Antonio de
Lima, João Barboza Santos, Guilherme Rodrigues dos Santos Lago, Manoel das neves,
Joaquim ventura dos Anjos, Antonio de Barros Silva, Joaquim José Santana, Eustáquio
153
Marciano Costa Nunes, Manoel Rodrigues de (…), José Antonio da Costa Portella, José
Antonio da Costa, Airto Joaquim Nunes, Francisco de Antonio da Costa, Manoel Pedro
da Silva, José Francisco das Chagas, Manoel Ferminno da Silva, Manoel Fernandes de
Gomes dos Reis, Inocencio Rodrigues da Costa, Joaquim Nunes da Costa, José (…),
José Joaquim da Costa.
154
ANEXO II
Ilustrissimo Senhor Respondido à 10 Agosto de 1853
Transmitto a Vossa Senhoria o Mappa incluzo da população do Termo desta Villa, no
termo que por Vossa Senhoria ma foi determinado em officio do mêz de Desembro
próximo passado.
Deos Guarde a Vossa Senhoria por muitos annos. Delegacia de Policia do Termo do
Poxim 7 de Janeiro de 1853.
Ilustrissimo Senhor Doutor Francisco Xavier Paes Barretto, Chefe de Policia da Capital
de Maceio.
MAPPA DA POPULAÇÃO DO TERMO DA VILLA DE SÃO JOSE DO POXIM
Total dos Extrangeiros
Total da população
Freguezia
do
mesmo
nome
Extrangeiros
Total dos Escravos
Villa do
Poxim
Escravos
Total de Livres
Livres
2452
2775
722
598
5
,,
5227
1320
5
----
,,
,,
,,
,,
,,
,,
,,
,,
,,
,,
-----
-----
-----
-----
-----
-----
-----
-----
-----
6552
Homens Mulheres Homens Mulheres Homens
Mulheres
Soma
155
ANEXO III
Arquivo Histórico Ultramarino – AHU, Cx. 3, Documento 265 - 9 de Dezembro de
1797.
Carta de Bento Bandeira de Melo ao [Secretário de Estado da Marinha e Ultramar],
conde de Linhares, D. Rodrigo de Sousa Coutinho sobre a geografia, navegação,
comércio e produções de Alagoas e a conveniência de se criar governo independente do
de Pernambuco, à semelhança do que fez para a Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará.
Versão Adaptada
Ilustríssimo Excelentíssimo Senhor
Sendo bem constantes os grandes dezejos, que Vossa Excelência tem em
adiantar o incomparável, e extenso domínio do Brasil de que seus habitantes tem a
felicidade de serem fieis vassalos da Coroa Portuguesa, e que com muita maior razão
presentemente devem ser felicíssimos de baixo dos auspícios de um Príncipe, que nos
governa, e de um Ministro, que sábio e providamente nos destinou para a repartição do
novo continente: devemos todos unidos ser agradecidos aos bens, que se nos bem
prepara tão sabiamente pelo aumento da Agricultura, e por tudo o mais, que houver de
preciozo neste gentil e tribunal país, que possa fazer não só a felicidade dos seus
habitantes, mas também o aumento do Estado, e dos Reaes Tesouros.
Eu já tive a honra de aprezentar a Vossa Excelência algumas noticias
pertencentes a Capitania da Paraíba do Norte, e com especialidade das boas matas,
donde se pode tirar as maiores e melhores madeiras de construção, por ter sido
incarregado do exame delas, do aumento da Agricultura da mesma, das hervas, frutos e
raízes medicinais, assim como de toda a extensão da mesma Capitania, fiz outro papel
da qual se serviu Governador, nomeado para mesma Fernando Delgado Freyre, que o
apresentou a Sua Alteza, e a Vossa Excelencia, e se bem me lembra também em outro
papel de algumas ideas das Capitanias do Rio Grande, e do Ceará que ficam ao Norte da
Paraíba.
156
Como, porém vejo que Sua Alteza tanto se desvela no aumento dos Reais
Domínios Brasilienses, criando de novo o importante Governo na Capitania do Espírito
Santo, que para o futuro será, sem dúvida, um dos primeiros daqueles continentes; devo
também falar em outro igual continente de meu País que suposto não seja ignorado por
Vossa Excelencia não terá, contudo ideias adequadas para dele fazer húa tão digna e
igual Lembrança da que teve Sua Alteza com a Capitania do Espírito Santo. É,
Excelentíssimo Senhor, o lugar em que falo a Capitania das Alagoas, sujeita ao
Governador Geral de Pernambuco sem outro governo mais, que o de um Capitão Mor
nomeado pela câmara da cabeça da Comarca, e feito pelo General.
Dista da Capitania de Pernambuco por terra, sessenta léguas, ficando a dita capital
em oito graus, e quarenta minutos, fica a Alagoas no Sul na altura de nove graus, e
cinquenta, e cinco minutos. Tem várias barras, onde podem ir deste Reino Embarcações
com fazendas, e trazeram os effeitos da terra, e lembra-me, que no tempo em que
governou Pernambuco, o Capitão Manoel da Cunha e Menezes mandou aproximar um
Navio Holandês, que estava negociando na barra de Cururipe, que fica ao Sul das
Alagoas; e três léguas ao Norte desta barra há outra chamada de São Miguel, onde
entram grandes sumacas, que são do mesmo lote, que são as maiores bergantim, assim
como podem entrar maiores Embarcações na própria barra das Alagoas, e em distancia
desta mesma barra ao Norte duas léguas fica a enseada do Jaraguá, onde podem ancorar
grandes navios, e carregarem em maior incomodo, e alem destas barras nomeadas tem
outras na compreensão da Capitania, e comarca das Alagoas, que melhor se possam
escolher para carga dos efeitos, que produz com abundancia a dita Capitania, como seja,
açúcar pelos muitos Engenhos, que em si contém algodão, e outros muitos gêneros, que
é capaz de produzir aquele fertil, e dilatado terreno, além das preciosas madeiras, de que
hé abundantíssimo, como é constante e notório. A maior parte dos efeitos, e dos gêneros
desta Capitania são carregados, e vendidos na Cidade da Bahia de Todos os Santos com
grande risco, e prejuízo dos seus Agricultores; e poderá vir a ser muito florente, e de
grande comercio, e vantagem para o Estado, se se criar um novo Governo nas Alagoas,
que desempenha as obrigações, que Sua Majestade lhe confiar, indo os navios em
direitura deste Reino a um dos Portos daquele continente, e carregaram os seus efeitos, e
as madeiras, que lá se construíram para os Reais Arsenais.
