Os Exus no Cosmo Religioso Umbandista Mudanças e Ressignificações Históricas - Adriano Oliveira Trajano Gomes
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS COMUNICAÇÃO E ARTE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA – MESTRADO
ADRIANO OLIVEIRA TRAJANO GOMES
OS EXUS NO COSMO RELIGIOSO UMBANDISTA: MUDANÇAS E
RESSIGNIFICAÇÕES HISTÓRICAS COM O DIABO CRISTÃO, VIÇOSA/AL
(1960-2013)
Maceió
2016
ADRIANO OLIVEIRA TRAJANO GOMES
OS EXUS NO COSMO RELIGIOSO UMBANDISTA: MUDANÇAS E
RESSIGNIFICAÇÕES HISTÓRICAS COM O DIABO CRISTÃO, VIÇOSA/AL
(1960-2013)
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação em História da
Universidade Federal de Alagoas, como
requisito parcial para a obtenção do grau de
Mestre em História.
Orientadora: Profa. Dra. Irinéia Maria Franco
dos Santos.
Coorientador: Prof. Dr. Anderson de Alencar
Menezes.
Maceió
2016
Catalogação na fonte
Universidade Federal de Alagoas
Biblioteca Central
Divisão de Tratamento Técnico
Bibliotecária Responsável: Helena Cristina Pimentel do Vale
G633m
Gomes, Adriano Oliveira Trajano.
Os exus no cosmo religioso umbandista: mudanças e ressignificações
históricas com o diabo cristão, Viçosa, AL (1960-2013) / Adriano Oliveira
Trajano Gomes. – Maceió, 2016.
195f. : Il.
Orientadora: Irinéia Maria Franco dos Santos.
Coorientador: Anderson de Alencar Menezes.
Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal de Alagoas.
Instituto de Ciências humanas, Comunicação e Artes. Programa de Pós-Graduação
em História. Maceió, 2016.
Bibliografia: f. 125-138.
Apêndices: f. 139-155.
Anexos: f. 156-195.
1. Religiões afro-brasileiras – Viçosa (AL) – 1960-2013. 2. Umbanda. 3. Exu.
4. Diabo. I. Título.
CDU: 981.35 Viçosa (AL): 299.6
À minha esposa, Marcella Pimentel, pelo apoio,
dedicação e presença agradável na confecção deste
trabalho. Muito obrigado, meu amor.
AGRADECIMENTOS
Ao maior de todos os revolucionários da história humana, por me libertar da insensatez
social e da insensibilidade cristã, Jesus de Nazaré, meu Libertador;
À minha estimada Família, razão de ser da minha existência. Ao meu pai, Antônio
Trajano, minha mãe Terezinha Trajano, aos meus irmãos queridos e estimados, Alexandre,
Andréa, Aline e Alexandro. A toda família Trajano na cidade de Pirpirituba/PB;
À minha esposa, Marcella Pimentel, parte de mim, por me acompanhar nessa trajetória
apoiando, relendo e corrigindo todo o trabalho por várias vezes;
A todos os filhos e filhas de santo, Pais e Mães de santo pelas sinceras contribuições e
seus respectivos terreiros de Umbanda viçosenses pelo acolhimento e compreensão;
À memória da Mãe Bastiana, umbandista de fé e hospitaleira;
Às Federações umbandistas do Estado de Alagoas nas pessoas do Pai Paulo Silva e
Benedito Maciel, pela atenção;
À minha Orientadora, Professora, Drª Irinéia Maria Franco dos Santos pelo processo de
orientação cientifica e coordenação do trabalho;
Ao Professor, Dr. Anderson de Alencar Menezes, pela Coorientação;
Ao amigo Rodrigo Dias, pelo apoio na pesquisa de campo;
Aos Programas CAPES/FAPEAL pela bolsa concedida;
A todas e a todos que de alguma maneira, contribuíram alegremente para verem a
concretização deste trabalho. Minha sincera gratidão.
“se a pessoa tem o instinto mau, já nasceu para a
perversidade, o Exu vem nesta mesma linha, ele pega
toda a intenção da pessoa. O que tem de ser feito é
apelar para Oxalá para que aquele filho ou filha de
santo piore ou melhore de vez.”
(Pai Bastinho, 74 anos –Viçosa/AL).
RESUMO
Na construção do patrimônio mágico-religioso, o “Exu-Diabo” desde as terras africanas até
chegar o Brasil, sofreu várias interpretações pejorativas das religiões monoteístas, bem como
por parte dos negros praticantes da modalidade religiosa iorubá e fon na Bahia que também
questionavam o aspecto dúbio de Exu identificando-o como um demônio ou como uma
divindade do mal, sobretudo, a partir do século XVIII na Bahia. Os traços africanos de Exu se
transformaram no território brasileiro. Percebe-se uma religião que traz em seu bojo cultural
elementos do índio, do negro e do europeu. Quanto a Exu, irá persistir a imagem de Diabo
cristão, de uma divindade travessa e difícil que faz a ligação entre o sagrado e o profano, cujo
altar fica separado por uma cortina dos outros cultos. Este esquema encaixou perfeitamente nos
rituais e no modo de pensar dos adeptos dessas religiões dos Orixás, a partir do início do século
XIX e com o ressurgimento ou sistematização da Umbanda no início do século XX, e seu
posterior desenvolvimento. A invisibilização e silenciamento da religiosidade negra em
Alagoas foram notórios no século XX. A tarefa de pensar todo esse percurso histórico deve
recorrer, sobretudo, ao triste episódio que marcaria para sempre a história do povo de santo
neste Estado de intolerâncias, o “Quebra-quebra” dos xangôs alagoanos no ano de 1912. As
religiões afro-alagoanas não foram priorizadas pelos acadêmicos, sobretudo, pelos oriundos de
Viçosa/AL, conhecida por a “Atenas alagoana” desde o século passado. A Umbanda é uma
realidade cultural penetrante no cotidiano brasileiro e de Viçosa/AL, que se mostrou um
ambiente bastante propício ao desenvolvimento dessa modalidade religiosa. Os rituais de
“Mesa Branca” ou “Mesa de Jurema” vinham sendo praticados em Viçosa desde meados da
década de 1930. Entre 1959 e 1960, tem-se o culto organizado propriamente dito da religião no
município. O culto aos Exus e Pombagiras – Espíritos/Entidades – ocupará lugar de destaque
no cosmo religioso vivido e sentido nos terreiros viçosenses multifacetados e em pleno estado
de metamorfose sociorreligiosa. Os paradoxos no âmbito de Exu marcados pela sua
imprevisibilidade, sexualidade desenfreada e papel provocador, atenuados no Brasil, acabou
provocando a “difícil demarcação”, “linha de direita” e “linha de esquerda” no campo ético da
Umbanda, principalmente a partir de 1960. Exu em Viçosa pode provocar estado de morbidez,
mas também sensação de vitalidade espiritual/axé diante da vida. Uma coisa é certa, “Diabo
não, da parte dele”, apenas.
Palavras-chave: Umbanda. Exu. Diabo. Viçosa/AL.
ABSTRACT
During the construction of the magic-religious heritage, “Exu-Devil” all the way from african
territory to Brazil, suffered many bad interpretations from the monotheistic religions, such as
by the black iorubá community and fonin Bahia state who also questioned Exu's dubious
appearence, identifying him as a demonor an evil divinity, especially, starting in the eighteenth
century in Bahia.The african traits of Exumodified themselves at thebrazilian territory. It is
perceivable that the religion brings in its cultural arrangement indian, black and european
elements. As to Exu, the christian devil image will persist as the mischievious and complicated
divinity, that makes a connection between the sacred and the profane, whose altar stands
separated by a curtain from other services. This scheme perfectly fit the rituals and way of
thinking of this Orixá's, religions followers from the beggining of the nineteenth century and
with, the Umbanda's resurgence or systematization in the beggining of the twentieth century,
and it´s further development. The impracticability and silencing of the black religiousness in
Alagoas were notorious in the twentieth century. The task of thinking all this historical route
must resort, especially, to the sad episode that would mark for the saint's people history forever
in this state of intolerance, the “Quebra-quebra” ofthe xangôs from Alagoas in the year of
1912. The african religions from Alagoas were not prioritized by the academic, especially, by
the residents of Viçosa/AL, known as Alagoas's Athens since the last century. The Umbanda
it's a cultural reality in the Brazilian everyday and Viçosa/AL, showed me a very propitious
enviroment to the development of this religious modality. The "White table" or "Jurema's
table" had been practiced in Viçosa since 1930's decade. Between 1959 and 1960, was founded
the properly organized religious celebration in the city. The worship to Exus and Pombagiras–
Spirits and entities – will take a featured place in the religious cosmos lived and felt in the
multifaceted worship places from Viçosa, and in full state of social-religious metamorphosis.
Exu's paradoxes known for it's unpredictability, unbridled sexuality and provocative role,
attenuated in Brazil, finished teasing the "difficult demarcation", "right line" and "left line" in
the Umbanda's ethical field, mainly from 1960. Exu in Viçosa may provoke state of morbidity,
but also the spiritual vitality or axé feeling against life. One thing is for sure, “Devil does not,
from his part, only”.
Key-words: Umbanda. Exu. Devil. Viçosa/AL.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Altares de Exus e Pombagiras e assentamentos de Exu Tranca Rua. ................... 156
Figura 2 – Altares e símbolos de Exu no interior dos terreiros. ............................................ 158
Figura 3 – Símbolos de Exu e crânios de animais sacrificados. ............................................ 159
Figura 4 – Congás ou Canjiras de Exu no interior dos terreiros. .......................................... 160
Figura 5 – Altares e símbolos de Exu na Entrada dos terreiros. ............................................ 161
Figura 6 – Processo sincrético no interior da Umbanda. ...................................................... 162
Figura 7 – “Matança pra Exu”. ............................................................................................ 163
Figura 8 – “Exu recebendo obrigação”. ............................................................................... 164
Figura 9 – Exu diante da obrigação. .................................................................................... 164
Figura 10 – Obrigação e axé aos Exus. ................................................................................ 166
Figura 11 – Exu recebendo axé, bebida e cigarro. ................................................................ 167
Figura 12 – “Matança pra Exu”. .......................................................................................... 168
Figura 13 – Exu Bagaceira e Exu Caveira no centro do terreiro. .......................................... 169
Figura 14 – “Obrigação pra Exu”. ....................................................................................... 170
Figura 15 – Exu Boiadeiro, Exu Caveira, Zé Pelintra e Exu Tiriri. ...................................... 171
Figura 16 – Exus e Pombagiras. .......................................................................................... 172
Figura 17 – Transe de possessão. ........................................................................................ 173
Figura 18 – “Arreia Exu”. ................................................................................................... 174
Figura 19 – Reverência, obediência e saudação aos Exus. ................................................... 174
Figura 20 – Consulentes e filhas de santo buscando ajuda dos Exus. ................................... 176
Figura 21 – “Toque” ou “Gira” de Exu. ............................................................................... 177
Figura 22 – Transe de possessão – Exu e Pombagira. .......................................................... 178
Figura 23 – Exu diante do Congá e Peji. ............................................................................. 179
Figura 24 –Pais de santo mais antigos. ................................................................................ 180
Figura 25 – Mães de santo mais antigas............................................................................... 181
Figura 26 – Liderança mais jovem. ..................................................................................... 182
Figura 27 – Mães de santo mais jovens e interior dos seus terreiros. ................................... 183
Figura 28 – Sessão de “Mesa Branca”, consulentes e ingomes. ............................................ 184
Figura 29 – “Calçamento de estátuas”, “Passagem de morto” e festa de Exu. ...................... 185
Figura 30 – Presidentes das Federações e pesquisa de campo. ............................................. 186
Figura 31 – Terreiros espalhados na cidade. ........................................................................ 187
Figura 32 – Terreiros em Viçosa na cidade e na zona rural. ................................................. 188
Figura 33 – Documentos de regularização dos cultos e Rua dos Paus Brancos. .................... 189
Figura 34 – Jornais contra a Umbanda em Alagoas nas décadas de 1950 e 1980. ................. 190
Figura 35 – Registro sobre Viçosa em 1977 e pesquisa de campo...........................................191
Figura 36 – “Marca” deixada por Exu Caveira e fim de “toque” de Exu.................................192
Figura 37 – Homenagem à Mãe Bastiana, falecida em julho de 2013.....................................193
Figura 38 - Socialização da pesquisa com a sociedade viçosençe – novembro de 2013.........194
Figura 39 – Mapas do Município de Viçosa e do Estado de Alagoas......................................195
SUMÁRIO
1
INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 13
2
O CULTO DA UMBANDA NO BRASIL E NO ESTADO DE ALAGOAS: BREVES
CONSIDERAÇÕES ..................................................................................................... 24
2.1 História da Umbanda: possibilidades de narrativas ................................................... 27
2.2 Adaptações e ampliações da Umbanda ....................................................................... 29
2.3 Candomblé, Umbanda e Quimbanda: convergências ................................................. 30
2.4 A vida religiosa dos negros em Alagoas ....................................................................... 34
2.5 O ambiente religioso em Alagoas no século XX .......................................................... 39
2.6 A desqualificação das práticas afro-brasileiras no Jornal O Semeador (1950 e 1960)
.............................................................................................................................................42
3
AS RELIGIÕES AFRO-ALAGOANAS NO CONTEXTO DE VIÇOSA ................. 47
3.1 Viçosa no século XX ..................................................................................................... 49
3.2 O povoado Bananal e a Rua dos Paus Brancos: singularidades ................................. 52
3.3 A afro-alagoanidade no município de Viçosa .............................................................. 55
3.4 Gerações de umbandistas em Viçosa/AL: reconstituição histórica da religião ......... 59
3.5 Remanescentes umbandistas viçosenses: desenvolvimento histórico ......................... 64
3.6 Terreiros de Umbanda inseridos no município de Viçosa, Zona da Mata alagoana . 69
3.7 A Umbanda atual (2010 a 2015) .................................................................................. 72
4
RECOMPOSIÇÃO HISTORIOGRÁFICA SOBRE EXUS E POMBAGIRAS NA
UMBANDA .................................................................................................................. 75
4.1 Projeções e identificações de Exu ................................................................................ 76
4.2 A feminização de Exu: o culto a Pombagira e seus desdobramentos no Brasil ......... 84
5
EXU EM VIÇOSA, ALAGOAS: RESSIGNIFICAÇÕES .......................................... 90
5.1 Exu na visão da liderança umbandista viçosense ........................................................ 91
5.2 “Exu não presta, Exu não vale nada, mas sem Exu não se pode fazer nada” ............ 97
5.3 “Matança pra Exu” ...................................................................................................... 99
5.4 Exu Caveira e Exu Bagaceira: de quem é a obrigação? ........................................... 101
5.5 “Não cumpriu, Exu dá coro” ..................................................................................... 104
5.6 “Saravá aos Exus”: panorama dos rituais estudados ............................................... 108
6
CONCLUSÃO ............................................................................................................ 116
REFERÊNCIAS..............................................................................................................125
APÊNDICES....................................................................................................................139
ANEXOS...........................................................................................................................156
13
1
INTRODUÇÃO
Quem deve a Exu tem que pagar, lá na encruza seu sangue
vai derramar (Ponto Cantado de Umbanda em Viçosa/AL).
Da cultura yorubá e fon por meio das interpretações dos missionários e viajantes
europeus na passagem para o Brasil pelo Candomblé e pela macumba carioca, desembocando
nas Umbandas brasileiras permeadas pelo processo sincrético, Exu nunca saiu do foco dos
olhares curiosos de seus filhos e admiradores. Do “embranquecimento” da religião,
intelectualização e elitismo branco, Exu continuou atuando mesmo sendo “empurrado para
trás da cortina”. “Entre a cruz e a encruzilhada” por meio dos “segredos guardados” regados
pelo “medo do feitiço” ressignificado pelos umbandistas, revigorado pelos quimbandeiros e
quase “descarregado” no redemoinho do pós-pentecostalismo, Exu nunca saiu de cena.
Da empreitada católica e kardecista aos congressos espíritas e escritos justificadores da
sua retirada do panteão afro-brasileiro, Exu continuou sempre presente entre os homens. Em
Alagoas, teve que “trabalhar dobrado” para os políticos do Estado, sendo expelido pela
sociedade cristã e populares revoltosos. Terreiros foram queimados, suas imagens expostas em
praça pública depois queimadas e despedaçadas pelas ruas da capital Maceió. Das discórdias
nos terreiros às opiniões divergentes ao longo de décadas, a Umbanda perdurou. Dos estigmas
das “encruzas” ao lugarzinho “nas partes infernais”, mesmo sendo “da parte do Diabo” e
“esposa de Lúcifer”, não deixou sua função de mensageiro e cavaleiro dos Orixás, Santos e
Caboclos. Foi preciso ser “amansado” pelos Pretos e pelas Pretas Velhas para, assim, ser bom
com quem é bom com Ele e mau para com quem é mau com Ele.
Exu acabou ganhando destaque desde seus primórdios, sendo moralizado pela cultura
cristã ocidental e demonizado pela teologia cristã – ainda hoje influentes no próprio interior
dos terreiros Brasil a fora. Depois de percorrer um longo caminho, chegou a Viçosa, nas
Alagoas, pedindo passagem nos quilombos e posteriormente, nos rituais de “Mesa Branca” e
nos caminhos escuros das matas e serras viçosenses, até desembocar no centro do terreiro para
beber, dançar, fumar e dar conselhos. Exu aqui pode provocar estado de morbidez, mas
também sensação de vitalidade espiritual diante dos percalços da vida. As demandas vindas aos
terreiros são retiradas pelos Exus, pois são Eles que lidam com todo tipo de “trabalho pesado”
praticado no interior e fora dos terreiros. Sua dinamicidade e magia não se esgotam em rituais
ou práticas no interior da religião. Pelo contrário, atua também nas forças da natureza
14
trabalhando com as forças dos “invisíveis” por meio dos seus “cavalos” dispostos a servir-lhes
com as obrigações requeridas. Os Exus registrados em Viçosa, nas Alagoas, foram: Seu Zé
Pelintra, Boiadeiro, Odé,1 Exu Serra de Fogo, Exu Pimenta, Exu Maresia, Exu Sete Facadas,
Exu Sete Catatumbas, Exu Tranca Rua, Exu Marabô, Exu, Toquinho, Exu Furacão, Exu Corre
Campo, Exu Arranca Toco, Exu Vira Mundo, Exu Ventania, Exu da Meia Noite, Exu da
Lenha, Exu Porteira, Exu do Lodo, Exu Bagaceira, Exu Gira Mundo, Exu Tatá, Caveira, Exu
Cancela, Exu Mulambo, Exu Veludo, Exu Marujo, Exu Marinheiro, Exu das Almas, Exu
Muleta, Exu Tiriri, Exu Sete Encruzilhadas, Exu Embola Pedras, Exu Caveira, Exu Morão,
Exu Benedito Fumaça, Exu Quebra-Galho, Exu Capa Preta, Exu Mirim, Exu das Matas, Exu
das Pedreiras e o Exu do Cemitério.
Cada Caboclo “carrega” ou “domina” vinte e um Exus no mundo. Seu Zé Pelintra e
Caboclo Boiadeiro trabalham na “esquerda” e na “direita” (os dois lados da religião), à
semelhança do Senhor Odé (Exu Mirim) que também trabalha na “direita” com os Caboclos.
Pelos menos mais de quatro dezenas de Exu são encontradas nos terreiros. Obviamente que
existem muito mais do que isso. Outra variedade de Exus também é registrada nos rituais e em
diferentes “matanças”. Tem-se a relação de Exu com eventos da natureza e sua proximidade
com os Caboclos, bem como seu poder de ultrapassar o plano mítico dentro da sua esfera
religiosa. Não se pode negar sua influência nos elementos do cotidiano dos filhos de santo
como a pedreira em Viçosa, as matas, o vaqueiro, a zona rural com a cancela, porteira, morão e
campos. Sua relação com o cemitério na cidade, com as ruas, em suma, seu poder agregador
em juntar elementos típicos da região com as coisas do além. O poder mágico de Exu presente
nos rituais e sua atuação direta no cotidiano dos filhos de santo e liderança também é uma
realidade.
O ambiente cultural e socioeconômico influencia esses terreiros voltados para a
dimensão invisível ou patamar sobrenatural da religião. O caráter relacional entre os/as
filhos/as de santo e os Exus, bem como a indissociabilidade verificada nos gestos, discursos e
ações inerentes à religiosidade praticada ficam explícitas. Frisa-se, caráter válido, sobretudo,
para exteriorizar esta relação com Exu latente e explícita ao mesmo tempo. É justamente a
ambiguidade provocada de Exu nesta relação, muito bem representada nos discursos que
definem o sentido análogo da religião emergindo da palavra, não se restringindo a ela, mas
irrompendo através dela e projetando-se no mistério expresso nos elementos mágicos e míticos
1
Segundo os umbandistas, trabalham nas duas linhas da Umbanda – esquerda e direita. Ou seja, apesar de serem
considerados mestres e caboclos da jurema sagrada, eles também atuam como os Exus – “na direita fazem o bem,
na esquerda fazem o mal”. Sobre essas linhas ou polos éticos no cosmo religioso umbandista serão discutidas no
corpo desse trabalho.
15
desse culto multifacetado, irradiante e singular. Faz-se necessário desvincular todo o
pensamento de ver a Umbanda como uma “religião dos demônios”, inimiga do Cristianismo e
responsável pelo sofrimento, desgraça e perdição humana. Desvincular a Umbanda da imagem
do mal, do diabólico. As dicotomias registradas pretendem instaurar, em primeiro momento, a
complementaridade e, por sua vez, a legitimidade da interferência do elemento mágico na
esfera social e psicológica da liderança. Proporcionou vivenciar as relações existentes entre o
material e o “invisível”, mediadas pela realidade cotidiana dos terreiros – realidade construída
a partir de laços religiosos, a partir de experiências entre filhos/as de santo e espíritos. Neste
contexto, as narrações da liderança constituíram o elo direcionador das experiências e visões
sobre Exu. Ou seja, o padrão que liga valores, crenças e práticas a partir dessa religiosidade,
aparentemente, ambivalente. Essa analogia ao inferno e ao Diabo, de fato existe e os Exus
cultuados nos terreiros influenciam diretamente em todas as esferas da vida dos adeptos,
inclusive causando-lhes medo. Especificamente, o campo deixou transparecer que os Exus,
talvez sejam cultuados mais por medo do que por admiração.
Fica claro o caráter transformador de Exu. Ele tem o poder de se transformar e de se
recriar no mundo. Mas também, de promover “caos”, “desgraças” e “pavor” em quem não lhe
dê o devido respeito. Ficou claro que Exu também “mata”, envia “cólera”, “cobra” e
“persegue” as pessoas. Afinal, “com Ele não se deve brincar”. Isto foi percebido no discurso
da liderança ao ver Exu por diferentes ângulos, formas e ações no mundo e na vida de cada
filho/a de santo. Tal paradoxo só explica a dinamicidade do campo. Apesar do aparente
distanciamento do culto africano, existem na Umbanda em Viçosa correspondências e
semelhanças nos rituais e construção do seu panteão. Olhar para Exu e vê-lo como um possível
Ser ligado ao Diabo não se deve apenas ao olhar externo à religião, mas ao próprio olhar
interno do seu lugar de culto. Isto significa dizer que a demonização de Exu se deu nos dois
contextos: na religião do Outro e na própria Umbanda. Talvez isto remonte o caráter da
discórdia, aventureiro e brincalhão de Exu desde suas raízes históricas.
Fica evidente a simultaneidade de sentidos que Exu revela na religião como:
multivalência
revelada
simultaneamente,
paradoxos
existenciais,
multiplicidade
de
significações, instabilidade mágico-religiosa, polêmicas, excepcionalidade de sua existência,
atitudes ambivalentes, fluidez ritualística e medo. Exu poderá significar a partir dos discursos,
todo o curso da vida religiosa dos praticantes como resultado de um longo processo de
assimilação (maldade) e de identificação (demoníaco) às formas espirituais já conhecidas e
disseminadas durante a organização e desenvolvimento da religião. Talvez, os movimentos
16
contraditórios identificados sejam o resultado das diferentes técnicas e manipulações da magia,
dos portadores dos poderes mágicos desde seus primórdios, bem como das ressignificações no
ambiente religioso cristão-kardecista.
O contato com a bibliografia afro-brasileira serviu, a priori, para desmistificar as
descrições pejorativas e de má fé, resultantes da falta de informação e de ideias préconcebidas/aproximação acerca das religiões afro-brasileiras no País e em Alagoas, sobretudo,
no interior do Estado. Os terreiros ainda são vistos por muitos como “centros de macumba” ou
“locais de magia negra”. Além dessa desmistificação, serviu também para vitalizar a
curiosidade e despertar o desejo da convivência e estudo empírico de um grupo religioso ainda
marginalizado e vítima de discriminação.
Estudar a cosmologia religiosa umbandista dentro do contexto alagoano proporciona
entendê-la como uma cultura dinâmica, em que o processo de criação de significados é
permanente e onde seus rituais e crenças passam, constantemente, por um processo de
ressignificação tanto no continente africano quanto em território brasileiro. É por isso que
desde o início do séc. XX, o estudo dos cultos afro-brasileiros impulsiona intelectuais à
discussão sobre a nacionalidade brasileira, identidade e valorização da cultura africana na
organização do Brasil, sobretudo, com o processo de exaltação das raízes culturais ocorrido nos
anos de 1960 (AVANCINI, 2008, p. 134-147). A expressão genérica “afro-brasileira” traz o
encontro de africanos negros e indígenas considerados negros pela classe hegemônica. “Negros
da Costa e negros da terra”. Trata-se de fusão, convergência, entrelaçamentos de suas
culturalidades em nova plasmação no Novo Mundo com forte sentido africano. Pensa-se aqui,
na união dos negros em “atos criadores de fé” como expressão de sua ideologia social, da
recriação ou reinvenção da África em território brasileiro entre os séculos XVII e XIX
(BARBOSA, 2002). As chamadas religiões afro-brasileiras sempre foram vistas como um
fenômeno de sincretismo religioso. Tais interpretações iniciais expressam a visão de uma
religião sincretizada. “Afro”, pelos seus traços africanos. Brasileira, por apresentar traços
católicos, espíritas e indígenas (MAGGIE, 1992; BIRMAN, 1993).
A expressão “afro-alagoana” ou “afro-alagoanidade”2 traz a cultura negra no Estado
de Alagoas, como um constante processo de ressignificações e universo simbólico, imbuído de
2
Atende também a sugestão do Professor Dr. Ulisses Neves Rafael – UFS, Examinador externo, que bem
observou no processo de Qualificação. A expressão afro-alagoana ou afro-alagoanidade, serviu, inclusive, como
título do Capítulo 2. Em Alagoas, a socióloga Ábia MARPIN, vem desenvolvendo pesquisas há alguns anos sobre
as relações raciais no Estado, as expressividades negras e a produção cultural dos negros em Alagoas. Uma
matéria sobre suas pesquisas foi publicada recentemente, no Jornal O Dia, e no Blog do Professor, Dr. Sávio de
Almeida, cuja matéria completa está disponível em: <http://luizsaviodealmeida.blogspot.com.br/2015/07/marpinabia-rede-afroalagoana-as-luzes.html>. Acesso em: 12. out. de 2015.
17
resistências, reapropriações e adaptações a diferentes realidades, políticas, sociais, culturais e
religiosas. E, ainda, por reconhecer a importância dos negros alagoanos e seus ancestrais
africanos como parte central da construção do Estado de Alagoas, sobretudo, das religiosidades
aqui existentes há séculos. “Ressignificações”, por entender uma cultura dinâmica, em que o
processo de criação de significados é constante.
A discussão dos elementos metodológicos que serviram como base para a análise das
fontes consultadas e para a elaboração do projeto surgiu de forma reflexiva e crítica ou, no
dizer de Da Mata (2010, p. 18-19), de um “autocontrole científico”. Buscou-se construir a
análise científica abstendo-se de juízo de valor ou de fé. Segundo Da Mata, “a problemática e
o faro investigativo do pesquisador é que ditam o tipo de documentação a ser utilizada” (DA
MATA, 2010, p. 72). Compreende-se que esta empreitada investigativa demanda, no mínimo,
um grau de intimidade com o objeto (DA MATA, 2010, p. 75) e que devem ser buscadas
explicações nas sociedades em seu conjunto de relações, em sua conjuntura social e cultural.
Deve-se também estar ancorado no tempo e no espaço, para assim elaborar e produzir – a partir
de uma situação específica e, sobretudo, do “lugar sociocultural” – conhecimento à luz do seu
campo de estudo. Tendo isso em vista, quis-se estudar a cosmologia umbandista em
Viçosa/AL, fazendo um esforço para que seus agentes fossem os protagonistas.
O termo genérico “xangô é muito utilizado no contexto alagoano. Roberto Motta (1996,
p. 24-32) e Araújo (2014, p. 63-65), dentre outros, utilizaram a expressão “Xangô
umbandizado” referindo-se à organização ritual dos terreiros de Umbanda. Para Roberto
Motta, esses rituais sofreram um processo de “hibridização” entre cultos umbandistas e
terreiros “nagô”. Ou seja, assumiram variadas vertentes refletidas em suas orientações
“litúrgicas” como os chamados terreiros “mistos”, terreiros “traçados”, terreiros de “Mesa
Branca” e outras expressões utilizadas pela sua liderança. Segundo Motta, existem
“especificidades exclusivas” do sistema de representação e dessas práticas religiosas em
diferentes contextos históricos. Classificar tipologicamente esses terreiros é algo complexo,
pois suas versões mais “sincréticas” ou “híbridas” assumiram formas de representação e prática
religiosa em diferentes contextos sociais, sobretudo, na zona urbana (MOTTA, 1996, p. 24-32).
Em Viçosa, por exemplo, se utiliza também a expressão “xangô”. Já a classificação e
orientação dos terreiros foram dadas pelas próprias lideranças locais, como sendo “traçada” e
“nagô”. As lideranças em Viçosa se autodeclararam “filhos de Umbanda”.
18
Para uma melhor delimitação do objeto, bem como melhor coesão científica da religião
estudada, escolheu-se investigar a Umbanda em Viçosa/AL. A escolha desse objeto como
unidade de análise e avaliação, pôde ser justificada pelo tipo de fenômeno ou ritual em causa.
Para isso, esta pesquisa vem desvincular toda forma de ver essa prática como sendo dos
demônios e, principalmente, o Exu como um “Diabo” ou “Satanás”. O recorte temporal
utilizado (1960-2013) justifica-se principalmente pelo fato de que a partir do final da década de
1950 e início da década de 1960, Viçosa passou a ter o culto organizado da Umbanda
propriamente dito, mas desde meados da década de 1930, já funcionavam com reuniões
chamadas de “Mesa Branca” ou “Mesa de Jurema”3. A partir da década de 1970 a 1990,
foram abertos terreiros na zona urbana e rural. Porém, somente em 2013, a Umbanda foi
incluída na programação cultural do Município nas comemorações do evento intitulado: Viçosa
nas Trilhas de Zumbi dos Palmares, ocorrido entre os dias 11 e 30 de novembro 4. No ano de
2014, o ingresso no Mestrado em História 5 proporcionou a retomada do campo de estudos, a
identificação de outros rituais, a abertura de novos terreiros e a atualização das fontes e revisão
bibliográfica sobre o assunto. De certa forma, foi possível ampliar os estudos na área. O
estudioso da religião poderá ancorar sua “perspectiva à luz das ciências sociais”, como uma
representação das suas relações; à luz da psicologia, como uma representação da realidade
mental; ou, se estiver interessado, poderá abordar a partir da ótica teológica ou metafísica, uma
preocupação suprema em que há um sentimento de dependência do “sagrado” ou “absoluto”
(MERRIAM-WBSTER, 2014, p. 915-916).
3
A expressão evoca o Kardecismo, mas de acordo com o campo de pesquisa, esta prática serve para receber
Caboclos e Pretos Velhos diante de mesa forrada com uma toalha preferencialmente de cor branca no canto do
salão de culto. Segundo os zeladores mais antigos, esta se constitui a primeira prática que se tem notícia dos
terreiros em Viçosa. Para Cosme Alves, (Pai Cosme), ainda criança, sua família o levava para “sessões de mesa” a
fim de se comunicar com os Caboclos e os Pretos Velhos. Compreende-se que os cultos afro-brasileiros no Estado
de Alagoas também sofreram fortes influências das doutrinas espíritas, do chamado “espiritismo de linha”.
Abelardo Duarte no início da década de 1950 reconheceu que era inegável essa influência. Ao se referir aos cultos
afro-brasileiros em Alagoas, Duarte escreveu que “infiltrou-se neles a Umbanda mesclada de espiritismo e
catolicismo. Caminha para a prática talvez do que chamamos de Umbanda Branca...” (DUARTE, 1952, p. 78).
4
A programação intitulada: Viçosa nas Trilhas de Zumbi dos Palmares foi organizada pela Secretaria Municipal
de Educação e Cultura e contou com o apoio da população nas festividades que ocorriam todos os dias em
diferentes espaços da cidade. A manhã do dia 19 de novembro foi escolhida para homenagear a religião da
Umbanda. A iniciativa partiu deste jovem pesquisador que desde os anos de 2009 e 2010 vem pesquisando sobre
esta modalidade religiosa presente no município há décadas. Esta empreitada acadêmica resultou na sua
Dissertação de Mestrado em Ciência das Religiões: As relações entre filhos/as de santo e espíritos no cosmo
religioso umbandista: Uma abordagem a partir do contexto de Viçosa/AL.(205f) defendida e aprovada em 18 de
fevereiro de 2013 na Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, em Lisboa, Portugal a qual está no
prelo na Edufal. Trata-se de uma pesquisa de campo etnográfica desenvolvida durante dezesseis meses em oito
terreiros de Umbanda inseridos no município de Viçosa. Após entregar, em maio de 2013, o projeto a então
Secretária de Educação e Cultura do município, a senhora Karina Padilha Rebelo, recebendo sua aprovação em
julho do mesmo ano, começaram os preparativos. O objetivo do evento foi socializar a pesquisa acadêmica e,
acima de tudo, ouvir a liderança umbandista e seus respectivos/as filhos/as de santo.
5
PPGH/UFAL – 2014.1.
19
A atividade simbólica aqui é entendida como “os rituais que formam essa atividade
coletiva ocupando lugar e se articulando com as atividades cotidianas”, técnicas e sexuais da
sociedade em torno de suas crenças e seus valores. Trata-se de uma elaboração da capacidade
simbólica e linguagens simbólicas pelo humano. Para Leenhard (2012, p. 7-8), magia e
simbolização constituem-se os fundamentos intransponíveis de qualquer religião. Segundo ele,
a religiosidade parte de três atos fundadores: (a) a magia (conquista, poder, busca); (b) a prática
ritual (obras, discurso) e (c) a comunidade sólida (sobrevivência da fé). Os atos e os gestos
constituem a religiosidade, pois só há religião se existirem gestos religiosos. Na religião, o
divino aparece em formas diferentes, de acordo com o local e a cultura, afirma Leenhard.
A base teórico-metodológica utilizada para o desenvolvimento desta pesquisa foi a
perspectiva da história social a partir da prática historiográfica com empreendimento científico,
procurando entender a realidade circundante do objeto investigado. Considerou-se a
interdisciplinaridade das ciências humanas e sociais, a fim de construir uma análise histórica do
objeto. Os terreiros investigados trouxeram em seu arcabouço ritualístico experiências próprias
e singulares. Desse modo, 33 terreiros inseridos no município de Viçosa/AL compuseram o
universo da pesquisa. A pesquisa foi desenvolvida entre abril de 2014 e abril de 2015, com
vinte e uma lideranças. As outras doze não participaram pelos seguintes motivos: (a) cinco não
aceitaram gravar entrevistas; (b) uma Mãe de santo veio a óbito; (c) três estão atualmente
residindo em outros municípios, vindo a Viçosa esporadicamente e; (d) após algumas tentativas
três não foram encontradas. Dois presidentes das Federações umbandistas do Estado também
compuseram o universo da pesquisa.
Foram realizadas entrevistas individuais semiestruturadas com as lideranças
umbandistas no interior dos próprios terreiros e em suas residências e com os dois Presidentes
das Federações. Todas foram gravadas em equipamento digital de áudio e vídeo constituindo,
assim, parte do empreendimento científico do trabalho. Houve a observação em vinte e uma
“giras” ou “toques” de Exus e Pombagiras e, em seis, nas chamadas “matanças pra Exu”,
ocorridas no mês de agosto/2014. Buscou-se também, fontes documentais, jornais e fotografias
para compor a pesquisa. O processo de compreensão da elaboração no tempo/espaço foi
construído dialeticamente, entre as relações de poder, a base ideológica e a forma social de
entender Exu. A história oral permitiu conhecer experiências e modos de vida dos grupos
religiosos estudados durante um ano e o diálogo com outras áreas do conhecimento como a
Antropologia e Sociologia da religião (ALBERTI, 2008). Segundo Alberti, “A História oral é
hoje um caminho interessante para se conhecer e registrar múltiplas possibilidades que se
20
manifestam e dão sentido a formas de vida e escolhas de diferentes grupos sociais, em todas as
camadas da sociedade” (ALBERTI, 2008, p. 164). Adotou-se também a “análise de conteúdo”
a partir de Bardin (2009), compreendendo que a análise de um enunciado deve partir do
conhecimento daquilo que está implícito nas palavras sobre as quais se debruça. Para Bardin,
todo pesquisar na tarefa de análise dos resultados deve lidar com os estereótipos e estes, de
acordo com sua definição (BARDIN, 2009, p. 45; 53), são as ideias, imagens e representações
que o pesquisador tem de coisas, pessoas e ideias partilhadas pelos membros de um
determinado grupo social. Segundo a autora, o estereótipo mergulha suas raízes no emocional e
afetivo, pois está ligado à predefinição por ele racionalizada, justificada e criada no labor da
análise.
Qualquer pessoa que faça entrevistas conhece a riqueza desta fala, a sua singularidade
individual, mas também a aparência por vezes tortuosa, contraditória, com “buracos”, com
digressões incompreensíveis, negações incômodas, recuos, atalhos, saídas fugazes ou clarezas
enganadoras. Uma entrevista é, em muitos casos, polifônica (BARDIN, 2009, p. 90). Buscando
certo rigor metodológico, verifica-se que a análise qualitativa (BARDIN, 2009, p. 140-143)
compreende o sentido da fala dos indivíduos. Bardin afirmou que o discurso, neste contexto, é
toda comunicação estudada em nível elementar – palavras ditas – e em nível de frases,
proposições, enunciados e sequências. Segundo a autora, o discurso é considerado um dado,
isto é, “enunciado imobilizado, manipulável, fragmentável” (BARDIN, 2009, p. 216). Além
disso, com base na autora, compreende-se também que discurso não é um produto acabado,
mas um momento num processo de elaboração da análise de conteúdo. Assim, compreende-se
que o labor historiográfico tem particularidades que possibilitam às experiências humanas do
passado tornarem-se inteligíveis no tempo presente. Trata-se da refiguração do passado. Ou
seja, na relação com o objeto, o historiador está tomando consciência do seu ofício a partir da
dimensão humana na elaboração da escrita, encontrando mais perguntas do que respostas.
Baseou-se na análise comparativa das informações na pesquisa bibliográfica,
documental e dos dados colhidos em campo durante doze meses, utilizando dialeticamente os
métodos dedutivo e indutivo, a partir da análise da disposição ordenada dos enunciados gerais,
em que tais informações foram sistematizadas em uma fundamentação teórica e alicerçadas
nesta última. Em Haguette, descobriu-se que “... os métodos qualitativos enfatizam as
especificidades de um fenômeno em termos de suas origens e sua razão de ser" (1992, p.63).
Buscou-se também, a realização de uma análise qualitativa do material (HAGUETTE, 1992,
p.52-68; MINAYO; DESLANDES; GOMES, 2008, p. 62), que permitiu compreender os
21
“Exus-Demônios” no interior desses terreiros. Para situar-se no campo de pesquisa adentrou-se
no município de Viçosa/AL, localizado a 86 quilômetros da capital Maceió, na mesorregião do
leste alagoano e microrregião serrana dos Quilombos dos Palmares, que atualmente registra
uma população de 25.444 habitantes6.
A problemática que norteou a escrita foi a seguinte: Por que Exu foi identificado com o
Diabo dos cristãos? Havia alguma concepção de Mal nas culturas africana e indígena presentes
na colonização do Brasil? O culto a Exu existia nos primórdios dessas práticas no Brasil? A
Umbanda contribuiu para a demonização de Exu? Por que Exu dividiu e ainda hoje divide
opiniões no interior desses cultos? O que as literaturas sobre as religiões afro-brasileiras dizem
sobre Exu? Será Exu o Diabo? O objetivo geral do trabalho foi justamente buscar compreender
as interpretações e percepções historicamente construídas acerca do Orixá Exu entre os anos
1960 e 2013, identificando as absorções e similitudes históricas, sobretudo no desenvolvimento
do processo sincrético no Brasil a partir da organização da Umbanda na segunda metade do
século XX. A partir daí tornou-se possível a reflexão acerca dos desdobramentos no imaginário
religioso umbandista, no município de Viçosa, interior de Alagoas, a partir da segunda metade
do século XX e constituiu-se uma base de reflexão que auxiliou no fortalecimento de uma
teoria explicativa sobre as transformações e mudanças históricas vivenciadas pelas religiões
afro-alagoanas, tendo em vista os embates culturais e, sobretudo, sociais de seus adeptos na
atualidade. Especificamente, buscou-se identificar dados sobre a história contemporânea das
religiões afro-alagoanas, a partir de uma ênfase no município de Viçosa; descrever as
mudanças históricas do Orixá Exu nos rituais umbandistas praticados no município de
Viçosa/Alagoas; caracterizar as percepções e experiências das lideranças umbandistas na
relação com os Exus cultuados nos terreiros; bem como identificar as transformações culturais
e sociais do Exu na Umbanda a partir da segunda metade do século XX e, por fim, verificar na
história da Umbanda viçosense as concepções dos Pais e Mães de santo sobre os Exus.
Tanto as hipóteses quanto os pressupostos alçados, bem como sua contextualização e
conceitos elaborados a partir do objeto de investigação, constituíram uma baliza dialética entre
o pesquisador e o campo. Por conseguinte, o pesquisador foi inserido dentro do universo da
pesquisa sob sua observação, por meio da relação direta com seus interlocutores, bem como da
interferência e modificação pessoal, a partir de dados colhidos dentro do contexto pesquisado.
Tomando-se como fundamento evidências dos autores sobre o assunto e lideranças
6
Censo IBGE 2010. Dados disponíveis em: <http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1>. Acesso em:
09 nov. de 2014.
22
umbandistas viçosenses, tornou-se possível entender que cada realidade constitui um fulcro e
uma idiossincrasia únicos e singulares no levantamento de dados científicos de qualquer
pesquisa acadêmica. A Dissertação está estruturada em quatro capítulos entrecruzados a fim de
alcançar os objetivos propostos acerca da temática. Todo o trabalho está centrado em torno do
personagem Exu, sobretudo, no interior da Umbanda, com ênfase nos trinta e três terreiros
inseridos no município de Viçosa. E ainda, um panorama histórico do objeto de pesquisa
intercalado com os dados orais das lideranças umbandistas viçosenses. Os quatro capítulos
foram organizados a fim de proporcionar ao/à leitor/a uma visão panorâmica do tema
escolhido.
O capítulo 1, intitulado: O culto da Umbanda no Brasil e no Estado de Alagoas:
breves considerações trará um panorama do desenvolvimento da religião umbandista no País,
desdobramentos e organização de culto, bem como os entrelaçamentos sócio históricos entre o
Candomblé, Umbanda e Quimbanda na formação da afro-alagoanidade. Buscará também,
basicamente, reconhecer o que ainda precisa ser pesquisado e problematizado a respeito do
campo religioso afro-alagoano. Também, identificar o imaginário social discriminatório ainda
visível no Vale do Paraíba, na Zona da Mata do Estado,
O segundo capítulo, As religiões afro-alagoanas no contexto de Viçosa, (1930-2015)
apresentará o mosaico religioso diversificado deste município, sobretudo a história da
Umbanda, seus primórdios, organização e desenvolvimento, bem como os pioneiros da
religião, a liderança mais antiga, os novos líderes e, principalmente, os rituais praticados nos
dias atuais. Mostrará também as dificuldades existentes em escrever sobre a história dos cultos
afro-alagoanos no município. Em síntese, apresentará a dinâmica religiosa existente
reconstruída, décadas após décadas, neste município centenário.
Já o capítulo 3, Recomposição historiográfica sobre Exus e Pombagiras na
Umbanda, trará o culto aos Exus e Pombagiras, seus desdobramentos na organização da
Umbanda no Brasil, sobretudo, no chamado processo sincrético no século XX. Os paradoxos
no âmbito de Exu marcados pela sua imprevisibilidade, sexualidade desenfreada e papel
provocador, atenuados no Brasil, bem como sua “difícil demarcação”, “linha de direita” e
“linha de esquerda” que permeou historicamente o campo ético da Umbanda até a atualidade,
também serão abordados. Por fim, um panorama acerca da imagem construída do Exu-mulher
no cosmo religioso umbandista.
O último capítulo, Exu em Viçosa, Alagoas: ressignificações; trabalhará com alguns
aspectos da presença histórica das religiões afro-brasileiras em Viçosa, com ênfase na segunda
23
metade do século XX. Diz que a Umbanda teve e tem um papel protagonista no processo de
consolidação dos cultos ali. Apresenta a complexidade de sua ritualística, destacando a
existência do Orixá/Entidade/Espírito Exu na sua complexa variação à brasileira e/ou à
nordestina. Em algum grau, registra-se que toda a liderança umbandista tem a plena
consciência de que a imagem de Exu como sinônimo de Diabo é inevitável e,
consequentemente, suas punições são uma realidade em todos os terreiros estudados.
Após o desenvolvimento dos quatro capítulos, caminhar-se-á para a Conclusão a fim de
retomar de maneira sintética, as análises e interpretações dos capítulos com o intuito de
proporcionar uma explicação histórica sobre a problemática suscitada, as hipóteses e as
soluções encontradas mediante o trabalho de campo. A lista completa da bibliografia composta
por fontes e referências está apresentada no final do texto. Nos Apêndices e Anexos estão
disponibilizados alguns documentos, modelos de entrevistas semiestruturadas, parte do
material da pesquisa de campo incluindo cerca de cento e cinquenta figuras e lista atualizada de
endereços dos terreiros viçosenses.
Por essa razão, com efeito, o tema proposto remeteu-se às peculiaridades locais,
experiências, cultura, redimensionamentos das práticas, relações entre esses grupos, realidade
social, olhares, interpretações, descrições e discursos dos interlocutores analisados durante
doze meses. Para isso, foi seguido o esquema do cronograma de execução do projeto no prazo
máximo de 24 meses determinados pelo PPGH/UFAL. Desse modo, espera-se que as páginas
que se seguem possam servir como interesse para os/as demais pesquisadores/as do tema em
Alagoas e fora do Estado e, acima de tudo, contribuir para cercear a discriminação religiosa tão
presente no País e aflorada nos últimos anos pelo fundamentalismo religioso midiático.
24
2
O CULTO DA UMBANDA NOBRASIL E NO ESTADO DE ALAGOAS:
BREVES CONSIDERAÇÕES
Alagoas é um dos Estados brasileiros com o maior contingente
de população negra e parda. O histórico de violência contra esta
população é sistêmico, chegando às raias do patológico.
Partindo-se de dados sociais, nota-se que esta não é uma
afirmação exagerada. Cabe aos historiadores da cultura negra e
das relações étnico-raciais no Estado, lidarem com a crua
realidade deste presente (SANTOS, 2013, p. 31).
