Peço licença ao velho Rubem Braga. Primeiramente, por me atrever a escrever e “adentrar” em uma área de seu brilhante domínio; segundo, por escrever sobre duas de suas paixões, temas recorrentes de suas crônicas: pássaros e mulheres. Entretanto, adianto não se tratar de quaisquer pássaros e muito menos de quaisquer mulheres.
Passeando por uma cidade de aspecto colonial, mas de clima bastante tropical, escutei um pássaro cantar. Era um canto belo, doce, mas não consegui identificar simplesmente por que não estou em casa. Sim, na minha Maceió eu costumo me atrever a identificar cantos de pássaros, nem que seja na base do “chute”. Mas aqui em Vale Real, um inferno gaúcho metido a paraíso europeu, desconheço e nem me atrevo a arriscar qualquer palpite.
O negócio é que o canto dele me fez compreender o quanto os sabiazinhos da minha terra me são importantes. Num jeito meio Castro Alves de se expressar, o sabiá, esse pássaro malandro freqüentador de toda palmeira ou pé de amêndoas, é a representação da simplicidade elegante do brasileiro, e mais especificamente nessa ocasião, do nordestino. Não que sabiás sejam exclusividade do Nordeste, mas garanto não ter visto nenhum enquanto estive no Sul.
O canto elegante desse pássaro sulista me encheu de saudade dos meus sabiás tanto quanto duas moças loiras que vinham voltando de algum colégio da região me fizeram sentir falta das nossas morenas. Eram lindas, joviais, deviam ter seus 17 anos. Aliás, aos 17 anos a mulher possui uma aura perigosa, de tragédia, como se estivesse prestes a alçar um grande vôo em direção ao coração do primeiro desavisado que surgir. São mortais dentro da sua beleza e juventude. Todo cuidado é pouco com moças na flor dos seus 17 anos.
Elas passaram risonhas e brancas, muito brancas dentro do seu uniforme de colégio justo e excitante. Gosto de loiras; acho-as diferentemente lindas. Mas a beleza delas só me fez lembrar o quanto as morenas, as queimadas moças nordestinas, são também alegres, joviais e especiais. Mulher é mulher, concordo plenamente. Só acho que sentiria saudade se deixasse as moças das praias, com suas marquinhas de biquíni e um sotaque gostoso igual ao meu para trás. Mesmo se fosse por uma dessas lindas estudantes com pretensão a Gisele Bündchen.
Fiquei pensando em pássaros e mulheres, até perceber ser o dia internacional da mulher. Parabenizei as que estavam ao meu alcance no momento e continuei a lembrar de sabiás e morenas. A mulher também voa, bate asas, canta docemente e pode ser intempestiva. Mulheres, de qualquer canto do mundo, nunca dizem tudo, sempre percebem geral talvez por, como os pássaros, terem uma intuição aguçada e que nos faltou. É a junção da razão e da emoção. Uma mulher com ódio é pior que mil homens, pois são Medeias e Marias, luz e escuridão, misteriosas como os pássaros. Saí de onde estava com a certeza de não se poder confiar em pássaros nem aprisionar, nunca, mulheres em gaiolas. Ambos têm naturezas parecidas.
O pássaro parou de cantar, as moças se foram, mas eu fiquei a lembrar das mulheres de minha família, referências fortes, das amigas presentes e ausentes, de ex-namoradas e de como cada uma parecia uma tigresa com alma de passarinho. Seriam capazes de matar ou amar cantando. No entanto um chapéu tem de ser tirado para elas, simplesmente por serem mais fortes e inteligentes que nós homens, pois temos o costume idiota de aprisionar passarinhos. Acho que o Velho Braga concordaria plenamente.