157
É, como já disse, a Capitania das Alagoas, sujeita ao Governo Geral de
Pernambuco, assim que fique este deteriorado pode ser criado um Governador para as
Alagoas com tanta extensão do termo para o seu governo, quanta tem o Ouvidor e
Corregedor das mesmas Alagoas de baixo da sua jurisdição, tanto pela parte que confira
pelo Norte com a Ouvidoria, e comarca de Pernambuco, como pela parte do Sul com a
Bahia. Além de muitas Vilas, e lugares, que tem esta comarca das Alagoas, tem a
populosa Vila da já dita Alagoas, que é a Cabeça de Comarca, aonde pode rezidir o
Governador, e fora da capital de Pernambuco; e Paraíba, não há outra povoação nos
limites de Pernambuco, e de mais opulencia, do que seja esta Vila, e outra pertencente a
mesma Comarca das Alagoas chamada de Penedo, que fica a borda do grande Rio de
São Francisco, que é assaz rica, e de grande comercio pela comunicação que tem pelo
mesmo Rio com os habitantes dos Sertões, e com as Minas, pois que delas tem a sua
origem o grande Rio das Velhas, que vem fazer barra com a de São Francisco, assim
como também nele desagua o Rio Pitangui, vindos ambos da parte do Sul deste Rio de
São Francisco
que pela sua grandeza hé conhecida pela barra do Pará, e deste Rio Pitangui, até os
brejais nascença do Rio de São Francisco fez diferença de setenta ate oitenta léguas,
como é constante, e o testemunha Frei Antônio da Silva Maria Jaboatão na Crônica que
compôs da sua Província do Brasil, dizendo que não é a sua vertente das serranias do
chile, como muitos afirmavam. O dito Rio de São Francisco terá com pouca diferença
quinhentas léguas de viagem, depois do Pará, ou Amazonas, e o da Prata, é sem duvida,
que se não tem descoberto no Brasil, outro maior, que este de São Francisco, por que
além da sua populosa nascença e de fazerem nele barra os ditos Rios, que vem de
Minas, fazem também nele barra ao Norte de Pernambuco, além de muitos de meros
nota, os Rios de Parmantú, de Pajahú, e que chamam corrente e faz barra junto ao
Santuário da Lagoa, ultimamente, nela também faz barra o chamado Rio Grande; e das
muitas, e grandes Ilhas, que tem o dito Rio e outras notáveis cousas, que não se
admiram, não tem faltado quem dê noticia. Este grande Rio é que divide o Governo de
Pernambuco com o da Bahia, e que pode servir de divisão ao governo das Alagoas pela
parte do Sul, e pelo Norte com a extensão, que der a Comarca das mesmas Alagoas. O
inumeravel povo, que tem esta comarca se pode coligir pelas Freguesias, porquanto a
Vila Freguesia da já dita Alagoas não há de ter menos de 15 almas, e outras tantas a
158
Freguesia, e Vila do Penedo e a proporção outras inumeráveis, e grandes Freguesias,
que em si contem a mesma comarca tanto a beira mar, como nos Sertões. No palmar
descrito das Alagoas tem uma Companhia de Soldados de Infantaria pagos, criada por
ocasião de um levante, que fizeram os Negros Zumbis, que o meu segundo avô materno
Luiz Lobo de Albertim os destruio, como consta do documento junto; já o novo
Governador, que for nomeado acha esta Companhia de Soldados para fazer dela uso no
que achar ser mais conveniente para o Real Serviço. O Rendimento dos Dizimos, que
produz cada uma das Freguesias da Comarca das Alagoas superarão muito bem e para
as despesas, e do Estado do Governo, que houver de se criar, e ainda para se fazer
algumas embarcações Reais, que sem dúvida serão de maior utilidade fazerem-se nas
mesmas Alagoas ou Enseada de Jaraguá do que na Bahia, ou em Pernambuco porquanto
as madeiras, com que a fazem as Reais Embarcações em uma, e outra parte, a maior
parte delas, e as maiores são remetidas das Alagoas, e fazendo-se nas mesmas Alagoas
as Reais Embarcações poupa-se as grandes despesas dos fretes, e outras muitas, e não
será o primeiro Estado, que se tem feito nas Alagoas, por quanto a Flor do Mar ou a
Porta lá foi feito, como outras desta estação. Enfim será de grande utilidade para os
habitantes daquele continente, se nele se criar um novo governo, porque tenham perto o
recurso para os seus danos, e havendo, embarcações, que comerciam de Lisboa para
aquele porto, não terão o incomodo de transportarem a maior parte de seus efeitos para a
Bahia, e ainda para Pernambuco, que pelo risco, e prejuízo, que experimentam não se
animam a fazerem maiores as plantações, produzindo com grande vantagem tudo
quanto se planta naquele continente, sendo a sua maior aplicação o açúcar, e as
plantações do algodão, ao mesmo tempo em que da boa qualidade da Terra se vê a
capacidade de produzir tudo mais. A Capitania das Alagoas foi da compreensão da
doação, que fez o Sereníssimo Senhor Rei D. João 3° ao Excelentíssimo Duarte Coelho
Pereira de cinquenta léguas de Costa, em Pernambuco do Rio de São Francisco ao Sul, e
de São Domingos, hoje conhecido por Igarassu ao Norte, que por lhe servirem estes
dois de seus limites veio a ter muito maior número de léguas por conta, e por terem
mais de noventa, e sem limite certo para os sertões, e embarcando-se o dito
Excelentíssimo Duarte Coelho de Lisboa para Pernambuco no anno de 1530 com sua
Família, e muitos dos seus Parentes por lá se estabeleceram, sendo primogênitos os
Donatários de Pernambuco, não tendo filho Duarte Coelho de Albuquerque sucedeu-lhe
seu Irmão Jorge de Albuquerque Coelho, o qual nasceu na cidade de Olinda a 23 de
159
Abril de 1539, e passando ao Reino acompanhou ao Senhor Rei D. Sebastião na infeliz
batalha de África, e restituído a Portugal casou duas vezes, e do segundo matrimonio
feito com a Excelentíssima Ilustríssima D. Anna de Alencar teve Excelentíssimo Duarte
de Albuquerque Coelho, quanto Donatário de Pernambuco e a dita Excelentíssima
Senhora era filha de D. Alvaro Coutinho Irmão do Excelentíssimo D. Francisco
Coitinho Conde do Redondo, e Vice Rei, que foi da Índia e nesse tempo foi
Pernambuco tomado pelos Holandeses, e passando a ele o seu Donatário em companhia
do Conde Barcelos onde assistia desde o ano de 1531 até o de 1538 aos mais arriscados
encontros, e batalhas, que toda a Capitania de Pernambuco apesar dos seus esforsos, e
das suas fadigas não pode conseguir a expulsão dos Holandeses; e voltando a Lisboa
casou-se com a Excelentíssima Senhora D. Joanna de Castro, filha do Excelentissimo D.