A proposta deste capítulo é apresentar uma síntese da produção acadêmica que vem
preenchendo algumas lacunas nas últimas décadas, bem como abordar os trabalhos de
historiadores e cientistas sociais que vêm auxiliando a montar um quadro de referências sobre o
desenvolvimento histórico dos cultos afro-brasileiros no País, sobretudo, acerca da Umbanda e
mais precisamente, no contexto alagoano. Pretende-se também reconhecer o que ainda precisa
ser pesquisado e problematizado na situação do conhecimento histórico a respeito do campo
religioso afro-brasileiro no Estado de Alagoas. Ao ler autores como Rafael (2004), Santos
(2012), Cavalcanti; Fernandes; Barros (2006; 2008), Cavalcanti; Rogério (2008), Araújo
(2009; 2014) e Tenório (2014), percebe-se a pouca alusão que se tem feito acerca deste assunto
em Alagoas. Para Lindoso (2005), a historiografia alagoana é marcada por uma “ideologia da
representação social”.
A primeira referência documental a atividades religiosas africanas no Estado de
Alagoas dataria do século XVIII. 7 Alagoas, segundo Barbosa (1985, 2006), é o lugar com
maior número de gangas8famosos até o Império. Para Barbosa, isso ocorria, talvez devido a
influência das sociedades secretas9 que atuavam por trás de Angola Janga. Para Tenório (2014,
7
Novas pesquisas ainda em andamento estão conseguindo identificar agentes da religião africana no período
colonial em Alagoas. Cf. MACHADO, Alex Rolim. Classificação e perseguição: os agentes da Inquisição, os
negros, pardos e mulatos em uma sociedade escravista. (Alagoas Colonial, 1674-1820). Maceió, UFAL, inédito,
2014. Alex Machado é mestrando em História, está desenvolvendo pesquisa sobre os familiares do Santo Ofício
em Alagoas.
8
Os gangas tradicionais eram perseguidos pela polícia. “Ganga” e “Kibanda” significam “feiticeiro” (Kibanda é
palavra ovambo). (BARBOSA, 1985, p. 93). Trata-se do sacerdote-feiticeiro-médico (Kimbanda, ganga).
(BARBOSA, 2006, p. 28).
9
“Na organização e na participação combativa dos negros nas diferentes revoltas, desempenhou importante papel
sua consciência religiosa e sua ideologia social independente. Numerosas sociedades secretas subsistiram ou se
formaram entre os negros (...).Estas sociedades mantiveram contatos políticos com o ramo vermelho da
Maçonaria, e outras organizações antimonárquicas, constituindo-se um embrião da vida política progressista e
independente dos negros. Os membros dessas sociedades eram, em geral, cavalos de santo (hieródulos das
25
p. 17), no século XVIII a religião dos negros sofria muita oposição, pressão, discriminação e
violência em Alagoas. Nas Vilas de Porto Calvo, Penedo e Alagoas do Sul – com suas
inúmeras propriedades de engenhos que se estendiam e se multiplicavam de Barra Grande, no
norte, ao Rio São Francisco, no sul do Estado onde existia população negra e as negras
benzedeiras conhecidas pelas artes dos sortilégios entre a população – já havia repressão,
aponta Tenório (2014).
Pesquisar a história das religiões afro-alagoanas é, por conseguinte, compreender a
formação cultural local e a inserção da cultura negra no Estado e os conflitos étnico-raciais
ainda presentes na historiografia alagoana (SANTOS, 2014, p. 1-31). Para Santos, “a elite
alagoana teve por muito tempo o privilégio de escrever a história local a partir de seus
interesses”. No século XIX, ela passou a produzir a historiografia oficial divulgada e reforçada
da “invenção de uma identidade alagoana branco-europeia”, escravagista e hegemonicamente
católica. O ambiente aqui seria claramente repressor da culturalidade negra. Tratar-se-ia de um
ambiente hostil. Porém, desde o século XIX, os negros conseguiram recriar a religiosidade
africana na região (SANTOS, 2013, p. 11-13; TENÓRIO, 2014, p. 9-35). Duarte (1952; 1974;
2010) identificará os “cultos africanos” e sua sincretização com o catolicismo popular e as
próprias seitas africanas na segunda metade do século XIX. Segundo ele, esses “cultos
africanos” eram formados em sua maioria, por “africanos puros”, “legítimos” e por seus
descendentes (DUARTE, 1974, p. 9; 15).
Essa produção historiográfica foi feita pelas elites e pela burguesia mercantil urbana, na
ideologia de dominação do século XIX. Esta ideologia é materializada e consolidada como
hegemônica, dominadora e conservadora. Para Lindoso (2005, p. 17-18), estaria representada
pela “coesão social e expressão política da elite urbana”, significaria “manipulação ideológica”
ao longo dos anos. A vasta produção etnográfica brasileira sobre a experiência religiosa negra,
a exemplo dos estados vizinhos de Pernambuco, Bahia e Sergipe, é muito superior se comparar
com a alagoana (RAFAEL, 2008, p. 31-37).
A falta de registro documental sobre a memória negro-alagoana também contribuiu para
a lacuna existente – conforme aludiram Rafael (2004, p. 12; 2008, p. 36) e Santos (2012, p.
64).Para Rafael, a existência de tão pouco material sobre o assunto registra notadamente o que
chamou de o “misterioso silêncio” da intelectualidade alagoana sobre a temática religiosa
negra. Isto ficou claro, sobretudo, no que diz respeito ao episódio do “Quebra” ocorrido no ano
de 1912 na capital Maceió. Santos (2012) destaca o que chamou de o “silêncio social” e o
religiões afro), encarregados de manter ativos, em quaisquer circunstâncias, o “templo” do grupo religioso, na
pessoa dos instrumentos sagrados do culto (feitiços)” (BARBOSA, 2006, p. 17-18).
26
“silêncio dos intelectuais”, que por muito tempo negaram uma análise específica sobre os
conflitos sociais ocorridos no início do século XX com o episódio do “Quebra”. Segundo a
autora, isso pode ilustrar a relegação da população negra em sua história. A autora escreve:
ainda identificam-se os candomblés de Maceió como “xangôs”, porém de
forma bem menos patente. Faz-se, então, a reafirmação aqui da presença de
Xangô, mesmo que silenciosa. Dizem que os silêncios também falam. O não
dito, serve para descortinar parte das transformações históricas das religiões
afro-brasileiras, não somente para Alagoas, mas para todo o território
nacional, pois ilustraria a forma como a população negra foi relegada sua
história. Por outro lado, reafirmaria também o resgate dessa história, a
valorização dos indivíduos e do coletivo negros e de suas lutas que se
ampliaram nessa segunda metade do XX(SANTOS, 2012, p. 64-65).
Para se ter uma ideia, segundo Barbosa (1985), até o ano de 1950 contavam-se por aqui
catorze feiticeiros ou chefes de seitas importantes na identidade negro-alagoana(BARBOSA,
1985, p. 92-93). Mesmo assim, a historiografia negra no Estado foi relegada. Este autor
reconhece Alagoas como o lugar do Brasil com maior número de gangas famosos, isto é,
chefes de seitas (BARBOSA, 1985, p. 1-98). Os pesquisadores Cavalcanti e Rogério já
reconheceram tal lacuna na história negro-alagoana,
do expressivo volume da produção científica brasileira sobre as religiões de
matriz africana no decorrer do século XX e início deste, muito pouco diz
respeito a dados oriundos da observação dos terreiros alagoanos ou
maceioenses. Assim, trata-se de uma realidade que reclama por ser
compreendida em suas características históricas, sociais e simbólicas, ainda a
merecer a devida atenção de estudiosos tanto sobre seu passado quanto acerca
do presente. Vários fatores colaboraram para esse cenário de esquecimento da
memória negro-alagoana por parte dos estudiosos locais que poderiam ter
efetuado maior registro documental sobre a matéria (CAVALCANTI;
ROGÉRIO, 2008, p. 9).
As manifestações afro-brasileiras também são chamadas em Alagoas de “xangôs”,
designando o culto ao Orixá da justiça, Xangô, muito praticado durante o período colonial e
imperial nas regiões de Pernambuco e Alagoas. 10 No período abolicionista, as concepções
racistas foram reforçadas, identificando os negros adeptos das práticas afro-brasileiras com o
“diabo ou o demoníaco na província” (SANTOS, 2013, p. 18; 30).A organização de cultos
afro-brasileiros em Alagoas data, pelo menos, de início dos oitocentos, mas suas raízes são
muito antigas no Estado. A religiosidade negra foi intensa, envolvendo a classe política e
10
MACHADO, Alex Rolim. Classificação e perseguição: os agentes da Inquisição, os negros, pardos e mulatos
em uma sociedade escravista. (Alagoas Colonial, 1674-1820). Maceió: UFAL, inédito, 2014.
27
contribuindo para as manifestações folclóricas na capital e interior. Segundo Tenório (2014), os
“autores” envolvidos nas tramas sociais e religiosas foram quase ausentes nos estudos voltados
para esta temática.
A “desconsideração da elite alagoana” foi e ainda continua sendo recorrente com os
episódios dos segmentos marginalizados, considerados “classes perigosas” (RAFAEL, 2008).
Torna-se preciso resgatar a dinâmica dessas crenças com suas características sociais, históricas,
culturais e simbólicas, sobretudo, no interior do Estado. As primeiras seções a seguir trazem
uma alusão às práticas umbandistas no contexto brasileiro e suas convergências com outras
práticas afro-brasileiras, mostrando possibilidades de compreensão dessa modalidade religiosa,
bem como sua dinâmica de culto. Nas seções posteriores mostrar-se-á a presença desses cultos
no contexto de Alagoas.
2.1 História da Umbanda: possibilidades de narrativas
Não se trata de buscar uma história da “fundação”, “aparecimento” ou “origens”;
tampouco, encontrar um “pioneiro” da Umbanda, muito menos de chegar a observações
conclusivas e plausíveis dos estudiosos dos seus cultos, mas pensar alguns aspectos
relacionados ao processo histórico da Umbanda, procurando as situações que propiciaram sua
constituição propriamente dita e seu posterior desenvolvimento no Rio de janeiro, no início do
século XX. O que se encontram disponíveis entre os especialistas do assunto são referências
institucionalizadas que emergiram historicamente – o chamado “mito fundador da religião”,
sobretudo, com um número enorme de publicações posteriores a 1960. Trata-se de referências
contemporâneas ou posteriores a morte de Zélio de Moraes11 no ano de 1975 (GIUMBELLI,
2002, p. 189).
Segundo Giumbelli (2006), a “busca pela África no Rio de Janeiro” nesse contexto –
passagem entre o século XIX e XX – conduz a duas especulações: (a) a um Candomblé
evanescente e difuso e (b) a uma macumba muito incerta e pouco assumida (GIUMBELLI,
2006, p.109). Giumbelli afirma que a ausência de estudos acadêmicos no sudeste (se
comparada com o nordeste nesse contexto) e a força do espiritismo de matriz Kardecista no
Rio de Janeiro são o resultado das distinções que as práticas africanas sofreram no Brasil – uma
11
O processo de “tornar branca” a Umbanda deu-se em 15 de novembro no ano de 1908, no Rio de Janeiro com a
descida do Caboclo Sete Encruzilhadas no médium kardecista Zélio Fernandino de Moraes nascido em São
Gonçalo, Rio de Janeiro. (1891-1975). Segundo Barbosa, isto levaria a Inbandlaà Umbanda de Linha Branca
como ramo cada vez mais desafricanizado dessa modalidade religiosa. Alguns intelectuais umbandistas veem em
Zélio o marco fundados da Umbanda.
28
vez que eram consideradas “degeneradas e contaminadas”. No nordeste, por exemplo, os
acadêmicos intervieram diretamente no processo de legitimação dos cultos validando suas
categorias como mediadoras sociais. Já no sudeste, os intelectuais incorporaram aqueles termos
utilizados nas disputas por legitimidade social e então, introduziram um viés nas práticas
repressivas (GIUMBELLI, 2006, p.110). Para o autor, nas primeiras décadas do século XX, da
expressão cunhada “baixo espiritismo”, pode-se tirar uma utilidade bem distinta: o sudeste
refere-se ao “campo mediúnico”, remetendo ao “espiritismo” e não ao “afro-brasileiro”. Tratase de categorias ao mesmo tempo jurídica e religiosa, envoltas em tramas, múltiplos autores de
legitimação e condenação (GIUMBELLI, 2006, p.110-111).
Quando se considera esta ideia de “baixo espiritismo”, visualizada naquele contexto, o
autor diz que se pode inferir o seguinte: (a) posteriormente nas décadas de 1920 e 1930
observadores descreveram as práticas africanas no Rio de Janeiro como uma modalidade ou
variante do espiritismo Kardecista; (b) levaram outros observadores a desconhecer que
houvesse Candomblé em terras cariocas; (c) com o processo da organização da religião
Umbanda, os próprios umbandistas optaram por manter a designação de “espíritas”
promovendo então o “espiritismo de umbanda” e (d) houve então redefinições propostas pelos
umbandistas no decorrer das décadas sobre a magia, principalmente, a partir de 1941 com a
realização do Primeiro Congresso Brasileiro de Espiritismo de Umbanda ocorrido no Rio de
Janeiro (GIUMBELLI, 2006, p.111-112; 2003, p. 247-281). Para ele, este congresso se
mantém como ponto de referência, marco inicial de normatização dessas práticas. Constata-se
na elaboração dos documentos do evento, uma clara alusão às origens orientais, aos princípios
kardecistas e à ascendência cristã em detrimento das origens africanas. Assim, o africano é
recusado e a tese do embranquecimento dos médiuns e auxiliares passa a ser um referencial
dessas práticas num congresso de várias lacunas (GIUMBELLI, 2006, p. 112-113).
Giumbelli traz uma observação interessante sobre a “não totalmente recusa do
africano”. Segundo ele, pelo menos em um ponto, a “ligação com a África” é reconhecida ali.
Trata-se da caracterização dos Pretos Velhos, entidades que têm como referência o africano ou
seus descendentes. Aqui é notada a relação com o “branco” que imputou-lhes a escravidão
(GIUMBELLI, 2006, p. 112). Outra questão que está ausente das conclusões daquele
congresso é a caracterização da Umbanda como “magia”. Uma das teses apresentadas traz uma
aproximação entre a Umbanda e certas correntes do ocultismo ocidental e ao mesmo tempo,
reconhece suas origens africanas, mas relacionando-a com os “aspectos grosseiros” das práticas
e pela sua “rudeza de vocabulário”. Percebem-se aí os mecanismos de regulação social do
29
religioso (GIUMBELL, 2003, p. 281). As conclusões apontam para apresentar a Umbanda
como uma reação à “magia negra” operada por “entidades trevosas”, convocando-a a combater
essas “entidades trevosas” responsáveis pelo “terrível surto do mal”. É a partir, sobretudo, da
década de 1940 que procuram apresentar a Umbanda como um recurso de “desenfeitiçamento”,
apresentando-a como um “instrumento para entregar o mundo ao bem e livrar os seres
humanos dos males espirituais”. Anterior ao congresso, a partir do ano de 1929 até 1940, os
cartórios já começavam a registrar terreiros de Umbanda, “travestidos de centros espíritas”
(NEGRÃO, 1996, p. 67; GIUMBELLI, 2006, p. 112-113).
O projeto de organização da Umbanda ou de “ideologização do mítico” elaborado pelos
líderes das Tendas de Umbanda, iniciado no ano de 1930 e reforçado na década de 1940 no Rio
de Janeiro e que se espalhou por toda São Paulo, na capital e no interior, na década de 1950,
reconhecia a Umbanda como uma religião legítima. O movimento federativo, principalmente a
partir das décadas de 1960 e 1970, se encarregou de “embranquecer”, “cristianizar” e
“racionalizar” os cultos afro-brasileiros para assim legitimar suas práticas e ganhar proteção e
reconhecimento do Estado e, acima de tudo, o respeito das demais religiões no país 12. Segundo
Negrão, a Umbanda teve seu clímax no final da década de 1960 e início da década de 1970. Só
para se ter uma ideia, data de 1964 a inclusão da Umbanda no Anuário Estatístico do IBGE,
reconhecendo-a como religião, bem como, a inclusão de suas festas nos calendários regionais,
a exemplo da festa de Iemanjá, no Rio de Janeiro, em 31 dezembro de 1964 (NEGRÃO, 1996,
p. 69-70; 96-97). Apesar da resistência por parte de alguns líderes, a busca pelo “caráter
nacional da Umbanda” ganhou força no seu processo de legitimação, adaptação e ampliação de
suas práticas em todo o país (NEGRÃO, 1996, p. 146-148). É justamente a partir dessa década
de 1960 que a Umbanda em Viçosa se apresentou como culto organizado aberto ao público, o
que constituiu o recorte desta pesquisa.
2.2 Adaptações e ampliações da Umbanda
Para Giumbelli (2002), atribuir a fundação da Umbanda à figura do médium Zélio de
Moraes e seu surgimento definitivo entre as décadas de 1920 e 1930, no contexto carioca, é
uma construção tardia, pois o reconhecimento dessa figura seminal perscruta em registros
posteriores à década de 1960, em sua maioria, referências contemporâneas a partir de 1975 e,
12
No campo de pesquisa, por exemplo, foram registrados catorze terreiros com o nome de “Centro Espírita” e um
identificado por “Casa de Oração”. Tudo leva a perceber a forte influência cristã-espírita na constituição dos
terreiros viçosenses.
30
principalmente, na década de 1980. Com isso, Giumbelli escreve que a imposição de maneira
inexorável da sua dispersão doutrinária e ritualística e suas divisões institucionais retratam sua
construção histórica tardia (GIUMBELLI, 2002, p. 189-190). Isto resultou nas indefinições do
mito de origem da religião que permeou por décadas e que, ainda hoje, proporciona diversas
discussões entre os intelectuais umbandistas. Percebe-se que a história da origem da Umbanda
trata-se de um processo “rizomático”, “descentralizado”, dominado pelo movimento de
organização e sistematização dos elementos codificados do Kardecismo nas primeiras décadas
do século XX no Sudeste do Brasil.
Partindo da análise de Negrão (1979, p. 170-180), é possível apresentara Umbanda em
três níveis de interpretação: (a) uma religião como expressão da cultura brasileira, portanto, à
brasileira; (b) uma religião a partir da visão de seus “legitimadores” e (c) uma religião como
processo de integração do negro à sociedade, portanto, estrutural. Esses três níveis de
interpretação se fundem. É possível enxergar a Umbanda como uma expressão arquetípica da
condição do dominado numa sociedade em pleno processo de efervescência social, mas é
possível também enxergar esta religião como um processo de apropriação dos seus líderes no
sentido de branqueamento de crenças e ritos religiosos para atender às concepções dominantes
à época. Segundo Negrão (1979, p. 180), aí reside a ambiguidade da Umbanda no
desenvolvimento do seu processo histórico no Brasil.
Para Negrão, as expressões ideológicas da sociedade dominante penetraram o interior
da Umbanda. E mais, apesar da sua expressão cultural popular – visão defendida por ele – ao
ver a Umbanda como uma religião “à moda brasileira” (NEGRÃO, 1976, p. 171-180), vê-se a
mesma inserida principalmente na estrutura social e econômica dos anos 1920 e 1930, ora
renegando seus traços africanos, ora assumindo-os para si. Ora repudiando a visão elitista e
branca, ora absorvendo suas ideologias como estratégias de inserção social ou de
sobrevivência. Desse modo, a Umbanda se desenvolveu num contexto social permeado por
contradições e busca por proteção institucionalizada. Como pode-se perceber, a questão da
origem da Umbanda e suas peculiaridades sempre mobilizaram e ainda mobilizam diversas
opiniões e narrativas entre seus adeptos e estudiosos específicos do assunto.
2.3 Candomblé, Umbanda e Quimbanda: convergências
As diferenças e semelhanças dessas práticas distribuem-se nos rituais praticados em
cada terreiro. Cada terreiro é singular e cada Pai ou Mãe de santo possui características
31
próprias de culto: vestimentas, elementos mágicos, invocações, danças, sacrifícios, louvações e
diferentes ornamentações nas casas. Enquanto o Candomblé apresenta traços culturais mais
próximos do imaginário africano, a Umbanda, também vem imbuída dessas características,
sendo, porém mais “abrasileiradas” fomentando o surgimento da prática da chamada
“Quimbanda”, cuja ramificação, “linha de Exus e Pombagiras”, também é praticada, tanto no
Candomblé – não em todos –, quanto na Umbanda. Nesta última, com maior frequência de
culto. É o que apontam alguns especialistas sobre o assunto. 13 Dessa forma, com base em
Prandi – em especial, torna-se possível perceber o sincretismo existente entre essas práticas de
matriz africana (PRANDI, 2005, p. 92-95).
À primeira vista, historicamente, o Candomblé serviu como uma espécie de
organização social, familiar e espiritual, frente às marcas deixadas pela escravidão. Lendo
Prandi, percebe-se que a religião dos Orixás africanos, hoje em dia, “tem se transformado e se
tornado cada vez mais brasileira” (PRANDI, 2005, p. 52-53). O Candomblé não pode mais ser
considerado uma “pequena África” fora da sociedade, conforme descreveram Bastide (2001)
na primeira metade do século XX e Verger (2000). Conforme Prandi, tornou-se uma “religião
para todos”, adaptada aos demais credos religiosos e “aberta no atual mercado religioso
brasileiro”. Para ele, o Candomblé se espalha e prospera, resultando na fragmentação e
dissipação do tempo africano. Ou como descreve Ortiz, passou pelo processo de
“embranquecimento” nas últimas décadas (ORTIZ, 1991, p. 34-40). Segundo Prandi (2005), a
cada dia há um repertório umbandista que cada vez mais se agrega ao Candomblé, resultando
na expressão híbrida: “umbandomblé”. A expressão “umbandomblé”, impressa no livro de
Prandi, também leva a perceber a influência do Candomblé nos terreiros de Umbanda e seus
empréstimos ritualísticos, que não são poucos – como, por exemplo, as imagens de Exus e sua
dupla natureza. Opta-se mais adiante, utilizar o termo Umbanquindomblé significando o
entrelaçamento entre Umbanda, Candomblé e Quimbanda que será explicado posteriormente
(GOMES, 2012).
13
Destacam-se os de maior aproximação nos estudos aqui alçados e os de maior identificação, a saber: BASTIDE,
Roger. O candomblé da Bahia: rito nagô, 2001; BIRMAN, Patrícia. O que é Umbanda, 1993; GIUMBELLI,
Emerson. Zélio de Moraes e as origens da Umbanda, 2002; SILVA, Vagner Gonçalves da. Candomblé e
umbanda: caminhos da devoção brasileira, 2005; SILVA, Vagner Gonçalves da. (Org). Memória Afrobrasileira: Caminhos da Alma, 2002; MAGNANI, José. G. C. Umbanda, 1991; NEGRÃO, Lísias Nogueira.
Entre a cruz e a encruzilhada: formação do campo umbandista, 1996; ORTIZ, Renato. A morte branca do
feiticeiro negro: Umbanda e sociedade brasileira, 1991. PRANDI, Reginaldo e SOUZA (Org). Encantaria
brasileira: O livro dos Mestres e Caboclos e encantados, 2004; PRANDI, Reginaldo. Segredos guardados:
orixás na alma brasileira, 2005. VERGER, Pierre F. Notas sobre o Culto aos Orixás e Voduns na Bahia de
todos os santos, no Brasil, e na Antiga Costa dos Escravos, na áfrica, 2000.
32
O entrelaçamento das práticas afro-brasileiras, neste caso, Candomblé e Umbanda
proposto por Prandi (2005), também conduz à linha da Quimbanda, ramificação do culto
umbandista, trazendo em seu arcabouço ritualístico elementos de ambas as religiões,
principalmente da Umbanda como, por exemplo, Exus e Pombagiras e organização dos
terreiros. No que concerne à Umbanda, Prandi escreve: “Na umbanda, a própria ideia de
religião implica essa noção de trabalho mágico, pois sem a atuação direta dos espíritos na vida
dos devotos a religião não se completa” (PRANDI, 2005, p. 79). A gênese umbandista,
conforme assinala Prandi, foi organizada em torno da prática do “bem”, uma religião que só
trabalha para o “bem de todos”. Tal pensamento compactua com o pensamento de Negrão, o
qual apresenta a Umbanda como uma “religião da caridade”, pois praticá-la significa “fazer o
bem aos vivos e aos mortos”, “único caminho para a evolução espiritual” (NEGRÃO, 1996, p.
370). Conforme Gonçalves da Silva, a Umbanda sintetizou em seu plano mítico-religioso a
integração de todas as categorias sociais, com exclusividade, as marginalizadas, abrindo-se às
formas populares da religiosidade afro-brasileira, constituindo-se uma religião nacional que
abarca imagens tipicamente brasileiras, como por exemplo, o espírito do pernambucano Zé
Pelintra – imagem do homem nordestino, sertanejo, rude, autoritário e trabalhador – arquétipo
da virilidade masculina (SILVA, 2005, p. 132-133).
A análise de Silva remete a Negrão, o qual delineia com coerência o universo simbólico
umbandista, associando-o à criatividade do imaginário popular brasileiro. Apresenta o terreiro
de Umbanda como o locus [o grifo é desses autores] por excelência da produção e reprodução
do sagrado (NEGRÃO, 1996, p. 145). Já de acordo com Prandi,
a umbanda é resultante de um processo de síntese, de uniformização. A
inclusão em seu panteão de personagens dos cultos caboclos regionais teve
que obedecer ao modelo dicotômico de direita e esquerda, e isso provocou
transformações radicais em muitas entidades que migraram para a umbanda.
Assim, Zé Pelintra, por exemplo, que na origem é um mestre do catimbó [...]
transmutado em exu, trabalhando para a esquerda [...]. Igualmente, Maria
Padilha, originalmente, mestra da jurema, foi feita pombagira de renome e
sucesso [...](PRANDI, 2005, p. 135).
Tendo em vista este processo de síntese e uniformização, bem como sua transmutação e
idiossincrasias metamorfoseadas ao longo da história, ainda com base nesse processo de
“evolução espiritual e releituras de seus personagens”, percebe-se que a religião umbandista
sofreu sua organização em solo brasileiro a partir do início do século XX (GIUMBELLI, 2002,
p. 195). Com relação à Quimbanda, Prandi escreve: “não há limites para os guias de
quimbanda, tudo lhes é possível [...] mesmo aquilo que os outros chamam de mal pode ser
33
usado para o bem do devoto e do cliente, os fins justificando os meios” (PRANDI, 2005, p.
82). Segundo ele, por quase duas décadas as sessões de Quimbanda –“sinônimo de umbanda”–
com o seu universo dos Exus e Pombagiras, eram praticamente secretas, realizadas à porta
fechada e nas avançadas horas da noite (PRANDI, 2005, p. 86).
Segundo Prandi, a Quimbanda nasceu como um “departamento subterrâneo da
Umbanda, justamente por causa das linhas dos espíritos julgados mediadores do mal ou da
magia negra, termo este significando ‘os especialistas em malefícios’” (PRANDI, 2005, p. 8687). A despeito da “brasilidade da Umbanda”, Prandi e Souza ressaltam a existência de uma
identificação generalizada, composta por inúmeros personagens da vida cotidiana dos
brasileiros, constituindo-se assim sua “dramatização”, sob o rótulo de “quimbanda”. Neste
caso, a Quimbanda propriamente rotulada representa um “palco de dramatizações da realidade
do povo brasileiro” (PRANDI; SOUZA, 2004, p. 305).
Negrão considera a Quimbanda uma das práticas predecessoras da Umbanda, egressa da
Macumba carioca. Negrão escreve que “na Quimbanda os Exus e Pombagiras são utilizados
para práticas maléficas em troca de bebidas, cigarros e comidas”. Na Quimbanda, as práticas
consideradas de “esquerda” são contra “desafetos”, “caminhos fechados” na vida pessoal e
profissional, “doenças”, “prejuízos materiais”, “amarrações” e tudo o que esteja prejudicando o
consulente; encontram respostas para todos os males ou os males para todas as respostas
(NEGRÃO, 1996, p. 221). Basta ler Ortiz (1991) e logo se perceberá que as “sete linhas da
Umbanda” correspondem às linhas da Quimbanda, desse modo, comprovando o sincretismo
existente (ORTIZ, 1991, p. 88). Portanto, após seguir um itinerário parcial dos referidos
autores, opta-se por utilizar outro termo a ser empregado neste contexto, o Umbanquindomblé
(GOMES, 2012, p. 22). Significando aquilo que está misturado, traçado, imbuído um no outro
e se complementando gradativamente formando o universo dessas práticas multifacetadas
desde suas origens e desenvolvimentos em território brasileiro. Magnani (1991, p. 41-49), vem
chamar de “Umbandas”14, já Negrão (1996, p. 316) e Prandi (2005. p. 92), de “Umbandomblé”
e Birman (1985, p. 90), de “Umbandas misturadas”. Ante o exposto, o termo
Umbanquindomblé (GOMES, 2012, p. 22) poderá representar melhor traços do Candomblé,
Umbanda e Quimbanda. Isto é, fenômeno sincrético plenamente ritualístico. Negrão também
não descartou esses traços existentes na Umbanda do Estado de São Paulo nos anos de 1980 e
1990 (NEGRÃO, 1996, p. 338).
14
O grifo é do autor da pesquisa.
34
Conforme visto, a produção acadêmica alagoana durante décadas mostrou-se
cristalizada sob a égide da mãe-pátria europeia, baseada nos quadros da civilização espanhola e
portuguesa dos Séculos XVI e XVII (GRAMSCI, 1982, p. 2-21). Aparentemente, representou
as categorias especializadas do grupo social dominante. Enquanto isso, o poder mágico-religioso
da afro-religiosidade alagoana não foi priorizado pelos acadêmicos, sobretudo, pelos oriundos
de Viçosa, conhecida como a “Atenas alagoana”. Também não se pode negar a perseguição e
resistência na história desses terreiros e praticantes, bem como os entrecruzamentos existentes
entre essas práticas na sociedade brasileira. O silêncio e recolhimento foram patentes. Alagoas
também foi uma região marcada por conflitos, por um mosaico religioso diverso e pela
presença negro-religiosa em atividade até os dias de hoje.
2.4 A vida religiosa dos negros em Alagoas
Um caso interessante ocorrido na primeira metade do século XVIII, no município de
Penedo, interior do Estado, chamou atenção. Lá foi registrada a prisão de Salvador Pacheco
entre os anos de 1738 e 1746, pelo Padre Caetano Dantas, acusado de ser “o maior feiticeiro e
insolente que havia em todo o Brasil”, um “negro alucinado pelo diabo”. Salvador Pacheco foi
levado para Olinda, no Estado de Pernambuco para ser castigado. A acusação do Padre
Caetano Dantas traria, segundo Santos (2014, p.1-31), a existência de um culto organizado e
conhecido do público penedense, uma das cidades mais importantes na Colônia. A
criminalização e demonização da religião africana seriam patentes na acusação do Padre
Dantas. A prisão do “feiticeiro” Salvador Pacheco não se tratava de um feito isolado, sem
alarde, pelo contrário, a denúncia do padre mobilizava a vila do Penedo, o Bispo de
Pernambuco, o Ouvidor e Auditor geral de Pernambuco. A denúncia tratava do templo
funcionando em uma das principais Vilas da Capitania de Pernambuco. “Feiticeiro e
mandingueiro” eram expressões bastante utilizadas pela Igreja e pela sociedade vigente. Ao
referir-se às religiões ou religiosidades africanas no Estado de Alagoas, Irinéia Santos (2014)
apresenta a seguinte hipótese:
[...] os xangôs (ou cultos organizados) já funcionariam na região desde
meados do século XVIII e fortemente se estabeleceriam a partir de 1850, com
o aumento da população escrava e liberta nas vilas e cidades, a exemplo de
Maceió que passou a ser a capital da província em 1839. Neste momento,
ainda seria referido nos jornais como “dança de Santa Bárbara” ou “festa de
Santa Bárbara”, denominação que pode ter sido dada por seus adeptos a partir
35
do sincretismo e/ou da necessidade de minimizar repressões. (SANTOS,
2014, p. 5).
A prática da feitiçaria no século XIX era entendida como crime contra a fé católica
(SANTOS, 2014, p. 15-16). Ainda nesse período já se realizavam cerimônias aos Caboclos ou
o chamado Candomblé de Caboclo na região do baixo São Francisco. Ao citar Câmara
Cascudo, Dantas identifica que essas cerimônias aos “encantados” eram praticadas pelos
negros em Penedo em meados dos séculos XVIII e XIX (DANTAS, 1988, p. 34).Tais
cerimônias não podem ser distanciadas da formação do povo brasileiro em sua experiência
cultural e histórica. Segundo Barbosa,
no caso da Bahia e de Alagoas, por exemplo, a estrutura religiosa conhecida
dos negros no século XVII e no século XVIII tornou-se bastante diferente.
Sob o impacto das grandes imigrações escravistas da Revolução Industrial,
plasmaram-se as fusões quase definitivas do corpo religioso afro-negro, com a
divisão atual entre o Candomblé e as correntes bantu da Macumba, Quibanda
e, mais tarde, Umbanda. Estes ramos principais datam, portanto, do terceiro
século de colonização (1750-1850). Em todas estas religiões caracteriza-se
facilmente o culto africano, o fundamento daquilo que é eterno, tal qual
concebido pelos antepassados africanos. Os próprios sacerdotes das religiões
negras reconhecem as diferenciações como expressivas da experiência
cultural e histórica de cada grupo. Nesse sentido, a consolidação do
candomblé, do cangerê, e das diferentes práticas religiosas no século XVIII
desempenhou papel-chave na formação do povo brasileiro (BARBOSA, 1998,
p. 18-19).
Segundo Brandão (1988. p. 20-23), existiam no estado de Alagoas em meados do
século XIX, principalmente na capital, duas “seitas religiosas” dos negros africanos de origem
sudanesas oriundos do Estado da Bahia: os xangôs e os malês. Notavam-se as principais
divindades: Ogum-Taió, o deus poderoso, Leba, o deus do mal, Baluaré, o mártir e, ainda,
outras divindades de menor importância. Notavam-se ainda: Oxalá, Xangô-nilé, Xangô-china,
Xangô-bomim, Ogum-eína, Oiá, Oxum e Ekum. Segundo ele, todas essas divindades eram
representadas em ídolos de madeira ou de barro em formas humanas e de animais.
Mas segundo Santos, em linhas gerais, o fim da escravidão em 1888 e da Monarquia em
1889 não significou “plena liberdade para os negros”, tampouco, “legitimação de suas práticas
culturais”. Mesmo com a criação do cargo de Curador de Africanos Livres na segunda metade
do século XIX em Alagoas, a discriminação continuava para os negros agora livres. A
repressão jurídica continuou, prolongou-se no tempo. A população negra continuou a ser
controlada pelo aparelho do Estado com princípios e termos jurídicos rígidos. Significou a
regulamentação das práticas culturais e religiosas negras em vigor, pelo menos, desde o ano de
36
1839 (TENÓRIO, 2014, p. 24). Os anos de 1880 foram anos conflituosos para o xangô
alagoano. Neste período a religião afro-brasileira apresentou-se como coletiva, de culto
doméstico ou individual (SANTOS, 2014, p. 13-14).
Para o século XIX tratava-se da presença religiosa negra no interior do Estado.
Conforme Santos é possível que já no início dos oitocentos casas de axé tenham chegado a
existir no interior e na capital do Estado. Para a autora verificou-se no início do século XIX a
existência dos cultos coletivos e da ação individual dos chamados “feiticeiros”, bem como a
identificação das casas de axépor “Santa Bárbara” na região de Muricy/AL. Em Anadia/AL, no
ano de 1824, também é possível identificar o sincretismo das religiões africanas com a festa de
coroação do Rei do Congo e apresentação de folguedos, inclusive o quilombo. “Na primeira
metade do século XIX em Alagoas, a religião e a cultura afro-brasileira estavam vitalizadas e
atuantes, apesar da tentativa de ordenação dos espaços urbanos e rurais e o controle de suas
práticas” (SANTOS, 2013, p. 5-17). A respeito do século XIX, Santos a partir de Machado
(2014), escreve que,
o fim da escravidão (1888) e o processo de urbanização e estruturação do
modo de produção capitalista no Brasil em fins do século XIX e início do XX,
configurou em um novo ambiente para o desenvolvimento das religiões afrobrasileiras. As perseguições que sempre existiram sobre esses cultos foram
sistematizadas a partir de novas legislações que tinham por objetivo
“higienizar” as cidades e modernizar os centros metropolitanos brasileiros.
(SANTOS, 2013, p. 4).
No final do século XIX existiam em Maceió pelo menos doze terreiros tradicionais,
sendo os mais antigos, o de Mestre Félix de Jaraguá – Centro de Culto Jeje-Mina e o de Tia
Marcelina. Ainda havia outros terreiros velhos que desenvolviam a religiosidade dos negros
alagoanos, a saber: o do Pai Manoel Guleiju (bairro do Mutange), Pai Manoel Coutinho, de rito
nagô, na Rua do Reguinho, o de Chico Foguinho, no Pernambuco Novo, onde ocorreu o
episódio de 1912; o do Pai João Catarina, no Trapiche da Barra, vinculado ao Candomblé da
Mãe Pulquéria do Gantois, o do Pai Adolfo (bairro do Poço), o da Mãe Maria da Cruz (no
Frechal de Cima), o do Pai Aurélio (na Levada), e o do Pai Manoel Martins Lolô (no
Reginaldo). Estes são considerados por Lindoso, terreiros velhos de Alagoas com Pais e Mães
de santo mais conhecidos (LINDOSO, 2005, p. 119-120).
Ainda no final do século XIX, a religiosidade negra foi marcada por ameaças e
vigilâncias e, principalmente, pelo racismo. O espaço social da prática da religião dos negros
foi extremamente cerceado. Segundo Araújo, na virada do século XIX para o século XX, Tia
37
Lucrécia e Tia Balbina, a Yalorixá Maria Omialê, atuaram na região da Ponta Grossa e
Ouricuri. Apesar de passar pelo crivo de uma polícia violenta, elas emergiram com seus
terreiros chamados de culto Nagô15 em Maceió e, após o episódio de 1912, redefiniram suas
estratégias de sobrevivência e readaptação (ARAÚJO, 2009, p. 3-5). Trata-se de “apropriação”
ou “incorporação” de valores da cultura vigente. Suas experiências religiosas foram expandidas
e consolidadas e, com o passar dos anos, readaptadas nos diferentes espaços sociais.
Nos anos de 1880 a imprensa de Maceió registra a presença e atuação de “feiticeiros”
nos bairros da capital. Em 1890 sob o peso do código penal os “curandeiros” são fortemente
perseguidos pela justiça (SANTOS, 2013, p. 20-22). Abelardo Duarte (2010) escreveu acerca
do folclore em Alagoas, destacando, sobretudo, a tradição dos quilombos. Segundo Duarte, os
primeiros troncos negros em Alagoas encontraram-se na primazia rural, no ambiente das casasgrandes e dos engenhos de cana-de-açúcar. Ali os negros desenvolveram inúmeras
modalidades folclóricas no ambiente do senhor de engenho. Os negros “nas horas de folga (...).
procuravam divertir-se ou divertir os seus senhores como derivativo ao duro regime de vida
que levavam nos engenhos, na época em que safrejavam, as cantorias, os pagodes, os batuques,
os cocos tinham livre curso” (DUARTE, 2010, p. 15-16). Os refugiados nos quilombos em
Alagoas fizeram sentir suas manifestações populares.
Na passagem do século XIX para o século XX é possível identificar líderes influentes: o
poder do Tio Félix, no Bairro do Jaraguá – Maceió/AL e o da Tia Marcelina, com casas de axé
funcionando e organização do culto. Conforme Santos: “Os espaços sociais em que floresceu a
presença afro-brasileira, neste sentido, foram as irmandades religiosas católicas, os xangôs e as
festas populares (quilombos, reisados, maracatus, carnaval etc.)”(SANTOS, 2013, p. 23;
25).Por longos anos (meados de 1913-1940), após a invasão aos terreiros de Maceió no ano de
1912, essa modalidade religiosa ficou conhecida como “xangô rezado baixo”, pois as
cerimônias públicas foram proibidas pelas autoridades alagoanas (ARAÚJO, 2014). O século
XX se iniciou com a “efervescência dos xangôs e da cultura negra” tanto na capital quanto no
interior do Estado. Segundo Santos, “o início do século XX, a associação das festas de Santa Bárbara,
com a palavra xangô (changô) aparece explícita na imprensa. Isso sem mencionar os rótulos seculares
15
“O pertencimento Nagô, em Alagoas, indicará, portanto, uma história viva de recolhimento, contenção e
silenciamento, que permanecerá como resistência a essa periferização sofrida, e que nos parece ser a característica
ainda predominante nos dias atuais. O que temos constatado em nossas visitas é que o sujeito Nagô é antes de tudo
um desconfiado, fechado em um território de âmbito doméstico, praticante de um culto que se materializa na
própria sala de visitas de sua casa. Essa postura, típica de uma tradição que sofreu as marcas da perseguição
ostensiva, se por um lado mergulhou historicamente o Nagô numa quase invisibilidade social, por outro, fechado
em si, possibilitou a forte demarcação de suas fronteiras identitárias, em um processo de diferenciação nítida em
relação às demais tradições religiosas, que, inicialmente, parece contrariar a crença numa umbandização arraigada
dessa tradição” (ARAÚJO, 2009, p. 3).
38
negativados aos termos ‘feitiçaria’, ‘bruxaria’, ‘curandeirismo’ etc. E a constante ‘demonização’ e
inferiorização estereotipada dos indivíduos negros” (2014, p. 5). Muitos desses filhos e filhas de
santo e seus respectivos representantes migraram para o interior alagoano a fim de encontrar
liberdade de culto. Tratava-se de uma forte repressão aos chamados praticantes da “magia
negra” ou “feiticeiros” até meados dos anos de 1940 (ARAÚJO, 2014). Segundo Araújo, foi
neste contexto que o xangô alagoano definiu interna e externamente seus sentidos de
pertencimento, suas margens identitárias e configuração do complexo conjunto de suas práticas
(“reapropriação” ou “negociação”) principalmente a partir da década de 1950 (ARAÚJO, 2014,
p. 62-63). Mas, a aparente liberdade festeira ainda no século XX, advinha de um ambiente de
conflitos, de um processo migratório e de repressão aos cultos afro-alagoanos.
Ao que se sabe, não houve nenhum episódio em Viçosa considerado violento e de alta
gravidade envolvendo a polícia e os terreiros. O que os discursos narraram foram “intervenções
policiais” no final da década de 1950 e nas décadas de 1960 e 1970, com o intuito de
fiscalização e, em alguns casos, suspensão dos toques dos atabaques após certa hora da noite.
Aliás, com base nos discursos das lideranças, a Umbanda em Viçosa nessa época funcionava
em sua maioria, como “casa de culto individual”, “doméstica”, sem culto organizado, sem
muita cerimônia aberta ao público, mas com hierarquias bem definidas. Em contato recente
com um dos agentes da Polícia Civil do Estado de Alagoas 16, a informação passada foi a de que
as ocorrências da Polícia Civil anteriores ao ano 2000 não constam nos cadastros da Polícia,
com raras exceções, como assassinatos e outras ocorrências com maior grau de gravidade.
Segundo este policial, em se tratando de cidades interioranas, “o material torna-se mais
escasso, pois geralmente, essas ocorrências envolvendo os praticantes das religiões afrobrasileiras não tinham um caráter formal no registro da delegacia”. E mais: “não se tem muita
notícia desses acontecimentos nos rincões alagoanos envolvendo essas práticas religiosas”.
Geralmente, segundo o policial, esses raros episódios envolvendo práticas no interior do
Estado, na maioria das vezes, “eram resolvidos ‘amigavelmente’ entre o delegado e o
representante do terreiro. Pois, em cidade pequena é muito típico as pessoas conhecerem umas
as outras”, afirmou ele. Mesmo existindo este aparente “clima amigável” entre a força policial
e os terreiros, ficou clara a desqualificação das práticas durante décadas ali.
16
Este policial é amigo do pesquisador e ocupa um dos cargos na secretaria da Polícia Civil no Estado. O mesmo
atuou em várias cidades no interior do Estado como agente. O diálogo ocorreu em sua residência, em maio de
2014.
39
2.5 O ambiente religioso em Alagoas no século XX
Pesquisar de maneira detalhada o que reconstitui essa modalidade religiosa no Estado
de Alagoas, principalmente no início do século passado (1912-1960) não é tarefa fácil. Nos
doze primeiros anos do século XX, tem-se uma forte aculturação da religiosidade negra e seus
folguedos populares. A partir de 1913-1940 tem-se a violência, repressão, perseguição e
resistência dos cultos no Estado, mas também de “integração” aos valores culturais
dominantes. Trata-se de um período de muita migração para outros Estados e interior. Nesse
contexto, os ritos (xangôs e malés) descritos por Brandão (1988) já se achavam mesclados com
as ideias católicas e espíritas. É o que Santos chama de “confluência afro-indígena no
catolicismo popular” (SANTOS, 2013, p. 5).Ao escrever sobre a presença da religiosidade
negra no Estado de Alagoas no início do século XX, Santos escreve:
como parte de um processo histórico mais amplo, poder-se-ia afirmar então
que o Quebra de Xangô em Alagoas, no início do século XX, exemplificaria
de modo extremo toda a sorte de violência, repressão e perseguição,
desencadeada durante a República Velha e o período Vargas aos cultos afrobrasileiros. As religiões afro-brasileiras sofreram as transformações políticas,
econômicas e sociais que atingiram a cidade de Maceió no período. Vale
lembrar que essas primeiras décadas foram marcadas por uma série de
conflitos entre as elites políticas locais, que lutavam para manter o poder e o
controle do Estado. A expansão e a urbanização da cidade se iniciaram a partir
dos anos 1930, o que também influenciou a alteração da geografia das
periferias da cidade, empurrando a população para os extremos (“as pontas”)
das orlas e cidade alta (SANTOS, 2012, p. 196).
A compreensão e, consequentemente, os estudos em torno das manifestações culturais e
religiosas negro-alagoanas vieram à tona ou foram “redescobertas” a partir do resgate do
episódio de 1912 em Maceió (RAFAEL, 2004). A Liga dos Republicanos Combatentes,
presidida pelo Manoel Luiz da Paz, possuía vínculos estreitos com o Partido Democrático de
Fernandes Lima. Essa milícia se formou especificamente para diminuir o poder político de
Euclides Malta, cuja propaganda ecoou negativamente na população que era preparada
secularmente para não gostar daquelas práticas religiosas ligadas à africanidade. A partir daí, o
governador iniciou a perseguição contras as casas de cultos maceioenses. Cerca de duas mil
pessoas invadiram as casas de xangô, revoltadas com o último representante da oligarquia
Malta, conhecido como “Legba” ou “Leba” (Exu 17 pelos seus adversários políticos
17
(MAGGIE, 1992, p. 251-255) e Brandão (1988, p. 20-23), já citados aqui, também identificaram desde o século
XIX, a imagem do Leba ou deus do mal nos xangôs alagoanos. Sobre o Leba, Elegbara, Legbaráou Exu-Leba,
assim como os Exus na Umbanda, será dedicada uma seção para tratar desse assunto posteriormente.
40
(CAVALCANTI; ROGÉRIO, 2008, p. 17).Um dos principais epítetos depreciativos naquela
época, servia para designar Malta e seus seguidores(RAFAEL, 2004, p. 20; 28-29; 53;
100;256). A acusação contra o Governador e seus correligionários, de praticarem feitiçaria, em
um contexto religioso extremamente católico e intolerante com as práticas do chamado
espiritismo, resultou no levante que culminou na destruição de inúmeras casas de xangôs
alagoanos. Este levante teve início primeiro pela Liga e depois pela população e força policial.
