:: Projeto de Extensão Coordenado pelos professores e jornalistas
:: Erico Abreu (MTb 354-AL) e Francisco de Freitas





De:
Por:
Clique para fazer a busca!
MENU
 

Universidade Federal de Alagoas - UFAL
 

23/10/2009
Saúde
A VIA CRUCIS DOS VICIADOS

Centros de tratamento são a esperança para muitos jovens que enveredam pelo caminho, quase sempre sem volta, das drogas

Por Porllanne Santos

Com cerca de um milhão de habitantes, Maceió vive um verdadeiro drama por possuir 47% da população de crianças e adolescentes envolvida com drogas. Os dados são resultado de um estudo realizado pela Universidade Federal de Sergipe (UFS), que mostra a dura realidade daqueles que deveriam ser o futuro da capital alagoana. Nas pesquisas e entrevistas realizadas com psiquiatras, psicólogos e especialistas de centros de reabilitação para usuários de drogas, o problema provém, na maioria dos casos, do mesmo motivo: a desestruturação familiar.

O Centro de Atenção Psicossocial - Álcool e Drogas de Maceió (CAPSad), recebeu, do início do ano até abril, 191 usuários de drogas, pertencentes geralmente às comunidades mais carentes do município. O CAPSad, que originalmente seria para tratar apenas casos de crianças e adolescentes viciados, estendeu os serviços para tratamento de adultos desde o início do ano passado, e, ainda assim, a demanda que chega ao local de menores viciados corresponde a pouco mais da metade dos casos tratados pelo Centro.

A coordenadora administrativa do CAPSad, Roberta Moreira, explica que a maioria dos menores que são tratados pelo Centro é levada pela família ou encaminhada pelo Conselho Tutelar judicialmente. “A demanda das crianças que chegam é muito grande e a cada dia percebemos que os casos de usuários se iniciam mais cedo, entre 7 e 9 anos. A maioria é encaminhada pelo Conselho Tutelar, como menor infrator, ou pela família, que, infelizmente, vê o Centro como uma forma de se livrar do problema”, explica.

De acordo com a coordenadora, o CAPSad recebe uma demanda exorbitante de menores viciados em crack, droga que, segundo Roberta, é altamente danosa ao organismo e que desenvolve dependência em curto período de tempo. O Centro funciona de segunda a sexta com um sistema de tratamento baseado em medicamentos e atividades de grupo, que tem intuito de realizar a reintegração social do menor. Roberta assegura que todo o tratamento é acompanhado por especialistas.

“Nós temos três modalidades de tratamento, a intensiva, que consiste no tratamento diário do usuário, a semi-intensiva, em que o usuário deve comparecer ao Centro ao menos doze vezes por mês e a não intensiva, que consiste em três visitas mensais. Todo o tratamento é acompanhado por especialistas e os usuários são medicados conforme a necessidade” – comenta.

FAMÍLIA: A BASE DE TUDO – A psiquiatra Vânia Fontan, que também trabalha no CAPSad, ressalta a importância da interação da família no tratamento dos menores usuários de drogas. Para ela, a estrutura familiar e a falta de limites estabelecida pelos pais, ou responsáveis, são as principais causas do problema. “A eficácia e efetividade do tratamento não funciona sem a família. Nós registramos muitos casos de recaída, e geralmente é detectada a ausência da mesma no acompanhamento do tratamento. A família deve estar presente principalmente no que diz respeito à ressocialização do usuário”, esclarece a psiquiatra.

Maria Cristina da Silva, 39 anos, é mãe de um usuário que iniciou o vício ainda no início da adolescência. Bruno Henrique da Silva se encontra hoje no Manicômio do Sistema Prisional e tem 24 anos. Ele está internado há 6 anos, a pedido da mãe, após ter assassinado a própria avó, com quem vivia, a golpes de peixeira. Cristina conta que Bruno Henrique degolou a avó e a esquartejou durante um delírio decorrente do efeito do crack.