Diego de Castro Vice Rei que foi de Portugal, e Conde de Berto, e passando
ultimamente o domínio de Pernambuco a casa do Excelentíssimo Conde do Vimiozo,
que então em D. Miguel de Portugal por filha de sucessão, e por deverem os
pernambucanos sem maior auxilio lançado fora o pesado jugo, que sofreram por espaço
de 24 anos, que os Holandeses dominaram aquela Capitania, e que os Pernambucanos
pois entregaram ao seu Soberano, ficando ultimamente pertencendo a Coroa de
Portugal, aquela florente, e ainda pouco conhecida Capitania, que por todos os títulos,
como as mais da América, não deve Sua Alteza Real perder de vista o aumento dela, e
dos seus infelizes habitantes, mas sempre fieis vasalos, que eu por ser respeito não me
animo a fazer ver os seus merecimentos, e que são dignos das atenções do seu Príncipe,
e dos seus Ministros, tanto pela sua fidelidade, e amor, que lhe consagram, como pelos
seus nascimentos, que suposto a maior parte das Famílias tão distintas, como
descendentes do seu primeiro Donatário, e Parentes se achem abatidas pelo pouco, que
são olhados no Brasil os sujeitos de merecimentos pelos enviados, que só lanção mão de
seus entraves sem que se embarassem com os do Estado, e do Publico. Será, com efeito,
Senhor, um império o Reino de Portugal, se o seu Príncipe tiver sempre em vista, o que
tem de mais precioso nos seus domínios, como é o Estado do Brasil, e, no entanto farei
sempre o que der, como o mais humilde, fiel, e obediente súdito.
Lisboa, 8 de dezembro de 1797.
Bento Bandeira de Melo
160
ANEXO IV
ARQUIVO HISTORICO ULTRAMARINO
CONSELHO ULTRAMARINO
BRASIL - ALAGOAS
[ant. 1801, Fevereiro, 13, Alagoas]
[ant. 1801, Fevereiro, 13, Alagoas] REQUERIMENTO do padre Antonio Joaquim de
Carvalho e Couto ao principe regente [D. João] a pedir provisão de insinuação para
confirmacão da doação para seu patrimônio que the fez seu irmão, o alferes Francisco
Manuel de Carvalho e Couto morador no termo da Vila Real de São José de Poxim,
comarca de Alagoas, de quantia referida ao engenho Genipapo. Anexo: requerimento
como
escritura,
carta,
provisão, termos
e
lembrete.
AHU-PERNAMBUCO.
AHU_ACL_CU_004, Cx. 4, D. 300.
[ant. 1801, Fevereiro, 13, Alagoas] – página 1
Diz Antonio Joaquim de Carvalho e Couto que o Alferes Francisco Manoel de carvalho
e Couto morador nato da Villa Real de S. José do Poxim Comarca da Alagoas,
Capitania de Pernambuco que lhe fez a doação na escritura inclusa e cujo maior valor.
[ant. 1801, Fevereiro, 13, Alagoas] – página 2
Junta aos mais papéis haja vista
Senhor
Procurador da Fazenda (…)14
de maio de 1802.
Procedendo aos deligenciados da ley, achei, que o alferes Francisco Manuel de
Carvalho e Couto muito por seu gosto, como costa do summario (…) doara trezentos
mil reis em terras e (…) do engenho Genipapo, de que he senhor a seu irmão suplicante
Antonio Joaquim de Carvalho e Couto, para não (…), e em duzentos mil reis mais , que
(…) paterna em (…) engenho (…) patrimonio, com que se pretendese ordenar de
161
clerigo e fazendo avalias o referendo engenho em seu terreno por estarem pro (…) ao
doador lhe fez dado pelo lavrado valor o de (…) conto de reis.
He o que posso informar a Vossa Alteza, que Mandará; o que fez a Villa Real de São
José do Poxim 4 de novembro de 1801.
O Ouvidor Manoel Joaquim Pereira de Matos Castelo Branco
[ant. 1801, Fevereiro, 13, Alagoas] – página 3
Ilustrissímo Senhor
Senhor, diz Antonio Joaquim de Carvalho e Couto, que o Alferes Francisco Monoel de
carvalho e Couto, marador das terras da Villa Real de São José do Poxim, comarca de
Alagoas, Capitania de Pernambuco, lhe fez a descrição incerta na (…) incluza para cuja
maior validade, pede Vossa alteza Real a graça delle conceder provizão de insinuação
na forma do estillo, (…).
162
ANEXO V
CAIXA 4918 - DOCUMENTO: Estado de alagoas – Tesouraria da Fazenda assunto:
livro de despesa e receita / substituições de notas / coletoria das alagoas / coletoria de
poxim ano: 1845-1846 / 1850 / 1867 / 1884. APA.
O coletor da Villa do Poxim Ananias da Costa Nunes vai entregar na Thesouraria da
fazenda das Alagoas os rendimentos arrecadados pertencentes ao ano financeiro de
1845 a 1846. A saber
1845 a 1846
ILIQUIDO
PREMIO
LIQUIDO
25$600
56$000
1$800
83$400
6$400
14$000
$450
20$850
19$200
42$000
1$3500
62$550
- 450
Imposto sobre lojas …
Taixa de escravos …
Livro de bens de raiz …
E para constar em trabalho dos livros competentes. Colletania da Villa do Poxim – 28
de novembro de 1846.
O colletor
Ananias da Costa Nunes
O escrivão
José Simplício Santiago
Recebi do senhor Thesoureiro da Thesouraria da Fazenda a quantia de vinte mil
oitocentos e cinquanta reais (20$850000) em importância dos 25 por centos a mim, e a
meu, escrivão, pela arrecadação que fizemos de diversos imposto pertecentes ao anno
financeiro disso de 1845 a 1846, e de como recebi passei o presente. Colletoria da Villa
do Poxim 28 de novembro de 1846.