O Quebra-quebra não se resumiu apenas à capital, mas se estendeu aos distritos mais próximos
como Santa Luzia do Norte, Atalaia, Pratagy, Alagoas, antiga capital da província e Tabuleiro
do Pinto. A maioria das peças dos terreiros foi queimada e destruída, poucas foram
conservadas (RAFAEL, 2004).
No que diz respeito à conservação das peças apreendidas naquele contexto, existiam
peças modeladas em barro e cimento do deus Leba que não foram incluídas inicialmente na
exposição, localizadas na sede da Liga. As exposições foram denominadas “peças do vivido”,
tendo em vista os fatos ocorridos e sua relação com o contexto sociopolítico à época. A
classificação das peças na organização da exposição é ambígua, não se conservando, por
exemplo, os fetiches, imagens, indumentárias e paramentos em sua totalidade (RAFAEL, 2004,
p. 48-51). Segundo Rafael, os critérios eruditos do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas
onde as peças se ocupavam classificaram essas peças em detrimento de outras.
Rafael
escreve:
a opção por algumas dessas esculturas como Oxalá, “Oxum-Ekum”, Oyá,
Omolu, Iemanjá, Obabá, “Ogum-Taió”, “Xangô-Dadá”, “Xangô-Bomim” e
“Xangô-Nilé”, foi feita em detrimento de outras entidades como o Leba,
“ídolo com chifres” que representava “o espírito do mal” e “Ali-Babá, o
santo que em forma de menino presidia a animação e os prazeres”, as quais
foram destruídas nas muitas fogueiras que arderam naquelas noites.
Importante perceber que a destruição das peças que estavam mais diretamente
associadas ao Governador, cuja relação com as casas de Xangô é estabelecida,
a princípio, pela imprensa oposicionista, traduz o sentimento de revolta da
população contra os terreiros, ou mais especificamente por uma modalidade
de práticas religiosas ali desenvolvidas, que contrariavam a expectativa geral
dos moradores da Capital, os quais, apesar de não devotarem muito destaque
àquelas práticas, também não as consideravam como focos de ameaça a
tranquilidade pública. Pelo menos, o número de denúncias sobre tais cultos
nos jornais foi irrisória no período investigado. A destruição das esculturas do
Leba e de “Ali Babá” se dá em razão da associação direta entre elas e
Euclides Malta, tido como a própria personalização do mal (RAFAEL,2004,
p. 50-51. Os grifos são do autor da pesquisa).
Importante notar a conservação das peças africanas em detrimento de outras. Como se
percebe, as que estavam diretamente associadas “à maldade e à promoção do mal foram
41
colocadas num ambiente neutro”, cuja eficácia estaria sob controle das autoridades políticas
(RAFAEL, 2004, p. 53). Tudo indica que o Leba recebia denominação própria naquelas casas
de xangô com características específicas. Mas, apesar da imagem do Leba ter sido mencionada
pelo repórter do Jornal de Alagoas18, não se encontra entre os objetos que compõem o acervo
da Coleção Perseverança. Tampouco, sequer uma escultura ritual dele que possa pelo menos
identificá-lo e, acima de tudo, confirmar sua presença naqueles cultos da capital (RAFAEL,
2004, p. 136-143). Assim, a partir do Quebra-quebra torna-se possível inferir que a dispersão
dos líderes ou fechamento dos terreiros após este episódio pode ter resultado na emigração para
o interior – Viçosa esteve nesta rota. Nos anos posteriores a 1912, vários grupos religiosos
afro-brasileiros instalaram-se no Estado, destacando-se os municípios mais alcançados, dentre
eles: Santa Luzia do Norte, Limoeiro de Anadia, Atalaia, Cajueiro, Água Branca, Viçosa,
dentre outros (AMORIM; SANTOS 2006; RAFAEL, 2004; CAVALCANTI; FERNANDES;
BARROS, 2008),
Na década de 1950, diminui um pouco a repressão da polícia. Alguns terreiros são
reabertos publicamente, mas sob o controle policial. É a partir da década de 1950 que o antigo
rito nagô, modificado desde o ano de 1913 por causa dos “anos de silêncio” dos xangôs,
recebeu forte influência da Umbanda Branca, isto é, da ética espírita vinda do Rio de Janeiro
(SANTOS, 2012, p. 202-203; 206). Esta modalidade teria constituído o chamado rito traçado19
em Alagoas (MOTTA, 1996, 1991; ARAÚJO, 2009; 2014). Designação esta que ainda hoje
causa certa confusão entre os próprios umbandistas, mas no dizer de Santos, “... essas
migrações e flutuações de identidades e designações também dizem respeito às visões externas
à religião, ou seja, a designação de maior prestígio social em determinados momentos...”
(SANTOS, 2012, p. 203).
Na década de 1960, diante da crise política do desenvolvimentismo, crise nos
movimentos sociais, repressão política e controle militar sob a cultura negra e folclore e as
perseguições policiais, que ainda continuaram acompanhadas da imprensa local com sua
campanha “anti-macumba”, o culto traçado do nagô e Umbanda sobreviveram em Alagoas e
não paravam de crescer (SANTOS, 2012, p. 228). “Em Alagoas onde se excetuarmos as
narrativas dos Palmares, a história do negro quase que se deixou ficar em apagado...”
18
“Debaixo das vestes de um ‘leba’ ídolo com chifres, foi encontrado um retrato do Cel. Clodoaldo da Fonseca,
virado de cabeça para baixo, como refém de futuros acontecimentos.” (Jornal de Alagoas. “Bruxaria”. Maceió,
06\02\1912. Ano V. p. 1. In: RAFAEL, 2004, p. 137).
19
Trata-se de influências de doutrinas espíritas criada para se distinguir do ritual africano (dos negros bantos).
Muitos xangôs alagoanos foram perdendo a tradição do padrão religioso primitivo (DUARTE, 1952, p. 78).
42
(BRANDÃO, 1988, p. 20). A “absorção” ou “integração” foram evidentes nesse processo de
integrar-se ao sistema dominante (CAPONE, 2004; TRINDADE, 1985).
A partir de 1960, o número de terreiros em Maceió aumentou e por meio das
Federações, foram ganhando visibilidade social (CAVALCANTI; ROGÉRIO, 2008; SANTOS,
2012, p. 243). Nos anos de 1970 e 1980, aquela “velha memória de violência” que acometera
as religiões afro-alagoanas nas décadas anteriores, ainda não tinha sido expurgada da sociedade
alagoana (SANTOS, 2012, 227). A partir do ano de 1980, com a abertura política e início da
redemocratização, em meio a crise econômica e social, percebeu-se uma expansão notável dos
cultos afro-brasileiros na capital e no interior do Estado, bem como o crescimento das
Federações e articulação do Movimento Negro e seu olhar à Serra da Barriga. Neste período,
surgiu também com força o discurso “demonizador do pós-pentecostalismo contra as religiões
negro-alagoanas” (SANTOS, 2012, p. 228).Nos anos 1990 a 2000, os terreiros seriam
marcados pela busca de afirmação e autonomia, porém, ao mesmo tempo, enfrentariam uma
profunda crise social e econômica atingindo os ambientes urbanos e, consequentemente, os
terreiros e seus adeptos.
A história das religiões afro-alagoanas, conforme visto anteriormente, é uma área com
relativa escassez de informações. A intelectualidade local silenciou-se e não dedicou atenção
merecida ao assunto dos xangôs alagoanos (CAVALCANTI; FERNANDES; BARROS, 2008;
CAVALCANTI; ROGÉRIO, 2008, p. 9-19; RAFAEL, 2004). Considerando-se os primeiros
estudos sobre as religiões afro-brasileiras como um todo, datados da época de Nina Rodrigues
e Artur Ramos, século XIX e XX, pode-se dizer que são recentes.
2.6 A desqualificação das práticas afro-brasileiras no Jornal O Semeador (1950 e 1960)
É sabido que no Brasil republicano (1890-1940) a feitiçaria ganhou materialidade. Seus
objetos deveriam ser descobertos como sinal de que a crença estaria em operação, por isso
deveriam ser encontrados e expostos. Os objetos apreendidos passavam a ser considerados do
“baixo espiritismo”, da “magia negra” (MAGGIE, 1992, p. 149; 188). O “baixo espiritismo” na
década de 1930 foi a acusação imputada à Macumba e ao Candomblé. O “feitiço”, a “magia
negra” e a “fraude” eram características atribuídas a essas práticas afro-brasileiras e afroameríndias. No Código Penal de 1940, por exemplo, ficou delineado claramente o perfil dos
participantes desses cultos: “macumbeiros”, “candomblezeiros” e “ignorantes”. O Brasil
republicano até o ano de 1940 (durante 50 anos) conheceu apenas um conceito de feitiçaria: o
43
poder da “magia maléfica”. A “religião do malefício” permeou o imaginário e a memória
social da população, sobretudo do poder jurídico e político-religioso durante os 50 anos de
República (MAGGIE, 1992, p. 166; 173-176; DANTAS, 1988, p. 165-209). As crenças
mágicas também foram associadas à loucura. Os terreiros eram vistos como o lugar da
produção da loucura. Passados todos esses anos, ainda nas décadas seguintes, o “combate à
macumba”20 continuava explícito e as prisões eram constantes.
Apesar da abertura do período da redemocratização a partir de 1945, com a promessa de
cessação do combate sistemático à Umbanda, na prática, a resistência continuou a existir. O
discurso sistemático de um periódico católico alagoano reafirma o quanto essa modalidade
religiosa foi combatida no país. Mesmo se passando quase cinquenta anos após o episódio do
“Quebra” os cultos afro-alagoanos ainda eram discriminados. Vale ressaltar que, mesmo com a
liberdade de culto promulgada na Constituição Federal no ano de 1946, as práticas afrobrasileiras ainda eram fortemente reprimidas pelo Estado. Em Alagoas não foi diferente,
obviamente. A década de 1950 foi marcada pela campanha antiespírita promovida pela CNBB
(Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). A forte oposição da Igreja ocorreu, sobretudo, no
Estado de São Paulo, estendendo-se aos outros Estados do Brasil – Alagoas esteve na rota. O
maior alvo da campanha foi a Umbanda e não somente o Espiritismo Kardecista, já combatido
pela Igreja desde o final do século XIX. A imprensa conservadora de todo o país também
contribuiu com seus editoriais na estigmatização da Umbanda. Vale ressaltar que na década de
1950, a denúncia de práticas de curandeirismo, bem como do exercício ilegal da medicina foi
frequente nos jornais da época em todo o país (NEGRÃO, 1996, p. 43).
20
De acordo com Bastide, “a macumba se encontra perfeitamente adaptada ao meio a que se dirige e podemos, por
seu intermédio, ver se desenhar a pintura fiel do meio pobre, simples, que lhe fornece a clientela. Desempregados
à procura de trabalho, doentes sem dinheiro, mocinhas que desejam um namorado, esposos que não vivem bem,
todos os pequenos dramas dos bairros de cortiços ou dos arrabaldes das fábricas, todos os infortúnios escondidos
aqui se manifestam. A macumba abre uma esperança, permite suportar melhor a vida, alimenta o mundo dos
sonhos [...]. É preciso debruçar-se com amor esse coração secreto, que o reativo poderoso da macumba põe a nu,
para compreender por que ela continua a viver, apesar das perseguições. Pois a polícia atinge apenas o órgão,
deixando subsistir a função; e a função torna a criar o órgão” (BASTIDE, 1983, p. 211). Com base em Bastide,
compreende-se que o macumbeiro exercia simultaneamente as funções de “curandeiro”, “mágico”, “padre” e de
“conselheiro da vida cotidiana”. Em Viçosa, por exemplo, as lideranças umbandistas ainda hoje são vistas como
“curadores de ramo” ou “rezadores” e são tratadas como padrinhos e madrinhas na esfera do povo de santo. Além
disso, os terreiros em Viçosa servem como uma espécie de “espaço familiar” e afetivo cuja clientela é formada por
pessoas pobres, sendo a maioria analfabeta, residente na área periférica da cidade. Entre as décadas de 1930-1950
o contexto socioeconômico viçosense foi marcado pelas dezenas de engenhos e fábricas de algodão instalados na
área urbana e rural, atraindo assim, inúmeros migrantes alagoanos e de estados vizinhos. Nesse período, as
“reuniões de mesa” como os mais antigos costumam chamar já funcionavam nos arredores da cidade sem negar a
influência do Mestre Zome, no município vizinho de Quebrangulo, iniciando suas atividades mágicas e de
fogueteiro, na região (ROCHA, 1996, 1998; RAFAEL, 1996).
44
No início de 1950 no Estado de Alagoas, o circuito católico de todo o Estado e a
sociedade alagoana de um modo geral, liam o circulante Jornal O Semeador21. Nele vê-se o
combate explícito à “macumba e aos macumbeiros” em Alagoas. O “combate aos
macumbeiros” em Alagoas permaneceu. Quatro edições do Semeador datadas do ano de
195122 e uma edição no início do ano de 196023 dariam uma noção das dificuldades enfrentadas
pelos adeptos das práticas afro-brasileiras em terras alagoanas nesse período. Tanto nos anos
1950 quanto nos anos 1960, o “combate aos macumbeiros” prosseguiu por parte da religião
hegemônica.
A matéria impressa na página 03, da edição 109, ano 1951, traz o título: Precisamos de
manicômios? No início diz: “Os macumbeiros de Maceió registraram os seus antros de
perdição ou escolas de loucura”. De acordo com o texto, dois são os “absurdos dos cultos
africanos em Alagoas”, a saber: a associação dos nomes dos terreiros aos santos católicos, um
exemplo disso é o de Santa Terezinha; o segundo é o fato de essas práticas estarem associadas
a “fins de filantropia, sociais e filosóficos”. A crítica da matéria é direcionada especificamente
aos cultos dos deuses africanos – “a macumba”, ao analfabetismo dos praticantes e de suas
respectivas lideranças, bem como o uso do álcool e tabaco nas celebrações. O pedido da
matéria é de que a Secretaria do Interior examine, através de sua Comissão, tais cultos
existentes no Estado, cujos adeptos “não eram poucos”. Para isso, “esse povo” precisava de
muitos manicômios para tratar suas “fontes de loucura” do “espiritismo absurdo”, conclui a
matéria.24
Já a edição 48, ano 1951, na página 03, traz um manifesto da Juventude Operária
Católica (JOC) dirigido ao então Secretário do Interior e Educação para que tome medidas de
ordem moral e social e que faça cumprir a Constituição brasileira no “combate aos feiticeiros
produtores de malefícios, loucura e esgotamento cerebral e físico”. O manifesto é enfático:
21
O centenário Jornal O Semeador foi criado em 02 de março de 1913 pelo então Dom Manoel Antônio de
Oliveira Lopes (1911-1922), o qual ordenou a três jovens sacerdotes a missão de fundação de um jornal diário
com orientação católica. O Semeador no início teve sua periodicidade diária, vindo logo depois a semanal a partir
de 1969. Em 1982tornou-se quinzenal, permanecendo assim até os dias atuais. Informações disponíveis em:
<http://www.arquidiocesedemaceio.org.br/noticias/arquidiocese/1805/o-semeador-comemora-cem-anos-defundacao>. Acesso em: 21. jul de 2015.
22
1) Receita de Além-Túmulo... . O Semeador. Ano. XXXVIII, nº 15, quinta-feira, 25 de janeiro de 1951. p. 3. 2)
Contra a macumba. O Semeador. Ano. XXXVIII, nº 48, sábado, 17 de março de 1951. p. 3. (Manifesto da JOC –
Juventude Operária Católica). 3) Precisamos de Manicômios? O Semeador. Ano. XXXVIII, nº 109, terça-feira,
26 de junho de 1951. p. 3. 4) Macumbeiros - - Macumba. O Semeador. Ano. XXXVIII, nº 111, sábado, 30 de
junho de 1951. p. 3.
23
NUNES, Adalberto de Paula. Macumba é uma indústria no Brasil. O Semeador. Ano. XLVII, nº 194, segundafeira, 31 de outubro de 1960. p. 3.
24
Precisamos de Manicômios? O Semeador. Ano. XXXVIII, nº 109, terça-feira, 26 de junho de 1951. p.3.
45
considerando serem verdadeiros antros de perdição as denominadas rodas e
macumbas pelos maléficos efeitos que produzem, loucura, esgotamento
cerebral e físico, pois neles são admitidos até menores; considerando ser a sua
prática um atentado ofensivo à moral pelas cenas ofensivas aos bons costumes
ali desenrolada; considerando ser a prática de tais atos [...] onde o operário
inculto gasta seu minguado salário; considerando ser a sua prática vedada em
nossa constituição. Solicitamos queira Vossa Excia. Como medida de ordem
moral, social e em cumprimento aos sinceros propósitos que animam o novo
governo de nosso Estado, ordenar a repressão aos citados exploradores da
macumba que começam a reaparecer em nossos subúrbios. 25
Neste período, a Umbanda estava entre dois fogos cruzados: a ortodoxia da Igreja e o
intelectualismo positivista. O presente manifesto datado de 17 de março de 1951 é assinado
pelo então Assistente Eclesiástico, Padre José Brandão Lima, pela Presidente da JOC, a Srª
Hosanita Vasconcelos Barbosa, pelo Presidente da Federação dos Círculos Operários de
Alagoas, o Sr. Jorge Cavalcante Morais, pelo Presidente do Círculo Operário de Maceió, o Sr.
José Viana e por fim, pelo Presidente da Federação dos Trabalhadores do Estado de Alagoas, o
Sr. Osvaldo Veloso. Percebe-se a articulação entre essas instituições operárias não só em
Maceió, mas em todo o Estado nesse período. A edição 111, em 30 de junho de 1951, registra a
prisão de 21 macumbeiros no bairro da Levada, em Maceió, a qual é comemorada na matéria
impressa na página 03. O título: “Macumbeiros – Macumba traz um juramento sobre o
brasileiro digno e amante da pátria”. De acordo com a matéria, todo brasileiro sincero que
preza e defende os “bons costumes” deve ser contra a macumba, considerada “antro de
corrução”. O texto traz cinco princípios considerados verdadeiros e exemplares para qualquer
brasileiro que deseja uma “nação civilizada e cristã”, a saber:
(1) Se prezo a dignidade humana serei contra macumba que avilta o homem...;
(2) Se sou brasileiro serei contra a macumba que solapa o edifício moral de
nacionalidade...; (3) Se sou amigo da ordem condeno a perturbação da mesma
pelo som lúgubre dessas cenas...; (4) Se defendo os bons costumes terei que ir
contra o inimigo número um dos mesmos...; (5) Se desejo um Brasil sadio
terei que condenar a escola de loucura ou seja a casa do macumbeiro. Por
esses princípios se rege qualquer brasileiro [...]. Ali se mente, sem medida:
engana-se com curas aparecidas, lesa-se o bolso do incauto [...] todos sabem
que é baixa e vil macumba... um atentado a honra, a dignidade de uma nação
[...]. Atualmente já contamos com uma vitória – a polícia prendeu na Levada
21 macumbeiros. 26
No círculo católico alagoano, era explícita a associação do “ser brasileiro” ao combate e
a consequente condenação das práticas afro-brasileiras – consideradas “berço” da perdição e da
25
Contra a Macumba. O Semeador. Ano. XXXVIII, nº 48, sábado, 17 de março de 1951. p. 3. (Manifesto da
JOC – Juventude Operária Católica).
26
Macumbeiros - - Macumba. O Semeador. Ano. XXXVIII, nº 111, sábado, 30 de junho de 1951. p. 3.
46
loucura. No artigo intitulado: “Receita de além-túmulo”, da edição 15 de 25 de janeiro de 1951,
identifica-se uma alusão ao espiritismo como prática que continua iludindo com suas fórmulas
e maneiras “certas classes”. Segundo a matéria, esse espiritismo está “levando à loucura, pois
são casos de perniciosa prática espírita registrados diariamente (...). Registre-se, portanto, mais
esta farsa dos que iludem o povo com receitas de além túmulo.” A crítica é contra o contato
com os mortos – mediunidade. Ainda no início da década de 1960, o “combate à macumba
continua”. O Padre Adalberto Nunes inicia seu artigo escrevendo que “a macumba no Brasil
vai tomando jeito de uma espécie de instituição nacional. Por todos os meios a grosseira
idolatria – na realidade a macumba não passa disto mesmo – vai se propalando por todo o
país.”27 Ele chama a macumba de “seita idólatra com matizes satânicas”.
de norte a sul de país há uma verdadeira organização de difusão da
abominável prática do candomblé, que é uma das modalidades macumbeiras
mais em voga no Brasil [...]. E os policiais porém estão fazendo uma
campanha contra a prática da macumba pelas tristes consequências que ela
traz à sociedade, à família e ao individuo. As pessoas realmente esclarecidas
deviam dar todo o apoio e toda a cooperação a este movimento que só poderá
ser benéfico para o Brasil, que é um país cristão e civilizado. 28
Nas décadas de 1950 e 1960, apesar da aprovação do Código Penal em 1940, as práticas
religiosas de origem africana ainda eram vistas como primitivas e arcaicas. Já na década de
1960, a Umbanda se preparou mais eficazmente contra as acusações e perseguições que ainda
eram uma realidade no país. A realização dos congressos contribuiu para tal combate (SILVA,
1996, p. 75-99). Segundo Negrão, a acusação mais frequente era a de feitiçaria associada ao
curandeirismo (NEGRÃO, 1996, p. 45). Só para se ter uma ideia, no ano de 1976, ainda
estavam submetidos à fiscalização da polícia, através das Delegacias espalhadas por todo o
país. Apesar da aproximação existente de alguns terreiros com o poder público, de alguns
representantes oficiais com o povo de santo, ainda assim, eram mantidos sob forte vigilância
policial (SANTOS, 2005, p. 142-145).
27
NUNES, Adalberto de Paula. Macumba é uma indústria no Brasil. O Semeador. Ano. XLVII, nº 194, segundafeira, 31 de outubro de 1960. p. 3.
28
NUNES, Adalberto de Paula. Macumba é uma indústria no Brasil. O Semeador. Ano. XLVII, nº 194, segundafeira, 31 de outubro de 1960. p. 3.
47
3
AS RELIGIÕES AFRO-ALAGOANAS NO CONTEXTO DE VIÇOSA
às vezes sobre o popular – o mais culturalmente expressivo
da vida da nossa gente alagoana praeira, sertaneja, matuta pairou como uma espada de Dâmocles, a ameaça de uma
tradição cultural erudita (às vezes só formalmente erudita)
apreendida nas bibliotecas conventuais, ou a intolerância do
exercício do poder de tipo colonial. Essa ameaça se tornava
mais séria quando encontrava uma resistência cultural por
parte dos índios aldeados ou de negros escravos
(LINDOSO, 1981. p. 6-7).
A ênfase do presente capítulo estará no mosaico religioso das religiões afro-alagoanas,
sobretudo,
no
interior
de
Viçosa.
Buscar-se-ão
seus
primórdios,
organização
e
desenvolvimento histórico, bem como os pioneiros da religião, a liderança mais antiga, os
novos líderes e, principalmente, os rituais praticados nos dias atuais. Segundo Brandão, a
região que hoje é Viçosa foi o “berço e o túmulo da república dos Palmares, o primeiro refúgio
e o último reduto dos desgraçados quilombolas” (BRANDÃO, 2005, p. 16-17). Segundo
registros históricos presentes no lançamento do seu Álbum do Centenário, Viçosa/Alagoas foi
escolhida pelos quilombolas entre 1556-1695, para servir de refúgio aos negros oriundos de
Palmares. Reza a tradição que o local, reduto dos negros quilombolas, foi a Serra Dois
Irmãos29, cerca de 400 metros de altitude (ÁLBUM DO CENTENÁRIO DE VIÇOSA, 2008, p.
4-5).
O “Diário de Viagem” do Capitão Blaer descrito por Brandão, data entre 1630 e 1654,
bem antes da chamada povoação do Riacho do Meio em meados de 1790. Este “Diário de
Viagem” pertenceu ao comandante das tropas holandesas no século XVII. Nele, o capitão
Blaer fez alusão a uma expedição holandesa, brasiliana e tapuias que ficava na terra que hoje é
chamada de Viçosa, nas Alagoas (BRANDÃO, 2005, p. 18).Essa expedição, datada de 26 de
fevereiro de 1645, foi considerada pelo capitão Blaer uma das mais antigas nos caminhos de
Palmares. Fez-se alusão às cachoeiras e ao rio Parahyba na Serra Dois Irmãos, nos limites com
o município de Capela (atual Cajueiro). Assim, os holandeses estiveram bem perto do ponto
onde hoje é a cidade. Na Serra Dois Irmãos, em 20 de novembro de 1695, relata a história
viçosense, o guerreiro quilombola Zumbi dos Palmares tombou sob o domínio português e foi
29
Houve uma cerimônia a Xangô e a Oxum neste local, em fevereiro de 2009, a qual foi registrada na íntegra por
(GOMES, 2012).
48
levado para Recife, capital pernambucana. O Álbum do Centenário de Viçosa (2008, p. 2-21),
elucida também “a lenda do caçador chamado por Preto Velho”30, que residia às margens do
Riacho Limoeiro, o qual batizou de Riacho do Meio pelo fato deste atravessar a parte central
da cidade, com a beleza de suas matas, lavouras, serras e rios.
Em 1831, a região recebeu o nome de Villa Nova da Imperatriz. Em 1833 a 1879, a
região foi chamada de Villa Nova da Assembleia; em 1890, de Villa Viçosa e, em 05 de junho
de 1892, deu-se a instalação da cidade chamada Viçosa. Até o ano de 1950, Viçosa possuía três
distritos: Chã Preta, Pindoba e Anel (BRANDÃO, 2005, p. 5-122).
Na atualidade, apesar dos programas sociais do Governo Federal, de acordo com os
dados do Censo Demográfico de 2010, 13.167 pessoas vivem abaixo da linha de pobreza,
correspondendo a 52,9% da população do município. São pessoas que possuem renda per
capita até R$ 140,00. Já aqueles que vivem abaixo da linha de indigência, ou seja, pessoas que
possuem renda per capita até R$ 70, correspondem a 32% da população .31 No que diz respeito
à desigualdade, os indicadores mostram que a participação dos 20% mais pobres da população
na renda do município, passou de 3,6%, em 1991, para 1,3%, em 2010, aumentando os níveis.
Os dados ainda mostram que em 2010, analisando o oposto, a participação dos 20% mais ricos
era de 61,4%, ou 46,5 vezes superior à dos 20% mais pobres.32.
Viçosa também é conhecida como a “Princesa das Matas” e possui atualmente duas
Comunidades Quilombolas registradas no Instituto de Terras e Reforma Agrária de Alagoas –
ITERAL: Gurgumba (25 famílias) e Sabalangá (100 famílias), certificadas apenas em 27 de
dezembro de 2010.33
Em quase todas as áreas que formam atualmente o bairro Mutirão, das conhecidas e
populares Ruas dos Paus Brancos, Rua da Matança, Rua do Cravo, Rua do Antigo IML, Rua da
Passagem da Areia, Rua do Cemitério aos Conjuntos de Frei Damião, Padre Cícero e Dourada,
existiu ou existe pelo menos um terreiro funcionando. Da zona urbana à zona rural, é possível
citar algumas regiões como a de Sabalangá, Santa Efigênia, Pedras de Fogo, Paturi, Jitirana,
Sant’Ana, Baixa Funda, Mata Escura, Mata Verde, Bicho Preto e Estrada Nova que
comportaram ou ainda comportam uma casa de culto afro-alagoana. Existem também
personagens históricos da religião ainda vivos, como o Pai Cosme (81 anos), o Pai Emídio (80
30
Preto Velho é considerado na Umbanda um espírito de negro da Bahia, experiente, paciente e cuidadoso, cuja
morada é na Jurema, espécie de jardim celestial. O grifo é do autor da pesquisa.
31
RELATÓRIOS DINÂMICOS: MONITORAMENTOS DE INDICADORES, 2014, p. 1-17.
32
RELATÓRIOS DINÂMICOS: MONITORAMENTOS DE INDICADORES, 2014, p. 1-17.
33
INSTITUTO DE TERRAS E REFORMA AGRÁRIA DE ALAGOAS, 2010.
49
anos), Mãe Antonia (74 anos), Pai Bastinho (73 anos) e Mãe Nazaré (72 anos), atuando na
religião cada qual com sua clientela.
3.1 Viçosa no século XX
De 1861 a 1961, funcionou a estação ferroviária de Viçosa, ligando a mesma ao
Recife/PE, Garanhuns/PE, Maceió, Palmeira dos Índios, Quebrangulo, Porto Real do Colégio e
demais localidades (DIÉGUES JÚNIOR, 2006, p. 129-130). A linha férrea significava a
manutenção da economia local, bem como o trânsito para outras regiões de Alagoas e
Pernambuco. Desde o início do século XX, a migração da população negra entre Maceió e o
interior do Estado era constante. Entre os anos de 1910 e 1935, as fazendas de algodão e as
dezenas de engenhos de açúcar movimentaram a economia do município. Tendo em vista a
influência do catolicismo popular rural, sua herança negra dos Palmares, o fluxo constante de
viajantes e operários trabalhando nas fábricas depuradoras de algodão e nas dezenas de
engenhos banguês espalhados pela região entre os anos de 1918 e 1958, torna-se possível
pensar numa religiosidade afro ali. A sobrevivência dessa população se dava, principalmente,
com o trabalho nas usinas de cana de açúcar espalhadas pelo interior alagoano (SANTOS,
2012, p. 199). Brandão Rego, em entrevista ao CPDOC, no ano de 1997, ao falar sobre o
contexto de vida dos operários em Maceió entre os anos de 1916 e 1919, apresentava o
contexto religioso dos operários como favorável às práticas da “macumba” na capital. Rego ao
descrever a Congregação Libertadora da Terra e do Homem, apoiada pelo setor operário no
ano de 1917 em Alagoas, expõe a religião daqueles operários da seguinte forma:
a macumba de lá se chama xangô. Eram trabalhadores que não iam às
reuniões para ir ao xangô. A cabeça deles, cheia de xangô e iemanjá. Era uma
luta muito grande. Para você ter uma ideia do ambiente, eram fetichistas, quer
dizer, xangô e toda esta coisa, espíritas, protestantes e aquela massa de
católicos, oficialmente católicos, mas na realidade eram católicos fetichistas
[...]. É; operários, assim, empesteados de fetichismo, de espiritismo, de
catolicismo misturado com fetichismo. Era uma luta muito grande e muito
difícil (REGO, 1993, p. 12-13).
Brandão Rego disse também que, no ano de 1917, ele e alguns operários de Maceió
penetraram em alguns interiores do Estado – não cita quais – mas, segundo ele, esteve nos
engenhos de seus familiares – provavelmente nas terras de Viçosa, sua terra natal – procurando
os trabalhadores de lá e dizendo: “A terra pertence a vocês! Divisão das terras! A terra ao
trabalhador de enxada!”. Sua família reagiu: “Ainda mais essa! O homem é um inimigo de
50
Deus, um inimigo de Cristo, e agora é inimigo dos próprios parentes, quer a desgraça dos
parentes!” (REGO, 1993, p. 9-11). Partindo de sua fala compreende-se que a prática da
“macumba” entre os operários em Maceió era bastante favorável. E, mais, a expressão
“empestados” em sua fala, mostra a dimensão dessa prática entre esses trabalhadores, vista
como negativa para a militância de esquerda à época. Talvez, pudesse existir algum tipo de
trânsito religioso com os trabalhadores nos interiores do Estado ou talvez, ter influenciado as
gerações de operários nas décadas seguintes. O município de Viçosa era de fácil acesso e um
dos grandes produtores de açúcar desde o século XIX. Tudo leva a compreender que a
religiosidade negra em Viçosa existia obviamente dentro desse contexto. O povoado do
Bananal ou do engenho “bananais” descrito por Diégues Júnior, poderá contribuir para tal
pensamento conforme se verá posteriormente (DIÉGUES JÚNIOR, 2006, p. 231).
Em meados de 1920, o folclore regional, sobretudo, o Quilombo 34 , era destaque no
povoado Bananal e evocava a “história de cor local” (VASCONCELOS, 1964?, p. 61). Eis,
aqui, mais uma singularidade: cultura afro-brasileira nos folguedos de Viçosa nas primeiras
décadas do pós-Quebra. Vale lembrar que nas décadas de 1930 e 1940 o desenvolvimento
econômico de Viçosa é representado pelos engenhos, dezenas espalhados pelo município e,
principalmente, por três grandes usinas de cana de açúcar, gerando assim muitos empregos
naquela região. Tudo indica que operários entre os anos de 1930 e 1960 não faltavam em
Viçosa movimentando a economia da cidade. Alguns deles, talvez, “comunistas” oriundos de
Maceió.35
No ano de 1931, por ocasião do centenário de Viçosa, o Mons. Cândido Ferreira
Machado36, escreveu que neste período todas as associações religiosas estavam funcionando
regularmente com “fieis orgulhosos, radiantes e alegres por serem católicos”. Segundo ele, os
católicos sabem que a maior glória deste mundo é ser membro da Igreja de Jesus Cristo e, por
conseguinte, cidadão do reino de Deus. E mais: “a religião católica na Viçosa tem sido um dos
maiores fatores do seu progresso e da sua civilização” (ÁLBUM DO CENTENÁRIO DE
34
O folguedo teve origem nas senzalas, como variante das Congadas e Cacumbis. Só em Alagoas recebe a
denominação de Quilombo, devido a questões históricas. Os brincantes se agrupam em duas alas: a dos negros e a
dos caboclos índios. As partes ou episódios são desempenhadas desde a véspera, quando ocorre o chamado roubo,
que consiste nos brincantes esconderem alguns objetos emprestados por membros da comunidade. Em seguida
vem o batuque, o resgate, o rapto e a luta. Em razão de seu enredo longo, estende-se por dois dias. Figurantes: Rei
dos Negros, Rei dos Caboclos, Rainha, Catarina, Pai Velho, Espia dos Caboclos, Vigia dos Negros e demais
caboclos e negros. Informações disponíveis em: (ALAGOAS POPULAR, 2013, p.80-90).
35
No ano de 2008, o Advogado, Júlio Vasconcelos Sobrinho, criou uma página na internet chamada Viçosa
Completa onde disponibiliza diversos artigos e indicação de leitura sobre o município tais como: (MELO,1995;
SÁ BRANDÃO, 2001; 2007; VILELA, 1962). As informações também podem ser encontradas em:
<http://blogvicosacompleta.blogspot.com.br/.>. Acesso em: 06. jul de 2015.
36
Pároco entre os anos de 1919 e 1958 em Viçosa/AL.
51
VIÇOSA, 2008, p. 121). A expressão “civilização” aqui, talvez, viesse acompanhada de
conversão, catequização e doutrinação católica, pois o catolicismo romano significaria
progresso da cidade e, consequentemente, civilidade do povo viçosense. Na década de 1940,
três grandes usinas funcionavam em Viçosa: a usina Boa Sorte, Recanto e Boa Esperança. De
Viçosa, o açúcar descia para a cidade de Pilar e de lá era transportado para Maceió (DIÉGUES
JÚNIOR, 2006, p.130). Também as máquinas de descaroçamento de algodão trabalhavam a
todo vapor nesse período (SÁ BRANDÃO, 2007, p. 11-17). As hipóteses aqui são lançadas a
partir do texto do Mons. Vasconcelos, o qual reconhecia que a fé católica sobrevivia ao lado
das “crendices africanas” e sincretismo religioso na primeira metade do século XX.
Viçosa no século XX desempenhou um relevante papel no desenvolvimento econômico
e cultural na região do Vale do Paraíba, área geográfica bastante conhecida no Estado.
Considera-se importante citar uma informação presente num levantamento para fins
apostólicos da Arquidiocese de Maceió, intitulado: Vida paroquial ajustada ao nosso tempo e
ao nosso meio. Este documento é um apanhado das paróquias de todo o Estado, parece datado
da década de 1940 e foi preenchido pelo então Mons. Cândido Ferreira Machado na paróquia
Senhor Bom Jesus do Bomfim. Traz na página 2, uma informação valiosa acerca do “baixo
espiritismo” ou “macumba” presente em Viçosa naquela época: “O baixo espiritismo tem
penetrado em vários lares. A esperança de curas e a orientação de remédios é também a causa
mais impulsionante para o espiritismo”. Já na página 3,escreve: “A infiltração espírita é um
fato. Aceitam também os operários, com muita facilidade as quiromancias e benzederas
(curandeiros). Mãos que piram outros ajuizados”.37 Os interlocutores em Viçosa informaram
que a liderança umbandista à época se identificava como “benzedores” ou “rezadores de
ramo”. Outra parte era vista como “curandeiros” e “espíritas”. Na década de 1950, Pai
Cosme (81 anos) e Pai Emídio (80 anos) disseram frequentar quando crianças “reuniões de
cura”, “oferendas aos espíritos” e de “Mesa Branca”. Mãe Antônia (75 anos) também
afirmou participar desde os sete anos de idade das “reuniões espíritas” na zona rural e na
cidade, levada pelos seus pais.
O documento parece confirmar a existência do culto. Talvez, o que não foi falado pelos
intelectuais foi acompanhado pela Igreja. Uma observação interessante que precisa ser feita no
37
Este documento traz um levantamento dos acontecimentos ocorridos no município naquele ano. Cabia ao
pároco apresentar ao Arcebispo o contexto geral onde a paróquia estava inserida. Nestas informações prestadas
deveria constar a realidade social, cultural, política, econômica e, principalmente, religiosa. O objetivo do
documento escrito à mão era conhecer o contexto da paróquia. Arquivo da Cúria Metropolitana de Maceió –
Arquidiocese de Maceió. Pasta de Viçosa, paróquia Senhor Bom Jesus do Bomfim. Infere-se, segundo
informação da Cúria, o ano de 1940, parece, tendo em vista a ordem cronológica da documentação existente
naquela estante. A pesquisa foi realizada entre 11-13 de junho de 2014.
52
informativo apostólico é acerca dos operários: “Aceitam também os operários...”.Nos anos de
1960, principalmente, Viçosa comportava mais de 130 engenhos produtores de açúcar,
rapadura e aguardente. Tratava-se de uma região bastante conhecida não apenas em Alagoas,
mas no Estado de Pernambuco. Neste período, a migração era muito forte, pois além de uma
economia bastante promissora, a cultura local alcançou seu auge, chegando a ser conhecida
como a “terra da cultura alagoana”. O contexto foi datado da segunda metade do século XX,
alguns anos depois do episódio do “Quebra” na capital Maceió em que ocorreu forte migração
dos praticantes das religiões afro-alagoanas para o interior do Estado. Viçosa neste período já
comportava seis povoados quilombolas. Forte coincidência, talvez.
As práticas da religião de origem africana não estavam ausentes naquela localidade nos
primeiros anos pós-Quebra e no início da segunda metade do século XX. Viçosa não esteve
alheia a esta realidade recorrente. As práticas afro-alagoanas seriam uma realidade cultural na
região. Viçosa mostrou ser um ambiente bastante propício à Umbanda. O quadro contribuiu
para fortalecimento da Umbanda como culto doméstico agregador de migrantes que por ali se
fixavam. Por que não foi feita nenhuma alusão histórica a este culto? Tudo indica que a
influência erudita europeia, branca e elitista permeou as ideologias dos escritores alagoanos,
sobretudo, viçosenses. Os umbandistas em Viçosa mencionaram que nunca foram visitados por
nenhum pesquisador para falar sobre suas crenças. Desse modo, cabe a presente pesquisa
juntamente com estas lideranças, desenvolver a história do culto umbandista em Viçosa a partir
dos discursos de seus praticantes, sobretudo, dos mais antigos. Afinal, Viçosa apresenta um
terreno bastante fértil para essas práticas religiosas. A história do povoado Bananal e da Rua
dos Paus Brancos poderá contribuir para compreender isso.
3.2O povoado Bananal e a Rua dos Paus Brancos: singularidades
O Mons. Vasconcelos38destacou um casal de negros do Bananal (Dona Isidóra e Seu
Quintiliano) que no ano de 1913(?) haviam comemorado 50 anos de casamento. Referiu-se a
eles como pessoas de “profundos sentimentos religiosos”. Este casal possuía uma imagem de
São Pedro 39 , dando a entender que pertencia ao primitivo quilombo. Dona Isidóra e Seu
Quintiliano construíram uma capela simples e bonita após terem recebido com alegria o
38
Foi ordenado Padre em junho de 1915 e em 7 de julho rezou, em Viçosa, sua primeira missa.
Só uma observação que se considera importante aqui: no sincretismo religioso, os santos católicos Santo
Antônio, São Pedro e São João, muito lembrados no mês de festas juninas, são, respectivamente, na tradição dos
xangôs alagoanos, Ogum, Xangô e Oxóssi. A fala do Vasconcelos (“crendices africanas e sincretismo ali”) talvez
possa indicar o fenômeno afro-brasileiro existente ali.
39
53
modesto nicho o qual substituíram em seguida por esta capela. Nela, “começaram uma vida
religiosa, esclarecedora e intensa” (VASCONCELOS, 1964?, p. 56. Os grifos são do autor da
pesquisa). Sacerdotes e franciscanos do Convento de Alagoas ali se estabeleceram. Era na pia
batismal que as pessoas integravam-se na fé e na civilização, cuja palavra divina pregada,
esclarecia e orientava aquele povo humilde e bom dos campos (VASCONCELOS, 1964?, p.
56-57. Os grifos são do autor da pesquisa). No final do ano de 1915, chegava ao Bananal o
segundo Bispo Diocesano, Dom Antonio Manoel de Oliveira que em visita à Paróquia de
Viçosa, quis conhecer de perto seu rebanho espiritual no Bananal, povoado festeiro, com suas
associações religiosas e povo humilde (VASCONCELOS, 1964?, p. 57-58).
Interessante notar que Dona Isidóra e Seu Quintiliano, pessoas de profundos
sentimentos religiosos, no dizer do Mons. Cícero Vasconcelos, haviam começado uma vida
religiosa esclarecedora e intensa. A expressão esclarecedora ali, pode vir acompanhada,
talvez, de conversão ao catolicismo, enquanto a expressão intensa talvez signifique o
aprendizado catequético. Vale lembrar que o casal, nas palavras do Monsenhor, começou uma
vida religiosa. Talvez isso possa subtender que Dona Isidóra e Seu Quintiliano não pertenciam
ao catolicismo, mas sim, a outra modalidade religiosa que não proporcionava civilização,
tampouco, orientava e esclarecia aquele casal.
Este povoado, cerca de 10 km da cidade, entre Viçosa e Chã Preta, desperta certa
curiosidade. De acordo com o Mons. Cícero Vasconcelos (1964?), filho da Paróquia de Viçosa
(1915), o povoado do Bananal foi um dos quilombos da região (VASCONCELOS, 1964?, p.
13). Também baseando-se no “Diário de Viagem” do Capitão Blaer (1630-1654), Vasconcelos
escreve que há fortes indícios de ter sido o Bananal um quilombo palmarino ao lado de outros
povoados quilombolas como o Sabalangá, Caçamba, Osenga, Gurgumba e Danibrabanga
(VASCONCELOS, 1964?, p. 14).A origem do nome é devido ao plantio de bananeiras, restos
das plantações dos quilombolas. Tudo leva a crer, segundo ele, que uma das interpretações
históricas é a de que a região do Bananal foi uma das sesmarias em que comportou o “reduto
da raça negra fugindo da escravidão” (VASCONCELOS, 1964?, p. 15).
Conforme Vasconcelos (1964?, p. 18), foi só na segunda metade do século XIX que
surgiram documentos que conferiam autenticidade e certeza à história do Bananal na Viçosa.
Em seu livro, dedica o capítulo 9 ao aspecto religioso do povoado, identificando a influência da
religiosidade africana no catolicismo, representada pela imagem do Senhor dos Martírios, cuja
capelinha era cuidada por uma senhora negra. “Nos mocambos havia igrejas e santos. As
crenças católicas sobreviviam ao lado das crendices africanas, num sincretismo que se vem
54
perpetuando na cultura religiosa da nossa terra” (VASCONCELOS, 1964? p. 56. Os grifos são
do autor da pesquisa).Tudo leva a compreender que, nas terras viçosenses, a “macumba” não
estava ausente do cotidiano daquela população no pós-Quebra.
Outra região em Viçosa conhecida como os Paus Brancos, também traz uma
singularidade que merece ser destacada. Entre o povoado quilombola do Sabalangá e o centro
de Viçosa fica a Rua dos Paus Brancos. Atualmente, a Avenida Dr. Evilázio Torres, a Rua São
José e a Estrada Boa Sorte estão interligadas formando a conhecida região dos Paus Brancos na
cidade. Antigamente, existiam dezenas de árvores ali, eram restos de matas e capoeiras da
região montanhosa da Serra Dois Irmãos. Essas árvores existiram até o início do século XX.
Com o desenvolvimento urbano, foram derrubadas. Anos depois, essa parte do caminho, uma
extensão de 2 km, foi chamada de Paus Brancos. Esta rua era a principal via de acesso à cidade
de Viçosa a partir do povoado do Sabalangá (SÁ BRANDÃO, 2007, p. 37-38).
De acordo com os umbandistas viçosenses, já chegaram a funcionar na Rua dos Paus
Brancos dez terreiros. Os moradores confirmaram a versão dos umbandistas. Numa extensão
de um pouco mais de 2 km, os terreiros existentes pertenciam aos seguintes Pais e Mães de
santo: (1) Mãe Maria Teixeira (falecida); (2) Mãe Maria Irene (falecida); (3) Mãe Minininha do
Sabalangá (falecida); (4) Mãe Eunice (atualmente está no povoado de Branca de Atalaia); (5)
Pai Rosalvo “Preto”; (6) Pai Rosalvo “Branco” (popular “Pesão”); (7) Mãe Maria Alfredo; (8)
Pai Cosme (único em plena atividade no local) e (9) Pai Balaio. Trata-se de uma área
interligada ao povoado quilombola Sabalangá o qual remonta à época dos Palmares. Talvez
seja o povoado mais antigo de Viçosa ao lado do povoado da Mata Escura (SÁ BRANDÃO,
2007, p. 37-38).
A usina de cana de açúcar Boa Sorte, localizada nas proximidades, que passou a
funcionar na década de 1940, chegou a empregar centenas de trabalhadores na produção do
açúcar. A região do Sabalangá, um dos redutos quilombolas mais antigos de Alagoas, serviu de
morada para dezenas de famílias daqueles trabalhadores e outros migrantes do Estado e da
região de Pernambuco. Esta região representou um dos principais centros do comércio rural,
agropecuário e fluxo de pessoas em constante trânsito e êxodo urbano. Como uma das
principais vias de acesso ao centro da cidade, a Rua dos Paus Brancos agregou inúmeras
famílias não só de trabalhadores da usina, mas de pessoas que buscavam trabalho numa região
permeada pela cana de açúcar, matas, serras e, principalmente, banhada pelo Rio Paraíba.
Esta Rua favoreceu bastante o ajuntamento de inúmeras famílias que construíam suas
casas de pau a pique e buscavam emprego nos engenhos da região de Viçosa, Cajueiro e Chã
55
Preta. O distrito de Chã Preta teve duas grandes usinas de cana de açúcar, a Usina Recanto e a
Boa Esperança, importantes para o desenvolvimento econômico da região nas décadas de 1940
e 1950. Compreende-se que o contexto social e econômico dessa região, bem como o trânsito
frequente de pessoas de várias partes de Alagoas, contribuiu muito para o aparecimento e
desenvolvimento de práticas religiosas diversas, uma delas a Umbanda obviamente.