“Quando percebi que meu filho estava viciado, tentei de todas as formas afastá-lo das drogas, mas percebia-o cada vez mais agressivo, por isto muitas vezes dava dinheiro para ele sustentar o vício, por ter medo que ele cometesse maiores delitos, como roubar. Chegou uma hora que eu não tinha mais dinheiro, e ele passou a vender seus próprios pertences, até que ele foi ameaçado de morte por um traficante por causa de dívidas”. Segundo Cristina Silva, foi uma época muito difícil. Ela teve que mandá-lo para Brasília para iniciar um tratamento, mas quando Bruno Henrique voltou estava pior e foi então que assassinou sua avó. “Mesmo diante de tudo, não me separo dele. Sou a única pessoa que o visita e que o ouve. Amo meu filho e tenho um compromisso enorme com ele, mesmo tendo medo de como será a nossa vida quando ele sair do manicômio”, ressalta.

OS GRANDES DESAFIOS – Apesar de todas as boas intenções do trabalho realizado pelo CAPSad do município, a realidade, segundo Alexandra Beurlen, promotora da 1ª Vara da Infância e da Juventude, está muito aquém do que deveria ser feito para, de fato, sanar o problema. Segundo a promotora, o CAPSad não supre a necessidade, nem tampouco, atende à demanda dos menores usuários de drogas.

“O CAPSad não possui internamento, os usuários são atendidos de segunda a sexta e das 8 às 17 horas. E o restante do tempo? Além disso, eles têm carência de material humano e de capacitação de profissional. Eles não têm transporte para realizar visitas nas residências dos usuários para dar um melhor atendimento, caso o menor não compareça, e não há um tratamento direcionado para o menor, uma vez que, no Centro, ficam misturados maiores e crianças e adolescentes que cometeram diversas infrações”, alerta.

De acordo com Alexandra, o Ministério Público entrou com uma ação, em junho de 2004, para que o município de Maceió criasse uma política pública de tratamento de crianças e adolescentes usuários de drogas, mas, segundo ela, a prefeitura alega que o CAPSad supre as necessidades da demanda. “O juiz Fábio Bittencourt concedeu uma liminar, em 2007, determinando que o município criasse um programa no prazo de 90 dias sob pena de multa de três dias de atraso, mas a prefeitura argumenta que o CAPSad atende às necessidades do município”, esclarece.

Algumas denúncias foram realizadas por usuários que necessitaram do tratamento do Centro e perceberam, através de formas alternativas, que a metodologia utilizada pelo CAPSad não era uma das mais eficazes. “Eu passei pelo CAPSad duas vezes, a última foi a vez em que eu cheguei ao fundo do poço. Perdi toda a credibilidade da minha família e valores que eu julgava não conseguir mais resgatar, tudo por conta da ociosidade em que vivíamos e que nos levava a usar drogas dentro do próprio Centro. Quando percebi já havia perdido a minha vida e nada mais fazia sentido, o que deveria me ajudar já me prejudicava, e eu não tinha para onde ir. Foi quando ouvi falar da Fazenda da Esperança e resolvi apostar minha vida nela”, diz um dos internos da Fazenda que já está próximo de terminar o tratamento, e que não quis se identificar.

SEMPRE HÁ ESPERANÇA – Baseada no princípio da religiosidade, a Fazenda da Esperança , segundo estimativas do próprio projeto, conseguiu tirar do vício centenas de usuários de drogas. O projeto é uma iniciativa da Igreja Católica, que nasceu em São Paulo há 26 anos. Em Maceió, a igreja possui uma filial em Marechal Deodoro desde agosto de 2007 e já conseguiu resgatar 80% dos que fazem parte da Fazenda em Alagoas.