Ananias da Costa Nunes
Registro Geral 3º livro entre 1845 – 1846. Em 30 de novembro de 1846.
Registro 62$550
163
ANEXO VI
Ofício do Presidente da Câmara da Vila do Poxim determinando o cumprimento de Leis
referentes aos impostos sobre os escravos. Alagoas 20 de março de 1822. IHGAL.
Documento – 00415 – 7 – 1 – 4.
Fai se necessario que vós mercês cumprirão com a maior brevidade que ser fassa o
artigo 4 das Instruções de 13 de dezembro proximo processado ultimamente remettidas
a essa comarca para a execução do § 5º do artigo 5º da lei de 8 de outubro do mesmo
anno na arrecadação na taxa de 12 mil reis sobre os escravos enviado a este Governo o
preciso documento dos limites que marcaram para o lançamento e cobrança da referida
taxa nos termos do citado artigo.
Deos Guarde Vossa Mercês
Palacio do Governo das Alagôas em porto Calvo 20 de março de 1834
Vicente Pires de Camargo
Presidente da Comarca Municipal da Villa do Poxim
164
ANEXO VII
Ofício ao presidente da Câmara da Vila do Poxim comunicando haver José Alemão de
Sismeiros, arrematado o subsídio literário, referente a carne verde e aguardente (...), em
10 de maio de 1800. IHGA. Documento – 0066 – 02 – 03 - 1
Nessa Junta da real da fazenda arrematou José Alemão de Sismeiros os subsidios
literários de hum real por cada libra de carne de Vaca, ou boi fresco que se consome,
não se determinndo, pessoas, a excepção da que consome os credores dos gados; o de
dez reis por cada canada de agua ardente, que se fabrica ou entra de fora, sem mostrar
que pagou o mesmo subsidio donde sahira; e tendo fé obrigado esta junta, em nome do
Princípe Rgente Nosso senhor a presta-lhe todo o auxílio, e favor licito, para so verificar
a exata cobrança dos referidos subsidios Reais, applicados para hum objecto de tanto
interesse dos povos desta capitania, qual he a sua instrução e para que os dias constados
não tinha motivo de queixa, antes se amine continua no dito contrato, e a subir de preço
nas seguintes arrematação por tanto esta junta recomenda vossa mêrces que preste
sobredito contratados auxílios e providencias que lhe requeres; a bem de hu’a (…)
arrecadação dos mencionados subsidios em caso que seoffereça algum obstaculo q’ não
popa’s remover, o participem desta junta, para ella setomarem suas medidas que forem
mais efficazes: afim o espera essa junta do seo zelo pele Real serviço bem publico.
José Bispo de Paiva Brito
José Joaquim Nabuco de Araújo
165
ANEXO VIII
Offício aos Vereadores e Procurador da Camara da Vila do Poxim, pedindo informacões
sobre melhoramentos e reformas dessa Vila. Alagoas, 18ju1, 1822. IHGAL.
Documento – 00187 – 04 – 03 – 27.
Para bem desempenhar minhas funções como representante desta provícia de Alagoas
que pela eleição me acho revestido peço as Vossas Senhorias que me trasmitam as
instruções das quais preciso.
Informações sobre reforma e benfeitora desta Vila de São José do Poxim e quais as
outras providências que possam ser atendidas pelo Soberano Congresso Brasileiro.
Espero que Vossas Senhorias se dirijam no endereço do Rio de Janeiro o que por mim
foi solicitado.
Pedimos que estas requisições para o bem desta Vila do Poxim não sofram delongas e
cheguem às nossas mãos sem delongas.
Vila de Alagoas 18 de Julho de 1822
Caetano Lopes, deputado junto às Cortes do Brasil
166
ANEXO IX
ESCRAVOS AFRICANOS
Illustrissimo e Excelentissimo Senhor
Sendo do meu maior dever participar a Vossa Excelência dos acontecimentos
extraordinarios que tenhão lugar no meu Destricto, agora se me oferece occazião de o
fazer sobre hum de não pequena monta. Constou-me por notificis vagas, quue na noite
de 26 do Co[rrente] huma pequena Sumaca, quue nesse dia appareceu neste mar,
desembarcára nestas praias huma porção de Escravos Africanos, e julga-se, que passará
outra porção para uma Lanxinha, que de manhã se fazia ao mar, quando ja não
apparecia a dita Sumaca ignorando-se o destino dos Escravos desembarcados. Sahi
immediatamente com a gente que pude (…) tar, a correr o litoral do meu destricto, onde
não encontrei o minimo vestigio, que fizesse publico o negro crime nem os seus
perpetradores. Eis aqui Excelentissimo Senhor como os malvados, illudindo toda a
vigilancia das Auuthoridades, poem em pratica os mais horrorozos attentados. De Vossa
Excelência espero todas as Just[corroído] ções, para me saber derigir em semelhante
(…)
zo.
167
ANEXO X
O Porto do Francês, o qual servia no passado para contrabando de pau-brasil foi um
trampolim para invasores e na primeira metade do século XIX, tornou-se Alfândega da
Capitania de Alagoas. IHGAL. Documento – 00260 – 05 – 01 - 07 – Ofício à Câmara
do Poxim acerca da mudança da casa da Alfândega para o Porto do Francês. 21 de maio
de 1823.
Remetemos as Vossas Senhorias os requerimentos que dirigimos também ao nossos
deputados do congresso, vigente do Rio de Janeiro. Transmitimos as atuais
circunstancias de nosso pais e suas novidades. Vossas Senhorias tomaram ciência deles
a acrescentarão o que lhes parece útil, uma ves que nosso Augusto Imperador já
providenciou as mudanças que ele achou úteis fazer. Agora é chegada a participação
desta mudança da Casa da Alfândega para o porto do Francês que sua Majestade
Imperial e o caputão que teve tanto êxito no comando do porto ordenam que se faça
para o bem das vilas circunvizinhas cujas câmaras foram unânimes em aprovar a
medida.
Nosso sumo Imperador aprova e afirma este fato e exige que seja informado este
governo da província de Alagoas e todas as Vilas interessadas,
Deus guarde Vossas Senhorias
168
ANEXO XI
Ofício ao Presidente da Câmara da Vila de São José do Poxim, comunicando que
Portugal achava-se livre da invasão Francesa. Recife, 09 de dezembro de 1808. 01 F.