Ela pôde significar a “morada da cultura negra”, do campo religioso afro-brasileiro,
talvez, presente no imaginário religioso dos antepassados e revividos nos remanescentes
umbandistas por várias décadas naquela região. Segundo Pai Cosme, desde a década de 1950
funcionaram pelo menos dois ou três terreiros nesta região que agregavam filhos e filhas de
santo. Segundo ele, desconhece outra localidade em toda a Viçosa em que tenham existido uns
dez terreiros de uma só vez. Isto pode ser explicado a partir dos primórdios econômicos da
década de 1940 vistos anteriormente. Segundo o Pai Bastinho (74 anos), “o xangô em Viçosa
nasceu na região do Sabalangá”, reduto dos negros quilombolas que habitavam na Serra Dois
Irmãos e região do Gurgumba. Para ele, “a herança religiosa dos negros daquela região, não
pode ser descartada na história da religião no município”. Atualmente, não existe nenhum
terreiro funcionando nessas duas localidades.
3.3 A afro-alagoanidade no município de Viçosa
Escrever sobre a história dos cultos afro-alagoanos no município de Viçosa não é tarefa
fácil. Algumas dificuldades podem ser enumeradas, dentre elas: (1ª) a maioria dos umbandistas
não se lembra dos nomes dos terreiros, dos locais de funcionamento, de alguns nomes mais
antigos, dos anos e épocas de maneira precisa; (2ª) trata-se de um público, de maioria nãoalfabetizada, tímido, não dado à fala, o que dificultou colher as entrevistas, relembrar fatos e
eventos da religião; (3ª) a mudança de endereço com frequência de suas lideranças; (4ª) o
falecimento das lideranças antigas e, consequentemente, a extinção dos seus terreiros; (5ª) a
inexistência de literatura específica que trate do assunto ali; (6ª) a falta de colaboração no
fornecimento de informações por parte de alguns umbandistas; (7ª) o desconhecimento do
assunto por parte das duas Federações representadas no município; (8ª) a Federação Zeladora
das Religiões Tradicionais Afro-Brasileiras em Alagoas – FRETAB, que não permitiu acesso
ao cadastro, bem como à documentação dos terreiros viçosenses filiados e, por último; (9ª) a
falta de indicação no exterior dos terreiros espalhados na periferia da cidade e numa
porcentagem menor na zona rural (o que pode ser um indício da repressão histórica no País).
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Com base nos discursos colhidos entre janeiro de 2009 e maio de 2010 40 e, mais
recentemente, entre abril de 2014 e abril de 2015das lideranças umbandistas mais antigas de
Viçosa, conhecidas popularmente por: Pai Bastinho, 74 anos, (Sebastião Teixeira de Freitas),
sacerdote afro-brasileiro há 45 anos; Pai Emídio, 80 anos, (Emídio Correia da Paz), sacerdote
há 56 anos; Pai Cosme, 81 anos, (Cosme Alves), sacerdote há 60 anos; Pai Rosalvo, 65 anos,
(Rosalvo Ferreira dos Reis), sacerdote afro há 45 anos; Pai Barnabé, 64 anos, (José de Oliveira
Costa), sacerdote há 43 anos; Mãe Nazaré, 73 anos, (Maria Nazaré dos Santos Silva),
sacerdotisa há 51 anos e Mãe Antônia, 75 anos, (Antônia Vieira de Araújo), sacerdotisa há 50
anos, foi possível traçar alguns elementos característicos dos umbandistas viçosenses.
Os discursos foram organizados e sistematizados a fim de apresentar um esboço
histórico dessa religião ali. Ficou claro que desde meados das décadas de 1930 e 1940 já se
praticava “mesa” em Viçosa. Segundo os umbandistas, a partir da década de 1950 em diante,
reapareceram os chamados “xangôs” em Viçosa no formato de terreiros que se conhece hoje.
A partir do final da década de 1950, poucos umbandistas começaram a realizar rituais públicos,
e na maioria das vezes, sem matança de animais ou toques de tambores, pois segundo eles, isso
não podia ser divulgado publicamente. Ainda segundo os discursos, sob forte repressão
policial, social e religiosa, realizaram raras cerimônias abertas ao público. Por isso, foi
necessário reconfigurar a cosmologia com o intuito de “reapropriar” ou “incorporar” os valores
culturais hegemônicos.
Com o surgimento da Federação dos Cultos Afro Umbandistas do Estado de Alagoas
em 09 de janeiro de 1957, a Umbanda em Viçosa passou a ser mais conhecida. Foi
precisamente a partir dos anos de 1958 em diante que os rituais, ainda prevalecendo os de
“Mesa Branca” ou “Mesa de Jurema” 41 , se desenvolveram. Eram celebrações curtas que
reuniam pouca gente, geralmente vigiadas por policiais. Os representantes dos terreiros tinham
que solicitar autorização ao delegado de polícia. Cada terreiro precisava redigir uma carta à
Delegacia de Polícia pedindo autorização para funcionamento das cerimônias públicas, que não
40
(GOMES, 2012). Este autor desenvolveu sua pesquisa de campo etnográfica (2009-2010) durante dezesseis
meses em oito terreiros de Umbanda inseridos no município de Viçosa, Zona da Mata alagoana.
41
De acordo com as lideranças mais antigas, nos rituais de “Mesa Branca” ou “mesa de jurema” são cultuados
apenas os espíritos julgados da Jurema. Os filhos de santo recebem os Caboclos e Caboclas, Pretos Velhos e
Pretas Velhas, Zé Pelintra e, em casos excepcionais, segundo eles, Exus. Nesse ritual não se utiliza bebida
alcoólica, nem tabaco e nenhum tipo de instrumento de percussão. As reuniões acontecem em torno de uma mesa,
forrada com uma toalha branca ornamentada com flores e velas acesas. Por meio das louvações, rezas sincréticas,
invocações dos espíritos, ali recebem consultas, aconselhamento, admoestação e repreensão dos espíritos.
Geralmente os rituais acontecem às quintas feiras das 19:h30 às 22:h00 e aglomeram poucos consulentes. Trata-se
de uma celebração tipicamente doméstica e bastante discreta. Ainda hoje os terreiros em Viçosa praticam o ritual
de “Mesa Branca” semanalmente. Em novembro de 2009, foi possível participar de dois rituais no Centro afro
brasileiro São Jorge, da Mãe Ana.
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eram tão públicas assim. Os horários de funcionamento eram determinados pelo delegado.
Geralmente as festas ocorriam no começo da tarde e se estendiam até as 19:00 ou 20:00 horas.
Segundo as lideranças umbandistas mais antigas no município, foi em meados de 1960 que se
começou a ter um pouco mais de liberdade para se praticar a religião. O que se tem hoje como
“toque de Exu”, “toque de Orixás”, festas religiosas públicas, só veio a acontecer em Viçosa
mais precisamente a partir do ano de 1960 em diante, mas vale lembrar que antes disso já
existiam as chamadas “mesas brancas” ou os cultos domésticos.
Segundo as lideranças mais antigas, o ritual de “Mesa Branca” acontecia às escondidas
no interior das casas dos Pais e Mães de santo. Para o Pai Cosme (81 anos) e Pai Emídio (80
anos), eram rituais que aglomeravam poucas pessoas. Na “Mesa Branca” só se trabalhava com
Caboclos e Pretos Velhos, para consulta e orientação espiritual. Tudo acontecia em torno de
uma mesa forrada com uma tolha branca, ornamentada com flores e velas. Poucas pessoas
sabiam da existência desses rituais – cada umbandista realizava secretamente, não era
divulgado. Uma das razões, segundo eles, era porque a lei não permitia “esses trabalhos
espirituais”. Se o delegado, à época, soubesse de algum culto dessa natureza, a força policial
viria tomar satisfação e acabar mesmo. Segundo o Pai Cosme, ainda menino (08 anos de
idade), “ia com meus pais a essas reuniões realizar ‘trabalhos espirituais’”. Em segundo
lugar, havia um preconceito muito forte e pregado pela religião oficial, que refletia a maneira
de pensar de parte da sociedade viçosense. Conforme o Pai Emídio, ser “macumbeiro” naquela
época era “ser corajoso para enfrentar os preconceitos que eram muitos”. Quando se tratava
de rituais a Xangô, Oxóssi, Iemanjá que exigiam um espaço aberto, os poucos umbandistas que
viviam em Viçosa saíam secretamente, na surdina da noite, geralmente durante a madrugada,
4:00 e 5:00 horas da manhã para realizarem as oferendas. Tudo sem som de ingomes, pois
“não se podia fazer barulho”. As cerimônias duravam poucas horas em lugares de difícil
acesso. “Os que trabalhavam com as coisas espirituais não podiam deixar nenhuma suspeita”.
Os Pais e Mães de santo levavam enxadas, foices, anzóis e redes de pescar para dar a entender
que iriam realizar atividades no campo.
Os Pais e Mães de santo mais antigos de Viçosa relataram que desde pequenos já
ouviam falar em “Xangô” ou nos “macumbeiros da Viçosa”. Mãe Antônia (75 anos) relatou,
que desde quando era menina (sete anos de idade), seus pais realizavam “cortes nas matas”. À
semelhança dos rituais de Umbanda, era proibida a leitura e exposição pública do chamado
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“livro da capa preta”, “livro de São Cipriano” 42 . O Pai Bastinho (74 anos), mostrou um
exemplar antigo o qual ele guarda com muito zelo – e disse que em meados de 1940, alguns
tinham esse livro, mas não podiam mostrar ou ler publicamente, pois era considerado um livro
de “magia negra” ou de “feitiçaria”. Segundo ele, “esse livro continha orações fortes que
podiam levar uma pessoa até a morte ou enlouquecê-la”. Pai Bastinho disse que “era um livro
muito temido e respeitado pelos umbandistas”. Com base em seus discursos, pouca gente da
cidade sabia das atividades dos xangôs (1930-1940). Os atendimentos aconteciam no quarto ou
no quintal da casa, a portas fechadas (ainda em 1950). Alguns Pais e Mães de santo
frequentavam a Igreja Católica a fim de deixar “poucas suspeitas na sociedade”. Também,
segundo eles, alguns umbandistas se deslocavam até Maceió, capital, (décadas de 1950-1960
principalmente) para buscarem ensinamentos e participarem de rituais nos terreiros antigos da
capital alagoana, localizados nos bairros do Trapiche da Barra, Prado, Vergel, Ponta Grossa e
Centro. Pode-se inferir que esta realidade assemelha-se bastante a fase que ficou conhecida por
“xangô rezado baixo” no pós-Quebra em todo Estado de Alagoas.
Conforme abordado acima, com a criação oficial da Federação dos Cultos Afro
Umbandistas do Estado de Alagoas (1957), os umbandistas viçosenses ficaram um pouco mais
confortáveis para praticarem suas crenças. Porém, mesmo assim, tratava-se ainda de uma
religião “às escondidas”, com celebrações mensais, trimestrais e muitas das vezes, anuais, sem
a utilização dos engomes ou atabaques. O Pai Emídio explicou que era utilizado um
instrumento chamado de peneira, uma espécie de tamborzinho de borracha, pequeno, que se
colocava sob as mãos e que emitia um som parecido com um pandeiro ou chocalho. Pai Emídio
disse que a partir de 1955 utilizou este instrumento. Chegou a mostrar não os originais, mas
42
“O Feiticeiro – confunde-se com um outro célebre Cipriano imortalizado na Igreja Católica: o “Papa Africano”.
Apesar do abismo histórico que os afasta, as lendas combinam-se e os “Ciprianos’’, muitas vezes, tornam-se um
só na cultura popular. É comum encontrarmos fatos e características pessoais atribuídas equivocadamente. Além
dos mesmos nomes, os mártires coexistiram, mas em regiões distintas. Cipriano – O Feiticeiro – é celebrado no
dia 2 de Outubro. Foi um homem que dedicou boa parte de sua vida ao estudo das ciências ocultas. Após depararse com a jovem (Santa) Justina, converteu-se ao catolicismo. Martirizado e canonizado, sua popularidade excedeu
a fé cristã devido ao famoso Livro de São Cipriano, um compilado de rituais de magia. A fantástica trajetória do
Feiticeiro e o Santo da Antioquia, representa o elo entre Deus e o Diabo, entre o puro e o pecaminoso, entre a
soberba e a humildade. São Cipriano é mais que um personagem da Igreja Católica ou um livro de magia; é um
símbolo da dualidade da fé humana. O FEITICEIRO Filho de pais pagãos e muito ricos, nasceu em 250 d.C. na
Antioquia, região situada entre a Síria e a Arábia, pertencente ao governo da Fenícia. Desde a infância, Cipriano
foi induzido aos estudos da feitiçaria e das ciências ocultas como a alquimia, astrologia, adivinhação e as diversas
modalidades de magia. Num aspecto geral, encontram-se instruções aos religiosos para tratar de uma moléstia,
além de cartomancia, esconjurações e exorcismos. A Oração da Cabra Preta, Oração do Anjo Custódio e outras da
crença popular também são inclusas (Magnificat, Cruz de São Bento, Oração para Assistir aos Enfermos na Hora
da Morte etc.). Além dos rituais de como obter um pacto com o demônio, como desmanchar um casamento e da
caveira iluminada com velas de sebo. ”Cf. MORGOM, F. J. O antigo e verdadeiro gigante livro de São Cipriano
– Capa Preta. Disponível em: <.http://pt.slideshare.net/nandosouza3705/sao-cipriano-capa-preta.>. Acesso em:
20. março. 2015.
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dois que adquiriu no ano de 1980. Ali o tamborzinho de borracha era chacoalhado e os
espíritos começavam a baixar no salão. Segundo ele, as cerimônias nos terreiros não podiam
chamar muita atenção da sociedade, só ouvia quem estivesse muito próximo das chamadas
“peneiras” – que emitiam um som de cachoeira. Atualmente é possível registrar em Viçosa
trinta e três terreiros, “centros” ou “salões” de Umbanda.
3.4 Gerações de umbandistas em Viçosa/AL: reconstituição histórica da religião
Pensar a Umbanda em Viçosa exige a elaboração de duas premissas, a saber: (1ª) uma
Umbanda da “Mesa Branca”, “Jurema” ou “anagô antigo” 43 e (2ª) uma Umbanda dos
“toques” ou giras”. Esta, a partir de 1955 propriamente, enquanto aquela entre as décadas de
1930 e 1940 aproximadamente. Os chamados “rezadores/as”, parte deles/as realizavam ritual
de “Mesa Branca” ou trabalhavam só com “Mesa”. Geralmente quem mexia com as “coisas de
espiritismo” era identificado como rezador/a, benzedor/a ou curador/a de ramo e médium, mas
nunca como Pai ou Mãe de santo.
Já se ouvia falar dos “xangozeiros”, “catimbozeiros”, “macumbeiros”, “espíritas” ou
dos “médiuns” de Viçosa nos primeiros anos de vida desses entrevistados. Segundo eles, o
ritual de “Mesa Branca” funcionava às escondidas tanto na zona rural quanto na urbana. O
fato de essas residências estarem situadas na periferia da cidade e, principalmente, na área rural
dificultava a passagem das informações por parte dos interlocutores. Eram lugares isolados e
distantes do centro de Viçosa. Além da capital, Maceió, muitos umbandistas se deslocavam até
os municípios de Atalaia, a 38 km de Viçosa e Quebrangulo, a 28 km, para participar de rituais.
Ainda hoje, parte da liderança busca atividade em terreiros do povoado de Branca de Atalaia
(BR 316), Cajueiro, Anadia e Maceió (Bairros do Jacintinho, Benedito Bentes, Prado e
Trapiche da Barra). A localização geográfica periférica da maioria dos terreiros pode significar
a marginalidade da religião em meio às práticas religiosas dominantes e aceitas pela maioria da
sociedade. O nível de pobreza dos seus líderes e praticantes pode significar também o lugar de
inclusão nos ambientes sagrados e na sociedade viçosense. É na periferia que as pessoas podem
43
Segundo Clébio ARAÚJO, “Nagô agregará também a marca da diferenciação em relação às tradições religiosas
externas a Alagoas, em sentido cultural/territorial, marcando um contraponto à força impactante da Umbanda de
origem carioca e ao candomblé Jêje de origem baiana. Por outro lado, a marca típica do Nagô será sem dúvida a
sua trajetória de repressão e estigmatização pública sofrida, tendo no Quebra seu marco histórico primordial, e que
o colocará na periferia das religiões afros diante do olhar do Estado. O pertencimento Nagô, em Alagoas,
indicará, portanto, uma história viva de recolhimento, contenção e silenciamento, que permanecerá como
resistência a essa periferização sofrida” (ARAÚJO, 2009, p. 3). A Umbanda em Viçosa compreende que o
“anagô” trata-se de uma prática antiga do Candomblé. Prática esta que guarda suas origens africanas e costumes
dos indígenas. Segundo Marileide Batista (Mãe Neguinha), seu terreiro é “dessa tradição antiga dos anagôs”.
60
encontrar uma “casa de culto” aberta para aliviar suas agruras e solicitar serviços mágicos para
a resolução dos seus problemas. O ambiente simples e, em alguns casos, de chão batido e
construção de pau a pique, pode significar ainda a realidade de uma religião que nasce nas
senzalas e nas periferias das grandes cidades e é praticada em princípio, por negros, pobres e
pessoas não-alfabetizadas.
Diante de tantas dificuldades, constituíram um “povo de santo” para o estabelecimento
e organização das práticas religiosas no município. Os interlocutores informaram que os
zeladores mais populares e falados naquela época, aproximadamente nas décadas de 1950 e
1960, eram os seguintes: (1) Mãe Maria do Carmo: não lembram o nome do terreiro – região
rural da Mata Verde; (2) Pai José do Jitirana: não lembram o nome do terreiro – região rural do
Jitirana; (3) Mãe Marina Munguba: Centro Espírita Santa Bárbara – Paus Brancos; (4) Pai
Roberto: não lembram o nome do terreiro – Dourada; (5) Pai Benício: Centro espírita da Mãe
Maria – Passagem da Areia; (6) Pai Pedro Ribeiro – Centro Áfrico Senhor do Bomfim – Rua
Assembleense/Rua do Cemitério; (7) Pai João Valério – não lembram o nome e local do
terreiro; (8) Pai “Touro Preto”– não lembram o nome e local do terreiro; (9) Pai João Belo –
não lembram o nome do terreiro – Rua da Matança; (10) Pai Aníbal – não lembram o nome e
local do terreiro; (11) Mãe Benedita – Centro espírita “Manoel Maior” – não lembram o local
do terreiro; (12) Mãe Maria Teixeira – Centro espírita Senhor do Bomfim – Paus Brancos; (13)
Pai Pedro Teixeira – Centro espírita Preto Velho – não lembram o local do terreiro; (14) Mãe
Margarida – Centro afro Senhor Oxalá; (15) Mãe Maria Júlia – não lembram o nome e local do
terreiro; (16) Pai Pedro Demésio – não lembram o nome do terreiro – Rua Nova; (17) Mãe
Lourdes – não lembram o nome e local do terreiro; (18) Mãe Adélia – não lembram o nome e
local do terreiro; (19) Mãe Maria Preta – não lembram o nome e local do terreiro; (20) Pai José
Mata – não lembram o nome do terreiro – Fazenda Lages/Pedras de Fogo; (21) Pai Manoel
Gonçalo – Região rural da Fazenda Bicho Preto; (22) Pai José Roberto – não lembram o nome
do terreiro – Rua Nova; (23) Mãe Minininha do Sabalangá – não lembram o nome do terreiro –
Região rural do Sabalangá/comunidade quilombola e; (24) Mãe Nazaré – não lembram o nome
do terreiro – zona rural da Fazenda Bicho Preto.
Esta liderança umbandista foi citada como sendo a “pioneira das práticas de xangô”
como “culto organizado” no município. Infelizmente, a liderança ainda viva não se lembra de
detalhes desses cultos e herança dos seus avós. Confirmaram que desde 1955 já se “cultuava
aos espíritos” em rituais domésticos (“sessões de mesa”) e nas matas e serras. O Jornal
61
Saravá44 em sua edição de julho de 1977 trouxe uma lista dos terreiros de Umbanda filiados à
Federação Zeladora dos Cultos em Geral do Estado de Alagoas (atual FRETAB). De acordo
com a listagem, Viçosa contabilizava à época, apenas três terreiros cadastrados nesta
Federação: Centro Africano Abaçá “Nossa Senhora da Conceição”, localizado na Rua Senador
Ismael Brandão, nº 70 sob a liderança do Babalorixá Sebastião Teixeira de Freitas; a Tenda
Espírita “Manoel Maior”, localizada na Rua Vigário Costa, nº 87, sob a direção da Yalorixá
Marina Teresa da Conceição e o Centro Espírita “Mestre Meônidas”, localizado na Fazenda
Balança (Arruado –zona rural de Viçosa), sob a direção da Yalorixá Maria Cícera Barbosa da
Silva. Nesta mesma época, no município vizinho de Cajueiro se encontravam cadastrados nesta
Federação oito terreiros de Umbanda. Vale lembrar que desde 1957 existia outra Federação no
Estado, a Federação dos Cultos Afro-Umbandista de Alagoas, enquanto a atual FRETAB só foi
criada no ano de 1972.
A zona rural de Viçosa chegou a comportar vários praticantes do chamado “xangô de
Alagoas” há cerca de 90 anos. Conforme os interlocutores, as regiões rurais de Santa Efigênia,
Mata Escura, Sabalangá, Mata Verde, Jitirana, Dourada, Pedras de Fogo e Bicho Preto tinham
pelo menos uma “Mesa de Jurema”, ou “Mesa Branca” ou “anagô antigo” funcionando.
Naquela época não se comentavam muito as práticas espirituais. Quem trabalhava com essa
modalidade religiosa não podia se identificar. Avós, pais e familiares da liderança umbandista
mais antiga de Viçosa comentavam com seus filhos e filhas e, quando precisavam, conduziam
seus filhos às residências dos conhecidos “curadores de ramo”45 para não serem identificados
como “espíritas” 46 . Algumas “celebrações espirituais”, 47 afirmam os interlocutores, eram
realizadas nas matas antes de amanhecer o dia, às escondidas.
Os avós de alguns desses interlocutores chegaram a receber espíritos e algumas mães
chegaram a desenvolver a mediunidade. Pai Cosme afirmou que já nasceu nessa religião e que
o “xangô” sua família já conhecia antes dele vir ao mundo. Segundo ele, foi iniciado aos oito
44
Terreiros de Umbanda e Candomblé, Tendas Espíritas e templos filiados a federação zeladora. Saravá. Ano. 2,
nº 1, julho de 1977,p. 7-9. (Revista do Turismo). Jornal mensal editado para a Federação Zeladora dos Cultos em
Geral do Estado de Alagoas pela Revista do Turismo. Criado em 1976 para integrar os Babalorixás, Yalorixás e
chefes de terreiros em Alagoas para a manifestação de suas ideias construtivas e divulgação dos seus trabalhos
espirituais. O Jornal Saravá foi considerado o porta-voz dos cultos afro-brasileiros no Estado. A edição de 01 de
julho de 1977 trouxe a lista dos terreiros de Umbanda e Candomblé, Tendas Espíritas e Templos filiados a
Federação Zeladora dos Cultos em Geral (atual FRETAB). Não se tem mais informações quanto a sua circulação
no Estado.
45
O mesmo que rezador. Prática considerada de curandeirismo. Geralmente as rezas são acompanhadas por galhos
de arruda ou pião. Esta prática é muito difundida no Nordeste brasileiro.
46
Segundo eles, sinônimo de “macumbeiro” ou “feiticeiro”.
47
Estas celebrações eram compostas por rituais de “Mesa Branca”, oferendas aos Orixás nos rios e nas matas e
aos Exus e Pombagiras. Os rituais eram às escondidas.
62
anos de idade. Já o Pai Emídio informou que desde os nove anos de idade vem desenvolvendo
sua mediunidade, pois trata-se de algo que “vem de família, de geração antiga”, afirmou ele.
Na área urbana as residências dos chamados médiuns estavam na periferia da cidade ou no
dizer dos interlocutores, “nas pontas de ruas”, lugares pobres e afastados do centro comercial.
Segundo eles, nessas “pontas de ruas”, vez por outra, se ouvia falar nessas “casas
espirituais”, se ouvia falar em algum “xangozeiro mexendo com essas coisas de espíritos do
além”. Eram pessoas pobres, não-alfabetizadas, influenciadas fortemente pelo catolicismo
popular. Muitos se autodeclaravam católicos apostólicos, filhos da religião católica. Batizavam
seus filhos e netos na Igreja, casavam seus filhos, participavam das festas religiosas na Matriz
ou nas capelas espalhadas pelo município. Recentemente (maio de 2014), a Mãe de santo,
Josefa Etelvina (Mãe Nêna), foi madrinha de casamento de uma afilhada sua. Também o Pai
Cosme batizou uma de suas netas no ano de 2013. Alguns filhos de santo acompanham
procissão, novenas e outras atividades cristãs na cidade.
Apesar dessa modalidade de Umbanda em Viçosa funcionar no “anonimato”, tinha sua
clientela fiel que buscava ajuda dos espíritos nesses rituais ou nas oferendas de mata adentro
sempre que precisava. A região serrana de Viçosa era bastante conhecida pelos praticantes
desta modalidade religiosa. Mãe Antônia, disse que ainda criança com seus nove ou dez anos
(1951 aproximadamente), começou a visitar “casas de espíritos” e já os incorporava na frente
de seus pais. Segundo ela, essa religião era falada pelos seus pais e a mesma lembra-se muito
bem quando seus pais as levavam para as reuniões: “eu gostava era muito”, afirmou ela. Num
quartinho escuro da casa ou na mesa da cozinha, com portas fechadas, os rituais aconteciam e
os “espíritos baixavam” nas pessoas, conversavam e instruíam a todos: “era uma maravilha”,
afirmou Pai Cosme.
Com base nos depoimentos, foi possível classificar o culto afro-alagoano em Viçosa da
seguinte forma: Uma Umbanda da “tímida celebração pública”/“toque”/“giras”, entre as
décadas de 1950 e 1960; Umbanda federativa dos alvarás/diplomas, entre as décadas de
1970 e 1980; Umbanda geradora de líderes, entre as décadas de 1990 e 2000 e uma
Umbanda da liderança jovem, décadas de 2010 a 2014. Já a caracterização “Mesa
Branca”/“Mesa de Jurema” ou “anagô antigo” praticada no município, está baseada nos
discursos dos representantes mais antigos: Pai Cosme, Pai Emídio, Mãe Antônia, Pai Bastinho,
Mãe Nazaré, Pai Rosalvo e Pai Barnabé. Todos se consideram da segunda geração de
umbandistas de Viçosa. A ideia de dividir em gerações partiu do Pai Bastinho que se
63
autodeclarou da “segunda remessa de médiuns viçosenses”.48 Já o Pai Emídio reforçou a ideia
de médiuns que já trabalhavam na época que ele ainda era criança, conforme ele mesmo se
expressou: “eu era criança e meus pais falavam nessas coisas de se consultar com os
espíritos”. 49 Para o Pai Cosme, com o passar dos anos, depois de 1960 e 1970, foram surgindo
outras lideranças, pois muitos filhos de santo “foram abrindo seus próprios salões e fazendo
seus trabalhos espirituais”. 50 Já para a Mãe Antônia, muitas coisas foram mudando com o
passar do tempo, além das “mesas brancas” que ainda funcionam, “muita gente ainda jovem,
resolveu abrir terreiro do dia pra noite sem ter documentação correta”.
Além dessa liderança considerada pela maioria dos entrevistados como a mais antiga,
há outras lideranças mais jovens no município a exemplo do Pai Lonan, 51 e Pai Cicinho, 52
ambos de uma geração mais nova ou no dizer do Pai Lonan, “espíritos novos” ou como se
expressou o Pai Cicinho: “sangue novo da religião”. Segundo eles, é de suma importância
“buscar reconhecimento legal dos terreiros junto às Federações”, pois significa “funcionar
com documentação certa em todo lugar”. De notar a Umbanda federativa, do alvará e do
diploma muito presente em Viçosa nas décadas de 1970 e 1980 em todo o Estado. O mosaico
umbandista viçosense é marcado por uma Umbanda que evoca ao mesmo tempo o
“Espiritismo Kardecista” ou a “Umbanda Branca” ou a “Mesa de Jurema”, as práticas do
“Candomblé Nagô”, a prática da “Quimbanda”, trabalhando com a chamada “linha de
esquerda” com seus Exus e Pombagiras, “catolicismo popular” e “tradições indígenas” com
seus Caboclos. Este entrelaçamento de práticas ou de expressões variáveis não se percebe
como um mosaico de conflito. Pelo contrário, isto só confirma o polêmico quadro de opiniões e
de práticas que se formou desde seu desenvolvimento na busca de sua “gestação” no século
XX. Não se pode negar o encontro de diferentes perspectivas religiosas na formação do seu
cosmo religioso e da construção da sua cosmovisão.
O importante é atentar para as particularidades e singularidades dos terreiros,
representadas nos discursos dos seus representantes e filhos de santo devotos. Um mosaico
formado por uma teia de relações, onde o humano e o sobrenatural se harmonizam e cujo elo
48
Sebastião Teixeira de Freitas (Pai Bastinho), Entrevista realizada no interior do seu terreiro em 11de abril de
2014. [Duração: 39:92mn].
49
Emídio Correia da Paz (Pai Emídio). Entrevista realizada no interior do seu terreiro em 04 de abril de 2014.
[Duração: 50:08mn].
50
Sr. Cosme Alves (Pai Cosme). Entrevista realizada no interior do seu terreiro em 04 de abril de 2014. [Duração:
29:44mn].
51
Sr. José Cícero da Silva (Pai Lonan), 32 anos. Entrevista realizada no interior do seu terreiro em 17 de maio de
2014. [Duração: 15:08mn].
52
Sr. Cícero Bernardo da Silva (Pai Cicinho), 34 anos. Entrevista realizada no interior do seu terreiro em 18 de
maio de 2014. [Duração:21:58mn].
64
resulta no sentido do culto e práticas religiosas reguladoras do cotidiano desses filhos/as de
santo em seus processos análogos com esses espíritos cultuados, não apenas nos terreiros, mas
na realidade vivencial de todos. Esta é a Umbanda destacada no corpo deste trabalho.
3.5 Remanescentes umbandistas viçosenses: desenvolvimento histórico
Tendo em vista a criação da Federação dos Cultos Afro Umbandistas do Estado de
Alagoas em 1957, na capital Maceió, a primeira do Estado, os terreiros em Viçosa ainda sob
forte repressão policial e, sobretudo, religiosa, passaram a realizar suas poucas celebrações
públicas, geralmente anuais, nos arredores da cidade e na zona rural. Em princípio, essas
celebrações eram vigiadas pela força policial e duravam poucas horas. Segundo o Pai Cosme,
“o delegado mandava parar a batucada”. Conforme os interlocutores o uso de ingomes não
era permitido, o sacrifício de animais também era veementemente combatido pelo delegado de
Viçosa. A maioria dos umbandistas realizava festas anuais e, em alguns casos, mensais ou
trimestrais, mas raríssimos os casos dessas celebrações – afirmam os interlocutores. Segundo
eles, o preconceito ainda soava muito forte. A Igreja Católica combatia essas práticas, a
sociedade hegemônica discriminava fortemente, os vizinhos apedrejavam os salões. Ao sair de
casa em dia de reunião, muitos filhos de santo tinham medo de se deslocar até os salões. Em
suma, “eram tempos difíceis”, afirmaram eles.
Aos poucos, algumas lideranças procuravam a tão falada Federação para buscarem
apoio e informação e, consequentemente, solicitarem documentos para apresentarem às
autoridades policias. Nesta mesma época, Pai Emídio, no início da década de 1960 visitou
Salvador, capital da Bahia, para buscar instruções com a Mãe Menininha do Gantois. Logo
depois recebeu ensinamentos no terreiro da “Mãe Catarina” ou “Vovó Catarina” como ele a
chama, também em Salvador. Ainda andou visitando por alguns meses vários terreiros no
Estado da Bahia. Pai Bastinho exibe com orgulho a foto da Mãe Menininha do Gantois exposta
na parede frontal do seu terreiro. Já a Mãe Nêna (Josefa Etelvina, irmã do Pai Bastinho),
buscou instrução no final dos anos de 1960 no terreiro da “Mãe Josefa”, em Olinda/PE. Pai
Rosalvo ainda muito jovem, com seus dezoito ou dezenove anos, no ano de 1969, retornou ao
município de Guarulhos, Estado de São Paulo, seu local de nascimento, onde passou alguns
meses visitando vários terreiros com o objetivo de aprender mais sobre a religião. O mesmo
esteve em Salvador também na década de 1960 visitando o terreiro da Mãe Menininha.
Muitos umbandistas viçosenses visitavam terreiros no município de São Miguel dos
Campos, Marechal Deodoro, Atalaia, Cajueiro, Quebrangulo e Maceió. No entanto, Pai Cosme
65
afirma que tudo o que ele aprendeu “veio dos espíritos”. Ele começou a receber espírito desde
os sete anos de idade, tradição esta que “veio dos seus avós”. Pai Cosme ainda visitou alguns
terreiros em Maceió e a própria Federação para saber mais sobre sua religião. Nos anos de
1960, existiam poucos terreiros em Viçosa realizando rituais públicos. A maioria continuava
com a prática da chamada por ele de “Mesa Branca”. Segundo os interlocutores, houve época
em que um ritual como este chegava a reunir até trinta e duas pessoas, mas geralmente eram
rituais com pouco público, pois as pessoas temiam a chamada “religião dos espíritas” ou da
“magia negra”.
Esses terreiros eram considerados os mais tradicionais na época e os mais respeitados
pelos umbandistas, funcionavam desde os anos de 1950. Na zona rural de Viçosa, na Fazenda
Bicho Preto, funcionava o ritual chamado por ele de “Mesa Branca”, com o Pai Manoel
Gonçalo na década de 1960. Pai Cicinho, conhecido por Fava Pura – que se verá mais adiante
– iniciou-se neste terreiro aos treze anos de idade. Outra Mãe de santo, neste período, foi a Mãe
Bila, esposa de um senhor conhecido, em Viçosa, por seu Deca. Mãe Bila, a quem recebeu em
seu terreiro, na conhecida Rua da Matança, paralela a Rua do Cravo, uma adolescente chamada
Carlinda, com seus quinze anos de idade, levada pelos seus pais que, anos depois, veio se
tornar Mãe de santo, conforme se verá posteriormente.
A busca de ensinamentos no Candomblé da Bahia dos anos 1960, nos terreiros de
Guarulhos/SP e Olinda/PE, bem como nos bairros de Maceió neste período, só confirma os
entrelaçamentos históricos de crenças e práticas existentes até os dias de hoje. Com base no
que foi visto nesta seção, esta modalidade religiosa pode ir além de uma “Umbandomblé”
podendo ser interpretada como uma Umbanquindomblé, mencionada no capítulo anterior. A
Umbanda agora passa a se preocupar com a “legalização” e “reconhecimento social” do seu
culto.
Foi só a partir dos anos de 1970 e 1980 que muitos filhos de santo foram se
aperfeiçoando na religião e então resolveram abrir seus próprios terreiros. Segundo eles, a
Federação em Maceió era bastante procurada, pois todos queriam regulamentar seus terreiros e,
consequentemente, receber sua documentação legalizando suas práticas na sociedade. Havia
Pais e Mães de santo que exibiam com orgulho a documentação da Federação. Com a criação
da Federação Zeladora dos Cultos em Geral no Estado de Alagoas no ano de 1972, a atual
FRETAB do Pai Paulo Silva, muitos terreiros em Viçosa se recadastraram nos anos de 1990 e
2000 migrando para esta Federação. Atualmente, apenas quatro terreiros estão cadastrados na
Federação dos Cultos afro-Umbandista do Pai Benedito Maciel. A outra parte tem seus
66
registros na atual FRETAB, enquanto outros, por motivo de extravio ou mudança de endereço,
ainda não apresentaram ou renovaram seus registros junto às Federações. Existem apenas dois
terreiros filiados à Federação Espírita Cavaleiros do Espaço da Mãe Dalva (Chã do Pilar) e a
Federação Espírita Alagoana para todo o Território Nacional do Pai Roberto (Arapiraca).A
FRETAB tem um fiscal que reside em Viçosa, o filho de santo Seu José Maria que acompanha
os terreiros ali. Ainda hoje, tanto os alvarás de funcionamento, quanto o diploma de
autorização e carteirinha de identificação da liderança são expostos nas paredes dos terreiros.
Na Rua São Francisco, nas proximidades do Mutirão Área 4, funcionou nas décadas de
1970, o terreiro do Pai Eriberto. Atualmente, suas duas filhas são filhas de santo do Pai Édson
ou Pai Balaio no Centro Espírita São João Batista. Ainda no início dos anos de 1970, Mãe
Nêna, conforme abordado acima, foi até Olinda/PE buscar ensinamentos e, assim, abrir seu
próprio terreiro. Mãe Nêna é irmã do Pai Bastinho e desde criança frequentou o terreiro do seu
irmão mais velho. Pai Barnabé (José Costa) abriu seu terreiro em 1973, o Centro Espírita de
Oxum Menina que funciona até hoje no Conjunto Pe. Cícero. No ano de 1977, Mãe do Carmo
iniciou seu terreiro. A mesma foi filha de santo do Pai José Mata, conhecido na região rural de
Lages/Pedras de Fogo. Lá participava de vários rituais. Ao se estabelecer na zona urbana
passou a frequentar o terreiro do Pai Benício, na Passagem da Areia na direção do município
do Mar Vermelho. Mãe Carlinda (Carlinda Nair dos Santos Silva) 53 foi filha de santo do Pai
Benicio desde os quinze anos de idade. Após a morte do Pai Benício, foi frequentar os terreiros
do Pai Cosme e do Pai Expedito, no município vizinho de Paulo Jacinto, onde se tornou Mãe
de santo.
Mãe Liete, que abriu seu terreiro na Zona rural do Paturi (divisa com o município do
Mar Vermelho), o Centro Espírita Caboclo de Orubá no ano de 1978, “pagava a Federação
direitinho todos os meses”. Seu terreiro funcionou até o ano 2008 e, neste mesmo ano, mudouse para a zona urbana; atualmente, as atividades do seu terreiro continuam suspensas. Seu
terreiro sempre estava em dia com a documentação. Ainda hoje, Mãe Liete aguarda seu alvará
de funcionamento da Federação. No final da década de 1980,Mãe Ana, sobrinha do conhecido
Pai João Belo, iniciou seu próprio terreiro. Segundo ela, “as primeiras providências foram
procurar a Federação na capital”, a fim de registrar seu “salão”. Mãe Ana desde criança
participava, juntamente com toda sua família, da Umbanda em Viçosa sob a orientação do Pai
53
Carlinda Nair dos Santos Silva (Mãe Carlinda), 65 anos. Entrevista realizada no interior do seu terreiro em 30 de
maio de 2014. [Duração: 28:47mn]. A Mãe Carlinda não quis assinar nenhum documento para ceder esta
entrevista. Mas, aceitou conversar gentilmente sobre a Umbanda em Viçosa passando informações muito
importantes. Além de conversar sobre sua experiência pessoal na religião conversou também sobre os terreiros em
Viçosa. Esta conversa ocorreu em sua residência.
67
João Belo – este fez parte da Umbanda desde os anos de 1960 e 1970 na Rua da Matança. Mãe
Ana foi filha de santo da Mãe Nazaré na década de 1980. Nesta mesma época, em 1980, Mãe
Nazaré depois de passar pelo município de Arapiraca no terreiro São Jorge, do Pai Júlio e em
Anadia, seu município de origem, chega a Viçosa e abre ali seu terreiro que funciona até os
dias de hoje.
Ainda no final da década de 1980 depois de frequentar os terreiros da Mãe Antonia e da
Mãe Neguinha, a filha de santo, Val (Valdirez Pereira) recebeu autorização para abrir seu
próprio terreiro. Foi filha de santo da Mãe Antônia por alguns anos. Mãe Val é filha da Mãe
Minininha do Sabalangá (falecida) cujo terreiro funcionou nos anos de 1970 vindo logo depois
a funcionar na região próxima da Rua dos Paus Brancos até o ano 2000. Na zona rural da Baixa
Funda, divisa com o município de Chã Preta, em meados de 1984,Pai Bené ou seu Bené,
curador, realizava sessão de “Mesa Branca” em sua residência todas as semanas. Foi ele que
iniciou a atual Mãe Tamires do Salão Ylê Axé de Oiá, fundado no ano de 1994. Mãe Neguinha
(Srª Marileide Batista, 55 anos), no ano de 1981 abriu seu próprio terreiro. Segundo ela, “tem
que andar certo com a lei”. Mãe Neguinha frequentou o terreiro do Pai Cosme aonde sua
família participava há muitos anos. A mesma esteve no terreiro Cosme e Damião do Pai
Expedito, no município vizinho de Cajueiro, no qual se iniciou como Mãe de santo. Seu
terreiro era o São Sebastião e funcionou dos anos de 1980 até o ano 2002. Seus pertences
foram doados para a Mãe Maria Alfredo que possuía um terreiro nos anos de 1990 no Mutirão,
Área 1, atualmente desativado.
A partir dos anos de 1990 e 2000, o município de Viçosa recebeu mais alguns centros
de Umbanda. Dentre eles, o da Mãe Maria José, Centro Espírita Ilê Axé54 São João Batista, no
Conjunto Cidade de Deus, que trabalha com o seu terreiro desde o início dos anos de 1990. Pai
Édson foi filho de santo da Mãe Eunice nos anos de 1990. Pai Vicente vinha de São Miguel
dos Campos para realizar toques e Mesa Branca em Viçosa na década de 1990. Seu terreiro
ficava na Rua Tribúcio Nemézio, conhecida por Guganema. Ainda em meados dos anos 1990,
conforme abordado acima, funcionava o terreiro da Mãe Maria Alfredo no Mutirão, na Área 7,
que há alguns anos não funciona publicamente, tendo em vista sua debilidade na saúde, idade
avançada e parte dos familiares mudar para Maceió. Mãe Goreti inaugurou seu terreiro no ano
de 1994, o Centro Espírita Palácio de Ogum, nas proximidades da conhecida Praça da
Cavalhada. Ainda em 1994, no Mutirão, na área4, o Salão Ylê Axé de Oiá55 passou a funcionar
publicamente. O jovem Edivaldo dos Santos, 38 anos, mais conhecido por Mãe Tamires, é
54
55
Observe a influência da reafricanização.
Idem.
68
transexual e se iniciou na Umbanda aos sete anos de idade na zona rural da Baixa Funda, na
divisa com o município de Chã Preta. Lá existia o terreiro do Pai Bené que funcionava apenas
com “Mesa Branca”. Padrinho Bené, como era conhecido nos anos de 1980, foi identificado
como “rezador” e “curador”. Foi ali que Tamires se iniciou na Umbanda e logo depois veio a
frequentar o terreiro da Mãe Célia, na zona rural do Guarani, no município de Atalaia. Outro
transexual, Mãe de santo há dezessete anos, é o jovem Carlos Alberto, mais conhecido por Mãe
Carlinha. Mãe Carlinha é filha de santo do Pai Rosalvo e recebeu autorização para abrir seu
próprio terreiro, o Palácio de Oxum, no ano de 1997, na conhecida Rua do Cochicho. Mãe
Carlinha atualmente atende no terreiro do Pai Rosalvo, no Palácio de Ogum.
Mãe Bastiana (falecida), se iniciou no município vizinho de Cajueiro, mas frequentou o
terreiro Preto Velho do Pai Emídio, bem como o da Mãe Nazaré, terreiro Senhor do Bomfim.
Ela foi vítima de infarto e veio a óbito em junho de 2013. Segundo sua família, o terreiro
continua desativado por tempo indeterminado, mas um dia voltará a funcionar regularmente.
Em conversas com a Mãe Bastiana nos anos de 2009 e 2010, ficou explícito seu desejo de
mudar-se com sua família para o município vizinho de Cajueiro. Neste período, realizou várias
festas para Pombagira e Mamãe Oxum as quais contaram com a presença deste pesquisador.
Começou seu terreiro, o Palácio da Oxum Menina, situado na Rua Dourada, no ano 2000.
Neste mesmo período, na região dos Paus Brancos, foi desativado o terreiro da Mãe Eunice que
atualmente reside no município de Atalaia/AL. Parte dos seus filhos de santo iniciados na
década de 1980 foi realizando seus atendimentos em suas residências, vindo logo depois a abrir
seus próprios terreiros.
Pai Édson chegou a frequentar por alguns anos o terreiro da Mãe Margarida, no
município vizinho de Cajueiro (anos de 1990). Foi lá que ele recebeu ensinamentos para abrir
seu próprio terreiro. No ano de 2002 o jovem José Cícero, 32 anos, mais conhecido por Pai
Lonan ou Paulinho abriu o Centro afro brasileiro Ylê Axé Oyá Lonangy. Depois de atender por
muitos anos em sua residência, no bairro Vila Nova, inaugurou seu novo salão, em agosto de
2015, no bairro da Sant’Ana. Pai Lonan saiu de Viçosa muito cedo para o município de
Arapiraca aonde aprimorou seus conhecimentos sobre a Umbanda. Ainda no ano de 2002, José
Édson dos Santos, 44 anos, conhecido por Pai Balaio ou Padrinho Édi, abriu o Centro Espírita
São João Batista na Rua Silvestre de Goiânia. No ano de 2006, o jovem Cícero Bernardo, 34
anos, conhecido popularmente por Pai Cicinho, filho de santo da Mãe do Carmo, abriu o
Centro Espírita Senhor Ogum no atual Conjunto Residencial Sant’Ana – vizinho da Mãe Val e
69
da Mãe Antônia. Percebe-se, de modo geral, um desenvolvimento histórico dinâmico e
agregador.
3.6 Terreiros de Umbanda inseridos no município de Viçosa, Zona da Mata alagoana56
A partir dos dados da pesquisa de campo, têm-se então, terreiros e filhos/as de santo
que contrariam qualquer dado estatístico oficial. Para facilitar o entendimento do
funcionamento dos terreiros de Umbanda em Viçosa foi preciso sistematizar da seguinte forma:
(a) terreiros que funcionam apenas com “Mesa Branca” ou “sessão” atendendo regularmente
sua clientela, mas sem cerimônia pública; (b) terreiros que realizam atividades apenas uma ou
duas vezes durante o ano; (c) terreiros publicamente desativados, mas que vez por outra, o
representante atende ao consulente que dele precisar; (d) Babalorixás ou Yalorixás com
registro na Federação, mas que não possui seu próprio terreiro e, (e) terreiros funcionando
regularmente com atividades quinzenais e mensais. Em suma, tem-se o seguinte quadro atual
de funcionamento da Umbanda viçosense.