O tratamento, segundo um ex-viciado e um dos coordenadores da Fazenda no Estado, Pablo Duchintanga, é baseado em uma rotina bem trabalhada e com princípios no tripé que corresponde à espiritualidade, convivência e trabalho. “É importante que o usuário venha por conta própria, que ele admita para si mesmo que está viciado e que precisa de ajuda. Aqui ele aprenderá a conviver em sociedade, sem individualismo e sem o uso da droga. O tratamento dura um ano e, assim que chega, ele passa 90 dias sem contato com a família, para que ele possa reavaliar a valorização que ela tem, após esse período ele passa a receber visitas mensais de familiares mais próximos”, esclarece Pablo.

A Fazenda da Esperança não faz uso de medicamentos, todo o tratamento é realizado com base em uma vida espiritual mais trabalhada e com um convívio humano mais seguro. A Fazenda conta com biblioteca – que recebe doações de livros – salas de lazer, dormitórios, salas para meditação, espaço para realização de atividades agrícolas e campo de futebol.De acordo com Pablo, para fazer parte da Fazenda, o usuário precisa dar uma quantia de três salários mínimos e vender uma cesta de produtos, confeccionados pelos próprios usuários, no valor de um salário.

“Nós temos certeza de que esse é um método muito eficaz. A droga não escolhe classe, idade ou cor e nós estamos preparados para resgatar a todos que precisem de nossa ajuda. O tempo de um ano de tratamento é uma experiência única para o usuário. Neste intervalo de tempo ele fecha um ciclo e pode perceber que pode passar todas as datas de sua vida sem o uso de drogas”, emenda.

DRAMAS –J.O.S., de 15 anos, iniciou a vida no mundo das drogas aos 7. O menor, que atualmente está recebendo tratamento pelo CAPSad de Maceió, conta que chegou ao Centro encaminhado pela unidade de saúde da comunidade onde vive, após ter passado por uma crise de asma, decorrente do uso do crack. “Eu fumei maconha pela primeira vez, forçado por um traficante, quando tinha 7 anos. Já fui ameaçado de morte e já furei um cara porque ele queria dar uns pega no meu melado [maconha misturada com crack] e até hoje não sei se ele morreu. Esta é a segunda vez que eu venho pra cá. Me arrependo de usar drogas porque sei que não leva a pessoa a nada”, conta.

Marcos Vinícius Costa Rosa, 18, é ex-usuário e, hoje, um dos responsáveis pela Fazenda da Esperança de Alagoas. Ele, que é natural do Rio de Janeiro, atribui o crescente número de jovens se envolvendo com drogas não só à desestruturação familiar, mas também, ao descaso do Governo.

“A droga não escolhe a quem, atinge todas as classes e cor. Eu era muito solto, filho de pais separados e passava muito tempo ocioso. O menor carente não pode trabalhar, depende apenas da má educação e influência que é passada nas escolas públicas e tem como opção passar o tempo na rua. Quem não tem oportunidades no Rio, quer ser bandido para matar polícia e adquirir respeito, somos muito embalados pelo que passa na mídia e comigo não foi diferente’, relata Marcos Vinícius.

Como a maioria dos usuários, ele disse que passou a traficar para sustentar o vício, fui internado várias vezes em clínicas de reabilitação e quando se recuperava, “arrumava um bico” e passava uma semana no morro gastando o dinheiro com o crack. “Já fui preso por roubo, cheguei a fugir de uma clínica, até que, em meus 14 anos eu havia chegado ao fundo do poço. Foi quando minha mãe me levou para a Fazenda, eu me recuperei e hoje sou um dos responsáveis pela Fazenda daqui”, ressalta Vinícius.

CONTATOS – Fazenda da Esperança: 3260-7192; CAPSad - 3315-3075 / 3346-0917

Clique nas fotos para ampliá-las.

Clique para ampliar Clique para ampliar Clique para ampliar Clique para ampliar
Clique para ampliar Clique para ampliar Clique para ampliar Clique para ampliar
Clique para ampliar Clique para ampliar Clique para ampliar Clique para ampliar