IHGAL. Documento – 0087 – 03 – 01 - 09
Com summo prazer participo Vossa mercês, que Portugal se acha evacuado dos tiranos
que tanto nos oprimirão, e restituido ao partenal Governo de sua Alteza real Nosso
Augusto Soberano.
Vos mercê por hum motivo de tanto alegria para os fieis portugueses farão ilunimar essa
Villa em três noites sucessecivas; mandarão publicar a proclamação que Lhe vem
remetter por copia, recebemos os donativos que cada hum volutariamente quizer se
oferecer os ques remetterão a junta da Fazenda desta capitania com relação individuais
dos que concorrerem para desejo do reino.
Deos os guarde Vossa mercês, Recife de pernambuco em 9 de dezembro de 1808.
Caetano Pinto de Miranda Montenegro
Senhores Oficiais da Camera
Villa de S. José do Poxim
169
ANEXO XII
CAIXA 1038 - DOCUMENTO: Estado de alagoas – assunto: Diplomático Contrabando em Alagoas ano: 1831. APA.
Contrabista (...) de Escravos a porta (...) das rigorozas averiguações que procedéra aos
Passaportes, as [ilegível] não obstante ter entrado em lastro, não se achou com tudo
materia para procedimento Judicial seja me pormettido levar igualmente à consideração
de Vossa Excelencia, que sendo vós publica que os mencionados Escravos foram
disembarcados de bordo d'este Brigue, na altura da Bahia, para aquella Sumaca, hé este
facto poderoza materia para hum legal procedimento judicial; pois do Contrario se
infringem as Leis, que tanto me cumpre pugnar pela sua religiosa observancia, na
qualidade de Empregado Publico, que dizem respeito à Nação Britanica, quanto a Vossa
Excelencia em as fazer cumprir.
Deos Guarde a Vossa Excelencia Muitos Anos
Maceio 19 de Novembro de 1831
Ilustrissimo e Excelentissimo Senhor Manoel Lobo de Miranda Henriques
Presidente da Provincia Maceió
[Assinatura] – Consul
170
ANEXO XIII
PONTAL DE CORURIPE
Tenho a honra de participar a Vossa Excelência, que sahi da Villa do Poxim as 8 horas
da noute do dia 10 do corrente, pelos motivos que espendí a Vossa Excelência em o
outro officio, e cheguei a Povoação de Coruripe a meia noute, e ahi me demorei té o dia
12, por me ter requisitado o Delegado, toda a minha força para capturar uns individuos
no lugar denominado Batel, e dest[a] deligencia rezultou a prizão de dous que
concorrerão para o desembarque dos Africanos que ultimamente chegarão. No dia 12 fiz
seguir o Senhor Cadete João Joaquim de Almeida Pinto, com as quinze praças para o
ponto do Peba, e eu segui para o Batel, e vi que o lugar não era proprio para o fim a que
veio este destacamente, pois que d’ahi não se avista um só ponto do mar, e para nos
collocarmos na praia fronteira que dista mais de um quarto de legua, ficavamos
expostos ao tempo; por isso me derigi para o Pontal de Coruripe, que fica meia legua ao
norte do Batel, não só por ter junto a praia onde nos abrigar, como por ser porto de
muitas jangadas, e [corroído] ahi se avistar toda a costa para o Sul até o Pontal Merim,
que tam bem é visto pelo destacamento do Peba. Não se tendo ainda concluido a barraca
para o destacamento de Pituba, por isso ainda se conserva na Barra do Jequiá o
destacamento, e em Pituba uma Guarda de quatro homens. No ponto em que me acho
nada tem occorrido, a não ser a entrada de um Hiate neste porto no dia 16 do corrente,
que foi immediatamente visitado, e não se encontrou Africanos nem indicios de se
empregar no trafico delles. Pela parte dada pelo commandante do ponto de Pituba,
consta ter ahi fundeado um Hiate no dia 13 do corrente que foi por elle e mais quatro
praças, vizitada immediatamente e nada encontrarão, que indicasse andar no trafico de
Africanos, e do officio que ultimamente recebo datado de 17 do corrente, consta ainda
estar o dito Hiate fundeado, e descarregando generos de commercio, e que passara ao
largo uma Sumaca no dia 16 do Sul para o Norte, o qual tambem passou nesse mesmo
dia pelo ponto e suponho ser o Brigue de Guerra que por aqui cruza. Da parte dada pelo
Commandante do ponto do Peba, consta ter por ali aparecido ao amanhecer do dia 1 do
corrente uma embarcação de trez mastro, a qual dezaparecia pelas trez horas da tarde.
Deos Guuarde a Vossa Excelência. Pontal do Coruripe 18 de Agosto de 1851
Illustrissimo Excelentissimo Senhor Doutor Manoel Sobral Pinto - Digno VicePresidente da Provincia das Alagôas.
Luiz Francisco Teixeira - 2º Tenente Comandante dos Portos do Peba, Pituba e Batel.
171
ANEXO XIV
Ontem me veio as mãos o officio de Vossa Excelência datado de 23 do corrente, e fico
sciente do quanto nelle Vossa Excelência me recommenda. Convindo de mais perto
providenciar sobre a exploração das mattas onde se suppõe ainda que e existe parte do
contrabando de Africanos, derigir me a esta Villa, e para aqui marchou parte da Força
que estava na Villa do Poxim, reunindo-a com a que aqui se achava, devidi-a; parte para
explorar as mattas das Alagôas, e parte para as do Engenho da Ilha, deixando na Villa
do Poxim 16 praças sob o commando do Alferes Acacio para explorar as mattas do
Poxim-Grande, que se estendem até as do Engenho da Ilha. Devendo contar com a
coadjuvação de pessoas praticas, que já estavão de antemão dispostas para servir de
guia, e auxiliaram a exploração, constame pelas communicações que levo a prezença de
Vossa Excelência, que se evadirão, deixando a força sem pratico: o mesmo quase
fizerão dous guias que acompanharão
o Tenente Aprigio, que com quanto não se retirassem, dicerão que não sabião de
direcção alguma, isto depois que a Força estava em marcha pelo que achão-se ambos
prezos. Estes dous factos não me são estranhos, e pelo que tenho observado, são
rezultados da indefferença e ao mesmo passo da connivencia, sobre o que já emittí
minha opinião ao Excelentissimo Antessessor de Vossa Excelência, e milita para
confirmar o que levo dito o seguinte, de não ser o contrabando um crime daquelles em
que ha uma parte offendida, que ferida ou tocada da aggressão, para poder nutrir sua
vingança, procura habilitar a Policia para dezencavar seu aggressor, no contrabando
pelo contrario, tenho observado e com muito sentimento, que em geral todos se
recentem que seja elle um crime, e é geralmente sabido quais as conveniencias que
rezultão de semelhante trafico, e as grandes fortunas que se tem criado.