Os terreiros funcionando regularmente com atividades públicas quinzenais e mensais
somam treze: CENTRO AFRO BRASILEIRO SÃO JORGE–Mãe de santo: Ana Maria Nunes
dos Santos; CENTRO ESPÍRITA SÃO COSME E SÃO DAMIÃO–Mãe de Santo: Maria do
Carmo Sercundes da Silva (Popular Do Carmo); CENTRO ESPÍRITA DE OXUM MENINA–
Pai de santo: José de Oliveira Costa (Popular: Barnabé); CENTRO ESPÍRITA SÃO JOÃO
BATISTA–Pai de Santo: José Édson dos Santos (Popular: Balaio); CENTRO AFRO
BRASILEIRO SÃO JORGE–Mãe de santo: Antônia Vieira de Araújo; CENTRO AFRO
BRASILEIRO SENHOR DO BOMFIM DA BAHIA–Mãe de santo: Maria Nazaré dos Santos
Silva; CENTRO AFRO BRASILEIRO SÃO JERÔNIMO–Pai de santo: Cosme Alves;
CENTRO AFRO BRASILEIRO SÃO JORGE–Pai de santo: José Cícero de Lima (Popular:
Seu Cicinho Fava Pura); CENTRO AFRO BRASILEIRO ILÊ AXÉ DE OIÁ–Mãe de Santo:
Edivaldo dos Santos (Popular: Tamires); CENTRO ESPÍRITA SÃO JORGE–Pai de santo:
Inaldo José da Silva (Popular: Zé); CENTRO ESPÍRITA PRETO VELHO–Pai de santo:
Emídio Correia da Paz; CENTRO ILÊ AXÉ OIÁ UNIRA–Pai de santo: José Aldo e o
CENTRO AFRO BRASILEIRO YLÊ AXÉ OYÁ LONANGY–Pai de santo: José Cícero da
Silva (Popular: Lonan).
56
(GOMES, 2012). Informações colhidas em pesquisa de campo realizada durante os anos de 2009, 2010, 2013 e
2014 no município de Viçosa e nas Federações umbandistas do Estado: Federação Zeladora das Religiões
Tradicionais Afro-Brasileiras em Alagoas – Presidente Paulo José da Silva; Federação dos Cultos AfroUmbandista de Alagoas – Presidente José Benedito Maciel. Última atualização em dezembro de 2015.
70
Os terreiros funcionando apenas com “Mesa Branca” somam quatro: CENTRO AFRO
ABAÇAR NOSSA SENHORA DO CARMO –Pai de Santo: Sebastião Teixeira de Freitas
(Popular: Bastinho); CENTRO ESPÍRITA UMBANDISTA NOSSA SENHORA DA GUIA –
Mãe de santo: Josefa Etelvina da Silva (Popular: Nêna); CENTRO AFRO BRASILEIRO
PALÁCIO DE OXUM –Mãe de santo: Carlos Alberto Vieira dos Santos (Popular: Carlinha) e
CENTRO ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO –Mãe de santo: Maria de
Lourdes dos Santos Correia (Popular: Nênem). Sete terreiros estão desativados publicamente, o
CENTRO ESPÍRITA CABOCLO DE ORUBÁ –Mãe de santo: Aliete Deolinda da Silva
Santos (Popular: Liete); CENTRO ESPÍRITA PALÁCIO DE OXUM –Pai de santo: Paulo
César Barbosa; CENTRO ESPÍRITA PALÁCIO DE OGUM –Pai de Santo: Rosalvo Ferreira
dos Reis; SALÃO PALÁCIO DA OXUM MENINA –Mãe de santo: Sebastiana Maria da Silva
(falecida); CENTRO AFRO BRASILEIRO SÃO SEBASTIÃO –Mãe de santo: Carlinda Nair
dos Santos Silva; CENTRO AFRO BRASILEIRO COSME E DAMIÃO –Mãe de Santo:
Valderez Pereira da Silva (Popular: Val) e o CENTRO ESPÍRITA YLÊ AXÉ SÃO JOÃO
BATISTA –Mãe de santo: Maria José Gomes da Silva (Popular: Guegué).
Existem também os terreiros com celebração esporádica como o CENTRO AFRO DE
UMBANDA NOSSA SENHORA DA GUIA –Mãe de Santo: Marileide Batista (Popular:
Neguinha); CENTRO ESPÍRITA PALÁCIO DE OGUM –Mãe de santo: Maria Goreti da
Conceição. (Popular: Goreti); CENTRO ESPÍRITA SENHOR OGUM –Pai de Santo: Cícero
Bernardo da Silva (Popular: Cicinho); CENTRO AFRO YLÊ AXÉ DE OGUM –Mãe de santo:
Rosário de Fátima Barbosa; CENTRO AFRO BRASILEIRO OGUM BEIRA MAR –Pai de
santo: Edivaldo dos Santos (Popular: Prof. Dal) e o CENTRO AFRO ALAGOANO SENHOR
DO BOMFIM –Mãe de Santo: Marlene Alves da Silva. Por fim, tem-se três terreiros ainda em
construção, o CASA DE ORAÇÃO PALÁCIO DE OXÓSSI–Pai de santo: Marcos Antonio
Argemiro da Silva. (Popular: Marquinhos); CENTRO ESPÍRITA UMBANDISTA SÃO
GERÔNIMO–Pai de santo: Klédson Pauliny Rodrigues dos Santos (Popular: Klêy) e o
“TERREIRO DO PAI TIQUINHO”–Pai de santo: Édson. (Popular: “Tiquinho”).
A dinâmica da religião, conforme abordado, ficou explícita no decorrer da pesquisa. Os
terreiros em Viçosa, ora mudam de endereço, ora suspendem suas atividades públicas, ora
realizam rituais esporádicos, ora funcionam regularmente. Em suma, são terreiros instalados,
na maioria dos casos, nas próprias residências de suas lideranças. Parte da liderança é oriunda
de outros terreiros viçosenses. Outros se iniciaram em cidades vizinhas e na capital Maceió.
Outra parte atende nos terreiros dos seus antigos líderes. Apesar da relação de independência
71
existente entre eles, foi possível registrar alguns Pais e Mães de santo colaborando com as
festividades em outros terreiros.
Os reflexos do processo de ressignifiações de Exu ao longo da história, bem como a
herança do chamado “sincretismo afro”, foram percebidos no campo de pesquisa. No contexto
de Viçosa, de acordo com os interlocutores, era bastante comum principalmente há cerca de
quarenta anos, a liderança dos terreiros participar de missas, novenários, procissões,
festividades religiosas na cidade e na zona rural e viajar em romaria para o Juazeiro do Norte,
no Estado do Ceará e Santa Quitéria, no vizinho Estado de Pernambuco. O Pai Cosme afirmou
ter viajado cerca de trinta vezes ao Juazeiro do Norte, no Estado do Ceará, para pagar
promessas. A Mãe Nazaré casou na Igreja Católica em 1980 onde batizou o seu filho, Marcos.
O Pai Emídio lembrou os tempos de “amizade” com o Padre Severiano Pires Jatobá (19581985). No interior de todos os terreiros ainda existem imagens de santos católicos, da virgem
Maria, do Coração de Jesus e dos santos populares como Padre Cícero e Frei Damião. As rezas
como o “Pai Nosso”, “Ave Maria” e o “Creio em Deus Pai”, também são frequentes no interior
dos terreiros.
Para os umbandistas viçosenses, a Igreja Católica merece respeito e admiração. Pai
Cosme chegou a afirmar: “não deixei de ser católico não. É a religião que veio primeira
aqui”. A maioria dos Pais e Mães de santo em Viçosa se autodeclara católicos romanos. Esta é
uma realidade encontrada\na pesquisa de campo. Outra parte se autodeclara católica e
umbandista ao mesmo tempo. Outros se autodeclaram espíritas ou xangozeiros. No interior dos
terreiros é comum encontrar altares com os santos católicos ocupando os mesmos espaços
sagrados dos Orixás – não nos altares dos Exus e Pombagiras. Quadros de Nossa Senhora,
Menino Jesus, São José, São Sebastião, São Jorge, Cosme e Damião, Padre Cícero e Frei
Damião, só para citar alguns, estão visíveis nas paredes dos terreiros assim como a imagem da
cruz ou um crucifixo. Nas cerimônias dos Orixás é comum rezar a Ave Maria e o Pai Nosso. Já
nas cerimônias dos Exus as expressões: “Quem é maior do que Deus?” Aí todos respondem
em uníssono: “ninguém”, é muito comum. Outra expressão: “O Grande” para se referir a
Deus Pai, também foi muito encontrada nas celebrações. A cruz está acompanhada da
quartinha de água, cachimbo dos Pretos Velhos, pólvora, velas, flores e terços no peji. Tudo
isso representa o ajuntamento de crenças e costumes de outras tradições religiosas regadas pelo
mistério da magia dentro do processo sincrético do século passado à atualidade e contribuiu
para entender a ligação que se faz entre a imagem de Exu e a parte diabólica dos cristãos.
72
3.7 A Umbanda atual (2010 a 2015)
Conforme visto até aqui, essas décadas geraram líderes umbandistas aprimorados e
fortalecidos pelos ensinamentos da Umbanda presentes em outros municípios alagoanos como
Arapiraca, Atalaia, São Miguel dos Campos, Chã Preta, Cajueiro e Maceió, bem como em
Estados como São Paulo, Bahia e Pernambuco. Desse modo, caminha-se para uma religião que
agrega diferentes gerações de praticantes que vão além da Zona da Mata alagoana. Nos últimos
quinze anos a dinâmica afro-alagoana com seu universo mítico multifacetado continuou
gerando novas lideranças e novos espaços de culto no município de Viçosa. Nos anos de 20142015, tem-se o seguinte: a) ano 2014, um terreiro aberto, Pai de santo iniciado na Umbanda
viçosense abre seu terreiro no município vizinho de Chã Preta, o Pai Cosme resolve abrir um
terreiro no município vizinho de Cajueiro; b) ano 2015, um terreiro inaugurado na periferia da
cidade e c) três terreiros viçosenses estão em andamento para serem abertos no final do ano de
2016.
O senhor José Cícero de Lima, 64 anos, foi fiscal da Federação dos Cultos AfroUmbandista de Alagoas durante a década de 1990. Iniciou-se na Umbanda aos treze anos de
idade no terreiro do Pai Gonçalo, zona rural de Viçosa na Fazenda Bicho Preto (anos 19701980). Também frequentou os terreiros do Pai Pedro Ribeiro, Pai Eriberto e, mais
recentemente, o do Pai Balaio. No ano de 2010, José Cícero de Lima – o Pai Cicinho – abriu
seu próprio terreiro. Pai Balaio se encarregou de todo o processo de sua formação. Pai Cicinho
ou como é conhecido em Viçosa, seu “Fava Pura”, abriu o Centro Afro Brasileiro São Jorge, na
zona rural da Grota Funda, depois da região da Sant’Ana. Apesar da sua idade e da sua
experiência na religião, considerar-se-á aqui como uma liderança nova/atual, aquela que
compõe a nova geração de umbandistas viçosenses. Entende-se que o Pai Cicinho (Pai de santo
há apenas cinco anos), significaria para a história da Umbanda em Viçosa um remanescente da
cultura religiosa afro-alagoana nesta região, “dedicado aos seus guias espirituais”, conforme
ele se expressa.
Ainda no ano de 2010, passou a funcionar também nas proximidades do Mutirão, na
Área 6, o Centro afro-brasileiro Ogum Beira Mar. Ali se realizou uma festa para os Pretos
Velhos, nos dias 17 e 18 de maio de 2014, cujo registro não foi permitido pela sua liderança.
Outro jovem que está se preparando desde o ano de 2012 para abrir seu próprio terreiro,
segundo informações de vários umbandistas, inclusive do Pai Lonan, é o Pai Tiquinho. Ele
adquiriu um terreno nas proximidades da Fazenda Marambaia para construir seu terreiro até o
final do ano de 2016.Outro exemplo está em dois terreiros existentes na Estrada Nova (região
73
periférica de Viçosa): o Centro espírita N.Sª da Conceição, da Mãe Lourdes, Mãe de santo há
20 anos, conhecida popularmente por Nênem e o Centro Espírita São Jorge, do Pai Inaldo, Pai
de santo há 18 anos, conhecido por Pai Zé. Esses dois terreiros se estabeleceram em Viçosa no
ano de 2013. Pai Zé e Mãe Nênem vieram do município de Anadia, 51 km de Viçosa. Pai Zé
veio por influência da Mãe Nênem – sua vizinha em Anadia – e construiu sua casa de taipa
onde funciona seu terreiro desde agosto de 2013. Mãe Nênem chegou em junho do mesmo ano
motivando seu amigo de crença a vir morar ali.
Ainda é possível citar mais quatro exemplos atuais da Umbanda em Viçosa. O jovem
Klédson Pauliny, foi admitido como Babalorixá em 08 de agosto de 2006, conforme consta no
cadastro, na Federação dos Cultos Afro-umbandista de Alagoas. Mas o Centro espírita
umbandista São Jerônimo ainda está em processo de construção com previsão de abertura em
2016. Atualmente, segundo informações dos umbandistas, Pai Klédson está trabalhando no
município de Cajueiro. Outro exemplo é o jovem Marcos Antonio Argemiro da Silva 57
(Marquinhos), 36 anos, filho de santo da Mãe Nazaré. Ele faz parte da Umbanda há 22 anos.
Comprou uma casa no Mutirão, Área 3, onde atende sua clientela discretamente desde o ano de
2013. Seu terreiro, a Casa de Oração Palácio de Oxóssi, será aberto publicamente no ano 2016.
No ano de 2014, o jovem Marciano Bezerra dos Santos, 29 anos, juntamente com suas
duas tias e um primo – filhos de santo do conhecido Pai Cosme – resolveram realizar desde
janeiro do mesmo ano, o ritual de “Mesa Branca” no Conjunto NSª da Conceição, periferia do
município vizinho de Chã Preta/AL, cerca de 16 km de Viçosa. A inauguração do terreiro do
Pai Marciano aconteceu em 30 de agosto do mesmo ano. Segundo ele, o Centro afro Ilê de
Xangô foi registrado na FRETAB e está funcionando regularmente aos finais de semana
atendendo aos chãpretenses. A família do Pai Marciano faz parte da Umbanda há mais de
quarenta anos, se iniciando no terreiro do Pai José Leobino que funcionou no município de Chã
Preta entre as décadas de 1970 e 1990.Pai Cosme afirmou que deu-lhe todo apoio necessário,
inclusive, lhes encaminhando à Federação, em Maceió, a fim de regularizar seu terreiro
naquele município. Em julho de 2014, o Pai Cosme iniciou os trabalhos de Umbanda na zona
rural de Cajueiro/AL, na divisa com o município de Capela/AL. O Centro Afro brasileiro São
Jerônimo criou uma extensão (“filial”) de suas atividades para atender a população daquela
localidade. No final do ano de 2014, foi aberto mais um terreiro, o Centro Ilê Axé Oiá Unira,
do Pai José Aldo, que após passar por Maceió, Arapiraca, Cajueiro e Palmeira dos Índios, se
57
Este filho/Pai de santo trouxe uma grande contribuição para o andamento desta pesquisa. Se disponibilizando
para acompanhar a realização das entrevistas nos terreiros e nas residências dos filhos de santo, recebendo em sua
residência gentilmente esta pesquisa. Agradecimentos sinceros a este filho/Pai de santo dedicado e atencioso.
74
estabeleceu no Conjunto Pe. Cícero, na saída da cidade, em direção ao município de Chã Preta.
Conforme visto, em 2015, Pai Lonan ampliou o espaço físico do seu terreiro, realizando dois
dias de muita celebração. O pesquisador foi convidado para se fazer presente, mas por força
maior, não foi possível registrar este momento tão significativo na história religiosa de Viçosa.
A cada ano surgem novos filhos e filhas de santo, Pais e Mães de santo e novos
terreiros. Assim, se desenvolve gradativamente ao longo de décadas. O culto é de um elemento
agregador, marcado pela diversidade de rituais e práticas que se entrelaçam desde seus
primórdios no seu desenrolar histórico. Em pleno século XXI, a Umbanda continua a gerar
novos líderes e adeptos em Viçosa e em municípios vizinhos. Isto significa dizer que Viçosa,
talvez seja uma das “moradas” da afro-alagoanidade, apesar das estatísticas oficiais mostrarem
o contrário.
O presente capítulo buscou apresentar a partir de dados orais os primórdios,
desenvolvimento e processo de organização de culto da Umbanda no município de Viçosa,
interior alagoano. As gerações de umbandistas viçosenses constituem-se um processo dinâmico
num campo religioso bastante diversificado. Em suma, trata-se de uma religião inexistente nas
estatísticas oficiais, pobre, negra, periférica, de uma grandeza cultural, lúdica, rica em símbolos
mágico-religiosos, de resistência no tempo e espaço. São terreiros, lideranças, filhos e filhas de
santo envolvidos e ativos na relação com esse cosmo religioso renascente, sempre dos braços e
mentes de um povo viçosense excluído e esquecido historicamente pela sociedade hegemônica
e religião aceita pela maioria.
75
4
RECOMPOSIÇÃO HISTORIOGRÁFICA SOBRE EXUS E POMBAGIRAS NA
UMBANDA
Tudo o que se une, se multiplica, se separa, se transforma,
tudo isso é Exu. Exu é a vida, com todas as suas
contradições e sínteses (AUGRAS, 2008, p. 104).
O objetivo deste capítulo é mostrar os desdobramentos da imagem de Exu na
cosmologia religiosa umbandista com o intuito de apresentar panoramicamente uma revisão
bibliográfica sobre o culto aos Exus e Pombagiras e seu processo sincrético, bem como suas
ressignificações ou mudanças ocorridas no itinerário afro-brasileiro com ênfase no século XX.
Em Canevacci, tem-se o que ele chamou de “antropologia da mudança”, a qual embala uma
ordem tradicional existente, para em seguida, recolocá-la em um ambiente diferente com outra
ordem. Aqui estão os contrastes desses novos itinerários religiosos: catolicismo popular,
espiritismo, práticas indígenas e manifestações de matriz africana(CANEVACCI, 1996. p. 35).
Por isso, esse processo sincrético não pode ser visto de maneira simplista. Canevacci diz que o
território brasileiro foi bastante favorável ao fenômeno do sincretismo religioso, mitos, ritos,
divindades, cosmogonias e filosofias de origem africana adaptaram-se às formas católicas com
o intuito de se tornarem aceitáveis na sociedade, dirigindo-se para acultura e a comunicação
com aquela realidade trivial (CANEVACCI, 1996. p. 20-22).
Trindade (1985) e Capone (2004) interpretam Exu como sendo uma “adaptação a uma
nova realidade” que o aguardava em terras brasileiras. Em um contexto urbano e industrial
particularmente difícil nas metrópoles do Sudeste do país na primeira metade do século XX, o
Exu transforma-se para se adaptar às circunstancias e, assim, reorganizar o campo afrobrasileiro. Uma forma de adaptação à realidade social das grandes metrópoles (Rio de Janeiro e
São Paulo). Mediações e soluções simbólicas foram precisos para a estruturação do seu campo
religioso. Ou seja, na análise de Ortiz não se encontra mais na presença de um sincretismo
afro-brasileiro, mas numa síntese de brasilidade da Umbanda, no seu caráter nacional. Seria
uma religião endógena, cuja origem não se pode determinar, mas que seu desenvolvimento ou
afloramento deu-se em meio às mudanças socioeconômicas ocorridas a partir dos anos 1930,
em plena Era Vargas. Irá persistir a imagem de Diabo, divindade travessa, difícil, que faz a
ligação entre o sagrado e o profano cujo altar fica separado por uma cortina dos outros cultos.
(ORTIZ, 1975. p. 89-97).
76
Inicialmente já se percebe na visão desses autores uma “adaptação” ou “transformação”
desses Espíritos/Entidades ligada à configuração social brasileira demarcando o território
sagrado da Umbanda. Será preciso recorrer à história ou voltar às origens para assim sintetizar
a temática buscando seu desenvolvimento histórico passando pelo Brasil até chegar ao campo
de pesquisa no capítulo posterior.
4.1 Projeções e identificações de Exu
Foram nos séculos XII e XIII que as ideias de Diabo receberam uma uniformização e
sistematização dogmática no Cristianismo. O século XIII é de suma importância para a
construção da história do Diabo. Neste período o Diabo tornou-se mais “respeitado e
poderoso”. Até o século XIV, o medo do Mal encaminhou a Europa ocidental para uma onda
de pânico generalizado. A grande crise do feudalismo provocou nas consciências a atribuição
aos demônios por todos os sofrimentos da coletividade. Neste contexto, o reino do Diabo
ascende em oposição à cidade de Deus. Com essa herança dogmática, a colônia portuguesa
nascia assim, sob o “signo do Demo” e das projeções do mal do pensamento
ocidental(NOGUEIRA, 2002, p. 50-61).
O Brasil passou não só a ser um prolongamento modificado do imaginário europeu, mas
um prolongamento da Metrópole conforme avançava o processo colonizatório. No dizer de
Souza, “o bom e o ruim, o Céu e o inferno que acabavam se harmonizando na Europa – na
metrópole – podiam, aqui – colônia – mais do que em nenhum lugar, tender à polarização”
(SOUZA, 1986, p. 26-31). Ou seja, tudo o que lá existia, existia também aqui, mas de forma
específica. Esse imaginário demonológico, muito forte a partir do século XIV, ancorava-se
numa série de fatos ocorridos em diferentes datas. Para Nogueira,
a crise geral do feudalismo e os seus desdobramentos: a peste negra, que em
1348 atinge a Europa de modo devastador, as revoltas urbanas e camponesas
que explodem de país em país, a interminável Guerra dos Cem Anos, o
ameaçador avanço turco após as derrotas de Kossovo (1389) e Nicópolis
(1396), o Grande Cisma – o escândalo dos escândalos –, as cruzadas contra os
hussitas, a decadência moral do Papado e a Reforma Protestante, com todas as
suas consequências, levam os homens atingidos por uma série interminável de
tragédias e calamidades a buscar os porquês desse sofrimento monstruoso
(NOGUEIRA, 2002, p. 83).
Precisava-se de uma resposta para essas calamidades: o Diabo era o culpado por tudo.
Para aquele contexto, a intervenção diabólica era um fato concreto. A “Pedagogia do Medo”
consolidara-se no discurso teológico com a implementação da sua demonologia muito
77
conhecida no século XIV. O Demônio associado ao medo estava presente na mentalidade
popular no início da Modernidade na Europa. Segundo Nogueira, o Renascimento herdou
muito bem esse imaginário. O Mal dominava as consciências e, posteriormente, a tripulação
que partia para o Novo Mundo. História do Diabo e do Cristianismo confundem-se. As
caravelas que por aqui atracaram eram consideradas de Deus, pois nelas vinham soldados e
missionários imbuídos da missão evangelizadora de levar os “incultos” e “bárbaros” ao lume
da fé católica.
No que se refere à utilização do termo Exu como sinônimo de Diabo, foi resultado de
um “círculo vicioso hermenêutico” desenvolvido com a chegada do cristianismo à África no
século XVI. Na cultura irorubá, Exu é o patrono da cópula, responsável pela sexualidade. É
aquele que rege a atividade sexual, garante a eternidade do humano. Tais aspectos foram vistos
pelos olhares ocidentais como partes de uma entidade “sexualizada” e, por isso mesmo,
demoníaca. (SILVA, 2013, p. 1088). Outro registro foi acerca dos sacrifícios oferecidos ao Exu
como animais e aguardente, tido como protetor do lar, cuja estátua de Elegbá feita de barro em
forma humana era posta nas entradas das casas(VERGER, 2000; PRANDI, 2001. p. 47-52).
Verger ao escrever sobre os cultos aos deuses da África permite visualizar que:
relatos de viagens empreendidos aos litorais vizinhos dessas regiões [Golfo
do Benin, Sudoeste da Nigéria, Sudeste do Daomé – República do Benin]
foram feitos pelos primeiros navegantes já a partir do século XV. Os
conceitos sobre as religiões africanas basearam-se em suas observações e as
divindades dos negros foram trazidas com o nome de ‘fetiche’, que tem sua
origem na palavra feitiço(VERGER, 2000. p. 35-36).
A imagem de Exu na cultura fon é representada por uma estátua de terra à semelhança
de uma figura humana agachada com um pênis ereto avantajado desproporcional ao seu corpo,
que chamava a atenção dos inúmeros viajantes antigos que passaram a atribuir-lhe o caráter do
deus da fecundidade e da copulação, conforme abordado acima. Segundo Verger, o pênis ereto
do Èsù representava o caráter de Exu como um ser truculento, violento, desavergonhado e
deturpador da moral e dos bons costumes, que para ele, as estatuetas esculpidas em Abomé,
República do Benin – África Ocidental – apresentavam um espírito mais humorístico do que
religioso(VERGER, 2000. p. 119-127). Ao descrever o que disseram os diversos observadores
de Exu nas culturas fon e iorubá a partir do século XV, Verger expõe os diversos recortes dos
escritos desses observadores estrangeiros e brasileiros, nos quais ficam explícitas algumas
imagens de Exu que foram construídas no imaginário religioso do Brasil. Dentre as descrições,
destacam-se: “espírito do mal, espírito imundo, satã, Diabo, deus da desordem, chefe da cólera,
78
causador de todas as doenças e acidentes, chefe da feitiçaria e deus erótico”. Todos os esforços
aventados principalmente pelos missionários católicos, em atribuir a Exu um caráter
demoníaco e erótico (VERGER, 2000. p. 133-140).
A conquista de território por parte dos portugueses era justificada com base na religião.
Era a ideia de um “reino de Deus por Portugal”. Os índios foram interpretados pelas missões
jesuíticas como “povo do Diabo”, como aqueles que “não conheciam a Deus”, “adoradores do
Diabo”. Os Pajés, por exemplo, eram vistos como “pessoas de má vida”, como “aqueles que
induziam ao mal”. Constatados os hábitos cotidianos no “Novo Mundo”, a demonização do
índio expandiu-se para o escravo. Assim, a “humanidade inviável”, “animalesca” e
“demoníaca” no Brasil colonial precisava ser combatida e homogeneizada na fé cristã, tarefa
que cabia ao Santo Ofício. A expansão ultramarina trouxe o imaginário europeu dos monstros e
seus demônios ao mundo colonial. Isto significa dizer que tudo era associado à religião cristã e
interpretado à luz dos dogmas da igreja (SOUZA, 1986, p. 32-35; 70-71). O forte teor
salvacionista e apocalíptico já havia aparecido na carta de Pero Vaz de Caminha no ano de
1548.
A povoação dos demônios no mundo ocorreu no início dos tempos modernos. A
América Portuguesa como “reino do demo” já havia sido identificada no século XVI. Foi vista
como “esta porção imatura da Terra”, o reino do demônio. Desde meados do século XVI, o
tráfico de escravos no Brasil de negros sudaneses, trazendo em seu arcabouço cultural e
religioso aspectos peculiares de suas tradições, de seus costumes, sobretudo iorubás, praticados
no contexto baiano por séculos, influenciaria sobremaneira a cultura brasileira. Vê-se que a
construção do patrimônio mágico-religioso no Brasil deve-se muito à presença do negro na
formação
social
do
país,
cujas
dimensões
sagradas/profanas,
materiais/simbólicas,
social/familiar contribuíram para sua identidade nacional. Desde os seus primórdios, a terra que
viria a ser brasileira recebeu toda a carga do imaginário europeu acerca do Diabo. Imagem
muito em destaque pelo menos desde o século XI. No século XVI e início do século XVII, a
demonologia era questão central dos teólogos, pois se especulava qual era o número de
demônios existente. (NOGUEIRA, 2002, p. 71; 74-75; 92-103). O Reino do Diabo no final da
Idade Média aparecia como uma monarquia organizada e presidida por Satã.
Segundo Souza, durante o século XVII, “a concepção mágica do mundo atravessava as
classes sociais, comum ao ‘gentil-homem’ e ao burguês, aos homens das aldeias e ao dos
campos [...]. Traços católicos, negros, indígenas e judaicos misturam-se pois na colônia...”
(SOUZA, 1986, p. 89; 97). Conforme Souza, o apogeu da ciência demonológica deu-se por
79
volta de 1600. Segundo ela, foi no início da Época Moderna e não na Idade Média, que o
inferno e suas legiões de demônios tomaram de vez conta do imaginário ocidental. O contexto
colonial que assumia frequentemente as feições de inferno e de domínio do Demo, tudo
contribuiu para demonizar o cotidiano e reforçar tal ideia. Tudo estava impregnado de
demônios (SOUZA, 1986, p. 139; 143; 145). Vale ressaltar que:
os portugueses chegaram ao Brasil num momento em que a presença de Satã
entre os homens era especialmente marcante. Monstros, animais, seres
diabólicos, os colonos foram também feiticeiros, as formulações se sucedendo
e se desdobrando no imaginário europeu. Índios da América, negros da África
e brancos da Europa se combinaram mais uma vez para engendrar práticas
mágicas e de feitiçaria extremamente complexos e originais (SOUZA, 1986,
p. 153).
Desse modo, tudo leva a compreender que houve projeções e identificações com
personagens dessas diversas culturas entrelaçadas e desenvolvidas em solo brasileiro ao longo
dos séculos. A crença de que o Diabo estava sempre presente em toda parte, era bastante
explícita. O olhar dos europeus em relação aos habitantes das Américas veio permeado por esta
visão de “demonização do outro”. O contato com a “caça às bruxas” nos países europeus foi
decisivo para a experiência com o Diabo nas novas terras. Só para se ter uma ideia, entre os
anos de 1486 e 1669 as publicações ou manuais de “caça às bruxas” dominaram de modo
global o imaginário ocidental. Suas publicações foram reeditadas dezenas de vezes
(NOGUEIRA, 2002, p. 98). O Diabo europeu, ocidental e cristão, acabou sendo reelaborado na
cultura brasileira, desta vez, com os elementos do negro e do indígena. Conforme Câmara
Cascudo, o Diabo branco português acabou sendo identificado com personagens da cultura
africana e indígena. De um lado, a Caipora dos indígenas – espírito das matas – do outro, o Exu
dos africanos – mensageiro dos Orixás. Para os indígenas, uma das principais características da
Caipora era a rebeldia. Para os africanos, o que caracterizava Exu era seu caráter ambíguo,
trapaceiro. Isto contribuiu para que o Diabo triunfasse na cultura brasileira legitimada pelo
discurso do colonizador. Exu não escaparia dessa experiência(CÂMARA CASCUDO 2002, p.
353; 379-380).
Antes da organização da Umbanda no início do século XX, os Exus masculinos e
femininos já eram cultuados nos antigos Candomblés da Bahia e do Rio de Janeiro em meados
do século XIX. Ao pesquisar sobre as religiões dos Orixás no século XIX nos terreiros de
Candomblé da Bahia, o médico Nina Rodrigues descreve que à divindade “Elegbá pertence
mais particularmente os prazeres sensuais, a luxúria [...] Elegbá, Elegbará ou Echú é uma
divindade fálica que entre os nossos Negros, graças ao ensino católico, está quase de todo
80
identificado com o Diabo [...]”(RODRIGUES, 2010, p. 247; 254).Segundo ele, essa foi a
concepção religiosa difundida na cultura brasileira. Conforme Nina Rodrigues, o Esú, Bará ou
o Elegbará era “confundido” por parte dos africo-bahianos com o Diabo. Segundo ele, apesar
de ser um orisá ou “santo” apresenta dualismo entre os negros, pois Esú não passaria de uma
“divindade má ou pouco benevolente”, trata-se de um “espírito do mal” (RODRIGUES, 1935,
p. 40; 77). Estaria aqui, o caráter trickster dessa divindade.
Embora exista a linha tênue entre o bem e o mal na passagem da África para o
Candomblé no Brasil, ela refere-se apenas à dimensão ritual, às práticas religiosas e não ao
panteão propriamente dito. Segundo Ortiz, os dois compartimentos divisórios desse mundo
religioso (bem e mal), especializam-se no universo sagrado da Umbanda que irá dividi-lo em
dois: domínio do bem (a Umbanda propriamente dita – direita) e núcleo do mal (a Quimbanda
– esquerda). Foi com a chegada de Exu ao Brasil que Ele acabou assumindo várias faces,
prevalecendo o aspecto demoníaco, dadas às condições objetivas do processo histórico de
dominação imposto pela Coroa portuguesa e a Igreja Católica. É o que mostraram as religiões
afro-brasileiras no seu processo de formação no Brasil, principalmente com a organização da
Umbanda (ORTIZ, 1991, p. 131-132).
O Exú-Leba da tradição gegê-yourubana acabou sendo identificado ao Diabo dos
cristãos no Brasil facilitado, sobretudo, pelo folclore cristão europeu mediterrâneo, envolto de
uma série de entidades malfazejas, espíritos maus e demônios como fruto de uma demonologia
medieval, escreve Ramos. Segundo ele,
....o negro africano encontrou essa demonologia preparada no Brasil. E os
seus orixás phallicos mais temidos identificaram-se com o Diabodos
catholicos. Exu dos yourubanos. Leba(Elegbara) dos gêges. Zumbi e
Cariapemba dos angola-congruenses (aliás, Zumbi e Cazumbi, mais
propriamente ‘espíritos maus’). Essa approximação ainda foi facilitada pela
série de entidades ameríndias malfazejas, já incorporadas ao nosso folk-lore:
Jurupary, Anhangá, Caipora, etc. A influência de Exú-Leba foi e é enorme no
Brasil. Não só pelo poder primitivo que, nos proto-cultos africanos se lhe
attribuia, como pela sua identificação com o Diabo catholico (RAMOS, 1935,
p. 24-25).
Os paradoxos no âmbito de Exu marcados pela sua imprevisibilidade, sexualidade
desenfreada e papel provocador, foram atenuados no Brasil nos grupos de cultos defensores da
tradição africana (os “ortodoxos” do Candomblé) – aquela velha história de “pureza de culto”
nas primeiras décadas do século XX – para que assim se adaptassem melhor naqueles valores
sociais vigentes. O culto de Exu se tornou no Brasil a marca característica do processo
sincrético, daqueles cultos bantos que perderam a fidelidade à África. Dessa forma, esses cultos
81
considerados mais “degenerados”, “degradados” em relação à tradição africana “pura” e
“verdadeira”, do deus da África ocidental, dos iorubás e dos fons, o deus Legbae Elegbará,
encontraram espaço na sociedade brasileira para existir, para se transformar e se transmutar em
novas formas.
Mesmo os nagôs, defensores da tradição no Brasil, acabaram descobrindo o caráter
“incontornável” dos Exus de Umbanda, dos Exus-Eguns, dos Exus-Pombagiras e sua
“adaptação” no interior da Umbanda. De notar que a fidelidade à “tradição” ou à “pureza
nagô”. Ou seja, o processo de reafricanização no Brasil presente na reinterpretação dos Exus e
das Pombagiras de Umbanda, implica na intelectualização, no contato com toda uma literatura
especializada que trata das tradições africanas e afro-brasileiras, nos cursos de línguas e cultura
iorubá no Brasil no intuito de buscar incessantemente os elementos do culto do Candomblé,
isto é, sua pureza africana. No dizer de Capone, africanizar-se significa, portanto,
intelectualizar-se (CAPONE, 2004, p. 33-48).
Para Silva (2013, p. 1107), “o Exu, devido ao seu caráter ambíguo, tem servido como
leimotiv para representar os dilemas da sociedade brasileira entre a incorporação dos valores
culturais da herança africana e a exclusão social dos negros”. Segundo Silva, Exu representa
“universos culturais” em contato. Exu ao desembarcar no Brasil foi logo assumindo faces por
diferentes “ferramentas mágicas” e discursos dos mais diversos. O próprio meio afro-brasileiro
com o intuito de se integrar nesse novo sistema social vigente, acabou entrando em
conformidade com a estrutura lógica de pensamento nas relações estruturais no Brasil.
Segundo Trindade, o contexto social brasileiro permeado pela exclusão e pobreza proporcionou
ao meio afro-brasileiro elaborar seus arquétipos abarcando aqueles valores socioculturais
rejeitados pela sociedade hegemônica e pela religião oficial. Esses Exus passaram a significar a
própria condição marginal de seus seguidores (TRINDADE, 1985, p. 81).
É evidente que, ao se ajustar à tradição cristã brasileira, o ritual de origem africana
faltou preencher o tradicional dualismo cristão, Céu-inferno, salvação-condenação, DeusDiabo, bem-mal e certo-errado à luz da fé. O “lado satânico” desse esquema se encaixou
perfeitamente nos rituais e no modo de pensar dos adeptos dessas religiões dos Orixás a partir
do início do século XIX e com o ressurgimento ou sistematização da Umbanda no início do
século XX. Enquanto os Orixás ou santos da Umbanda, como comumente são chamados,
assumiam o terreno do bem, representados nas imagens dos Pretos Velhos e Caboclos, os Exus,
agora pluralizados, assumiriam o papel de espíritos de condutas questionáveis, figuras do mal.
Ante o exposto, compreende-se que o Cristianismo se encarregou de demonizar as práticas
82
afro-brasileiras com o intuito de permear a ideologia cristã à moda ocidental elitista. Segundo
Sanchis, “A figura do Exu sofreu uma cristianização paradigmática, afastando-se da função
verdadeira do Exu nas tradições africanas que era de orixá intermediário entre os deuses e os
homens; um ambivalente, contaminado-se pelo Diabo católico” (SANCHIS, 1997, p. 106).
Duas dimensões ou significados de Exu podem ser inferidos na Umbanda: a primeira é
a de que Exu é o que resta de negro, de afro-brasileiro, do tradicional frente à sociedade
moderna e, a segunda, é a de que Exu se associa à morte tornando-a uma categoria à parte. Em
suma, Exu passaria a representar um “conflito de cor” –para melhor se integrar numa sociedade
de classes – e uma dimensão das trevas ou dos cemitérios. Os sistemas ritualísticos mudam. As
práticas africanas são transformadas. O pensamento religioso vai reinterpretar as práticas afrobrasileiras. Trata-se de um valor novo emergindo na sociedade brasileira. Uma religião
legitimadora e integradora dos valores dominantes na busca de um status que corresponda aos
valores dominantes da sociedade de outrora(ORTIZ, 1991, p. 134-137). A Umbanda acabou
pondo em xeque a linha de esquerda, sincretizando-a com as ideias do inferno e demônio
católicos. Para a Umbanda os Exus intervêm magicamente no mundo dos humanos para a
solução de todos os seus problemas por meio dos rituais praticados. Segundo Prandi, todo
mundo tem medo de Exu. Outro território da Umbanda que este autor chama de “difícil
demarcação” é o dos espíritos situados na chamada linha de “direita”, a exemplo dos ciganos,
marinheiros e baianos que se comportam como se fosses da linha de “esquerda” nos rituais. É o
que o autor chama de “Exus metamorfoseados”. É como se fosse uma espécie de disfarce pelo
qual os Exus passam a participar das giras ou sessões destinadas aos Caboclos e Pretos Velhos
e outras entidades julgadas da linha de “direita”. Sendo que os baianos são os que dão mais
trabalho, tendo em vista sua maior aproximação com a “linha de esquerda”, por seu
comportamento estereotipado de zombeteiro e de intimidade com as pessoas.
O discurso umbandista afirma trabalhar somente para o bem, mas na prática criou-se
um jogo de contradições no campo ético com a constituição de um universo paralelo, no qual
suas práticas mágicas não recebem nenhum tipo de restrição ética. “Inclusive aqueles ligados a
aspectos mais rejeitados da moralidade social, como a transgressão sexual, o banditismo, a
vingança,
e
diversificada
gama
de
comportamentos
ilícitos
ou
socialmente
indesejáveis”(PRANDI, 2001, p. 53). Esse foi o território da religião que a Umbanda passou a
chamar de Quimbanda e foi nesse universo quimbandeiro, que a Umbanda empurrou Exu e
Pombagira – espíritos que tudo podem, inclusive fazer o mal. Nesse universo paralelo, Exu é
transfigurado no Diabo fazendo todos os tipos de serviço mágico, inclusive o mal. Assim, o
83
contraponto está criado: direita e esquerda. A Quimbanda agora, ramificação da Umbanda,
passa a esconder Exu e suas legiões.
Os dois campos éticos “opostos”, na expressão de Lísias Negrão, significariam dizer
que a Umbanda acabou ficando “entre a cruz e a encruzilhada”. Está posta a oscilação da
Umbanda entre o polo cristão-ocidental e o polo afro-brasileiro. O conjunto das formas
combinatórias intermediárias entre esses dois polos forma o gradiente umbandista. As
conotações ideológicas construídas no cosmo religioso umbandista ancorando-se na
ambivalência histórica dos Exus relegaram esses espíritos ao lado negativo da religião, bem
como foram observados como objeto de desconfiança permanente, aceitos com certa
prudência, dividindo opiniões entre esses grupos religiosos, principalmente entre os intelectuais
umbandistas da segunda metade do século XX (NEGRÃO, 1996, p. 29; 145-164). No dizer de
Ortiz(1991, p. 140-141), foi criada uma espécie de “teatro demoníaco”. A existência dessas
duas polaridades se faz necessária uma vez que a Quimbanda serve para estabelecer o
equilíbrio entre a direita e a esquerda. A perspectiva de empurrar o Orixá mensageiro dos
deuses e dos humanos para o mal foi essencialmente cristã, sobretudo, católico-romana dada ao
processo sincrético já estabelecido, o qual renderia inúmeras discussões entre os próprios
umbandistas.
Tendo em vista a ampla popularização do culto a Exu, seus devotos e consulentes têm
apresentado um efeito banalizador e desmistificador da sua imagem de Diabo. Em muitos
terreiros os Exus são vistos como compadres, amigos e guias. Ou seja, como aqueles que
possuem uma relação mais estreita com os humanos, como quem conhece de perto seus dramas
cotidianos. Nesse contexto restrito, sua imagem continua sendo vista como contraditória e
problemática, cuja ligação com o mal é bem discreta, no entanto a consolidação da imagem de
Exu com o Diabo deu-se, especialmente, a partir do discurso das igrejas evangélicas, tornandoo o Diabo brasileiro por excelência. Este discurso ecoou na sociedade brasileira e no interior da
Umbanda nas últimas décadas. A Umbanda tentou expelir Exu do seu culto, ou torná-lo
batizado, doutrinado e submisso aos Pretos Velhos, para assim inseri-lo na estrutura social da
religião e da classe hegemônica.
A ambiguidade e o aspecto mágico-religioso desses Exus diante de uma estrutura lógica
construída fizeram com que os próprios umbandistas em particular, concebessem o Diabo dos
cristãos como uma entidade mágica, por sua vez, assemelhando-se aos seus Exus cultuados
como modelo de referência. Desse modo, foi preciso passar por vários processos de adaptações
sociais, culturais e religiosas na tentativa de legitimar e tornar reconhecido socialmente seu
84
culto e suas tradições. Exu se adapta ao palco do Brasil e acaba ganhando uma companheira, a
Pombagira.
4.2 A feminização de Exu: o culto a Pombagira e seus desdobramentos no Brasil
De antemão, entende-se que feitiçaria e prostituição sempre andaram juntas (SOUZA,
p. 336). As bruxas no Brasil Colônia também foram vistas muitas vezes pelos juízes e
inquisidores como “prostitutas” (SOUZA, 1986, p. 227-228). Ao ler panoramicamente sobre a
sexualidade feminina no Brasil, percebe-se a relação pessoal do corpo com o espírito,
significando o processo das relações pessoais numa sociedade extremamente individualista,
preconceituosa e, sobretudo, machista desde a época colonial (PRIORE, 2011, p. 28-29, 4344). Encontram-se mulheres que fugiam aos padrões morais estabelecidos pelo aparelho social,
religioso, estatal e judiciário (PINSKY, 2011, p. p. 181-186; 209; 213-214), pois diante de um
cenário extremante machista e, acima de tudo, repressor, depreende-se que as mulheres
poderiam assumir uma postura de liberdade sexual e ruptura com as normas vigentes. No
contexto da Colônia, principalmente nos séculos XVI-XVII, a mulher foi interpretada como
imagem do desregramento, pecado, luxúria e danação (ARAÚJO, 2011, p. 45-77; PRIORE,
1993, p. 188).
O discurso da misoginia e do androcentrismo sob a égide da teologia cristã, patentes na
historiografia da mulher brasileira, principalmente, na construção da sua sexualidade, ainda
hoje encontra ecos sociais (FREYRE, 2006, p. 186-189; 394-395; 436-437).A sexualidade
feminina ainda continua sendo vigiada e adestrada pela moral cristã ocidental. E isto penetrou
bastante no interior dos terreiros há décadas. A vulnerabilidade feminina aos demônios
disseminada pela medicina no Brasil dos séculos XVI a XVIII (PRIORE, 2011, 78-114)
contribuiu para ver o feminino como desclassificado e inferiorizado e, principalmente,
responsável pela transgressão dos valores hegemônicos do Estado e da religião que ainda
tendem a disciplinar a sociedade brasileira através da mídia.
Vale ressaltar que as relações sexuais e de família, a magia e a mítica pela maior
influência africana, constituem-se a organização social, moral e religiosa do povo brasileiro.
Aqui, três elementos foram juntados para formar o Brasil: o sexual, o religioso e o português
(FREYRE, 2006, p. 164-168). Mediante o exposto, alude-se que a história da sexualidade
feminina, bem como a imagem da mulher construída social, cultural e religiosamente no Brasil,
só revela uma cultura androcêntrica e explicitamente legitimadora dos padrões morais
socialmente aceitos pela classe hegemônica. Ao estudar a imagem da mulher no Brasil, torna-
85
se possível perceber os traços culturais, sociais, religiosos, políticos e econômicos na formação
e atual configuração social e cultural do feminino no Brasil (SILVA, 2015, p. 78-82). Desse
modo, a sexualidade e religiosidade estão entrelaçadas na história das mulheres. Conforme
visto, o que existe são conotações ideológicas construídas sob uma base moral imbuídas na
cultura religiosa brasileira.
Isto poderá contextualizar e ajudar na compreensão da personagem Pombagira em seus
desdobramentos na cosmologia religiosa umbandista. Elbein dos Santos identificou em sua
pesquisa no sistema de crença Nàgô, o Èsú profundamente associado à atividade sexual. Para a
autora,
o falo e todas as suas formas transferidas, tais como seu gorro tradicional com
sua longa ponta caída, os vários estilos de penteados, em forma de crista, de
longas tranças ou rabos de cavalo caindo pelas costas, seu Ogo ou maço, sua
lança [...], são símbolos de atividade sexual e de reprodução [...]. As
numerosas cabacinhas, representação deslocada dos testículos, sublinham
ainda mais claramente sua preocupação com a atividade sexual (ELBEIN
DOS SANTOS, 2012, p. 184).
Elbein dos Santos (2012) dedica dois capítulos a análise de Èsú reconhecendo sua
complexidade, dinâmica e riqueza de símbolos na ação ritual no sistema Nàgô como totalidade.
Segundo ela, Èsú está relacionado aos ancestrais masculinos e femininos com suas
representações coletivas e múltiplas variedades, mas de natureza e origem únicas. O útero
mítico fecundado também está associado à imagem de Èsú (ELBEIN DOS SANTOS, 2012, p.
140-228).
Monique Augras diz que não se dispõe de dados históricos que permitam, com
exatidão, o aparecimento do fenômeno Pombagira, mas apenas aproximações. Uma dessas
aproximações, segundo ela, está no mito da Bombojira, equivalente ao mito iorubá congo do
Exu, deus fálico, mediador em divindade feminina, representação de feminilidade, o que
resultou num processo de dissimilação que no primeiro momento recebeu o nome de
Bombojira. Depois nas primeiras décadas do século XX, foi chamada de Pombagira, ou seja, a
imagem feminina de Exu, mito ligado à sexualidade dentro das religiões africanas(AUGRAS,
2000, p. 30-35).Na tradição do Candomblé angola (banto), Exu é Bongbogirá. Tudo leva a
compreender que no desenvolvimento da Umbanda, o culto a esta entidade foi sistematizado
recebendo qualidades femininas (PRANDI, 1996, p. 140; SILVA, 2015, p. 78-82).
No transe de possessão, no contexto das tradições afro-brasileiras com seu espraiamento
no século XX, leva-se em conta o processo sincrético e espíritos de mortos. A infindável
86
família de seres sobrenaturais permeia o imaginário mágico-religioso afro-brasileiro. A
Pombagira aparece com um dos contatos personalizados nesse processo de relações religiosas.
