A Modernidade rompeu tradições e promoveu inúmeras transformações, em todo mundo, que vão desde as inovações técnicas e tecnológicas a uma revolução nas formas de comunicação e nas relações humanas. No entanto, sabemos que a modernidade não trouxe consigo somente coisas boas, pois, a partir da lógica industrial e mercadológica de racionalidade, instrumentalização e materialismo, ela reorganizou os valores éticos e morais, as ralações sociais e a própria subjetividade do homem enquanto indivíduo.
Hoje, vivemos num mundo em crise cheio de insegurança, intolerância, individualismo e ambição. Essa crise tem feito crescer nas pessoas um sentimento bastante desagradável: o medo. É fato que, hoje, se sente muito mais medo e insegurança do que no passado e que doenças e transtornos – como a depressão, a síndrome do pânico e a fobia –, causados por ele são cada vez mais frequentes.
Universal e presente em toda a história do homem, o medo é uma reação em cadeia no cérebro que tem início com um estímulo de estresse e termina com a liberação de compostos químicos que causam aumento da frequência cardíaca, aceleração na respiração e energização dos músculos. Embora seja uma sensação desagradável, o medo, até o nível da normalidade, é um mal necessário, pois o receio e a apreensão causados por ele nos protegem de perigos. A psicóloga maceioense Conceição Honorato explica que o medo também é adquirido e que para nossa proteção somos ensinados a temer algumas coisas. Por exemplo, quando uma criança é orientada pela mãe a não pôr o dedo na tomada, através do medo de receber um choque, ela estará se protegendo.
Mas quando é que o medo deixa de ser um mecanismo de defesa, um bem profilático, para se tornar algo ameaçador que pode comprometer nossas atividades cotidianas e nossas relações sociais?
Há dois transtornos causados pelo medo excessivo: a síndrome do pânico e a fobia. A síndrome do pânico é um distúrbio sério que se caracteriza por crises súbitas de pânico sem fatores desencadeantes aparentes. O ataque pode acontecer em qualquer lugar ou situação, quando se menos espera. A partir do primeiro ataque a pessoa tende a evitar a situação ou lugar em que ocorreu a crise, foi o que aconteceu com Rodrigo Cavalcanti, 28 anos, de Olinda (PE). “Meu primeiro ataque aconteceu na sala da minha casa, onde eu estava deitado assistindo a um DVD. Depois daquele dia eu passei uns quatro meses sem querer colocar um DVD pra assistir, com medo de passar mal na frente da tevê outra vez”, conta Rodrigo.
PREDISPOSIÇÃO GENÉTICA –Tanto a síndrome do pânico quanto a fobia não são gerados apenas pelo fator psicológico, há também a predisposição genética. Segundo a psicóloga Conceição Honorato, estudos detalhados foram feitos e mostraram casos de gêmeos criados em lugares e culturas diferentes que desenvolveram o mesmo medo fóbico. Hoje, de 2 a 4% da população mundial sofrem de síndrome do pânico, a maior parte dessas pessoas são mulheres. Mesmo com um número alto de pessoas com pânico, o diagnóstico ainda demora a acontecer, pois, ao identificar sintomas como taquicardia, muitas pessoas procuram um cardiologista e não um psicólogo ou psiquiatra. Os sintomas são vários: tontura, coração disparado, sudorese, falta de ar etc. “Quando se tem um ataque, a única coisa que a gente sente é que vai morrer. Simplesmente isso”, explica Rodrigo sobre os sintomas do ataque de pânico.
A fobia caracteriza-se por um medo desproporcional à ameaça, um medo irracional. As pessoas que sentem esse medo irracional e incontrolável tendem a evitar a situação ou coisa ameaçadora. Existem três tipos de fobias: a agorafobia, a fobia social e a fobia específica. A agorafobia é o medo de lugares ou situações onde possa ser difícil escapar ou ser socorrido. Quem sofre da agorafobia tende a evitar multidões, sair de casa desacompanhado, pegar ônibus. A fobia social é quando se tem medo de passar vergonha, de ser humilhado e ofendido pelas pessoas. Pessoas com fobia social têm dificuldade de falar em público, de iniciar conversações, de ter encontros amorosos. Já a fobia específica é o medo irracional de objetos, animais, coisas e situações específicas.
Théo Queiroz, 23, de Maceió, Layz Costa, 22, de Feira de Santana (BA) e Olindina Rodrigues, 73, também de Maceió sofrem de fobia específica, cada um por uma ameaça diferente. Théo tem medo de injeção e conta que desde criança não toma vacina. Quando faz exames de sangue é inevitável, ele procura não olhar para a seringa, mesmo assim se sente muito mal, suando muito, sentindo tontura e calafrios. Layz tem fobia de aranhas e sente que isso a atrapalha muito. “O que eu mais desejo é passar por um tratamento e me sentir mais livre, me sinto presa, cheia de limitações”, conta ela. Não é tão comum que pessoas com fobia procurem tratamento, pois para muitos só evitar a ameaça já é suficiente. Dona Olindina conta que tem fobia de répteis, seja um jacaré ou uma lagartixa, e que evita vê-los até na televisão. Ela chegava a tirar o jacaré, símbolo de uma marca de roupa, das camisas do marido para não ter que olhar para ele. Muita gente não compreende os medos de quem tem fobia e pânico, chamam de “frescura”, agem com preconceito, o que pode piorar ainda mais os transtornos.
A informação ajuda muito no tratamento desses distúrbios e, hoje, há inúmeros sites, blogs e fóruns na internet, onde as pessoas pegam, transmitem e trocam informações. Os tratamentos são vários e em muitos casos é necessário o uso de remédios. O importante é que, a partir do diagnóstico e da informação sobre o transtorno, a vítima procure um psicólogo ou psiquiatra para receber o tratamento adequado. Medo de bichos, de gente, de altura, de avião, de elevador, de morrer e até de viver, medo do medo. A vida tem se tornado tão perigosa e insegura que são cada vez maiores e mais diversos os nossos medos.