Embora alguns proclamem factos posteriores revelão que são esses os proprios a
coadjuval-o e pelo que bem longe de encontrar appoio e aquella confiança que se deva
esperar para aniquilar esse indigno trafico, vejo malogradas as deligencias as mais bem
combinadas. De uma só Autoridade Policial não tive ainda uma noticia circunstanciada
a respeito do contrabando, e de seus agentes, e quando se prestão é como que reciozas.
Se isto se observa na classe de pessoas que são habilitadas pelo Governo, e que os
172
suppõe idonias para coadjuval-o; não é de esperar menos da classe inferior, que
costumada de ha muitos annos a assistir impunimente a dezembarque de Africanos, que
de publico se vendião aqui, no Poxim, e mesmo em qualquer porto da Provincia, está
subordinada a essas influencias locaes, que, ou por seu prestigio, ou pela dependencia
que estes adiquirirão, não hezitão inintimidala para que nada respire que os possa
comprometter. Hoje estou informado, que não sendo possivel conservar-se reunido o
contrabado, foi retirado das mattas do Engenho da Ilha, e nos taboleiros de Anadia,
proximos ao Engenho Ferrado, foi devidido pelos compradores, que tinhão sido
convidados, sendo estes de diversos lugares da Provincia, seguindo uma porção de cem
á duzentos Africanos para o sertão de Pernambuco, outra de menor numero para as
Alagôas, repartindo-se o resto por diversas pessoas, tocando a uns 20 a outros 16. Vejo
por tanto um embaraço, quaze insuperavel para se fazer já a apreensão pela diversidade
de lugares por onde está espalhado o contrabando. Do Officio do Delegado de Anadia
vejo que para o centro foi uma parte, e supponho ser a que foi dirigida para Garanhuns,
para onde já officiei ao Delegado e ao Juiz de Direito da mesma Comarca, inviando o
officio que Vossa Excelência enderesou, ao mesmo Delegado. Se a difficuldade que
tenho encontrado é a respeito da aprehensão, pode Vossa Excelência avaliar da que deve
haver para se obter prova para instaurar-se o Prosseço. Tenho esgotado os meios que
podem determinar o bom exito da deligencia; mas infilizmente vejo que de totodos os
lados surgem difficuldades. Os caçadores com quem havia contrata do a descoberta do
covil onde estivesse oculto o contrabando, arripiarão a carreira, ocultarão-se, e bem
defficil será a captura delles pela destancia de suas moradas, e incerteza dos lugares
onde possão ser encontrados. Hoje voltarão as duas Forças, e das explorações que
fizerão nada se pode conseguir, quer nas mattas do Engenho da Ilha, quer nas dos
Engenhos = Utinga - Sinimbú, e Canabravas, e nas adjacentes ao Curralinho.
Consta-me que do Destricto da Palmeira suvira o Subdelegado com uma Força de
sessenta homens, e suppõe-se ser em seguimento dos que forão para Garanhuns, e até
esta data não sei ainda do rezultado da deligencia. Do Poxim ainda não tive
communicação do Alferes Acácio sobre a ultima exploração que hia a fazer. Acho
acertado que sejão exploradas as mattas e Grutas dos Engenhos Pinto e Lama, para onde
consta que forão cincoenta Africanos. Acha-se doente de sesõens o Tenente Aprigio
Commandante da Força de Policia, e as praças de Policia tambem tem sido
acommettidas do mesmo mal. Hé o quanto tenho a communicar a Vossa Excelência
173
quue ordenará o que for servido. Deus Guarde a Vossa Excelência Villa de São Miguel
26 de Junho de 1851.
Illustrissimo Excelentissimo . Senhor Doutor Manoel Sobral Pinto -Vice Prezidente da
Provincia
O Chefe de Policia interino. Herculano Antonio Pereira da Cunha
174
ANEXO XV
[ant 1804, Julho, 18, Vila Real de São Josó do Poxim]
REQUERIMENTO de Francisco Antônio de Sousa, negociante e natural de
Pernambuco e residente na barra de Jiquiá da Praia, termo da Vila Real de São José do
Poxim, ao príncipe regente [D. João] a pedir providências devido a penhoras e
arrematação de seus bens, praticados pelo ex-ouvidor-geral da comarca de Alagoas
Manuel Joaquim Pereira de Matos Castelo Branco, relativamente aos impostos que
cobrou às embarcações e quilhas que entraram no estaleiro em que faz construção de
navios para o seu comércio e para venda nos portos da Bahia, Rio de Janeiro e
Pernambuco.
AHU-PERNAMBUCO.
AHU_ACL_CU_004, Cx. 5, D. 396.
Diz Francisco Antonio de souza, negociante e natural de Pernambuco: que passando-se
para a Barra de Jiquiá da Praia termo da Vila meramente criada de São José do Poxim
comarca das Alagoas, a fim de fazer alli Commércio de embarcações tanto para a
navegação do seu commércio quanto para arrumador vender nos Portos da Bahia, Rio
de Janeiro, e Pernambuco, bem, e (…) modo que entrou negociantes fazem por ser
aquelle lugar muito accomodado para a sahida das embarcações sucedêo quando o
ouvidor da Comarca Manoel Joaquim Pereira de matos Castello Branco sem mais
autoridade quando o fez simples arbitrio entrasse a exigir de cada huma das
embarcações, que ião carregar ao Porto a quantia de 4ø000 réis; e por cada huma quilha
que sepunha no estaleiro para se construir no mesmo porto a quantia de 6ø400 réis.