Ela apareceu como uma contraposição à figura de Iemanjá que no Brasil, se desafricanizou e
espiritualizada, se transformou em “vibração do mar”. Isto significou dizer que Iemanjá foi
moralizada e, consequentemente, sincretizada (quase “assexuada”) com Nossa Senhora da
Conceição, enquanto a Pombagira passou a representar o erótico, os aspectos sexuados, o lado
marginal da religião (AUGRAS, 2000, p. 31-32; 39-40).
Segundo Capone, a Pombagira além de encarnar o estereótipo de prostituta também
recebe a qualidade da mulher que se rebela contra a dominação masculina. Ela não é mulher de
ninguém. Nos anos de 1920 e 1930, a Pombagira já estava nos cultos cariocas significando a
negação da mãe de família, o poder sexual transbordante de não submissão (CAPONE, 2004,
p. 109; 117-118). Augras e Montero escrevem que as significações simbólicas e
transformações da imagem da Pombagira estão longe de sistematizações, ainda merecem
estudo específico (AUGRAS, 2000, p. 32-33; MONTERO, 1985, p. 205-230). Segundo esta
autora, a Pombagira é uma invenção brasileira promovida pela Umbanda “síntese dos aspectos
mais escandalosos que pode representar a livre expressão da sexualidade feminina aos olhos de
uma sociedade ainda dominada por valores patriarcais”(AUGRAS, 2000, p. 18).
A imagem da Pombagira é dotada de identidade própria, representando as aspirações e
frustrações de parte da população que não se enquadra no código de ética e de valores
estabelecidos à base da tradição cristã ocidental. Ou seja, Pombagira representa liberdade
sexual, de comportamento estereotipado de “mulher da vida 58”. Conforme abordado acima, de
um lado Iemanjá, do outro Pombagira, dois aspectos de um único arquétipo. Segundo Augras,
na ‘umbanda branca’, afirma-se a imagem etérea de Iemanjá, mãe pura e
luminosa, mas logo atrás perfila-se sua contra-partida, dançando
despudoradamente, soltando gargalhada, trabalhando tanto para o bem como
para o mal, e desde modo, desempenhando papel de reativação da própria
umbanda, para a qual ‘muita força e luz tem para dar’(AUGRAS, 2000, p.
124).
Um dos aspectos da Pombagira está a serviço dos casos de amor, sendo capaz de
propiciar às mulheres que procuram sua ajuda soluções para seus afetos de amor e desafetos.
De acordo com os pontos cantados da Umbanda, a morada da Pombagira é nas encruzilhadas
em forma de T e no inferno. As Pombagiras são muitas, existem dezenas delas cada qual com
58
Trata-se de uma expressão tipicamente dos rincões nordestinos o qual as pessoas utilizam para se referir às
prostitutas, às mulheres de vários homens, puta, meretriz, rapariga, quenga ou vadia.
87
nome próprio, aparência, símbolos e cantigas próprias e podem ser também consideradas
espíritos de mortos, ou seja, “eguns” ou “quiumbas59” (PRANDI, 1996a, p. 146; SILVA, 2015,
p. 78-82).“Além de suas funções mais imediatas, terapêuticas e de solução de problemas
variados de uma clientela flutuante, creio preencher a Umbanda, em suas giras, uma função
lúdica nada desprezível” (NEGRÃO, 1996, p. 251). Segundo Augras, Exu é polivalente,
cambiante, múltiplo e
[...]. muda o jogo a seu bel-prazer. Enreda e desenreda os caminhos do
mundo. É um trickster. [...] São inúmeras as peças que prega. Não expressam
malignidade, antes resultam dessa pluralidade, essa polivalência, essa
capacidade de ser um e múltiplo, imutável e cambiante, que faz a essência de
Exu(AUGRAS, 2008, p. 91).
A Pombagira pode significar um drama de uma classe social que não pode integrar-se
dentro de uma ordem sociocultural vigente. Pode significar também não uma contracultura,
mas um sinal de uma conjuntura sociocultural onde a marginalização da mulher torna-se um
fator integrante (ORTIZ, 1991, p. 131-149). Ou seja, a construção marginal de sua morada
como espaço de banimento e condenação pode significar a influência que a religião sofreu em
sua construção e desenvolvimento no Brasil industrial ou a realidade socioeconômica das
mulheres no Brasil. A chamada sincretização de Exu com o Diabo também se deu tanto no
Brasil como em Cuba. Esse suposto sincretismo com o Diabo representado, brandindo o
tridente de ferro é uma reinvenção à moda brasileira legitimada pela hegemonia cristã e
absorvida pelos adeptos das religiões de tradição africana.(VERGER 2002. p. 79-80). Apesar
da incorporação cristã, a Umbanda, na verdade, nunca conseguiu se cristianizar
completamente, pois sempre afirma trabalhar somente para o bem, mas influenciada pela noção
do bem e mal, conforme o ideal da magia (PRANDI, 2004, p. 80; NEGRÃO, 1996, p. 203).
Aquele ilícito ou não aceito socialmente, território este chamado de magia negra ou
Quimbanda, muito explorado por Ortiz, permeia o território mágico da Umbanda desde seus
primórdios, principalmente a partir da segunda metade do século XX.
O feminino/Pombagira aqui significa proprietário do sexo, aquele que joga conforme
seus desejos e instintos mais vorazes. O masculino agora passa a lhe servir, a lhe implorar
atenção e realização dos seus desejos mais íntimos. Uma explícita relação de poder legitimada
59
“Têm um evidente caráter diabólico [...] espíritos de mortos que em vida foram assassinos, ladrões, etc. Ficaram
vagando até serem recolhidos por Lúcifer, que os colocou a seu serviço. Aparecem nos terreiros rastejando, bebem
pinga jogada no chão; se eretos têm o andar cambaleante e as mãos retorcidas como garras [...] que podem fazer o
mal da mesma forma que os exus [...] espíritos obsessores [...]” (NEGRÃO, 1996. p. 83; 85; 88).E mais, “[...] os
eguns ou espíritos de mortos, representados em categorias como caboclo, preto-velho, exu, pombagira, etc. Até
mesmo os orixás da umbanda, pelas diferenças de culto e de formas de transe, foram considerados eguns
‘disfarçados’ [...] também chamados de encostos” (SILVA, 2005. p. 161).
88
pelo cenário mágico-religioso ao som de atabaques, bebidas, tabaco e samba miúdo. A
Pombagira é vista como prostituta que domina os homens, a “mestra da paixão” e do “amor
ardente”, a mulher capaz de “abrir e fechar os caminhos das relações” dos que buscam seus
poderes mágicos. Essa imagem também goza de liberdade e movimento sem limites ou
imposições, inverte os valores socioculturais do prisma teológico cristão, causa mal estar nos
que pautam sua fé na moral cristã e nos bons costumes socialmente aceitos pela maioria.
No interior dos terreiros, esses espíritos incorporados são de mulheres sem marido e
dadas à prática do sexo. Incorporam também em corpos fora dos “padrões de beleza”
socialmente predominantes, transmitem fascínio e sedução no sambar miúdo e no quebrar das
mãos. Isto pode significar que caminham na contramão da história da sexualidade feminina no
Brasil. Esses espíritos podem significar seres “imorais” e “porta de entrada” de toda sorte de
pecado sexual e danação. Na Umbanda estão estereotipadas com nomes que as “rebaixam” na
categoria dos espíritos, em relação aos espíritos da Jurema como as Pretas Velhas e as
Caboclas. Alguns estereótipos como a Pombagira Sete Esquinas, Pombagira Gargalhada,
Pombagira Sete Saias, Pombagira Tatamulambo, Pombagira de Sete Maridos, só para citar
alguns, são nomes ligados diretamente à sexualidade e à posição da mulher na sociedade. Ela
se sobrepõe à sexualidade masculina. O domínio do erotismo, a personagem da paixão, aquela
que ata e desata os laços afetivos e sexuais, que faz esfriar uma paixão ardente ou esquentá-la
ainda mais, são características típicas desse personagem.
Na Umbanda rompem com o poder vigente, pois a ambiguidade que sua imagem
carrega pode significar não apenas liberdade, mas imaginação, coragem e resistência. O desejo
e o ambíguo são tomados como algo positivo. A positividade do ambíguo aqui como sendo
uma imagem que movimenta tudo contra ao que está socialmente construído e aceito pela
classe hegemônica. Assim, tem-se um cosmo religioso que é a cara do Brasil onde o desejo e o
ambíguo se fundem. Conforme visto, a questão sempre foi se diferenciar ao máximo da prática
religiosa do “outro” a qualquer preço, da violência ao derramamento de sangue, sendo a mulher
a maior vítima do poder dominante. Apesar de certo avanço com o debate de gênero, ainda
hoje a existência da baixa condição da mulher tem sido apenas retocada socialmente,
dissimulada politicamente e, de alguma forma, revestida religiosamente de formas de maior
suavidade cultural, mas nunca suprimida.
No presente capítulo foi possível situar-se na história do personagem Exu e seus
desdobramentos nos cultos afro-brasileiros enfatizando, sobretudo, o século XX. A adaptação,
absorção, incorporação e integração da Umbanda aos valores socialmente aceitos contribuíram
89
para a construção do seu cosmo religioso marcado pela maneira cristã-espírita de pensar. O
lugar de origem do Orixá Exu é impreciso, cercado de lendas, mitos e estórias que vão do
Daomé aos testemunhos de Babalorixás e Yalorixás da Bahia do século XIX. Tudo o que se
sabe sobre seu lugar de origem, pelo menos em princípio, baseia-se unicamente em diversas
lendas e mitos em suas numerosas versões, reproduzidas e reconstruídas no tempo e em
diferentes contextos. “Exu não ‘é’ o diabo e o diabo não ‘é’ Exu, mas ambos podem
estabelecer relações que ampliam seus significados a partir do contato entre os sistemas
culturais que os originam” (SILVA, 2015, p. 33). Os polos morais empregados às religiões
afro-brasileiras em sua configuração religiosa como (esquerda/direita/bem/mal) e os polos
patrimoniais disputados (preservação/pureza/mistura/traçada/tradicional/popular), organizamse num continuum de práticas, arranjos singulares e conteúdos intercambiáveis presentes em
cada terreiro, cada qual com sua particularidade ritualística. Esta ideia do “Exu-diabo” não é
uma característica exclusiva da Umbanda do século XX, mas já se encontrava presente na
tradição nagô no século XIX, é o que identifica Silva (2015, p. 34).
Exu traz em si partes mediadas: afro-americana e afro-brasileira. Um ser duplo e plural
que acabou se tornando brasileiro, sobretudo, nordestino. Os reflexos desse processo histórico
discutidos até aqui, foram percebidos em Viçosa como se verá no próximo capítulo.
90
5
EXU EM VIÇOSA, ALAGOAS: RESSIGNIFICAÇÕES
A história faz-se com documentos escritos, sem dúvida.
Quando eles existem. Mas ela pode fazer-se, ela deve
fazer-se sem documentos escritos, se os não houver. Com
tudo o que o engenho do historiador pode permitir-lhe
utilizar para fabricar o seu mel, à falta das flores habituais.
Portanto, com palavras. Com signos. Com paisagens e
telhas (FEBVRE, 1985, p. 249).
Neste capítulo, buscar-se-á inferir algumas considerações sobre a presença de Exu na
Umbanda em Viçosa, bem como os estigmas que a religião sofre ainda hoje. Da complexidade
de sua ritualística, destacou-se a existência do Orixá/Entidade/Espírito Exu, na sua complexa
variação à brasileira e/ou à nordestina/afro-alagoanidade.
Recentemente nas ruas de Viçosa, o pesquisador se deparou com um jovem viçosense
estudante da Universidade Federal de Alagoas que é filho de santo de uma das casas de
Candomblé na capital Maceió. Perguntado por que não participava de uma das casas de
Umbanda no seu município, respondeu que preferia “na capital por comportar pessoas com
mais instrução e cultos mais organizados, trabalhando mais com a linha dos Orixás, dos
santos”. Deparou-se também com outro viçosense que faz parte da Umbanda na capital.
Segundo ele, “a Umbanda em Viçosa trabalha muito com a esquerda, com Exu, com matanças
de animais”, práticas as quais ele não se identifica como umbandista. Foram identificados
também espíritas viçosenses fazendo críticas aos umbandistas no que diz respeito às suas
práticas e sacrifícios de animais. Um dos episódios mais marcantes aconteceu quando o
pesquisador chegou numa das pousadas na qual se hospedava, logo após retornar de um “toque
de Exu”. A proprietária em tom de ironia disse: “deixe seus exus pra lá, não entre com eles
aqui não, deixe-os lá fora”. A resposta amigável foi imediata: não precisa deixar lá fora, pois
eles estão em todo o lugar, eles andam vagando. Imediatamente a proprietária da pousada fez o
sinal da cruz dizendo, “não sei como um pastor anda no meio dessas coisas de macumba, eles
só fazem o mal às pessoas, Deus me livre. O senhor não tem medo não?”– Por que ter medo
deles? A conversa foi encerrada, pois a hora já era avançada e, principalmente, para não
permitir que surgissem, da parte dela, possíveis atitudes de discriminação e desrespeito aos
umbandistas e à pesquisa.
Nas salas de aula em Viçosa, o pesquisador presenciou alguns alunos e professores
tecendo severas críticas aos umbandistas, tratando-os como “estranhos”, “esquisitos”,
91
“macumbeiros”, enfim, se dirigindo à pesquisa como ato de coragem, pois para eles, visitar um
terreiro é “ter coragem”. Coragem? Em seus discursos ficou clara a alusão feita à “magia
negra”, aos “despachos”, às “encruzilhadas”, aos “sacrifícios” e, em alguns casos, ao
“barulho” produzido nos terreiros. Presenciou-se também vizinhos fechando suas portas em
dias de culto e curiosos observando o pesquisador com olhares desconfiados. Em suma, nos
dias atuais a Umbanda ainda é vista como “religião do mal”, “do diabo”, “da magia negra”.
Ou seja, o estigma histórico produzido há mais de um século de ver essas práticas como
maléficas ainda é visível no interior alagoano. O personagem Exu continua sendo o mais
temido e ressignificado não apenas no interior da religião, mas na própria sociedade. Os mais
de quarenta Exus identificados nos terreiros trazem características singulares e traços
marcantes em suas dramatizações. O Exu Muleta, por exemplo, ao descer em seu “cavalo” faz
com que ele busque uma muleta ou espécie de bengala para sustentá-lo no ritual. Outro
exemplo é o do Exu Mudo que faz seu “cavalo” permanecer com o dedo polegar na boca o
tempo todo, sem proferir nenhuma palavra ou gesto. Buscar-se-á a partir deste ponto descrever
o personagem Exu no interior da Umbanda viçosense e seu lado “misterioso” nos rituais
estudados.
5.1 Exu na visão da liderança umbandista viçosense
Parte da liderança acredita que num passado recente (1960-1970), os rituais de Exu
eram mais “sérios” nos terreiros. Entende-se por “sérios” aqui o processo do transe de
possessão, a prática nos terreiros, a atenção dos filhos de santo, o conhecimento e
reconhecimento da liderança. Acredita-se que “não mudou muita coisa” entre a Umbanda do
passado e a do presente. Compreende-se por “não mudou muita coisa não”, as oferendas, os
“toques”, a atuação de Exu e sua força mágica. Será preciso trocar em miúdos estas expressões
proferidas pela liderança. Em primeiro lugar, “antigamente o povo de santo tinha mais respeito
pelos espíritos, levavam mais a sério as coisas dos espíritos, hoje em dia não, tem gente que
faz de qualquer jeito as coisas”. Antigamente era “feita a prova”, ou seja, se “queimava” o
braço do filho de santo para saber se de fato ele estava incorporado por um Exu. Para eles, “o
povo levava mais a sério a religião”. Quanto aos rituais, “antigamente não se via tanta
cachaça, tanta matança, tanto palavrão como se vê hoje em dia”. Parte da liderança reclamou
de muitos “toques” com os seus consumos exagerados de bebidas alcoólicas e a presença de
muitos que vêm para se embriagar nas festas.
92
Naquela época “se valorizava mais a religião, o povo tinha mais respeito com as
entidades”. “Muitos se fingem estar incorporados por um espírito”. Acredita-se que muitos
que dizem estar incorporados por Exus e Pombagiras, na verdade “não sabem nem do que se
trata, tampouco estão possessos”. “Sempre houve muita bebida e cortes nos salões nos quais
os Exus baixavam para comer”. Em todos os rituais se utiliza a prática da “matança”, bebida
alcoólica e cigarro. Ainda há “falta de união dos terreiros” e a disputa pela “sabedoria
espiritual” da liderança. Ficou clara certa rivalidade entre a liderança no que diz respeito às
práticas de cada terreiro, bem como certa disputa por número de filhos de santo. Todos
“trabalham pra Exu”. Para a liderança mais antiga, hoje em dia “falta mais respeito para com
o zelador/a”, pois “abrem terreiros do dia para a noite, alguns funcionando sem documentos
da Federação”. E mais, “alguns zeladores/as se dizendo realizar um monte de coisas por aí,
se sentindo os donos da magia, não sabem trabalhar direito”.
O que se percebeu foi que em certa medida, a liderança mais antiga disputa espaço
com a mais jovem e vice-versa. Ficou evidente o culto a Exu, suas oferendas, suas
“cobranças”, suas admoestações aos filhos de santo. O respeito e temor para com os Exus e sua
ação direta na vida de todos nos terreiros e no seu cotidiano ficou patente. Percebeu-se também
que Exu em Viçosa foi ressignificado e revivido na prática e na visão de cada liderança. Os
discursos ora divergentes ora convergentes serviram para recriar ou ressignificar a imagem de
Exu que historicamente provocou e ainda provoca bastante discussão no interior da Umbanda.
Foi perguntado o seguinte: Quem são os Exus para o/a senhor/a? Ou Como o/a
senhor/a vê a Exu? As respostas foram: “Exu é da magia negra, pertence às trevas. Exu é
pagão. Ele pertence aos rituais de magia negra. Ele não pertence a Oxalá. É da parte do
Belzebu que faz parte com satanás. Ele pertence ao satanás, às trevas. Já as Pombagiras são
as cavaleiras dos Exus. Também são das trevas, da magia negra, das partes baixas da terra”;
“Exu é da parte da esquerda. Ele é esquerdo, da parte de Satanás. Ele vai ao inferno e mora
nas encruzilhadas. Já a Pombagira é um Exu mulher. Ele é da parte diabólica. É o esquerdo
legítimo. Ele não gosta da gente. Ele apenas acostuma. Ele amansa através dos Pretos Velhos.
Quem sabe amansar Exu, são os Pretos Velhos e as Pretas Velhas”.
“Eu trabalho com a esquerda, com a corrente da encruza, com a que pertence às
encruzilhadas. Os Exus maltratam as pessoas, andam fazendo o mal. Eles são os cavaleiros
dos Orixás, não fazem nada sem os Orixás. São do mal e do bem. Eles fazem o mal, mas
também fazem o bem. Só sei que os Exus não pertencem muito a Deus!”; “Os Exus e as
Pombagiras são os agregados dos Orixás e dos Pretos Velhos. O Exu pega toda parte mal da
93
pessoa. Se a pessoa nasceu com aquele instinto mal, perverso, Exu toma conta disso. O Exu
não é Diabo. É o filho/a de santo que coloca Exu no caminho mal, que trabalha para o mal”.
“Existem muitos Exus e Pombagiras na Umbanda. Cada Caboclo domina vinte e um
Exus. Todos os Exus são do inferno ou das encruzilhadas, são da parte infernal. Eles são
infernais. As almas morreram aqui e não ganharam o céu e por causa disso desceram ao
inferno e de lá se transformaram em Exu para ocupar a terra. São espíritos maus”; “As
correntes de esquerda são das trevas. Quando os Exus se aproximam da gente Eles vêm brutos
e precisam ser dominados, amansados. São dominados através das oferendas que pertencem a
Eles. São todos das trevas, de uma linha só”.
A construção da cosmovisão religiosa umbandista a partir dos discursos dos seus
representantes só comprovam o dilema histórico que ainda cerca o personagem Exu e suas
falanges. Para eles, ora Exu não é o Diabo, tampouco o Satanás, ora Ele é “da parte do
Diabo”, “das trevas”, “da magia negra”, “do inferno” e da “parte do mal”. Outro detalhe
interessante observado foi que Exu pode ser do “bem” e do “mal” ao mesmo tempo, cuja ação
no mundo depende de quem trabalha com Ele. E ainda, que os filhos de santo ou a matéria
podem dominá-lo. “Todos são do inferno”; “quem o torna mal é o filho/a de santo”. São os
filhos de santo que “dominam Eles”; “são do mal e do bem” ao mesmo tempo.
Pertence a “parte diabólica”; “pertence a Satanás”. Como pensar a imagem de Exu
diante desses discursos? Como entender que Exu não é o Diabo, mas que carrega todos os seus
estigmas? É possível pensar Exu como um verdadeiro representante das trevas e da magia
negra e ao mesmo tempo um representante do bem ou vítima do filho/a de santo mal
intencionado? São os umbandistas que dominam Exu ou vice-versa? Durante a pesquisa foi
possível perceber o quanto Exu ainda hoje divide opiniões dentro dos terreiros. A Mãe
Antônia, 74 anos, na Umbanda desde os oito anos, reconheceu isto afirmando que “até hoje
não entendia bem esta questão”. Ainda hoje a questão da personalidade de Exu não foi
resolvida. Tudo leva a compreender, a partir dos discursos acima, que Exu acabou se tornando
um “mal necessário” à religião, pois com Ele os rituais caminham entre o dendê e o sangue,
entre a jurema e as encruzas. Ele é expressão máxima da condição humana. A profundidade
mitológica de Exu expressa a psicologia social de seus seguidores. Ninguém é somente bom ou
mau. O foco não está na aparente “confusão”, mas na incapacidade de buscar um padrão a
partir do olhar da religião hegemônica.
A fim de tornar a problemática mais coesa, passa-se a apresentar mais visões da
liderança viçosense. Os discursos vão de líderes iniciados na década de 1980 a líderes que
94
abriram seus terreiros a partir da década de 2000. Os Exus “São espíritos fortes. Eles vêm no
vento e se concentram nos seus filhos. São da parte de Lúcifer, das encruzilhadas. Mas Eles
não fazem mal a ninguém”; “os mortos são esses Exus que incorporam nos seus cavalos para
curar o povo. Os Exus tiram o mal das pessoas, tiram as doenças, tiram as macumbas. É um
pessoal que não tem pena de ninguém. Quem tem que dominar Exu é a matéria quando Ele
vem incorporar. Ele cura, liberta, não faz o mal, isto só depende da pessoa”; “os Exus são da
parte de baixo. Eles são diabólicos. É diabólico. Eles vêm para receber suas obrigações, vêm
para curiá. Exu quando desce é diferente do Orixá. Os Exus são carniceiros, da esquerda, de
Satanás, do Cão, então são muito diferentes dos Orixás. São espíritos da esquerda. Exu não
cura ninguém”.
“Os Exus são das encruzilhadas. São os invisíveis que vivem nas encruzas. Todo Exu
é infernal, uns mais infernais do que outros. São da corrente negra, da esquerda, para
combater as correntes que perturbam as pessoas. Um dia já foram vivos, cada um tomou o seu
destino através de Oxalá. Exu cura, faz o bem”; “os Exus são os cavaleiros dos Caboclos. São
enviados pelos Orixás para realizarem trabalhos, curas. Eles são das trevas e dos ventos, não
possuem casa, vivem vagando no mundo”; “os Exus foram os machos das Pombagiras. São
Eles que incorporam nos terreiros. São da esquerda, da Quimbanda, da parte do mal. Moram
nas encruzilhadas. Eles fazem parte do Diabo mesmo. São do mal. Maria Padilha, por
exemplo, é a Pombagira mulher de Satanás”.
“Os Exus moram nas encruzilhadas, são parte dos demônios. São da magia negra,
do demônio. Não são gente boa, são da corrente de Lúcifer. São da corrente infernal, das
correntes ferozes. Não são coisas boas não”; “os Exus são os escravos dos santos. São
escravos dos Orixás. Exu Tiriri, por exemplo, é chaveiro do inferno, é Cão mesmo”; “os Exus
foram anjos que viviam com Deus e por motivos de desobediência foram expulsos do céu.
Passaram a atuar no mundo, nas pessoas. São cavaleiros dos Orixás. São da parte esquerda,
vivem nas encruzas. Existem os da parte infernal”; “Eles têm um rei e este rei não pode vir em
terra, caso contrário o mundo se acaba. Eles têm um príncipe das trevas, um comandante dos
Exus que é o Lúcifer. É Lúcifer que comanda toda linha da esquerda. Então os Exus vêm
dominados por Ele, as Pombagiras também são dominadas por Ele”.
“Exu bebe, fuma, chama palavrão, não faz o bem. Ele também cura, faz tudo. Eles
trabalham pela esquerda, podem fazer o bem e o mal ao mesmo tempo. Se pedir Ele faz o mal
e faz o bem. Eles vêm das encruzilhadas, dos cemitérios, das matas e das águas; os Exus são
escravos dos santos”; “os Exus não são como muita gente pensa que só servem para fazer o
95
mal. Os Exus não são só para fazer bagunça. Os Exus no meu terreiro têm doutrina,
trabalham certo para ajudar as pessoas”; “os Exus e as Pombagiras são da carniça como Eles
mesmos dizem, pegam você do jeito que você estiver. Os Exus são escravos dos Orixás, os
Orixás comandam os Exus. Tem os Exus que são do mal. Eles são das encruzas e dos infernos
pra lá. Quando manda fazer o mal Ele faz o mal e quando manda fazer o bem Ele faz o bem”.
“Os Exus são os nossos guardiões, guardiões da nossa casa, dos nossos templos. Os Exus
protegem a gente. Há muitas interpretações sobre os Exus”; “os Exus tomam conta da gente,
dominam a gente. São pessoas que morreram e vêm incorporar nas pessoas para fazer o mal.
Existe uma parte do Satanás e a outra parte boa”.
Ficou claro que existe terreiro que “trabalha para o bem” e terreiro que “trabalha
para o mal”, bem como Pai e Mãe de santo que trabalham para os dois lados. O que chamou a
atenção foi que os Exus podem ser classificados de duas formas: (a) os que são do bem e (b) os
que são do mal. Ficou claro que “existem muitas interpretações sobre os Exus”. Exu também
pode fazer o bem e o mal ao mesmo tempo, confirmando o que ficou visível acima. A
“intencionalidade” de quem trabalha com os Exus também foi enfatizada. Exu segue na
direção na qual o filho/a de santo colocá-lo para seguir. Exu é o “dominado de Satanás”. Ficou
confirmada a ligação direta com “Satanás”, “inferno”, “trevas”, “magia negra”, “Diabo”,
“Cão”, “Lúcifer” e “parte baixa”. Os Exus são todos “infernais”, “Exu é diabólico”. Então
existem duas qualidades de Exus? Se não são o Diabo, por que se referiram a ele como “da
parte” daquele? Exu não faz o mal, mas depende de quem trabalha com Ele. Ou seja, neste
caso Exu passa a ser um “dominado” e não o “dominador da magia”. Vale salientar que
nenhum umbandista afirmou ser Exu o próprio Diabo, Satanás ou Lúcifer, mas “da parte”
deles. Esta expressão “da parte” poderá denotar ou não certo apaziguamento do discurso
externo que costuma ver a Umbanda como sinônimo de Diabo. Ou, quiçá, certa reprodução e
legitimação do discurso religioso hegemônico acerca das religiões afro-brasileiras no País. Ou
ainda, talvez queira significar a ligação da religião com as forças misteriosas do além. Forças
ocultas que podem até fazer o mal, ou uma estrutura própria mitológica – qualidade intrínseca
da entidade.
Apesar dos relatos acima, pôde-se notar em alguns discursos que Exu também é
“cavaleiro” e “mensageiro” dos Orixás, “guardião” e “protetor” das casas e dos terreiros.
São também “amansados” pelos Pretos Velhos, bem como “escravos dos santos”. Aquele que
está por trás de cada Orixá, “macho” das Pombagiras, “Aquele que cura”, que carrega todo
tipo de “corrente branca”, que “abre caminho”, “cavaleiros dos Caboclos”, em suma,
96
“enviados dos Orixás”. Outra aparente ambiguidade existente em alguns discursos foi a de que
“Exu cura” e “não cura”. Para o Pai Barnabé, quem afirmar que Exu cura estará mentindo. Já
o Pai Cicinho (“Fava Pura”), Mãe Ana, Pai Balaio e Mãe do Carmo afirmaram que “Exu
cura”. Em outra ocasião em conversa com Pai Cosme e Pai Emídio a mesma pergunta foi feita
e as respostas foram paradoxais. Para o Pai Cosme Exu cura. Já o Pai Emído acredita que “Exu
não cura ninguém”.
Sempre se trabalhou com Exu em Viçosa, na mata ou em casa, sempre se “cortou pra
Exu”. Uma Mãe de santo disse o que aconteceu com ela em seu terreiro localizado na zona
rural. Segundo ela, em uma festa dedicada a Exu Caveira que passou por uma prova de fogo.
Contou que um filho de santo de outro terreiro duvidou do seu transe de possessão inclusive
comentando nos bastidores que a mesma havia bebido muito e que estava com fingimento.
Então Exu Caveira ficou enfurecido e para provar que se tratava de fato sua presença no salão e
que a festa era Dele, resolveu provar. Para isso, foi até o fogo onde estavam assando as carnes
da festa e pegou um pedaço de ferro marcando profundamente o braço da Mãe de santo, isto é,
do seu “cavalo”. A Mãe de santo disse que no momento do transe não sentiu nenhuma dor,
continuou a dançar e a beber. Após o transe de possessão ela disse que o seu braço começou a
doer bastante e que três dias após o ocorrido foi ao médico examinar o ferimento. Segundo ela,
o ferimento era profundo e que levaria em torno de cinco pontos. Começou a colocar dendê,
remédios alternativos e foi sarando aos poucos. Ainda hoje leva em seu braço direito à altura
do ombro a marca deixada por Exu Caveira por duvidarem da sua presença. Por que Exu
Caveira não provou sua força punitiva no filho de santo duvidoso ou descrente? Será que a
Mãe de santo atribuiu a este possível filho de santo suas dúvidas e temores? A Mãe de santo
não soube explicar o ocorrido com detalhes, mas afirmou que antigamente, há cerca de
quarenta anos, costumavam provar se havia de fato incorporação nos filhos de santo,
marcando-os com algum tipo de objeto em chamas. Outros Pais e Mães de santo também
confirmaram isto. Acredita-se tudo isso ser parte do arquétipo mítico.
Na visão da liderança umbandista viçosense, antigamente o transe de possessão “era
coisa mais séria”, conforme já mencionado acima. Os Exus, segundo eles, sempre provocavam
algum tipo de “confusão” nos terreiros, “Eles gostam disso, da bagunça”; “Eles mesmo
fazem, não mandam ninguém fazer”. Isto reforça o caráter histórico ambivalente e “malfazejo”
de Exu construído principalmente na organização da Umbanda. Se Ele “não presta”, então por
que precisar Dele?”. Se não é o Diabo então por que é diabólico?
97
5.2 “Exu não presta, Exu não vale nada, mas sem Exu não se pode fazer nada”
Foi o Pai Emídio quem pronunciou esta frase. Em dado momento nos rituais estudados,
praticamente todos os filhos de santo participantes da “gira”, entram em estado de transe. O
interessante é que, nos “toques” de Exu, quando é chegado o final do ritual, é entoada uma
louvação para a retirada de Exu do terreiro: “... tua encruza é longe Exu, vou mandar levar, tá
chegando a hora Exu de retirar, tá chegando a hora Exu de se retirar, sai daqui, aqui não é o
teu lugar, aqui é uma casa santa aruará, não é lugar de Exu morar (...) eu mandei vê, vou
mandar levar, sai Exu para aonde eu mandar, xô Exu, vá embora”. Por que esta ambiguidade
ritualística? Por que Aquele que é invocado para entrar também é invocado para sair? Se Ele
“não presta, não vale nada”, então por que precisar Dele? Para os entrevistados, “Exu não tem
pena de ninguém”. O transe de possessão, a depender do tempo de incorporação, deixa o corpo
do filho/a de santo bastante debilitado. Nos rituais registrados, após o transe, as/os filhas/os de
santo suavam bastante, não conseguiam ficar de pé, sentadas no canto do salão, reclamavam de
dores no corpo, na cabeça e nas pernas, algumas chegando a ficar com falta de ar. Em alguns
dos casos acompanhados, houve filha de santo que ficou desacordada por alguns minutos,
outras que reclamaram bastante do transe como, por exemplo: “isso não é vida, meu Deus!”,
“ah, não estou aguentando”, “o que aconteceu comigo?”, “oh que dor na cabeça”. O
“toque” de Exu acaba sendo mais “forte” que os dos Orixás. Ficou claro que o transe cansava
bastante e não era bem aceito por alguns filhos de santo. Essa catarse é um trabalho psicológico
imenso que o grupo religioso realizou para lidar com as “forças do mal”. É uma regra da
magia. Ela cobra caro. Só assim haverá poder para fazer o bem. Essa lógica faz muito sentido
quando se vive em condições materiais precárias.
Em dias de “matança”, algumas filhas de santo repugnavam aqueles gestos de tomar
sangue, sobretudo no pescoço do animal, deixando transparecer visivelmente enjoos.
Perguntadas se estavam com enjoos, elas acenaram com a cabeça que não. Os Exus
representariam um estado mundano horrendo ou uma espécie de inferno cristão, pois o
vermelho forte e o preto, bem como os rituais que envolviam sangue, pareciam aumentar a
tensão do grupo. As toadas a Exu traziam expressões como, “inferno”, “encruzilhada”,
“Lúcifer”, “cemitério”, “sangue”, “meia noite”, “Mal, “faca”, “morrer” e “linha do trem”.
Outras, “Exu Toquinho do inferno arrebenta Miranda, é na linha de ferro no terreiro da
Umbanda”; “trabalha nos dois lados”; “eu sou Zé da Bagaceira, vim aqui pra trabalhar, na
direita eu faço o bem, na esquerda eu faço o mal”; “lá na encruza tem outro rei é seu Lúcifer
98
e a rainha Pombagira”. Representando, talvez, o caráter “maléfico” dos espíritos “baixados”
no terreiro.
Percebeu-se ainda, que a experiência religiosa umbandista foi vivida, sentida e
compreendida corporalmente. Observou-se que as classes de Exus e Pombagiras corporificam
significações religiosas, encarnadas e moduladas em significações e compreensões não-verbais.
No transe de possessão, as mãos eram encolhidas e postas para trás vindo logo depois a
ajoelhar-se diante do conga ou assentamento de Exu, cambaleando, com a cabeça em direção
ao chão sempre. As acentuadas disfonia 60 , disfemia 61 e dislalia 62 ficaram visíveis durante o
transe. Muitos Exus não conseguiam sequer pronunciar uma palavra ficando apenas emitindo
sons de extrema rouquidão e derramando saliva ao chão. Para um Pai de santo, esses Exus são
os mais “pesados”, “infernais”.
Nos rituais umbandistas, a subalternidade das entidades ocupava um valor positivo. Os
espíritos mais valorizados na Umbanda eram pensados como seres inferiores e subalternos aos
homens – como se pôde observar nos discursos registrados: “da parte baixa”, “do invisível”,
“da magia negra”, “da esquerda”. Aquele poder religioso decorria de uma inversão simbólica
de valores em que, do ponto de vista estrutural, são julgados inferiores na sociedade, no ritual
são detentores de poder mágico particular, advindo da própria condição que possuem.
Identifica-se esta inversão de valores da hierarquia espiritual como constituintes do triunfo
religioso da Umbanda em que os fracos e socialmente despossuídos passam a ter, por meio do
poder mágico, sabedoria, força e atuação no mundo, legitimadas pela religião. Assim,
compreendeu-se que a Umbanda em Viçosa retira do estigma de seres inferiores e menos
evoluídos, sua vitalidade, sua ação mágica. Um exemplo disso ficou explícito nas figuras
observadas dos Exus e Pombagiras, os quais recebiam louvação, admiração e temor dentro e
fora dos terreiros. Este aspecto paradoxal, ou esta inversão simbólica assumia ali um caráter de
transgressão, renovando outra fonte de poder na sociedade – os “toques” reuniam todas as
Entidades/Espíritos em terra por meio de um poder mágico inigualável.
60
Perturbação na voz, sons vocais distorcidos.
Sons com dificuldades de audição, gagueira.
62
Falas com perturbação sonora, sons distorcidos.
61
99
5.3 “Matança pra Exu”
Durante o mês de agosto de 2014, aconteceu nos terreiros de Viçosa o que eles chamam
de “matança pra Exu”. Tornou-se possível participar de seis rituais em seis terreiros.63 São
celebrações internas voltadas para o oferecimento de animais aos Exus, não sendo permitida a
entrada de crianças, nem de visitantes. Os terreiros abriram uma exceção a esta pesquisa,
recebendo-a de bom grado e permitindo o registro, inclusive, convidando o pesquisador para
participar das ceias no dia seguinte – convite aceito de bom grado. Os terreiros em sua maioria
estão instalados nos fundos das residências de seus líderes e em alguns casos num pequeno
puxadinho ao lado da casa. Em dias de festa e de “matança”, os fogos de artifícios anunciam
nos céus de Viçosa a presença das religiões de matriz africana no município.
Os preparativos começam uma semana antes com a compra dos elementos para a festa.
Já na sexta feira, acertam os mínimos detalhes das celebrações e a entrega dos pertences. Os
“toques” de Exu ocorrem às sextas, domingos e segundas feiras. Já as festas específicas
destinadas a “alimentar os Exus” ocorrem durante o mês de agosto e são celebradas por quase
todos os terreiros aos sábados e aos domingos. Para organizar tais festas, os terreiros
necessitam de dinheiro; o todo custa caro. Por causa disso, parte dos terreiros não consegue
realizar o que eles chamam de “matança pra Exu” ou “festa pra Exu”. Realizam também o
que eles chamam de “cortar pra Exu”. Refere-se ao corte de animais, geralmente frangos
(bicho de dois pés) em rituais privados feitos pelos próprios Pais ou Mães de santo. Em alguns
casos, tais lideranças se deslocam aos terreiros de Cajueiro, São Miguel dos Campos, Atalaia e
Maceió, geralmente terreiros de seus antigos zeladores, para participarem das oferendas e das
celebrações.
No sábado, acontecem os sacrifícios e a entrega de todas as oferendas aos Exus. Filhos
de santo apresentam cigarros, bebidas, frangos, cabritos e, em alguns casos, pequenos bezerros
e ofertas em dinheiro depositadas no centro do salão antes da cerimônia de matança. Ao início,
pedidos escritos em pedaços de papel são colocados discretamente debaixo dos animais
oferecidos e forrados com sangue. Os filhos de santo conversam em segredo com os espíritos
“baixados em seus cavalos” no cantinho do salão. Bebidas e cigarros são oferecidos a todos os
presentes. Depois de horas de celebração, o chão fica forrado de animais mortos com uma
bacia ou bandeja de barro contendo as cabeças e vísceras. Em alguns momentos do transe de
63
Outros terreiros também realizaram “matança pra Exu”, mas os terreiros visitados foram: Centro Espírita Preto
Velho; Centro Afro Brasileiro São Jerônimo, Centro Afro Brasileiro São João Batista, Centro Afro Brasileiro São
Jorge; Centro Espírita de Oxum Menina; Centro Afro Brasileiro Senhor do Bonfim da Bahia.
100
possessão, os “cavalos” comiam parte dessas vísceras e bebiam sangue num copo misturado
com mel e com um pó preto que eles chamam de “axé”. Os fogos de artifícios são soltos no
quintal onde se encontram vários animais amarrados e os preparos para a celebração.
No domingo, os terreiros participam de uma grande ceia aberta ao público com muita
comida, bebida e fogos de artifícios soltos na rua. O som dos atabaques anuncia a festança
religiosa. A comida preparada durante todo o dia exala o delicioso cheiro misturado com as
cores, sons e afetividade dos filhos de santo e atenção do seu líder. Consulentes começam a
chegar com seus filhos e amigos. O terreiro fica lotado. O “toque” tem início e dura quase três
horas. Ao final, uma mesa é posta no centro do salão, repleta de comidas e bebidas,
caracterizando uma ceia aberta a todos, um momento de confraternização entre o povo de
santo, consulentes, visitantes e familiares. Apesar do pouco espaço existente nos salões, a
celebração prossegue até altas horas da noite, mas sem o som dos atabaques. Uma coisa é certa,
tem “matança”, tem festa no dia seguinte.
Nesses rituais, é entoado o ponto: “Oh Exus dos invisíveis, venham todos nos ajudar,
nós queremos vós aqui na hora de curiá, Oh Exu olha a matança pra cair um pelo, na hora da
matança venham todos curiá, olha aqui, olha a matança”. Os filhos de santo vestidos de
vermelho e preto (as cores de Exu e Pombagira) se reunem em forma de círculo em torno de
algumas imagens de Exus e Pombagiras, postas no centro do terreiro diante de velas acesas,
aguardente, cigarro, uma bacia, geralmente de barro e facas peixeiras. Cada toada convida e
exalta um Exu a vir receber sua obrigação ou seu ebó. Primeiro são “baixados” nos terreiros os
Exus, depois as Pombagiras. Cada espírito recebe sua obrigação e pedido dos filhos de santo.
Os Exus brincam, repreendem, cantam, dançam, admoestam, em alguns casos ficam em
silêncio. O espírito Zé Pelintra sempre se faz presente nos rituais de Exu. Para os umbandistas,
o espírito pertence aos “dois lados”, a “Jurema” e a “esquerda”, à semelhança do Boiadeiro.
No Centro Afro Brasileiro São Jorge, todos os anos é sacrificado um boi a este espírito.
Segundo a Mãe Ana, ela não gosta de “festa pequena”. Nos anos de 2010 e 2014, fez a
oferenda de dois bois com quinze arrobas cada um. Para os umbandistas, essas festas
significam uma forma de gratidão e respeito aos espíritos por tudo que eles realizam quando
deles precisam. As oferendas realizadas nesses rituais vêm para fortalecê-los, vitalizá-los a fim
de cumprirem seus pedidos e suprirem suas carências nas mais diversas áreas da vida.
São colocados, diante dos animais, pedidos que vão de saúde a sorte no amor. A
confiança na força dos Exus é visível. Filhos de santo atentos a cada detalhe do ritual, a
preocupação com a limpeza do salão, as conversas paralelas sussurradas acerca de cada
101
incorporação e fala dos Exus. O cansaço é visível nos seus rostos após o transe de possessão. O
abanar das toalhas devido ao calor sufocante nos recintos fechados e cheios de gente, o som
dos resistentes atabaques fazem parte dos elementos lúdicos que compõem cada ritual. Todos
os anos acontecem as “festas” ou “cortes” para Exu na Umbanda em Viçosa. A “comida do
santo” nos terreiros representa comunicação entre seres vivos e mortos, como os próprios filhos
de santo conclamaram: “é do invisível”. Cada um deles tem seu “dono de cabeça” que carrega
um Exu, o qual rege seu cotidiano constantemente. Esta relação com o “dono de cabeça”
precisa ser mantida através dos rituais: acender os pontos, velas, rezas, indumentárias,
quartinha e cantos. Ainda há variações na relação/participação entre os cultos aos Orixás e
Exus. De acordo com a tradição, a relação entre Orixás, Caboclos e Pretos Velhos diferencia-se
daquela dos chamados Exus da parte esquerda, cuja relação quase sempre é mediada por tensão
e está ligada mais à precaução pessoal, enquanto a relação com os primeiros representa
reciprocidade positiva, mais amigável.
Para isso, o/a filho/a de santo precisa alimentar seu santo sempre, uma vez que a
comida de santo é como se fosse uma espécie de comportamento contratual, preventivo,
precaução pessoal, espiritual e social, na relação com Exus por devoção. Em síntese, trata-se de
um relacionamento direto, amigável. Poderá significar uma espécie de “barganha espiritual”,
pois Exu depende das ações diretas dos filhos de santo para atuar no mundo. Isto significa dizer
que quanto maior for o despacho, mais rápida será a resposta às demandas.
5.4 Exu Caveira e Exu Bagaceira: de quem é a obrigação?
No terreiro do Pai Emídio 64, em dia de matança para os Exus, no chamado processo
de “curiá”65 Exu, o terreiro está lotado com cerca de vinte e cinco filhos de santo. Diante das
oferendas espalhadas sobre um lençol vermelho e preto, cores dos espíritos, forrado no centro
do salão e colocadas sobre o aguidá (vasilhas ou cacos de barro), eles descem e recebem suas
obrigações. A filha de santo incorporada por Exu Bagaceira começa a cantar: bem forte “Pai,
Pai, Ele é Pai, nem todo filho que Ele tem, reconhece que Ele é pai. Cuidado filha de santo que
você come capim, se mexer com Zé Pelintra termina levando fim. Pai, Pai, Ele é Pai, nem todo
filho que Ele tem reconhece que Ele é Pai. Cuidado filha de santo que você come capim, se
bulir com Zé Pelintra, termina levando fim.” O aparente desentendimento começa quando uma
filha de santo incorporada por Exu Caveira está recebendo obrigação, diante do caco de barro e
64
“Matança pra Exu” realizada em 23 de agosto de 2014, das 18:h00 às 23:h00, no Centro Espírita Preto Velho.
“Curiá” na Umbanda significa oferecer ao espírito, bebida, sangue, oferendas sob a cabeça. Se curia com
sangue no aguidá (vasilhas de barros). Curiá é beber o sangue do sacrifício.
65
102
do seu copo de aguardente e cigarro entre os dedos e outra filha de santo, incorporada por Exu
Bagaceira, insinua tomar sua cachaça e tocar na sua obrigação. Exu Caveira irritado diz: “quer
tomar minha obrigação, filha da peste? Espere a sua vez que há de chegar.” Exu Bagaceira
olha para ele e começa a cantar a canção descrita acima. Uma menção clara à força e domínio
do Zé Pelintra, invocado como Pai, possivelmente Pai de todos os Exus na tradição
umbandista.
Exu Caveira bastante irritado começa a falar mal de Exu Bagaceira: “Eu já morri e
não tenho medo de você seu filho da peste, filho da doença do rato.” Exu Bagaceira revida do
lado de lá do terreiro: “quem tem medo dele é a filha da peste. Se eu tiver medo dele que o
diabo me carregue para o fundo do inferno”. Exu Caveira começa a dar gargalhada e Exu
Bagaceira continua dizendo que não tem medo dele. Imediatamente, o Pai Emídio, incorporado
por Exu Serra de Fogo, resolve botar ordem no local perguntando aos Exus: “quem quer me
morder primeiro? Quero ver agora. Vamos! Quem vai me morder agora? Comecem logo!”
Exu Serra de Fogo insiste na pergunta: “eu quero saber quem vai me morder primeiro. Eu
quero saber agora. Vamos! Quem vai me morder? Estou esperando agora.” Exu Caveira
disse: “eu vou sair por consideração a Padrinho, mas por esse aí não. A gente se encontra seu
filho da peste”. Exu Bagaceira brama forte expressando ódio, enquanto Exu Caveira continua
rindo sem parar. Naquele momento Exu Bagaceira começa a cantar: “eu sou babá, babá da
encruzilhada, quem quiser falar meu nome eu sou Exu Sete Facadas”. Pai Emídio ainda
incorporado por Exu Serra de Fogo insiste na pergunta: “quem vai me morder primeiro?
Vamos! Estou esperando agora. Quem vai? Comece agora a me morder? Vão me morder?
Vão? Exu Bagaceira responde: “eu não, não vou lhe morder Padrinho. Agora não tenho medo
desse filho da peste não, nem na casa da peste eu não tenho medo dele não.” Exu Caveira diz
que vai embora, mas que voltará para se encontrar com o Bagaceira e “acertar as contas com
ele”. Exu Bagaceira diz: “eu não quero comida desse filho da peste não, ele tá ficando doido?
Eu não quero briga com ninguém não. Eu não quero briga com ninguém não, tá doido?” Exu
Caveira responde: “eu vim aqui pra comer e não pra brigar com ninguém. Agora, Exu filho da
peste nenhum vem mexer comigo porque eu sou Exu Caveira”. Pai Emídio, desta vez
incorporado por Exu Furacão (André Furacão), resolve juntar as mãos deles dizendo: “olha,
nesta festa não tem briga, nesta batalha não tem briga, não tem intriga, não tem briga aqui”.
O Exu Furacão tenta acalmar os ânimos do Caveira e do Bagaceira. Exu Bagaceira
insiste novamente: “eu não vim tomar nada de ninguém. Eu vim para ajudar o Emídio e
ajudar qualquer filha de santo daqui, qualquer um que precisar de mim”. Exu Caveira
103
continua revidando-o: “você tinha comido filho da peste e ainda queria comer do meu, boba
da peste. Eu sou Exu Caveira nessa boba da peste”. Exu Bagaceira resolve ir embora, então
Exu Caveira exclama bem forte: “agora eu te pego boba da peste nas encruzas”, e também foi
embora. A desavença fica – ou não – para ser resolvida mesmo nas encruzilhadas. Após o
transe de possessão, as filhas de santo ficam visivelmente cansadas e perguntando o que havia
acontecido ali. A preocupação das outras filhas de santo com aquele episódio que acabara de
acontecer é visível. O evento dura cerca de quinze minutos pairando tensão e temor no terreiro.
Logo após a desavença, a filha de santo incorporada por Exu Bagaceira logo incorpora o Seu
Zé da Bagaceira que acaba confirmando a força do Bagaceira e sua coragem dizendo: “ele
trunfa com qualquer um aqui, ele trunfa com qualquer Exu, Ele não tem medo não, Ele é
corajoso”. Já a filha de santo que esteve incorporada por Exu Caveira não lembra de nada,
ainda cansada, disse que aconteciam essas coisas e só sobrava para ela que ficava muito
cansada, com dores no corpo e sem fôlego.
Ao que se sabe, as filhas de santo não tinham intrigas pessoais, não houve desavença
ou desentendimentos anteriormente entre elas. Depois do ocorrido, elas conversaram entre si
perguntando o que havia acontecido. Este episódio pode denotar certa disputa no plano mítico
entre os espíritos ou talvez, proporcionar uma leitura da capacidade de discórdia dos Exus. No
entanto, opta-se empreender que esta possível discórdia pode significar o zelo pela oferenda e o
respeito pelo filho/a de santo necessitado dos trabalhos mágicos. Uma coisa fica explícita: cada
oferenda tem seu destino certo e receptor atencioso e bastante preocupado em se alimentar e,
acima de tudo, em atender ao que lhe é solicitado por cada filho/a de santo carente de proteção
e de realizações pessoais. Essa aparente “desavença” contribui para perceber o quanto Exu
ainda provoca temor e divide opiniões no interior da Umbanda. Uma coisa é certa, “quem deve
a Exu tem que pagar” e ele não hesita em receber esta dívida quer seja no terreiro, quer seja na
encruza.
Enquanto isso, em outro terreiro, um ponto cantado diz assim: “Quem deve a Exu tem
que pagar, lá na encruza seu sangue vai derramar”. Pai Édson, incorporado por Exu Arranca
Toco, começa a cantar: “o inferno é bom, é infernal, oh Arranca Toco do inferno, Arranca
Toco no congá”. O terreiro está em festa, é dia de “matança pra Exu”. Exu Arranca Toco com
uma peixeira na mão canta: “os meus Exus do meu salão estão em festa, São Bento meu
abençoou. Arrebata, arrebata, meu ebó, oh São Bento lá meu é protetor.” Ele circula todo o
salão. Em seguida, com um galo preto nas mãos diante das imagens dos Exus e das
Pombagiras, sobre uma bacia com água, azeite e cachaça, corta a cabeça do galo e agarrado ao
104
seu pescoço toma todo o seu sangue com cachaça. O sangue representa “força”, “axé”,
“proteção”, “alimento” dos espíritos, “obrigação”, “comida” dos Exus, “energia” e
“pagamento”. Já a utilização de frangos, cabritos, cabras, ovelhas e, em alguns casos, bois é
comum em todos os terreiros. Todos utilizam esses animais na hora das “matanças para os
Exus”.
Para a Umbanda em Viçosa, “com Exu não se brinca”. Não só os cânticos ou toadas
dos Exus evocam isto, mas os próprios discursos dos líderes e filhos de santo. Os discursos
legitimam o poder de cobrança e de punição de Exu aos filhos de santo relapsos. As oferendas
ou obrigações devem ser cumpridas à risca, pois os Exus são bons para os que são bons com
eles. Caso contrário, cobrarão sem pestanejar aos filhos de santo relapsos. Ficou claro que Exu
não hesita em cobrar suas obrigações, por isso “quem deve a Exu pague logo”. Uma Mãe de
santo diz que uma filha de santo morreu embriagada por Exu Tiriri. Ela desrespeitou o terreiro
e não deu crédito às palavras de Exu Tiriri. Ele baixou fazendo-a ingerir bebida alcoólica até
vir a óbito. Quando estas experiências são sistematizadas, aparecem as razões para o fiel
cumprimento das “dívidas espirituais”: barganha espiritual, temor, respeito e, principalmente,
poder mágico encorajador e vitalizador. Um Pai de santo diz que se não pagar o que foi
prometido, Exu “não deixará a pessoa sossegada, vai insistir até a pessoa pagar as
obrigações. Será um maltrato muito grande na pessoa. Fica aquela voz nos ouvidos cobrando
da pessoa”.
Tais discursos fazem lembrar que toda experiência religiosa é crença – fé – e não
conhecimento adquirido; está presente no humano que tem a intuição do divino. Constata-se
que um grande número de preceitos acompanha a Umbanda em Viçosa, dentre eles, as
oferendas-rituais. Entende-se que todas as obrigações, oferendas e despachos servem de
comunicação ou meios pelos quais as entidades espirituais tornam-se dispostas a retribuir
aquilo que estão recebendo. Entende-se ainda que a benevolência dos espíritos só ocorrerá se o
filho/a de santo for cuidadoso com suas dívidas espirituais, caso contrário, seu relaxamento o
conduzirá a inúmeras desgraças e infelicidades, conforme se verá a seguir de maneira mais
detalhada.
5.5 “Não cumpriu, Exu dá coro”
Os Exus são os espíritos mais requerentes de obediência. Isto significa dizer que a
chamada “linha de esquerda” da Umbanda sobressai a dos Orixás – comumente chamada de
“linha dos santos”. A Umbanda em Viçosa convencionou atribuir à “linha” dos Exus e
105
Pombagiras ações perniciosas e de maior subordinação religiosa de seus “cavalos”. Em sua
maioria, os umbandistas reconhecem as exigências e, por sua vez, rapidez dos Exus no que
tange aos cumprimentos das suas obrigações. Desse modo, a relação com os Exus torna-se
mais austera e temerosa. Em um dos “toques” de Exu, um episódio ocorrido com Seu Zé
Pelintra chama a atenção. Seu Zé Pelintra joga os búzios e conversa seriamente com os filhos
de santo. Em dado momento, uma filha de santo, Mãe Pequena do terreiro, começa a rir
discretamente conversando com outra filha de santo. Zé Pelintra se irrita e pergunta por que ela
estava rindo. A Mãe Pequena diz timidamente que se trata de outra coisa e que não possui
nenhuma ligação com o momento. Zé Pelintra exclama bem forte: “você quer que eu faça você
parar de rir agora mesmo?”. A filha de santo diz: “não precisa Padrinho, pois já tenho
apanhado um bocado”.
Um Pai de santo conversando, relatou um caso que aconteceu com ele mesmo acerca
de um garrote que Exu da Meia Noite solicitou (uma obrigação) e, que passados mais de dois
anos, ele não cumpriu. Certo dia, ele estava em sua bicicleta e foi jogado subitamente debaixo
de um carro por algo inexplicável. Como causa desse trágico acidente, foi hospitalizado,
passando um ano internado e mais quatro anos andando de muletas. Foram cinco anos de
sofrimento por causa desse garrote não ofertado ao Exu. Quando o Pai de santo cumpriu seu
dever, as coisas foram resolvidas. “Exu fez isso comigo mesmo”.
“Eu já vi filho/a de santo jogado na linha do trem, caiu de um barranco e morreu na
hora porque brincou com Eles. Não se pode brincar não, tem que ter respeito por Eles que
Eles terão respeito por nós”. “Eu conheço uma filha de santo que morreu porque deixou pra
lá as obrigações, relaxou e aí já viu”. A relação é de inteira responsabilidade e temor, pois os
espíritos precisam ser temidos e respeitados. Percebe-se também que os filhos de santo confiam
piamente na ação dos Exus. Toda sorte de malefícios acontece por não cumprir com as
obrigações exigidas pelos espíritos. “Estou levando um coro desde o ano passado e eu sei que
são Eles que estão me dando esse coro. Estou doente de mais, é porque eu não estou
cumprindo com o dever Deles, depois que eu adoeci minhas coisas estão todas abandonadas.
Não tive mais disposição pra nada”. “Minha tia já ficou em cima de uma cama porque não
cumpriu com as obrigações Deles. Eles pedem e a gente tem que dar comida pra eles”.
“Conheço um caso que teve uma filha de santo que negou um galo ao Exu dela, ela zombou do
compadre Zé Pelintra, aí depois de quinze dias deu um negócio nela que ela caiu no chão,
ficando internada por vários dias, sem poder comer nada. Não teve jeito, morreu mesmo. Isto
106
se deveu por ter mexido com o seu espírito. Com o invisível não se pode mexer”. A
transposição entre “cavalo” e entidade/espírito é visível nesse processo relacional.
Muitos são os casos nos quais relapsos foram punidos e até mortos pelos espíritos.
“Se não cumprir com as obrigações, apanha mesmo. Eu mesmo já tive doença, Eles já me
deixaram em cima de uma cama, porque Eles queriam as coisas e às vezes eu não dava pra
Eles”. “Eu conheço muita gente que já passou por situações difíceis. Meu sobrinho mesmo já
passou por uma situação muito difícil, caiu na cama e se ele não se consertasse com Eles, já
viu, morria na hora”; “já apanhei muito Deles, estava grávida e perdi o filho. Quase morri, só
vivia sofrendo com uma dor no peito e os médicos nunca descobriam a causa. Aí quando eu
dei tudo o que Eles precisavam, aí fiquei boa de repente”. “Um Pai de santo que foi passado,
morreu porque negou obrigação. Só vivia fazendo coisa errada, não cumprindo suas
obrigações. Antes de morrer, Eles deram coro nele, o fizeram sofrer mesmo”. Eu mesmo já fui
cobrada várias vezes por Exu Caveira. Ele já me pegou pra valer. Ele é fogo, é pesado. Só
faltou eu quebrar a minha cabeça de tanta dor”; “aconteceu um caso comigo que eu adoeci e
não vi mais nada, quebrei tudo dentro de casa, me separei do meu marido e fiquei
desacordada por horas, só fui acordar no terreiro. O caso é sério, não se deve brincar com
Eles não, eu tenho medo Deles por causa dessas coisas. Eu estava levando coro Deles, cheguei
a pesar trinta quilos, estava só a carne e osso. Aí quando eu fui para o terreiro, a Mãe de
santo disse através da Pombagira que eu tinha que fazer os despachos e cortar tudo o que Ela
estava me pedindo”.
A vida religiosa está marcada por um profundo sentimento de temor e respeito às
forças consideradas pelos terreiros “invisíveis” e bastante rígidas. Neste sentido, todas essas
entidades cultuadas são inexoravelmente infligidoras conforme se observa. Os espíritos não se
deixam titubear nesse processo de troca entre o material e o imaterial. “Teve um tempo que eu
quase morria, quase que eu ficava doida. Todo mundo aqui em casa se viu doido comigo,
ficamos no fundo do poço, aí graças a minha Mãe de santo e Deus primeiramente, me curou
no terreiro. Recentemente recebi uma repreensão. Em breve darei comida pra Ele, é um Exu,
tenho que cortar pra Ele logo, pode demorar não, Eles estão vendo tudo da gente”; “teve uma
vez que eu estava tirando lenha na mata aí o Exu Garrancho me jogou num buraco e aí caí
feio. Lá dentro fiquei agoniada, quase que morria com um fecho de lenha na cabeça, foi Ele
que fez isso”. “A minha sogra começou a adoecer e os médicos não davam um diagnóstico.
Passaram-se três meses de internação. Ela teve que cortar pra Eles, caso contrário nunca iria
ficar boa”. Os espíritos não hesitam na cobrança e, consequentemente, na punição do/a filho/a
107
negligente. “Uma filha de santo perdeu tudo, ficando de esmola. O motivo foi por ter
desprezado Eles. Se procurar Eles e depois abandoná-los, aí já viu, não funciona”; “tinha
uma terra grande aqui perto, perdeu tudo. Ele se divorciou, estava no fundo do poço mesmo.
Aí ele recorreu a Exu Bagaceira que baixou e disse que iria trazer sua esposa de volta, mas
para isso queria um bode como oferenda. Exu Bagaceira trouxe sua esposa de volta, melhorou
sua vida. Depois de tudo, ele disse que não estava se importando com Ele, vivia debochando
Dele, desacreditando dos seus feitos. Não teve outra, um dia ele estava sentado à mesa e de
repente começou a esfaquear sua esposa e depois a seu próprio corpo. Muito ferido acabou
morrendo”.
Tais relatos descrevem parcialmente os pontos de vista dos umbandistas com relação
ao “coro” dos Exus. “Eu já passei por uma situação na qual eu sofri um acidente de carro,
quase morri. Isto foi porque eu deixei de cumprir com as obrigações Deles, quando eles pedem
a gente tem que pagar certo, caso contrário, Eles maltratam mesmo”. A cobrança não vem
apenas dos espíritos da chamada linha de esquerda, mas também dos Orixás, dos chamados
santos. “Os Orixás são piores do que os Exus, porque os Orixás dominam os Exus. Iemanjá,
por exemplo, dá uma barriga d’água na pessoa deixando-a crescer pra saber que ela tem
força”. Torna-se possível perceber a interveniência direta dos espíritos na vida dos seus
“cavalos”, principalmente nos representantes dos terreiros pesquisados. Encontra-se também a
relação de temor e explícito reconhecimento da capacidade de ação dessas forças espirituais.
“Eu mesmo já fiquei em cima de uma cadeira de roda, sofri pra danado. Os espíritos pedem
obrigação e nós devemos cumprir, Eles querem comida. Os Exus são mais forte do que os
Orixás, são mais pesados, maltratam mais. A derrubada do Exu é pior, enquanto não cumprir
com suas obrigações, Eles não param de cobrar, eu sou uma prova disso”; “uma filha de
santo morreu afogada com a cara numa poça de água porque ela vivia zombando dos
espíritos. Ela dizia que esse negócio de manifestação era fingimento. Ela acabou caindo no
mundão, saiu do terreiro e passou a falar mal os espíritos. Veio um Exu, baixou nela e
derrubando-a numa poça de água na beira do rio ela ficou sem respirar e morreu na hora”.
Os espíritos merecem cuidado especial a fim de que suas lembranças permaneçam
sempre vivas na memória coletiva. Em troca das oferendas, eles enviam proteção, ajuda,
determinações, conselhos e principalmente, identidade coletiva aos seus descendentes
humanos, representados nos chamados “filhos de santo” ou “povo de santo”, expressão
genérica que se refere à macrovisão do conjunto de várias formas de cultos aos Orixás e aos
Exus. As oferendas e sacrifícios são necessários para manter o poder, o potencial, a força
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sagrada das divindades, ou seja, o “axé dos deuses”. A força dos espíritos é revitalizada
periodicamente através das oferendas e sacrifícios que, regados pelas cantigas e danças,
evocam as entidades por meio da linguagem gestual, recordam fatos e proezas do ancestral
divinizado. As obrigações, além de seu caráter votivo, estavam envoltas em uma aura de
mistério e imbuídas de comunicação entre os viventes e espíritos cultuados.
5.6 “Saravá aos Exus”: panorama dos rituais estudados
Antes de iniciar a celebração, são postas velas acesas no centro do salão, com um caco
de barro no qual os filhos de santo vêm depositar suas ofertas, com gestos de reverência e
singular respeito aos Exus e ao zelador/a da casa. Os gestos de saudação com os braços
cruzados rapidamente na altura do ombro e das coxas, ajoelhando-se e beijando o chão, como
sinal de submissão às forças sobrenaturais, marcam os preparativos para a abertura das
celebrações. Cada filho/a de santo chega mais cedo para se vestir, ajudar na limpeza do salão e
acertar os mínimos detalhes que vão da afinação dos ingomes às velas acesas no congá. Cada
serviço é realizado com bastante cuidado. O limpar das taças que irão servir as Pombagiras, a
organização dos chapéus que irão compor as indumentárias dos Exus, bem como os cordões
(guias) distribuídos em cada pescoço. O filho/a de santo chega bem perfumado e bem vestido
alguns trazendo seus familiares ou amigos, sorridentes e demonstrando alegria e prazer em
estar ali naquele local, saudando a todos os presentes, cumprimentando individualmente a cada
filho de santo e, principalmente, o seu Pai ou Mãe de santo.
O salão limpo e perfumado é preparado para receber a todos e a todas sem distinção,
inclusive filhos/as de santo de outros terreiros. É comum encontrar filhos/as de santos de outros
terreiros viçosenses e até de Maceió. Parentes, amigos, consulentes, pais e mães com seus
filhos visitam as celebrações para prestigiarem a festa. As cores fortes, vermelha e preta,
representando vitalidade, beleza e vida colorem os salões com suas bandeiras, cortinas e
camisas, principalmente, com os longos e belos vestidos das filhas de santo, bem maquiadas e
com os seus cabelos soltos. Há filha de santo que confecciona o seu vestido para aquela
ocasião importante. Houve filho de santo que mesmo doente não hesitou em vir ao salão
prestigiar os Exus. Consulentes também chegam ao salão trazendo suas ofertas como garrafas
de espumante, latas de cerveja, vinho e cigarros. Enquanto isso, vizinhos se mantém atentos
para a movimentação do entra e sai do terreiro. Curiosos ficam na porta com os olhos fitos no
momento do transe de possessão. Alguns vêm apenas para beber e fumar e bater papo com
amigos e, em alguns casos, paquerar as jovens filhas de santo.
109
A “gira” é formada de modo circular com os/as filhos/as de santo organizados e atentos
à abertura pelo Pai ou mãe de santo que com um sininho agitando na mão chama a todos para o
ato de abertura da “gira de Umbanda”. Começa com uma louvação aos Exus, os quais vão
baixando no salão mediante os pontos cantados. Cada ponto cantado chama um tipo de Exu
que gradativamente vai baixando em seus “cavalos” e ocupando o centro do salão: “arreia
Exu, quero ver cair, arreia Exu, quero ver cair”. O Pai de santo exclama: “saravá a todos os
Exus”, os filhos de santo respondem batendo palmas para o alto. A partir daí, inicia-se o
“toque” de Exu com o seguinte ponto cantado: “o sino da igrejinha faz delem delem, é meia
noite o galo já cantou, Seu Tranca Rua é dono da gira cuidar da gira, que Ogum mandou”.
Neste momento, os/as filhos de santo ficam apenas cantando enquanto o Pai de santo continua
puxando os pontos com o sininho na mão. Os ingomeiros começam a tocar entusiasmados de
maneira envolvente e empolgante. Pontos em dialetos africanos também são entoados. O Pai de
santo ocupando o centro do salão diz novamente “saravá os Exus” e começa a cantar: “os Exus
vão chegar no ilê, eu quero ver quem é? São cerca de quatro pontos cantados para o início da
“gira” propriamente dita. Em seguida todos os/as filhos/as de santo começam a dançar em
forma de círculo cantando forte invocando os Exus.
O transe de possessão vai acontecendo, os/as filhos/as de santo batem palmas sem
perder o ritmo envolvente. Os Exus ocupam o centro e, imediatamente, são servidos por uma
bebida e cigarro. A Mãe pequena, sempre prestativa, com uma toalha na mão atenta para
enxugar o suor no rosto do/a filho/a de santo incorporado, traz os adereços de Exu como guias
e chapéus. Exu bebe, dança, canta, se diverte, saúda a todos os presentes com um abraço
carinhoso, não se incomodando com as filmagens e fotografias. Os visitantes ficam atentos
observando a festa. A Mãe Pequena serve aos visitantes, cerveja e água gelada, alguns
começam a dançar e cantar alguns refrãos. Os ingomeiros não cansam de tocar a cada toada o
ritmo continua mais acelerado e envolvente. A primeira parte da “gira” é para chamar aos
Exus podendo durar umas duas horas. Já a outra parte destina-se a invocar as Pombagiras que
também fazem a festa não perder o seu ritmo mágico. Mais de duas dezenas de Exus e
Pombagiras são baixadas na “gira”, os quais se dirigem até o altar prestando reverência e
respeito às outras entidades. Alguns Exus demoram mais no transe, outros vão embora logo.
Alguns consulentes presentes recebem atendimento dos Exus e Pombagiras no cantinho
do salão ou em outros cômodos da casa. Outros levam suas ofertas a sua Pombagira ou a seu
Exu, os quais recebendo um abraço saem dali confiantes no que lhes foram prometidos. As
“giras” geralmente começam às 19:00 e vão até às 22:00, mas existem casos em que
110
começaram às 15:h00 indo até às 20:00. No momento dedicado às Pombagiras, a festa ganha
mais beleza e brilho. Os seus cabelos soltos abanando, com uma mão segurando a ponta do
vestido e a outra na cintura como se estivesse quebrada. No centro do salão gira sem perder o
equilíbrio e sem perder o ritmo. Suas gargalhadas e deslocamento do corpo para trás até
encostar-se ao chão anunciam sua chegada e festança. Requebrando percorrem o terreiro
transmitindo liberdade e muita alegria. As taças que lhes servem cerveja, espumante e vinho
são diferenciadas, só reforçando a beleza mágica da Pombagira com seus gestos afetuosos:
“olha as ondas do mar me enrolando, Pombagira da praia dá sua risada, Ela é bonita e
formosa estava trabalhando na encruzlihada”. Outro ponto dizia assim: “Oh Cigana o teu
vestido é de ouro, oh Cigana a tua sandália é de prata, saravá oh, saravá oh”. Após horas de
muita dança, transe de possessão e pontos cantados, a “gira” chega ao fim. Nos bastidores,
muita conversa, sinal nos rostos de cansaço, mas com aquela sensação de mais um dever
cumprido. Alguns filhos de santo vão para casa outros ficam conversando até tarde dentro do
salão.
Diferenças e semelhanças das celebrações distribuem-se nos rituais praticados em cada
terreiro. Cada terreiro é singular e cada Pai ou Mãe de santo possui características próprias de
culto como vestimentas, elementos mágicos, invocações, danças, sacrifícios, louvações e
diferentes adereços nas casas de culto. Nos terreiros há a reprodução de uma relação familiar,
cultural e social, revivendo aspectos puramente culturais como o compadrio, numa espécie de
empreendimento familiar: padrinho, madrinha, filho/a, pai e mãe. Geralmente, os filhos/as de
santo desses terreiros tratam seus Pais e Mães de santo como padrinhos e madrinhas ou pai e
mãe espirituais, sempre os saudando com um abraço carinhoso e gestos de total respeito e
reconhecimento espiritual. Essa liderança também dá consulta na casa dos/as filhos/as de santo
e clientela que procura ajuda nos terreiros. A hospitalidade nos terreiros é ímpar acolhendo a
todos sem distinção, pessoas pobres, negras, homossexuais, prostitutas, jovens, crianças,
senhores e senhoras sem nenhum tipo de acepção. Afetividade, solidariedade e respeito pelo
outro foram identificados ali.
Dos rituais de “Mesa Branca”– Caboclos, Pretos Velhos e Mestres de Jurema, a
abertura de passagem para Exu e Pombagira – às reuniões nas matas e no quarto escuro e
cultos organizados públicos e privados, Exu recebe diferentes nomenclaturas. Durante o transe
de possessão, por exemplo, em um dos “toques”, foi perguntado a seis Exus “baixados” nos
terreiros: o que ele poderia fazer com uma pessoa que não cumprisse com suas
obrigações? Eles responderam: “eu bebo o sangue dele, jogo debaixo de um carro, mato e
111
bebo o sangue. Quando a pessoa está errada diante dos meus pés, aí eu faço isso mesmo, eu
bebo o sangue como eu bebo cachaça porque eu sou morcego de satanás” (Exu Bagaceira);
“filho da peste, eu mato, quero comida sempre, um dia eu matarei ele” (Exu Corre Campo);
“se ele chegar até mim, o que eu puder fazer com ele eu faço, se não, ele verá o que é bom pra
tosse, porque eu sou filho daquele homem lá de baixo, o qual as pessoas chamam de Cão,
Diabo, Satã” (Exu Sete Catacumbas); “eu jogo debaixo de um trem, jogo debaixo de um
carro, faço cair de cima de um cavalo, ele se quebrará todo” (Exu Tirirí); “as forças daqui
podem fazer tudo, por isso não se deve brincar com nós. Desse lado não, destrói, mata, quebra
perna e braço, dor de cabeça pra endoidar as coisas” (Exu Caveira) e “joga no chão para se
quebrar toda, aí ela sentirá o aperto do braço de Marabô, Marabô correrá direitinho com um
apertinho de leve” (Exu Marabô).
Os exemplos acima talvez legitimem o estigma de Exu como sendo um agente do mal
ou sinônimo do diabo no universo mítico da Umbanda. Isto significa dizer que esses Exus,
possivelmente sejam os considerados “da parte infernal”. Em Viçosa, Exu possui múltiplas
faces ou múltiplos personagens que vão de Lúcifer a Cavaleiro dos Orixás. Pelo menos foram
identificadas vinte e cinco dessas faces nos vinte e um terreiros: cavaleiro dos Orixás, dos
santos e dos Pretos Velhos, mensageiro e agregado dos Orixás e Pretos Velhos, empregado dos
Pretos Velhos e dos santos, escravo dos santos, da parte do diabo, lúcifer, satanás, maioral, dos
demônios, da parte do demônio, da parte da magia negra, da parte das trevas, da parte do
Belzebu, do lado esquerdo, espírito mal, afastado de Deus, vento da encruzas, pessoa que já
morreu, anjo caído, carniceiro, espírito que vive vagando no mundo, guardião das casas,
protetor, espírito pesado, infernal, bom e mau, invisível, macho das Pombagiras e como sendo
da parte baixa da terra.
Foi comum identificar uma espécie de pausa, silêncio ou gaguejar da liderança ao
serem perguntados sobre os espíritos da “linha de esquerda”. É como se falar em Exu fosse
algo temeroso, amedrontador e, principalmente, duvidoso. Eles sabem do que estão falando.
Pensar sobre Exu provoca dúvidas, receio, curto silêncio nos depoentes. Uma Mãe de santo
antes de começar a falar sobre os Exus faz o sinal com mão em direção ao congá e depois,
beijando-a, respirando forte, começa a conversar. Em outra ocasião diante da “matança pra
Exu” um Pai de santo põe a mão sobre a cabeça de uma filha de santo ajoelhada incorporada
por um Exu e diz: “esse é infernal, é pesado todo”. Exu poderá ser interpretado de diferentes
formas e de diferentes atitudes.
112
Tudo isso prova a capacidade de horizontes abertos para se pensar este personagem,
ou melhor, este mosaico mítico “pintado” por diferentes cores e diversos “pintores”. O
contexto acima mostrou muito bem isto. A nítida influência da teologia cristã em linguagem de
alguns dos umbandistas é fato, tais como: “Afastado de Deus”, “Anjo caído”, “Da parte do
Belzebu”, “Espírito mal”, “Da parte do Diabo, Lúcifer, Satanás, Maioral, dos demônios”,
“Da parte do demônio” e “infernal”. Nota-se também a relação direta com o catolicismo ao
afirmarem serem os Exus os “escravos” e “cavaleiros” dos santos. É sabido que na Umbanda
o peji está representado pelos Orixás, Caboclos, Pretos Velhos e Mestres, uma alusão clara ao
sincretismo religioso ou como eles chamam de “linha da direita”, “linha da Jurema” ou
“linha dos santos”. Passa-se a entender que a dicotomização da Umbanda em separar Orixás e
Exus – Bem e Mal – conduz à interpretação de que os Exus e Pombagiras, na verdade,
encarnam miticamente a realidade social desses grupos excluídos pela sorte, estigmatizados e
marginalizados pela sociedade. Ele passa a ser ressignificado, reinterpretado, reaproximado e
revivido por essas comunidades. A Umbanda também ficou dividida entre os mensageiros de
Deus e do Diabo.
As atribuições às fontes impessoais, mais que pessoais, bem como situações, talvez de
alto estresse psicológico, casualidade ou características novas através dos símbolos religiosos,
representam muito bem a linguagem religiosa legitimada e adotada pela religião. Há desse
modo, uma naturalização, aceitação e valorização desses iminentes ataques espirituais
revividos na conduta diária dos umbandistas viçosenses. A ênfase nos casos ocorridos narrados
por eles servem como fulcro de uma relação de interdependência entre espíritos e filhos/as de
santos. Diante das evidências expostas, é possível partir da premissa de que os “sofrimentos”
advindos desses espíritos legitimam suas ações e influências no mundo material, bem como na
vida religiosa do cosmo religioso umbandista. Constatam-se as punições concebidas pelos
espíritos como “cobrança” no “cavalo de santo”, tornam-se a possibilidade de abertura de um
canal de comunicação com os seres “invisíveis”, permanente e duradouro. Ancorado nesse
canal de comunicação entre espíritos e filhos/as de santo ou na linguagem construída em torno
desse processo relacional, passa-se a entender que este fator de comunicação ou linguagem
religiosa presente nesta relação torna-se facilmente manipulável.
As perturbações sempre são interpretadas como interferências espirituais e
inexplicáveis à medicina comum. Os espíritos obsessores, causadores das perturbações só são
retirados no interior do terreiro. Sob esse aspecto, deduz-se que as sensações mórbidas,
definidas usualmente pela medicina como doença, além de solapadas são transformadas,
113
através do discurso religioso, em indicadores de outra ordem, neste caso, de ordem “espiritual”.
Embora relegados às esferas da esquerda da espiritualidade umbandista, esses espíritos são
bastante respeitados e valorizados nos rituais. As esferas inibem e, por sua vez, impulsionam
esses filhos/as de santo ao cumprimento imediato das obrigações exigidas. Esses espíritos
considerados da “linha de esquerda” da Umbanda constituem-se numa espécie de “retrato”
social; “descrição condensada” da realidade e condições de vida desses filhos/as de santo às
margens da sociedade viçosense. Desse modo, torna-se possível pensar cada espírito na
Umbanda como sendo um arquétipo, o qual informa e fornece aos filhos/as de santo, padrões
temperamentais e comportamentais. Há um vínculo religioso piramidal em que o divino ou
sobrenatural sobrepõe o material ou, melhor dizendo, o visível.
Trata-se de uma relação de extrema reverência e respeito às forças consideradas por
eles de “sobrenaturais”, “invisíveis”, “do além” ou conforme todos explicitam: “do invisível”.
Os espíritos descem nas “giras” incorporando-se nos filhos/as de santo, principalmente nos
Pais e Mães de santo, onde são invocados e despedidos através dos seus cantos ou toadas, ao
som dos seus atabaques e palmas bem ritmadas. Os Pais e Mães de santo incorporados dirigem
as celebrações, sãos as autoridades máximas, respeitados e venerados dentro e fora dos
terreiros. Os Exus e Caboclos, a exemplo do Caboclo Boiadeiro, representantes da brasilidade
umbandista, descem para serem homenageados, incorporando-se e dançando, recebendo a
importância que lhes é atribuída historicamente. Os espíritos na Umbanda encontram-se
próximos do mundo material, com afinidade, próximos dos filhos/as de santo, com suas
aflições e incertezas, representando a condição social desses indivíduos. A relação com o
mundo material está explícita na ligação com a regionalidade, com o modo de pensar suas
entidades, suas personificações e atuação direta no cotidiano dos terreiros. Os “toques”,
costumes e rituais religiosos, dentre eles, o uso de instrumentos, o transe de possessão e as
louvações, bem como as vestimentas com suas cores representando divindades do antigo
panteão africano permeiam singularmente os rituais estudados. Reconstituem uma experiência
real retratada em suas experiências e idiossincrasias com esses espíritos com várias moradas.
Se a natureza de Exu é indefinida nos terreiros, sua morada também não é diferente. Exu pode
morar em determinados lugares ou em lugar nenhum.
Quanto à imagem feminina de Exu, também foram identificadas na Umbanda em
Viçosa pelos menos vinte e cinco faces construídas da Pombagira – Exu feminino: mulher de
sete maridos, mulher da Rua, rapariga, prostituta, mulher da vida, rainha do inferno (Maria
Padilha), mulher de Exu, mulher de lúcifer (Maria Padilha), da parte infernal, do invisível,
114
mulher de cabaré, cavaleira de Exu, da parte diabólica, da perdição, amor, paixão ardente,
espírito sedutor, boa e má, Exu mulher, espírito das encruzas, da esquerda, falsa, perigosa,
malvada, mulher que morreu e a dama da noite. Uma jovem acabara de ter saído de um
relacionamento que durou mais de cinco anos e não aceitava em hipótese alguma o término,
por esse motivo resolveu buscar ajuda às Pombagiras. Ela acabou se iniciando, participou de
muitos rituais e oferendas à Pombagira com o intuito de trazer seu amor de volta. Atualmente,
ela não está mais frequentando regularmente os cultos, mas continua admirando a Umbanda.
Não se teve notícias se a Pombagira atendeu o seu pedido, mas ficou visível a busca pelos
serviços mágicos nos terreiros em Viçosa. A imagem feminina de Exu ou o “Exu mulher”,
como muitos chamam, atua diretamente na vida dos filhos de santo recebendo diferentes
nomes. À semelhança do “Exu homem”, o “Exu mulher” também é identificado com as forças
infernais ou diabólicas. Ela vai de “Dama da noite” a “Mulher de Lúcifer”.
O “Exu mulher” divide opinião entre os líderes quanto ao transe de possessão. Parte da
liderança diz que a Pombagira “não baixa em heterossexual, só em homossexual e mulher” e,
outra, diz que “baixa sim em heterossexual também”. Nos “toques” o número de
homossexuais é significativo, inclusive dois líderes são transexuais e cerca de quatro são
homossexuais assumidos. Em um dos “toques” um filho/a de santo homossexual incorporado
por um Exu olha para outro filho/a de santo homossexual incorporado por uma Pombagira
sambando miúdo, acena com a cabeça e diz: “aí não! Aí eu não gosto disso não”. A
moralidade cristã permeia o imaginário mítico dos terreiros. A imagem feminina de Exu
também divide opinião interna. Ela pode ser “do amor, da paixão ardente”, mas também
“perigosa”, “malvada” e da “perdição”. Estereótipos ou estigmas imaginados de uma
categoria de espíritos bastante polêmica e produtora de pontos de vista diferenciados existem
ali. A Umbanda também ficou dividida entre a liberdade sexual e o “casamento” com Lúcifer.
O presente capítulo procurou compreender uma avaliação das regras e valores que
reafirmam a presença do “Exu malfazejo”, que pode vir a atuar como Exu benfazejo”, das suas
forças mágicas nos/as filhos/as de santo em seu cotidiano. É importante elucidar que a inserção
em grupo de Umbanda gera compromissos, tanto no âmbito individual, quanto no social.
Existem tarefas religiosas descritas pelos grupos que precisam, de maneira individual, ser
cumpridas à risca, no caso, as chamadas “matanças” ou “cortes” pra Exu. Essas tarefas são
dedicadas a Ele e às comunidades ou famílias de santo locais. Com efeito, a construção da
imagem de Exu nos terreiros tem sentido a partir da rede social e religiosa que a compartilha.
Nesta perspectiva, procurou-se identificar as múltiplas faces de Exu e sua relação com a
115
imagem do Diabo dos cristãos na constituinte da realidade pessoal e coletiva do processo
religioso entre a chamada “linha de esquerda” e a diversidade de Exus existentes em seu
panteão. A partir deste ponto o trabalho se dirigirá para as considerações finais.
116
6
CONCLUSÃO
a reconstrução afro-religiosa no Brasil compreende
elementos muito importantes para serem decifrados, o que
implicaria também o abandono de visões empobrecidas
das complexas relações étnicossociais nos quase cinco
séculos de existência de nossa sociedade
(BARBOSA, p. 1, 1998).
O Censo do IBGE de 2010 sobre as religiões no Brasil, divulgado apenas no final de
junho de 2012, apesar de seus limites, apresenta dados considerados importantes para se
compreenderem as tendências do campo religioso brasileiro (TEIXEIRA; MENEZEZ, 2013, p.
17-35). Ficaram explícitas as dificuldades de detectar a real presença da Umbanda e do
Candomblé no Brasil. Fica evidente também, partindo do Censo de 2010, a forte tendência dos
adeptos das religiões afro-brasileiras camuflarem sua identidade, conforme apontam alguns
autores (TEIXEIRA; MENEZES, 2013, p. 29; PRANDI, 2013, p. 203-218; DUCCINI;
RABELO, 2013, p. 219-234). O Censo das religiões no município de Viçosa também apresenta
a dificuldade detectada em âmbito nacional por diversos especialistas. (TEIXEIRA;
MENEZES, 2013). Em 2010, nenhum viçosense se declarou umbandista ou candomblecista.
De acordo com esses dados não existiria nenhum/a seguidor/a das religiões afro-alagoanas em
Viçosa, interior do Estado.66
Isto talvez possa encontrar algumas explicações com base nos autores, Teixeira e
Menezes (2013), Prandi (2013), Duccini; Rabelo (2013) e, sobretudo, no campo de pesquisa.
No século XIX, na Bahia, em Alagoas e no Sudeste do País, o catolicismo romano como base
de legitimidade social e única oficial no país, tanto para o negro quanto para o escravo liberto
era indispensável para o cidadão brasileiro. Declarar-se católico apostólico romano era
legitimar-se socialmente. Esses negros e escravos libertos diziam-se e/ou sentiam-se católicos,
comportando-se como tais na sociedade. Frequentavam os cultos de seus ancestrais e as missas.
Mesmo com o advento da República, quando o catolicismo romano deixou de ser a única
religião oficial e de legitimidade social, esses adeptos dos rituais de seus ancestrais,
continuaram se autodeclarando e se sentindo católicos romanos. Escreve Prandi: “até hoje o
catolicismo é uma máscara usada por setores das religiões afro-brasileiras, máscara que as
esconde igualmente dos recenseamentos” (PRANDI, 2013, p. 205).
66
Censo
IBGE
2010.
Cidades:
Amostra
de
religião.
Dados
<http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1 >. Acesso em: 31. jun de 2014.
disponíveis
em:
117
Infere-se o fato de a Umbanda, desde o seu nascedouro, estar ligada ao espiritismo
Kardecista, chegado da França no final do século XIX. Com a formação da Umbanda no início
do século XX, a mesma passara a ser chamada de “espiritismo de umbanda”, só mais tarde de
Umbanda. Durante décadas no século XX, a Umbanda foi chamada de “baixo espiritismo” para
diferenciá-la do espiritismo Kardecista que a combatia com o mesmo zelo dos cristãos
católicos. Era problemático quantificar seus seguidores. Pode-se buscar explicação também nas
rubricas: “católico” e “espírita” que boa parte dos afro-brasileiros utiliza para se “esconder”. O
campo de pesquisa mostrou isso.
Outra explicação, talvez o “clima de liberdade religiosa” que o país goza atualmente e,
mais, o aumento do nível de conscientização resultante dos movimentos das religiões afrobrasileiras não tenham sido suficientes para resolver a questão de identidade dos afrobrasileiros que ainda permanece mal definida. Talvez o próprio declínio da Umbanda nos
últimos vinte e quatro anos, desde 1991 quando se passou a ter estatísticas separadas no Censo
na categoria “religiões afro-brasileiras”, colocando a Umbanda de um lado e o Candomblé de
outro, contribuiu para a perda da Umbanda. Pode-se inferir também pela falta de metodologia
mais acurada na indicação desses seguidores ou por falha na elaboração do questionário. Devese permitir comparações ao longo do tempo, bem como as tendências no interior complexo
dessas religiões (TEIXEIRA; MENEZES, 2013, p. 29; PRANDI, 2013, p. 203-218; DUCCINI;
RABELO, 2013, p. 219-234).
Talvez, o fato de o Candomblé e a Umbanda serem religiões especialmente tolerantes
com relação aos outros credos contribua para este quadro. O campo de pesquisa mostrou que a
Umbanda aceita outras religiões, inclusive, ampliando cada vez mais os limites do seu
sincretismo e assimilando valores e práticas adicionando-os ao seu panteão. Possivelmente, o
surgimento das igrejas de massa, o pós-pentecostalismo – a partir das décadas de 1960 e 1970,
se tornando inimigo implacável dos cultos afro-brasileiros – e sua atual ascensão no universo
televisivo nos últimos anos, possa ser outra explicação para a não declaração no Censo de parte
dos adeptos das religiões afro-brasileiras. Conforme o Censo 201067, a população religiosa de
Viçosa apresenta o seguinte quadro: 21.230 católicos; 1.803 evangélicos; 1.937 de outras
religiões – não especificam quais; 131 de outras religiosidades – também não especificadas - e
82 espíritas – o que abre um leque de possibilidades de umbandistas estarem inclusos nesta
categoria.
67
Censo IBGE 2010. Dados disponíveis em: <http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1 >. Acesso em:
31. jun de 2014.
118
Constatou-se o seguinte nos discursos das lideranças umbandistas: (a) sou católico/a –
minha primeira religião; (b) sou espírita; (c) sou católico/a e umbandista; (d) sou do
Candomblé; (e) sou católico; (f) sou filho/a de seita; (g) sou do xangô; (h) sou de uma religião
diferente e (i) não gosto de dizer não. Vale lembrar que parte dessa liderança viaja para as
romarias do Juazeiro do Norte, no Ceará, frequentou igreja evangélica, frequentou as missas
dominicais, batizou seus filhos e netos e se casou na igreja católica; é padrinho ou madrinha de
afilhados batizados e casados na igreja, participa das festividades cristãs na cidade; se
autodeclara “filho/a de seita”, parte de seus familiares é católica ou evangélica praticante; parte
não costuma falar que é da Umbanda.
Somando-se as possíveis explicações para este fenômeno e os dados disponíveis às
concepções da própria liderança umbandista em Viçosa, tem-se a seguinte premissa: os adeptos
da Umbanda viçosense, talvez, tenham se declarado católicos romanos, espíritas ou de outras
religiosidades e religiões. Tudo leva a compreender que as influências externas: como a
religião hegemônica e a concepção estigmatizada da sociedade acerca da modalidade religiosa,
bem como as influências internas: como os discursos imbuídos de dualidades, medo ou a
vergonha da identificação religiosa, talvez contribua para a invisibilidade histórica da religião
num município centenário como este.
E como contribuição a essa invisibilidade histórica, tem-se também a escola dos
intelectuais viçosenses que chegou a comportar mais de quarenta jornais circulando em todo o
Estado por décadas, nunca fez sequer menção à religião. Obviamente, o objetivo aqui não é
comparar o número de adeptos da Umbanda com o número de católicos e evangélicos – escapa
do aspecto quantitativo –, mas apenas identificar o papel importante que esta modalidade
religiosa tem na formação da sociedade viçosense e na sua identidade cultural e,
principalmente, religiosa. Em Viçosa também existe Umbanda. Há 33 terreiros organizados.
Há religiosidades afro-brasileiras funcionando regularmente, desde os anos de 1930 e 1940 e
como culto organizado, provavelmente desde o final da década de 1950 e início de 1960.
Provavelmente, as diversas ocasiões tenham servido para a integração da Umbanda na
sociedade viçosense hegemonicamente católica. O que se vê atualmente é a inexistência da
religião nos dados do Censo do IBGE (2010) no município. Talvez, as possíveis “tentativas” de
inserção da religião na sociedade a fim de minimizar, quiçá, o preconceito histórico, não
tenham servido muito para sua organização, reconhecimento e prestígio social. Resta saber
onde estavam os umbandistas declarados durante a pesquisa censitária do Governo.
119
Viçosa, este interior alagoano, comporta hoje trinta e três terreiros de Umbanda sendo a
maioria na zona urbana. Funcionando regularmente com celebrações públicas são vinte e três.
Os demais funcionam com atividades de “Mesa Branca” ou celebrações esporádicas. Quanto
aos praticantes, não foi possível colher números exatos, mas o campo proporcionou registrar
nos rituais visitados, aproximadamente, um pouco mais de duzentos filhos de santo espalhados
no município. Existem também os consulentes que procuram os terreiros para consulta ou
realizar algum tipo de trabalho. Constatou-se também a presença de admiradores, parentes e
amigos de filhos de santo nos rituais. Segundo a liderança, existem também as pessoas
oriundas de outros municípios vizinhos como Chã Preta, Cajueiro, Capela, Paulo Jacinto,
Quebrangulo, Pindoba, Anadia, Atalaia e até mesmo Maceió que vêm a procura dos serviços
deles. Ficou registrado também que alguns viçosenses frequentam o Candomblé na capital do
Estado – nos bairros do Bendito Bentes, Prado, Trapiche da Barra, Levada e Jacintinho. Foram
identificadas pessoas que não possuem uma frequência regular às casas de cultos, mas que
possuem altares domésticos de Exus e Orixás em suas próprias residências, no cantinho da sala
ou do quarto.
Pôde-se inferir que, em seus primórdios – década de 1930, a Umbanda em Viçosa
funcionava como ritual de “Mesa Branca” e, como culto organizado aberto ao público, apenas
a partir do final da década de 1950. Neste município, a auto-identificação é predominantemente
Umbanda, mas encontram-se identificações diversas como: “xangô”, “espiritismo”,
“Candomblé”, “Quimbanda”, “Seita” e “Macumba”. Segundo seus representantes, sua
religião é de linha “traçada”, “anagô antigo”, deixando bem claro os traços do Candomblé,
Umbanda e Quimbanda na construção dos rituais ali praticados. Por isso, longe de rotulações,
optou-se chamar para fins de análise, este encontro de cultos de Umbanquindomblé tendo em
vista o entrelaçamento dessas práticas. No que diz respeito à identificação exterior, apenas o
terreiro da Mãe Tamires, o Centro Afro Brasileiro Ilê Axé de Oiá – localizado na Área 4,
Mutirão, possui números de telefones para atendimento espiritual em domicílio, disponíveis
para quem dela precisar. Os demais centros, conforme aludido aqui, estão instalados nas
próprias residências dos seus líderes, nos fundos dessas residências ou num quartinho ao lado,
mas sem nenhuma apresentação externa, o que dificulta a identificação da religião no
município. Talvez seja um tipo de estratégia de proteção bastante útil, por sinal. Na região da
zona rural, foram identificados centros na região do Patury, Grota Funda e Rua Nova. Todos os
terreiros cultuam aos Exus e Pombagiras realizando os chamados “toques”, “giras”, “salvas”
e “matança” pra Exu. O congá ou a canjira onde ficam assentados os Exus estão presentes em
120
todos os terreiros com quartinhas, cachaças, cigarro, velas, cacos de barros com ossadas
cranianas de animais, facas e tridentes de ferro. Todos disseram trabalhar com a chamada
“linha de esquerda”.