Quanto os primeiro imposto, hé certo, quando queixando-se aos donos das embarcações
do competente Governo, fôrrão por este providenciados expedindo-se ordem á Camara,
para mais não exigir simples imposto. Quanto porêm os segundo, bem quanto o
Supperior oppussesse, e mesmo procurasse tão bem recorrer, todavia não chegou a
fazer; porque antevendo isso mesmo o ex-Ouvidor evitou no mesmo recurso dando
ordem para que o imposto se não cobrasse coactivamente de pessoa alguma, mas
175
somente aquelles que por mais (…) amigaveis quizesem satisfazer; o que porêm não
practicou o teu sucessor José dos Santos Pinheiro Matos, que apenas tomou pose do
lugar entrou a mando (…), (…) e mais constructores que queirão pagar, e com tal
violencia evexame que nem lhes admitia requerimento algum supperior, entre tanto os
(…) estivessem em remessas, e o dinheiro recolhido ao cofre e ameaçando
compromisso assim a todos que copperasse como disse ao proprio Comandante da Villa
Pedro José de Matos (…) hé (…) até lhe infformava todos os recursos porque se alguma
advogado se proponha defende-lo, o tractado mal de palavra, suprendia, e até prendia
como fez ao advogado da Villa do Penedo Antonio de Mello Paes, e a propria parte
estando em autoridade geral e não menos a outro advogado da mesma Villa na segunda
comunicação que for (…) hé contrario a todas as Leis, Direito, Razão, porque impôs
novo tributo hé proprio da Suprema Real autoridade, e não dos Ministros, aos que hé só
concedido o executado as leis e as faze-las accrescendo so aquelle imposto prejudicial
ao commércio, e por consequencia ao estado e á Real Corôa hé pois por tudo isso que o
Suppremo recorre a Vossa Alteza Real para que se diga dão lhe aprovidencia, que o
caso pede, mandando informar (…) do exposto; e achando (…)que não se (…) do mais
por fim o imposto, senão que se faça repôr ao Suppremo tudo quanto, indevidam se lhe
houver extorquido pelo os titulo ou multando se aprenheram e rematação indevidam
(…) restituindo-se (…) os bens arremataodos. Portanto.
176
ANEXO XVI
Ofício que dirigiu a Câmara do Penedo a Câmara do Poxim, comunicando que força
estacionada em Vila Nova apreendera toda farinha, e um oficial comissionado pelo
Governo Interino das Alagoas. 15 de abril de 1817. IHGAL. Documento – 001680 –
21 – 03 – 26.
Senhores Ilustre do Nobre Senado de Penedo – Recebemos o offício de Vossas
magnificências nos dirigimos na data de 12 do corrente mês em que nos pede de madar
apenas duzentos alquires de farinha da embarcação que se acha ancorada no porto de
Coruripe. Fazemos saber Vossas magnificências que a dita embarcação, foi tomada por
uma tropa na Vila Nova desse rio São Francisco. Fizemos também prender o oficial
Felipe da Silva Morais enviando ao governo Interino da Comarca Alagôas. Fazemos
também conduzir a farinha da mesma embarcação para o destacamento do porto do
Jaraguá em Maceió. Por esta cuja não prestamos atendimento pedido, e também
esperámos as mesmas tropas pelo edital que se publicou nesta Vila, Real de São José do
Poxim em comunicado de 15 de abril.
Antônio dos Santos – Juiz Ordinário, José dos Santos, José Roque da Silva, procurador
– Pasta conforme o original, o escrivão da Comarca, Luís Manoel Almeida Silva.
177
ANEXO XVII
IHGAL. Documento – 939 – 21 – 03 - 22 - Auto de Veneração em que houve
adjuntamente das repúblicas desta Vila, do Penedo, de 12 de abril de 1817.
Ano do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil oitocentos e dezessete, aos
doze dias do mes de abril do dito ano, nesta Vila do Penedo, do Rio de São Francisco,
Comarca das Alagoas, Capitania de Pernambuco, em casas da Câmara, onde foram
juntos os Oficiais da mesma, Juiz Presidente, o licenciado Antônio José da Silva
Lamêgo, Vereadores Antônio Moreira de Lemos e por empréstimos Alferes José
Antonio de Faria Lôbo, Antônio José da Silva e Procurador também, por impedimento,
digo, por empréstimo, José Leandro dos Santos os Republicanos desta Vila, para efeito
de se tratar do Serviço de Sua Majestade e bem comum do Povo.
Acordaram que se escrevesse Carta de Officio a Câmara do Poxim para ter em
segurança e debaixo de embargo, duzentos alqueires de farinha, para a sustentação das
Tropas que vêm da cidade da Bahia para se reunirem com as desta Vila e as mais da
Comarca, e que fossem remetidos cinquenta alqueires para Piassabuçu a ser conduzida a
esta Vila para o mesmo suprimento das tropas. E logo os mesmos Republicanos
Senhores de Fazendas de gados, que eles em geral se obrigavam a dar as carnes
conforme os gados que eles ou cada urn tivesse para o suprimento das mesmas tropas. E
logo por se achar presente o Tenente Quartel-Mestre José Antônio da Costa se ofereceu
a dar alguns alqueires de farinha e arroz para sustentação das mesmas tropas, e foi
nomeado pelo mesmo Senado o referido Tenente José Antônio da Costa para a
arrecadação dos mesmos víveres, como também o Alferes Manoel José Gomes para o
fim de ir por enviado à Câmara do Poxim, a tratar da condução das farinhas e tudo o
mais que for preciso para este fim.
Acordaram mais que se lhe deveria dar ajuda de custo, tanto a um, como a outro,
conforme os gastos e despesas que fizerem na arrecadação dos mesmos víveres.
Acordaram mais em se receber todos os donativos que gratuitamente
oferecerem os habitantes desta Vila para o fim da presente guerra, determinando, para o
Juiz Ordinário, Procurador e Escrivão, passassem a fazer as diligências possíveis pelas
casas de todos os habitantes desta Vila, por não se acharem presentes nesta ocasião
todos os Repúblicas e mais povos desta terra, digo, desta Vila.
178
Acordaram mais que todo o Armamento e petrechos precisos e necessários para
auxiliar a facia tropa vinda da cidade da Bahia como da que se acha nesta Vila, para
acompanhar esta mesma tropa, se fizessem todos os consertos precisos e necessários,
encarregando este mesmo objeto ao Sargento-mor dos Homens Brancos, Miguel
Veloso, e por não haver mais que acordarem, mandaram fazer este Auto em que
assinaram: eu, Luiz Manoel d'Almeida e Silva, Escrivão — o escrevi — Lamêgo —
Lemos — Farias — Silva — Santos — José Antônio da Costa — Manoel José Gomes.
Está conforme. O Escrivão da Câmara Luiz Manoel de Almeida Silva.
179
ANEXO XVIII
IHGAL. Documento – 001676 – 21 – 03 - 22 - Ofício que dirigiu a Câmara do Penedo
a Câmara do Poxim, pedindo-lhe farinha para as tropas. 12 de abril de 1817.