Diferentes características de Exu foram identificadas nos terreiros, tais como: Exus
urrando, babando, se arrastando, cambaleando, xingando, “puxando” ponto cantado, dançando,
bebendo, fumando, raivoso, sisudo, brincando, gargalhando, embolando no chão, teimoso,
obedecendo e conversando com os consulentes. Exu em Viçosa assume todas essas
características comportamentais no interior dos terreiros.
O convívio com a liderança umbandista em Viçosa, as conversas estabelecidas desde
meados de 2009, bem como a participação em diversos rituais, festas e cerimônias privadas,
proporcionaram inquirir sobre a Umbanda e seus praticantes neste município. Nos rituais,
entrevistas, registros fotográficos, áudios e vídeos captados no campo, ficou patente o
personagem Exu e suas múltiplas faces nos cultos e nas relações pessoais com os/as filhos/as
de santo. Ficou clara também a influência do catimbó-jurema, do tradicional Candomblé da
Bahia, do catolicismo popular tão forte no interior alagoano, a influência dos quimbandeiros,
do espiritismo francês, das tradições mescladas indígenas, bem como da Umbanda branca. A
influência de todas essas modalidades religiosas na construção do universo religioso,
sobretudo, da chamada “linha de esquerda” é óbvia. Todo esse imaginário religioso foi
ressignificado e reconstruído no interior de cada terreiro. As práticas afro-brasileiras integramse aos valores sociais e culturalmente aceitos, negociando suas práticas, absorvendo valores da
religião hegemônica, adaptando-se aos diferentes contextos da repressão. Em Viçosa Exu não é
o diabo cristão, mas é “da parte dele”. Pode-se deduzir que Exu como “símbolo do medo” ou
como aquele que “amedronta o povo”, símbolo de “mistério” e das “coisas do além”, possa
talvez servir como uma espécie de proteção para assim afastar os inimigos da religião. Ou seja,
“com a gente não se deve brincar”, caso contrário, Exu está aí para colocar ordem na casa e
afugentar a quem dele duvida.
Há uma lógica operatória específica numa estrutura mítico-ritual nos terreiros
estudados. Esta estrutura diz respeito às relações que ligam os adeptos desses cultos ao sistema
social por intermédio de uma complexa rede de mediações e soluções simbólicas a partir de
contexto repleto de contradições sociais, conforme apontou Capone (2004, p. 31-32). Terreiros
na periferia, adeptos pobres e sem muita instrução, infraestrutura precária, falta dinheiro para a
realização das festividades em alguns terreiros. Tudo leva a compreender que o personagem
Exu dentro desses sistemas religiosos reproduz códigos de estruturação do mundo e da
121
sociedade ativos na mente desses adeptos, como sistema de significação que muda de acordo
com sua ocupação no contexto no qual está inserido. O que está em jogo é a força operatória do
mítico-ritual, oferecendo recursos necessários à resolução de conflitos na caótica sociedade
urbana brasileira desde o século XX até os dias de hoje. Em Silva(2005, p. 132), entende-se
que é neste contexto que a Umbanda integrou em seu plano mítico todas as categorias sociais
marginalizadas, através de uma nova síntese onde os valores dominantes e as formas populares
afro-brasileiras depuraram-se em nome da mediação cultural. Exu acabou sendo
“cristianizado”.
Os nomes dos Exus identificados fazem alusão ao universo rural, à rua, à morte, ao
cemitério, aos elementos da natureza, ao universo marginalizado da sociedade. A Umbanda em
Viçosa também adaptou Exu ao seu contexto interiorano, pois do sertanejo às encruzilhadas do
meio urbano, Exu ganhou outras faces. Outro exemplo interessante dessa integração cultural
está na Pombagira espanhola ocupando lugar de destaque no Centro afro brasileiro São Jorge,
da Mãe Ana e o Seu Zé Pelintra em Viçosa que de “malandro carioca” acabou se tornando um
“sertanejo cabra macho” do município de Quipapá, no Estado de Pernambuco. Foi assim que a
Umbanda se desenvolveu no contexto brasileiro em seus processos de adaptações e inserção na
sociedade brasileira conforme visto. Para isso, o chamado “processo sincrético” foi de extrema
importância para a formação do seu cosmo religioso multifacetado e dinâmico. A dinâmica de
culto é uma realidade nos terreiros.
Após a leitura compreensiva do conjunto do material coletado em campo, as seguintes
hipóteses são postas no sentido de se ter somado à concepção das lideranças, entendendo, a
priori, ser a relação entre filho de santo e Exu, marcada por extrema obediência e esperança na
sua força mágica rodeada de mistérios. Seu caráter trickster, bem como suas ressignificações
disseminadas, principalmente a partir da segunda metade do século XX, fizeram com que o
universo mágico-religioso da Umbanda o interpretasse como representante das trevas ou “da
parte” do diabo cristão. Com relação à temática, entende-se que houve “silenciamento” e
“recolhimento” dos intelectuais alagoanos como fruto da classe elitista e hegemonicamente
cristã. Outra hipótese seria que, em algum grau, toda a liderança umbandista teria a plena
“consciência” de que a imagem de Exu como “da parte” do Diabo, seria inevitável e,
consequentemente, suas punições seriam uma realidade. De certo modo, a relação com os Exus
constitui-se temor, reverência, disciplina rígida, extremo respeito e obediência. Tanto os
atributos satânicos a Exu quanto suas características de Orixá mensageiro e cavaleiro ficaram
explícitos.
122
Antes do fechamento, julga-se importante relatar um episódio ocorrido com este
pesquisador em uma comunicação oral apresentada em um simpósio na cidade do Recife/PE,
no ano de 2015. Dois coordenadores de um grupo de trabalho, teólogos umbandistas,
professores de Teologia Umbandista e alguns filhos de santo da chamada Umbanda esotérica
tomaram como pejorativo e mal intencionado o fato de um pesquisador, por ser Pastor,
escrever e falar sobre “a religião deles”. No mínimo atípico. Com elegância e calma duvidaram
veementemente
da
pesquisa.
Duvidaram
também
da
intenção/proposta
do
pesquisador/Pastor/protestante/crente/evangélico ao escolher esta temática. Duvidaram da
possível defesa da figura do Exu, tão polêmica e divisora de águas no interior da “religião
deles”. Duvidaram da ética na pesquisa, da postura inter-religiosa do pesquisador. Duvidaram
até dos rituais de matança registrados em Viçosa/Alagoas, perguntando: você conseguiu entrar
mesmo? Como deixaram? Por que mostrar isto? O que você pretende com esta pesquisa? Você
como Pastor o que acha de tudo isso? Como sua igreja vê isso? O que a comunidade fala
sobre isso? Na sua religião eles te aceitam assim? Os umbandistas de Viçosa, o que acham
dessa pesquisa? Dizem o que? Por que você resolveu pesquisar sobre esse assunto? Qual sua
intenção de fato?
Mediante o fato ocorrido pode-se inferir que a intolerância está em todo o lugar e muda
de lugar facilmente. Veste-se com roupagens diversas. Pensar um Pastor/crente/protestante/
evangélico intolerante/preconceituoso/ignorante parece normal e bastante típico na atual
conjuntura religiosa brasileira. Mas, e pensar ao contrário? Como pensar isto de um Pai de
santo/professor umbandista/filho de santo/teólogo umbandista/escritor umbandista? Naquela
manhã foi o que aconteceu. Ficou claro e plausível nos discursos ali alçados: Pastor não pode
escrever ou falar sobre essas coisas. Caso resolva falar, então a intenção é macular “a nossa
religião”. Ficou explícita ali a exaltação do lado intelectualizado da Umbanda, pois nossa
teologia é “sem dogmatismo, reconhecida pelo MEC, pura e científica”. No final das
apresentações já nos bastidores, o pesquisador foi convidado para assistir a um “verdadeiro
toque de Exu” em São Paulo/SP. Pareceu que a Umbanda em Viçosa/Alagoas, a partir daqueles
discursos, não é a “verdadeira Umbanda” e que a pesquisa ali desenvolvida não deveria ter sido
feita por um evangélico/crente. Frisa-se, quando o “intolerável” torna-se “intolerante”. Nota-se
que a intolerância só muda de palco e ocupa outros personagens até então, impossíveis de tais
vestes. A intolerância do lado de lá. O “outro” apontando o “outro”, o “indiferente” acusando o
“indiferente”. A “nossa religião” discriminando a “sua religião”. O filho de santo umbandista
123
“discriminando” o Pastor. A Umbanda “intolerante” com o protestantismo. O sudeste
“julgando” o nordeste. Foi o que ficou implícito naquela ocasião.
Quem conhece o início e desenvolvimento desta pesquisa jamais interpretaria desta
maneira. Fato lamentável e deselegante partindo, sobretudo, de teólogos umbandistas de São
Paulo/SP. Atitude como esta jamais ocorreu em Viçosa/AL, pois neste campo, além do
pesquisador, existe a figura de um amigo, irmão, companheiro de caminhada e professor
naquele município há alguns anos. Este pesquisador vai além das formalidades acadêmicas que
compete a toda pesquisa de campo. Na Umbanda em Viçosa, o cafezinho com pão com os Pais
e Mães de santo, aquela sopinha com torradas e chá, o bate papo na sala e no quintal, o abraço
e aperto de mão sinceros, a fotografia de bom grado, o caminhar nas ruas e na feira livre, a
viagem comunitária para a praia na capital Maceió, as festas nos terreiros e fora deles, os
telefonemas amigáveis, o convívio com transparência e respeito, vão além da burocratização
acadêmica e institucionalismos. Acadêmicos – obviamente imprescindíveis. Trocando em
miúdos, procura-se construir um diálogo inter-religioso em tempos de intolerâncias. Dialogar,
conviver e aprender com a religião do “Outro” ainda é possível nos dias atuais.
Enfim, todo pensamento desenvolvido sobre Exu nos terreiros de Viçosa, interior
alagoano, mostrou que Exu não é um Diabo, Satanás ou Lúcifer, mas naturalmente, está
sempre no caminho de “parecer com ele” ou de continuar “agindo como ele”, “pertencendo a
ele” e “trabalhando do lado dele”. As reinterpretações no contínuo fazer e refazer na
reconstrução do universo mítico multifacetado e simbólico da Umbanda ao longo da história
acabou produzindo as ressignificações do ambivalente Exu discutidas aqui. A pertinência
social desta pesquisa poderá contribuir para cercear as atitudes iconoclastas acerca deste
fenômeno, mostrando a diversidade religiosa alagoana, desmistificando as atitudes de violência
e de demonização desta modalidade religiosa, bem como cercear a violência e discriminação
contra esta prática religiosa. Entende-se também que este trabalho contribuirá para identificar
ainda mais, a brasilidade da Umbanda. Cientificamente ele poderá contribuir com a
interdisciplinaridade existente neste campo de pesquisa, como lugar de destaque que as
religiões afro-brasileiras vêm obtendo nos círculos acadêmicos nas últimas décadas, como um
campo de saber multidisciplinar, bem como para o campo das Ciências da Religião, Sociologia
da Religião, Antropologia, Psicologia e, sobretudo, da História das Religiões.
Ficou evidente que no campo da memória social, coletiva e cultural se processa a
reconstrução de uma dada conjuntura e/ou situação política, na qual vai se firmando uma
interação entre o individual e o comunitário. Não se trata de “sacralizar” a memória, conforme
124
aponta Ferreira (2006), mas de preservá-la a fim de evitar futuras manifestações autoritarismos
e desrespeitos às testemunhas. Espera-se assim, despertar curiosidade em novos/as
pesquisadores/as interessados/as na temática “Exu-Diabo” e “linha de esquerda na Umbanda”,
promovendo e ampliando o debate acerca da cosmologia umbandista, sobretudo, no Nordeste
brasileiro. Academicamente, compreende-se que trará contribuições à História das Religiões no
interior do Estado, à produção acadêmica sobre as religiões afro-alagoanas, contribuindo
também com o legado da cultura negra em Alagoas e no Brasil proporcionando maior
visibilidade dessa religião na sociedade alagoana e, principalmente, na viçosense. Se os setenta
e cinco anos da Mãe Antonia na Umbanda ainda não conseguiram entender a natureza de Exu,
imagina uma pesquisa circunscrita como esta.
125
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REFERÊNCIAS DOS TERREIROS PESQUISADOS
CENTRO ESPÍRITA SÃO COSME E SÃO DAMIÃO. Mãe de Santo: Maria do Carmo
Sercundes da Silva (Popular Do Carmo)
CENTRO ESPÍRITA DE OXUM MENINA
Pai de santo: José de Oliveira Costa (Popular: Barnabé)
CENTRO ESPÍRITA SÃO JOÃO BATISTA
Pai de Santo: José Édson dos Santos (Popular: Balaio)
CENTRO ESPÍRITA PALÁCIO DE OGUM
Pai de Santo: Rosalvo Ferreira dos Reis
CENTRO ESPÍRITA CABOCLO DE ORUBÁ
Mãe de santo: Aliete Deolinda da Silva Santos (Popular: Liete)
CENTRO ESPÍRITA PALÁCIO DE OGUM
Mãe de santo: Maria Goreti da Conceição. (Popular: Goreti)
CENTRO ESPÍRITA SENHOR OGUM
Pai de Santo: Cícero Bernardo da Silva (Popular: Cicinho).
CENTRO ESPÍRITA UMBANDISTA NOSSA SENHORA DA GUIA
Mãe de santo: Josefa Etelvina da Silva (Popular: Nêna)
CENTRO ESPÍRITA PRETO VELHO
Pai de santo: Emídio Corrêia da Paz
CENTRO AFRO BRASILEIRO SÃO JORGE
Mãe de santo: Ana Maria Nunes dos Santos
CENTRO AFRO BRASILEIRO SÃO JORGE
Mãe de santo: Antônia Vieira de Araújo
CENTRO AFRO BRASILEIRO SENHOR DO BOMFIM DA BAHIA
Mãe de santo: Maria Nazaré dos Santos Silva
CENTRO AFRO BRASILEIRO SÃO JERÔNIMO
Pai de santo: Cosme Alves
CENTRO AFRO BRASILEIRO SÃO JORGE
Pai de santo: José Cícero de Lima(Popular: Seu Cicinho Fava Pura)
CENTRO AFRO BRASILEIRO YLÊ AXÉ OYÁ LONANGY
Pai de santo: José Cícero da Silva (Popular: Lonan)
CENTRO AFRO BRASILEIRO PALÁCIO DE OXUM
Mãe de santo: Carlos Alberto Vieira dos Santos (Popular: Carlinha).
136
CENTRO AFRO BRASILEIRO SÃO SEBASTIÃO
Mãe de santo: Carlinda Nair dos Santos Silva
CENTRO AFRO BRASILEIRO COSME E DAMIÃO
Mãe de Santo: Valderez Pereira da Silva (Popular: Val).
CENTRO AFRO BRASILEIRO ILÊ AXÉ DE OIÁ
Mãe de Santo: Edivaldo dos Santos (Popular: Tamires).
CENTRO AFRO DE UMBANDA NOSSA SENHORA DA GUIA
Mãe de Santo: Marileide Batista (Popular: Neguinha)
CENTRO AFRO ABAÇAR NOSSA SENHORA DO CARMO
Pai de Santo: Sebastião Teixeira de Freitas (Popular: Bastinho)
137
REFERÊNCIAS DE JORNAIS E SITES DE PESQUISA
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(Manifesto da JOC – Juventude Operária Católica).
O Semeador. Macumbeiros - - Macumba. Ano. XXXVIII, nº 111, sábado, 30 de junho de
1951. p. 3.
O Semeador. Precisamos de Manicômios? Ano. XXXVIII, nº 109, terça-feira, 26 de junho de
1951. p. 3.
O Semeador. Receita de Além-Túmulo... . Ano. XXXVIII, nº 15, quinta-feira, 25 de janeiro
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139
APÊNDICES
140
APÊNDICE A – ENDEREÇOS E TELEFONES DOS TERREIROS DE UMBANDA
INSERIDOS NO MUNICÍPIO DE VIÇOSA, ZONA DA MATA ALAGOANA68
1. CENTRO AFRO BRASILEIRO SÃO JORGE
Rua Ademar Vasconcelos, nº 166 – Boa Vista – Viçosa/AL CEP: 5770-000
Mãe de santo: Ana Maria Nunes dos Santos
2. CENTRO ESPÍRITA SÃO COSME E SÃO DAMIÃO
Rua “C”, nº 46 – Mutirão Pe. Cícero – Viçosa/AL CEP: 5770-000
Mãe de Santo: Maria do Carmo Sercundes da Silva (Popular Do Carmo)
3. CENTRO ESPÍRITA DE OXUM MENINA
Rua “D” Mutirão Frei Damião, nº 45 – Viçosa/AL CEP: 5770-000
Pai de santo: José de Oliveira Costa (Popular: Barnabé)
4. CENTRO ESPÍRITA SÃO JOÃO BATISTA
Rua Silvestre de Goiânia, nº 59 - Centro – Viçosa/AL CEP: 5770-000
Pai de Santo: José Édson dos Santos (Popular: Balaio)
5. CENTRO AFRO ABAÇAR NOSSA SENHORA DO CARMO
Rua Senador Ismael Brandão (Rua do Cravo), nº 70 – Centro – Viçosa/AL CEP:
5770.000
Pai de Santo: Sebastião Teixeira de Freitas (Popular: Bastinho)
Obs: Desde o ano de 2010, o Pai Bastinho não realiza rituais públicos, pois segundo
ele, as enfermidades que o acometeram deixaram-no bastante debilitado. Além do
mais, metade dos seus filhos de santo migrou para outras cidades, afirmou ele.
6. CENTRO AFRO BRASILEIRO SÃO JORGE
Conjunto Sant’Ana, Quadra F, nº 10 – Viçosa/AL CEP: 5770-000
Mãe de santo: Antônia Vieira de Araújo
Obs: Atualmente está sendo construído um novo salão da Mãe Antônia que segundo
ela, será inaugurado no final deste ano ou no início de 2015.
7. CENTRO ESPÍRITA PALÁCIO DE OGUM
Rua “A” Mutirão Frei Damião, nº 23 – Viçosa/AL CEP: 5770-000
Pai de Santo: Rosalvo Ferreira dos Reis
Obs: Segundo o Pai Rosalvo, esta sede é provisória, acontecem raras celebrações no
local. Ele costuma realizar os rituais no terreiro da Mãe Neguinha, por sinal, são
grandes amigos. Atualmente o Pai Rosalvo está residindo na Rua do Brejo, s/n – zona
rural de Cajueiro (divisa com o município de Viçosa/AL – Usina Capricho).
8. CENTRO AFRO DE UMBANDA NOSSA SENHORA DA GUIA
Povoado Mata Escura, conhecida também por Vila Nova, às margens do rio Paraíba, nº
12 – Viçosa/AL CEP: 5770-000
Mãe de Santo: Marileide Batista (Popular: Neguinha)
9. CENTRO AFRO BRASILEIRO SENHOR DO BOMFIM DA BAHIA
Avenida 12 de julho, nº 37, Área 7 Mutirão (antiga Praça da Cavalhada) – Viçosa/AL
CEP: 5770-000
Mãe de santo: Maria Nazaré dos Santos Silva
10. CENTRO ESPÍRITA PRETO VELHO
68
Informações colhidas em pesquisa de campo realizada durante os anos de 2009, 2010 e 2014 e nas Federações:
Federação Zeladora das Religiões Tradicionais Afro-Brasileiras em Alagoas – Presidente Paulo José da Silva;
Federação dos Cultos Afro-Umbandista de Alagoas – Presidente José Benedito Maciel. Última atualização em
dezembro de 2015.
141
Conjunto Frei Damião, Rua “J”, nº 15 – Viçosa/AL CEP: 5770-000
Pai de santo: Emídio Corrêia da Paz
11. CENTRO AFRO BRASILEIRO SÃO JERÔNIMO
Rua Dr. Evilázio Torres, nº 111 – Centro – Viçosa/AL CEP: 5770-000
Pai de santo: Cosme Alves
12. SALÃO PALÁCIO DA OXUM MENINA
Rua Dourada, nº 80 – Centro – Viçosa/AL CEP: 5770-000
Mãe de santo: Sebastiana Maria da Silva (falecida em junho de 2013)
Obs: A Mãe Bastiana faleceu em julho de 2013. Atualmente o terreiro está fechado,
segundo seus familiares não tem previsão para reabri-lo. Além do mais, parte da sua
família está residindo na capital, Maceió.
13. CENTRO AFRO BRASILEIRO SÃO JORGE
Grota Funda, s/n, (nas proximidades das fazendas do Geraldo Tenório e Toinho da loja,
após o povoado da Sant’Ana) zona rural de Viçosa/AL CEP: 5770-000
Pai de santo: José Cícero de Lima(Popular: Seu Cicinho Fava Pura)
14. CENTRO ESPÍRITA PALÁCIO DE OGUM
Avenida 12 de julho, nº 27 – Mutirão área 7 (antiga Praça da Cavalhada) – Viçosa/AL
CEP: 5770-000
Mãe de santo: Maria Goreti da Conceição. (Popular: Goreti)
Obs: Segundo a Mãe Goreti, o salão passará por uma reforma e só será reaberto em
2015.
15. CENTRO ESPÍRITA SENHOR OGUM
Conjunto Sant’Ana, Rua “B”, nº 18 (Saída para Mar Vermelho) – Viçosa/AL CEP:
5770-000.
Pai de Santo: Cícero Bernardo da Silva (Popular: Cicinho).
16. CENTRO ESPÍRITA UMBANDISTA NOSSA SENHORA DA GUIA
Rua Cônego Pimentel, nº 33 – Centro – Viçosa/AL CEP: 5770-000.
Mãe de santo: Josefa Etelvina da Silva (Popular: Nêna)
17. CENTRO AFRO BRASILEIRO YLÊ AXÉ OYÁ LONANGY
Conjunto Vila Nova, Rua “D”, nº 05 – Viçosa/AL CEP: 5770-000
Pai de santo: José Cícero da Silva (Popular: Lonan)
Obs: Em agosto de 2015 foi inaugurado seu novo salão, desta vez, no Conj. Sant’Ana
onde existem mais três terreiros.
18. CENTRO AFRO BRASILEIRO PALÁCIO DE OXUM
Rua São José, nº 13 (popularmente conhecida como Rua do Cochicho, por trás da
Prefeitura) – Centro – Viçosa/AL CEP: 5770-000.
Mãe de santo: Carlos Alberto Vieira dos Santos (Popular: Carlinha).
19. CENTRO AFRO BRASILEIRO SÃO SEBASTIÃO
Avenida 12 de julho, nº 75, Área 7 Mutirão (antiga Praça da Cavalhada) – Viçosa/AL
CEP: 5770-000
Mãe de santo: Carlinda Nair dos Santos Silva
Obs: Funcionou durante 40 anos, principalmente com Mesa Branca. Está desativado
há 12 anos. Segundo Mãe Carlinda, por motivos de saúde e falecimento de algumas
filhas de santo mais idosas.
20. CENTRO AFRO BRASILEIRO COSME E DAMIÃO
Conjunto Sant’Ana, Quadra “B”, nº 28 – Viçosa/AL CEP: 5770-000.
Mãe de Santo: Valderez Pereira da Silva (Popular: Val).
Obs: Atualmente está desativado. Mãe Val frequenta um terreiro no município vizinho
de Cajueiro, mas de vez em quando, oferece festa em seu terreiro, duas ou três vezes ao
ano, segundo ela nos informou.
142
21. CENTRO AFRO BRASILEIRO ILÊ AXÉ DE OIÁ
Mutirão, Área 4, Rua “B”, nº 21 – Viçosa/AL CEP: 5770-000.
Mãe de Santo: Edivaldo dos Santos (Popular: Tamires).
22. CENTRO ESPÍRITA YLÊ AXÉ SÃO JOÃO BATISTA
Mutirão, Área 3, Rua “N”, nº 48 – Viçosa/AL CEP: 5770-000
Mãe de santo: Maria José Gomes da Silva (Popular: Guegué)
Obs: De acordo com os umbandistas, o terreiro funcionou até o ano de 2013, ano em
que a Dona Maria mudou-se para o município vizinho do Cajueiro/AL. De vez em
quando ela vem atender em Viçosa.
23. CENTRO ESPÍRITA PALÁCIO DE OXUM
Pai de santo: Paulo César Barbosa
Obs: Este centro foi citado pelo Presidente da FRETAB. Ele não nos informou o
endereço desse terreiro. De acordo com os umbandistas, trata-se de um terreiro
situado na Zona Rural que só atende Mesa Branca. O Pai César não reside em Viçosa.
24. CENTRO AFRO YLÊ AXÉ DE OGUM
Rua Senador Ismael Brandão (Rua do Cravo), nº 95 -Viçosa/AL CEP: 5770-000
Mãe de santo: Rosário de Fátima Barbosa
25. CENTRO AFRO BRASILEIRO OGUM BEIRA MAR
Mutirão, Área 6, Rua “B”, nº 13 - Viçosa/AL CEP: 5770-000
Pai de santo: Edivaldo dos Santos (Popular Prof. Dal)
26. CENTRO AFRO ALAGOANO SENHOR DO BOMFIM
Povoado Mata Escura, conhecida também por Vila Nova, às margens do rio Paraíba, nº
54 – Viçosa/AL CEP: 5770-000
Mãe de Santo: Marlene Alves da Silva
27. CENTRO ESPÍRITA CABOCLO DE ORUBÁ
Fazenda Paturi – Zona Rural de Viçosa/AL (divisa com o município do Mar Vermelho)
CEP: 5770-000
Mãe de santo: Aliete Deolinda da Silva Santos (Popular: Liete)
Obs: O terreiro no Sítio Paturi funcionou durante 30 anos (1978-2008). Desde o ano
de 2008 Mãe Liete reside na zona urbana, no Mutirão, Área 3.
28. CENTRO ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO
Estrada Nova, s/n, Viçosa/AL CEP: 5770-000.
Mãe de santo: Maria de Lourdes dos Santos Correia (Popular: Nênem)
Obs: A Mãe Nênem é Mãe de santo há 20 anos, natural da Chã do Brejinho, Zona
Rural do município de Anadia/AL, cujo terreiro está filiado à Federação dos Cultos
Afro-Umbandista de Alagoas (Presidente Pai Maciel), desde o ano de 2006.
29. CENTRO ESPÍRITA SÃO JORGE
Estrada Nova, s/n, Viçosa/AL CEP: 5770-000.
Pai de santo: Inaldo José da Silva (Popular: Zé)
Obs: O Pai Zé é natural do município de Anadia/AL, Pai de santo há 18 anos e veio
residir em Viçosa com sua família em agosto de 2013. Segundo ele, a iniciativa veio da
Mãe Nênem (sua vizinha lá em Anadia) que após se estabelecer em Viçosa, ajudou-os
na mudança. O terreiro do Pai Zé é filiado à Federação Umbandista dos Cultos
Áfricos do Estado de Alagoas (Presidente Édson Gomes da Silva) desde o ano de 2011.
30. CENTRO ESPÍRITA UMBANDISTA SÃO GERÔNIMO
Rua Guganema, nº 22, Centro. Viçosa/AL CEP: 5770-000.
Pai de santo: Klédson Pauliny Rodrigues dos Santos (Popular: Klêy).
Obs: Atualmente, segundo informações de amigos, o jovem Klêy está trabalhando no
município do Cajueiro há um ano.
143
31. CASA DE ORAÇÃO PALÁCIO DE OXÓSSI
Mutirão, Área 4, Rua “B”, nº 29. Viçosa/AL CEP: 5770-000.
Pai de santo: Marcos Antonio Argemiro da Silva. (Popular: Marquinhos)
32. “TERREIRO DO PAI TIQUINHO”
Fazenda Marambáia (próximo ao Estádio Municipal).
Pai de santo: Édson. (Popular: Tiquinho).
Obs: O Pai Tiquinho não aceitou participar da pesquisa, tampouco, ceder informações
detalhadas sobre suas empreitadas religiosas em Viçosa. O que se sabe é que ele está
se preparando no terreiro do Pai Alexandre, no bairro Jatiúca/Maceió. Seu terreiro
será aberto provavelmente no final do ano de 2016.
33. CENTRO ILÊ AXÉ OIÁ UNIRA
Rua “C”, s/n – Mutirão Pe. Cícero – Viçosa/AL CEP: 5770-000
Pai de santo: José Aldo.
TOTAL DE TERREIROS NO MUNICÍPIO: 33 (Trinta e três).
144
APÊNDICEB- FUNCIONAMENTO ATUAL DA UMBANDA EM VIÇOSA/AL (2015).
Terreiros em plena atividade
(atividades públicas quinzenais e
mensais)
Terreiros funcionando apenas com
“Mesa Branca”
1. CENTRO AFRO BRASILEIRO SÃO JORGE
Mãe de santo: Ana Maria Nunes dos Santos
2. CENTRO ESPÍRITA SÃO COSME E SÃO
DAMIÃO
Mãe de Santo: Maria do Carmo Sercundes da Silva
(Popular Do Carmo)
3. CENTRO ESPÍRITA DE OXUM MENINA
Pai de santo: José de Oliveira Costa (Popular: Barnabé)
4. CENTRO ESPÍRITA SÃO JOÃO BATISTA
Pai de Santo: José Édson dos Santos (Popular: Balaio)
5. CENTRO AFRO BRASILEIRO SÃO JORGE
Mãe de santo: Antônia Vieira de Araújo
6. CENTRO AFRO BRASILEIRO SENHOR DO
BOMFIM DA BAHIA
Mãe de santo: Maria Nazaré dos Santos Silva
7. CENTRO
AFRO
BRASILEIRO
SÃO
JERÔNIMO
Pai de santo: Cosme Alves
8. CENTRO AFRO BRASILEIRO SÃO JORGE
Pai de santo: José Cícero de Lima (Popular: Seu Cicinho
Fava Pura)
9. CENTRO AFRO BRASILEIRO ILÊ AXÉ DE
OIÁ
Mãe de Santo: Edivaldo dos Santos (Popular: Tamires).
10. CENTRO ESPÍRITA SÃO JORGE
Pai de santo: Inaldo José da Silva (Popular: Zé)
11. CENTRO ESPÍRITA PRETO VELHO
Pai de santo: Emídio Correia da Paz
12. CENTRO ILÊ AXÉ OIÁ UNIRA
Pai de santo: José Aldo
13. CENTRO AFRO BRASILEIRO YLÊ AXÉ OYÁ
LONANGY
Pai de santo: José Cícero da Silva (Popular: Lonan)
1. CENTRO AFRO ABAÇAR NOSSA SENHORA
DO CARMO
Pai de Santo: Sebastião Teixeira de Freitas (Popular:
Bastinho)
2. CENTRO ESPÍRITA UMBANDISTA NOSSA
SENHORA DA GUIA
Mãe de santo: Josefa Etelvina da Silva (Popular: Nêna)
3. CENTRO AFRO BRASILEIRO PALÁCIO DE
OXUM
Mãe de santo: Carlos Alberto Vieira dos Santos (Popular:
Carlinha).
4. CENTRO ESPÍRITA NOSSA SENHORA DA
CONCEIÇÃO
Mãe de santo: Maria de Lourdes dos Santos Correia
(Popular: Nênem).
145
Terreiros desativados publicamente
Terreiros com celebração esporádica
Terreiros ainda em construção
Total geral de terreiros existentes
1. CENTRO ESPÍRITA CABOCLO DE ORUBÁ
Mãe de santo: Aliete Deolinda da Silva Santos (Popular:
Liete)
2. CENTRO ESPÍRITA PALÁCIO DE OXUM
Pai de santo: Paulo César Barbosa
3. CENTRO ESPÍRITA PALÁCIO DE OGUM
Pai de Santo: Rosalvo Ferreira dos Reis
4. SALÃO PALÁCIO DA OXUM MENINA
Mãe de santo: Sebastiana Maria da Silva (falecida).
5. CENTRO
AFRO
BRASILEIRO
SÃO
SEBASTIÃO
Mãe de santo: Carlinda Nair dos Santos Silva
6. CENTRO AFRO BRASILEIRO COSME E
DAMIÃO
Mãe de Santo: Valderez Pereira da Silva (Popular: Val).
7. CENTRO ESPÍRITA YLÊ AXÉ SÃO JOÃO
BATISTA
Mãe de santo: Maria José Gomes da Silva (Popular:
Guegué).
1. CENTRO AFRO DE UMBANDA NOSSA
SENHORA DA GUIA
Mãe de Santo: Marileide Batista (Popular: Neguinha)
2. CENTRO ESPÍRITA PALÁCIO DE OGUM
Mãe de santo: Maria Goreti da Conceição. (Popular:
Goreti)
3. CENTRO ESPÍRITA SENHOR OGUM
Pai de Santo: Cícero Bernardo da Silva (Popular:
Cicinho).
4. CENTRO AFRO YLÊ AXÉ DE OGUM
Mãe de santo: Rosário de Fátima Barbosa.
5. CENTRO AFRO BRASILEIRO OGUM BEIRA
MAR.
Pai de santo: Edivaldo dos Santos (Popular: Prof.
Dal).
6. CENTRO AFRO ALAGOANO SENHOR DO
BOMFIM
Mãe de Santo: Marlene Alves da Silva.
1. CASA DE ORAÇÃO PALÁCIO DE OXÓSSI
Pai de santo: Marcos Antonio Argemiro da Silva.
(Popular: Marquinhos)
2. CENTRO ESPÍRITA UMBANDISTA SÃO
GERÔNIMO
Pai de santo: Klédson Pauliny Rodrigues dos Santos
(Popular: Klêy).
3. “TERREIRO DO PAI TIQUINHO”
Pai de santo: Édson. (Popular: “Tiquinho”).
33 (Trinta e três terreiros)
146
APÊNDICE C - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)
PARTICIPAÇÃO INDIVIDUAL
147
APÊNDICE D - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)
PARTICIPAÇÃO DO TERREIRO
148
APÊNDICEE - ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA – PAIS E MÃES DE SANTO
149
APÊNDICE F - ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA – PRESIDENTES DAS
FEDERAÇÕES
150
APÊNDICE G - LIDERANÇA UMBANDISTA EM VIÇOSA/AL (1950 E 1960).
A Umbanda como “culto
organizado”
Mãe Maria do Carmo
Pai José do Jitirana
Mãe Marina Munguba
Pai Roberto
Pai Benício
Pai Pedro Ribeiro
Pai João Valério
Pai “Touro Preto”
Pai João Belo
Pai Aníbal
Mãe Benedita
Mãe Maria Teixeira
Pai Pedro Teixeira
Mãe Margarida
Mãe Maria Júlia
Pai Pedro Demésio
Mãe Lourdes
Mãe Adélia
Mãe Maria Preta
Pai José Mata
Pai Manoel Gonçalo
Pai José Roberto
Mãe Minininha do
Sabalangá
Mãe Nazaré
Total de líderes
Fonte: Autor (2016).
Localidades
Região rural da Mata Verde
Região rural do Jitirana
Paus Brancos
Dourada
Passagem da Areia
Rua Assembleense/Rua do Cemitério
Não lembram o nome e local do terreiro
Não lembram o nome e local do terreiro
Rua da Matança
Não lembram o nome e local do terreiro
Não lembram o local
Paus Brancos
Não lembram o local do terreiro
Não lembram o nome e local do terreiro
Não lembram o nome e local do terreiro
Rua Nova
Não lembram o nome e local do terreiro
Não lembram o nome e local do terreiro
Não lembram o nome e local do terreiro
Fazenda Lages/Pedras de Fogo
Região rural da Fazenda Bicho Preto
Não lembram o nome do terreiro
Região rural do Sabalangá
Região rural da Fazenda Bicho Preto
24 lideranças umbandistas
151
APÊNDICE H - UMBANDA DA “MESA BRANCA”/”JUREMA”OU “ANAGÔ
ANTIGO”(1930 E 1940).
Características de culto
Umbanda
da
“Mesa
Branca”/”jurema” ou “anagô
antigo”
Umbanda
da
“tímida
celebração
pública”/”toque”/”giras”
Umbanda
federativa
dos
alvarás/diplomas
Umbanda geradora de líderes
Umbanda da liderança jovem
Fonte: Autor (2016).
Período aproximado
Entre as décadas de 1930 e 1940
Entre as décadas de 1950 e 1960
Entre as décadas de 1970 e 1980
Entre as décadas de 1990 e 2000
Entre as décadas de 2010 a 2014
152
APÊNDICE I - PRÁTICAS RELIGIOSAS EM VIÇOSA/AL, (2015)
Igreja/grupo religioso
(ano 2015)
Congregação Cristã no Brasil – ano de fundação 1964.
Espiritismo Kardecista – Centro Espírita André Luiz – criado em 1973.
Igreja Evangélica Assembleia de Deus Missão – ano 1937.
Igreja Católica Apostólica Romana – Paróquia Bom Jesus do Bomfim criada em 1835.
Igreja do Evangelho Quadrangular – ano 2001.
Igreja Presbiteriana Renovada – ano 2000.
Igreja Evangélica Assembleia de Deus Madureira – fundação em 2003.
Igreja Pentecostal Assembleia de Deus – ano 2013.
Igreja Universal do Reino de Deus – ano de fundação 1996.
Igreja Cristã Maranata – Congregação do município de Chã Preta criada em 2009.
Igreja Adventista do 7º Dia – ano 2010.
Igreja Cristã Para Os Povos – ano de fundação 2009.
Igreja Batista – Congregação da 1ª Igreja Batista de Maceió criada em 1976.
Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias – criada em 1990.
Maçonaria – Loja “Princesa das Matas” fundada em 1976.
Testemunhas de Jeová – criada em 1970.
Umbanda – desde 1930. Como culto organizado em 1960.
Fonte: Rodrigo Dias e Autor (2016).
153
APÊNDICE J - AS MÚLTIPLAS FACES DE EXU EM VIÇOSA, NAS ALAGOAS
Como a Umbanda em Viçosa ver a Exu
1. Cavaleiro dos Orixás, dos santos e dos Pretos Velhos
2. Mensageiro e agregado dos Orixás e Pretos Velhos
3. Empregado dos Pretos Velhos e dos santos
4. Escravo dos santos
5. Da parte do Diabo, Lúcifer, Satanás, Maioral, dos demônios
6. Da parte do demônio
7. Da parte da magia negra
8. Da parte das trevas
9. Da parte do Belzebu
10. Do lado esquerdo
11. Espírito mal
12. Afastado de Deus
13. Vento da encruzas
14. Pessoa que já morreu
15. Anjo caído
16. Carniceiro
17. Espírito que vive vagando no mundo
18. Guardião das casas
19. Protetor
20. Espírito pesado
21. Infernal
22. Bom e Mau
23. Invisível
24. Macho das Pombagiras
25. Da parte baixa da terra
Fonte: Autor (2016).
154
APÊNDICEL - AS FACES DE POMBAGIRA NA UMBANDA EM VIÇOSA, NAS
ALAGOAS
Como a Umbanda em Viçosa ver a Pombagira
1. Mulher de sete maridos
2. Mulher da Rua
3. Rapariga
4. Prostituta
5. Mulher da vida
6. Rainha do inferno (Maria Padilha)
7. Mulher de Exu
8. Mulher de Lúcifer (Maria Padilha)
9. Da parte Infernal
10. Do invisível
11. Mulher de cabaré
12. Cavaleira de Exu
13. Da parte diabólica
14. Da Perdição
15. Amor, paixão ardente
16. Espírito sedutor
17. Boa e Má
18. Exu mulher
19. Espírito das encruzas
20. Da esquerda
21. Falsa
22. Perigosa
23. Malvada
24. Mulher que morreu
25. Dama da noite
Fonte: Autor (2016).
155
APÊNDICE M - NOMES DOS EXUS IDENTIFICADOS EM VIÇOSA/AL
Seu
Zé Pelintra
(trabalha
nos dois
lados)
Exu
Sete
Catatumbas
Exu
Vira Mundo
Boiadeiro
(trabalha
nos dois
lados)
Odé
(Exu
Mirim
também)
Exu
Serra de Fogo
Exu
Pimenta
Exu
Maresia
Exu
Sete Facadas
Exu
Tranca
Rua
Exu
Ventania
Exu
Marabô
Exu
Toquinho
Exu
Furacão
Exu Corre
Campo
Exu Arranca
Toco
Exu
do
Lodo
Exu
Marujo
Exu
Bagaceira
Exu
Tatá
Caveira
Exu
Muleta
Exu
da
Lenha
Exu
Mulambo
Exu
Porteira
Exu
Gira Mundo
Exu
da Meia
Noite
Exu
Cancela
Exu
Marinheiro
Exu
Tiriri
Exu Sete
Encruzilhadas
Exu
Caveira
Exu Morão
Exu
Capa
Preta
Exu
Mirim
Exu
Embola
Pedras
Exu
Das
Matas
Exu
das
Almas
Exu
Benedito
Fumaça
Exu
QuebraGalho
Fonte: Autor (2016).
Exu
Veludo
Exu
Das
Pedreiras
Exu
Do Cemitério
156
ANEXOS69
69
O autor optou manter as identidades preservadas dos praticantes da Umbanda
santo/consulentes/frequentadores) dos terreiros em Viçosa/AL, exceto das suas lideranças.
(filhos
de
157
ANEXO A
Figura 1 – Altares de Exus e Pombagiras e assentamentos de Exu Tranca Rua
Fonte: Autor (2016).
158
ANXO B
Figura 2 – Altares e símbolos de Exu no interior dos terreiros
Fonte: Autor (2016).
159
ANEXO C
Figura 3 – Símbolos de Exu e crânios de animais sacrificados
Fonte: Autor (2016).
160
ANEXO D
Figura 4 – Congás ou Canjiras de Exu no interior dos terreiros
Fonte: Autor (2016).
161
ANEXOE
Figura 5 – Altares e símbolos de Exu na Entrada dos terreiros
Fonte: Autor (2016).
162
ANEXO F
Figura 6 – Processo sincrético no interior da Umbanda
Fonte: Autor (2016).
163
ANEXO G
Figura 7 – “Matança pra Exu”
Fonte: Autor (2016).
164
ANEXO H
Figura 8 – “Exu recebendo obrigação”
Fonte: Autor (2016).
165
ANEXO I
Figura 9 – Exu diante da obrigação
Fonte: Autor (2016).
166
ANEXO J
Figura 10 – Obrigação, e axé aos Exus
Fonte: Autor (2016).
167
ANEXO L
Figura 11–Exu recebendo axé, bebida e cigarro
Fonte: Autor (2016).
168
ANEXO M
Figura 12 – “Matança pra Exu”
Fonte: Autor (2016).
169
ANEXO N
Figura 13 – Exu Bagaceira e Exu Caveira no centro do terreiro
Fonte: Autor (2016).
170
ANEXO O
Figura 14 – “Obrigação pra Exu”
Fonte: Autor (2016).
171
ANEXO P
Figura 15 – Exu Boiadeiro, Exu Caveira, Zé Pelintra e Exu Tiriri
Fonte: Autor (2016).
172
ANEXO Q
Figura 16 – Exus e Pombagiras
Fonte: Autor (2016).
173
ANEXO R
Figura 17 – Transe de possessão
Fonte: Autor (2016).
174
ANEXO S
Figura 18 – “Arreia Exu”
Fonte: Autor (2016).
175
ANEXO T
Figura 19 – Reverência, obediência e saudação aos Exus
Fonte: Autor (2016).
176
ANEXO U
Figura 20 – Consulentes e filhas de santo buscando ajuda dos Exus
Fonte: Autor (2016).
177
ANEXO V
Figura 21 – “Toque” ou “Gira” de Exu”
Fonte: Autor (2016).
178
ANEXO X
Figura 22–Transe de possessão – Exu e Pombagira
Fonte: Autor (2016).
179
ANEXO Z
Figura 23 – Exu diante do Congá e Peji
Fonte: Autor (2016).
180
ANEXO AA
Figura 24 –Pais de santo mais antigos
Fonte: Autor (2016).
Pai Emídio
Pai Cosme
Pai Bastinho
Pai Rosalvo
181
ANEXO BB
Figura 25 – Mães desanto mais antigas
Mãe Antonia
Mãe Nazaré
Fonte: Autor (2016).
Mãe Neguinha
Mãe Goreti
182
ANEXO CC
Figura 26 – Liderança mais jovem
Mãe Tamires
Mãe Carlinha
Pai Balaio
Pai Cicinho
Fonte: Autor (2016).
183
ANEXO DD
Figura 27 – Mães de santo mais jovens e interior dos seus terreiros
Mãe Do Carmo
Fonte: Autor (2016).
Mãe Ana
184
ANEXO EE
Figura 28 – Sessão de “Mesa Branca”, consulentes e ingomes
Fonte: Autor (2016).
185
ANEXO FF
Figura 29 – “Calçamento de estátuas”,“Passagem de morto” e festa de Exu
Fonte: Autor (2016).
186
ANEXO GG
Figura 30 – Presidentes das Federações e pesquisa de campo
Pai Paulo Silva – Sede da Federação
Pai Benedito Maciel – Sede da Federação
Entrevista Pai Emídio - Maio de 2014
Entrevista Pai Lonan - Maio de 2014
Fonte: Autor (2016).
187
ANEXO HH
Figura 31 – Terreiros espalhados na cidade
Centro afro-brasileiro São Jorge
Centro afro-brasileiro São Cosme e São Damião
Centro Espírita Preto Velho
Centro afro-brasileiro São João Batista
Fonte: Autor (2016).
188
ANEXO II
Figura 32 – Terreiros em Viçosa na cidade e na zona rural
Centro afro-brasileiro Senhor do Bomfim da Bahia
Centro Espírita de Oxum Menina
Fonte: Autor (2016).
Centro afro-brasileiro São Jorge
Zona Rural de Viçosa
189
ANEXO JJ
Figura 33 – Documentos de regularização dos cultos e Rua dos “Paus Brancos”
Extensão de 2 km – dez terreiros já funcionou aqui
Fonte: Autor (2016).
190
ANEXO LL
Figura 34–Jornais contra a Umbanda em Alagoas nas décadas de 1950 e 1980
Fonte: Autor (2016).
191
ANEXO MM
Figura 35–Registro sobre Viçosa em 1977 e pesquisa de campo
Região da Rua Nova – agosto de 2014
Zona Rural de Viçosa/AL
“Matança pra Exu” – pesquisa de campo – agosto de 2014
Fonte: Magno Dantas (2016)
192
ANEXO NN
Figura 36 – “Marca” deixada por Exu Caveira e fim de “toque” de Exu
Fonte: Autor (2016).
193
ANEXO OO
Figura 37 – Homenagem à Mãe Bastiana, falecida em julho de 201370
Fonte: Autor (2016).
70
Durante dezesseis meses de pesquisa (entre janeiro de 2009 e maio de 2010), a Mãe Bastiana recebeu
gentilmente o pesquisador cedendo entrevistas, oferecendo café e hospedando-o em sua residência. O Salão
Palácio da Oxum Menina ainda permanece sem atividades até a presente data (2016). Em contato recente com
seus familiares em Maceió, informaram que não há uma data para a retomada das atividades religiosas ali.
194
ANEXO PP
Figura 38 - Socialização da pesquisa com a sociedade viçosense – novembro de 2013
Fonte: Autor (2016). Ascom Viçosa /AL (2013)
195
ANEXO QQ
Figura 39 – Mapas do Município de Viçosa e do Estado de Alagoas
Região do Vale da Paraíba em Alagoas
Fonte: https://www.google.com.br/imagens.Acesso em: 14. out de 2015.