Offício que a Comarca do Penedo dirigio à da Vila do Poxim pedindo-lhe farinha para a tropa Real –
1817.
Ilustrissimos Senhores, membros do nobre Senado da Vila real de Sao Jose do Poxim.
No dia 11 do presente mês, acabamos de receber uns editais mandados pelo ilustríssimo
Govemador da Bahia que nos informa que as tropas da mesma cidade do Salvador
passarão por esta Vila do Poxim com a finalidade de firmar as bases do domínio e poder
por essas vias e caminhos do nosso Augusto Soberano para estabelecer a soberania real
nessa região do Sr. Dom Joao VI. É de nosso dever procurar fornecer com todo
empenho possível ao comando e ás tropas o alojamento e alimentação para essas tropas.
Sabemos da necessidade publica em que encontra esta Vila do Poxim por falta de
farinha e demais mantimentos. Rogamos a Vossa Magnificência que em nome de sua
Majestade, fidelíssimo Dom Joao VI, providenciem apenas duzentos alqueires de
farinha desta embarcação que se acha ancorada no Porto de Coruripe. Este Senado do
Poxim fica sendo obrigado a responder pelos impostos da mesma farinha ao fisco real.
Para este fim, o alferes Manoel Jose Gomes irá tratar das condições fiscais dessa mesma
farinha. Esperamos que pela fidelidade de Vossa Magnificência ao nosso Augusto
Soberano, não pouparão meio algum de prestar atendimento para o bom êxito deste
presente objeto.
Deus guarde Vossas Magnificências. Passado no Câmara do Senado do Poxim em 12
de abril de 1817.
Antônio José da Silva Lamengo - Juiz Ordinário
Antônio José da Silva - Vereador
José Antônio de Farias Lobo - Vereador
Antônio José da Silva - Vereador
José Leandro dos Santos - Procurador
Pasta conforme, o escrivão da Comarca. Luiz Manoel de Almeida da Silva.
180
ANEXO XIX
PARECER do Conselho Ultramarino sobre o requerimento do escrivao da Ouvidoria e
Almotacaria da vila de Alagoas, alferes Bento Rebelo Pereira, em que pede se tire nova
devassa para averiguagao e confirmação da sua inocência relativa ao conflito corn o exouvidor-geral João Vilela do Amaral, e seja posto em liberdade. Anexo: despachos do
ConseIho Ultramarino e pareceres do procurador da Coroa, aviso, bilhetes e
requerimentos, cartas do vice-rei do estado do Brasil e do desembargador Antonio do
Rego e Sá Quintanilha. AHU_ACL_CU_004, cx.1, D.45.
Pareceo ao conselho que pela informação do Ouvidor das Alagoas sefaz nottoria a
inimizade que João Villela do Amaral tinha como Suplicantepois dandose aque (…)
contra outras pessoas, o pronunciou a elle. Nem (…) ta para Vossa Magestade lhe negar
a graça que pretende o haver tirado a devaça o Juiz ordinário, e não o ditto Ministro,
porque sendo manifestado a inimizade, que com elle tinha facilmente poderia conseguir
que o Juiz ordinário continuas sea oppressão a que elle havia dado principio.
Persuadindo também muito o supplicante a sua inocencia por se haver metido
voluntariamente na prizão para mais justamente procurar socorro na justiça de Vossa
Magestade pelo que se faz digno de que (…) que se sirva de ordenar ao Ouvidor das
Alagoas, que tire nova devaça deste cazo, e (…) a remeto à Relação da Bahia donde se
acha o livramento, e o (…) para ser por ella sentenceado, e quehavendo (…) culpados
proceda contra eles, na forma da Ley. Lisboa occidental 19 de Mayo de 1727.
181
ANEXO XX
Document o N° 01313
Caixa; 18 Pacote ; 01 Doc; 11
Coleção: Original de um traslado de um capítulo sobre farinha e peixe. 1724. 02F.
Dizem os officiais da Câmara que servião no anno de 1724 que servindo de almotação
Bento Rebelo Pereira condenou a Antônio Silva e outras mais pessoas das Povoações de
S. Miguel e do Norte porque plantadores das postulas da Câmaras na quantia de 26
(Unidade de medida) cada hu’ a saber 6 da alçada da Câmara e 20 do capítulo da
correção que o Senhor e Doutor Ouvidor-geral que então servia deixou por provimento
e para sim fazerem os despachos de hu’ que (…) dos autos carece do capítulo que
deixou o dito senhor doutor Ouvidor-geral (…) fiz a cerda das ditas condenações que
deve esta lançado no livro da correção (…) nos livros da Câmara dessa Villa. Por assim
seja servido mandar que o escrivão em cujo poder estiver provimento lhe der por
certidão em (…) dizem os súplicantes que apresentando a petição ao escrivão da
Câmara Ignácio Rabelo sobredito dúvida (…) passa-lhe a dita certidão dando por
desculpas não (…) o que se pede na petição o que entendem o súplicantes (…) do
sobreditos o erro dos súplicantes estes pedem a Vós mercêr seja servido mandar (…).
182
ANEXO XXI
Ofício ao Juiz Presidente e Senadores da Câmara da Vila das Alagoas sobre a inspeção
da plantação de mandioca. (…) 03 Jul. 1828. 01F. IGHAL. 00319 - 05 - 03 – 10.
Em comprimento da comição de que foi emcarega do no dia 18 do Mes de Junho sobre
as plantaçoins de mandioca; fasso ver a vossas senhorias que no termo do Engenho
Massaguera athe Camuripim e Ilha do porto termo da minha Jurdição, eszaminando
com todo o coudado a chei pouco mais ou menos eszistirem secenta mil covas de
mandiocas comederas e o que reprezenta o estado dellas hē de cre que as secenta mil
covas se axão sē podres sem mister com o frio do rigorozo emverno e as cincoentas mil
covas que inda as concidero livre da prudidão contudo poderão pouco mais ou menos
crear (...) oitos sentos Alqueres de farinha visto as plantaçoins novas das ditas
mandiocas de Janeiro athe agora pude reavaliar pello tereno (...) em que foram
[corroído] em vinte mil covas e estas mesmas não eszistirão vinte mil covas estas não
estão seguras pois as veio muito abatidas pella frieza do mesmo Inverno he verda deira
a mesma Partipação Deos guarde a vossas senhorias (...) 2 de Julho 1828.
Ilustrissimo Senhores Juiz Presidente viriadores e Procurador da camara da cidade das
Alagoas
Antonio Correia da Gama - Almotace
183