“Tempo é vida”. Para milhares de pessoas essa expressão tem uma importância a mais além da força de sua concepção. Concluída em outubro, a campanha para doação de órgãos que adotou esse slogan desde 2006 não passa, ela é permanente. Apesar de registrar um aumento de 300% nas doações de rins e córneas em relação a 2006, a Central de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos de Alagoas que existe desde 1997, passa por dificuldades nos diversos processos que envolvem um transplante.
Um relatório elaborado pela equipe de assistentes sociais da CNCDO-AL, traça entre os anos de 1997 e 2007 um perfil dos doadores alagoanos. Foi constatado que os homens são a maioria, representando 73%. Uma informação importante diz respeito a doadores em potencial e os motivos de sua morte. Armas de fogo e acidentes de transito representam maioria das mortes por traumatismo craniano. Os tipos de óbitos por causas desconhecidas estão em segundo e as paradas respiratórias em terceiro. Quando é constatada uma morte cerebral nos hospitais, a equipe da Central começa uma corrida contra o tempo na tentativa de sensibilizar os parentes da vítima a doarem os órgãos para que eles passem a funcionar no corpo de quem ainda vive.
Atualmente, o Sistema Nacional de Transplantes tem aproximadamente 70 mil brasileiros aguardando a chance de prolongar e melhorar seus dias depois de um transplante. As cidades de Roraima e Tocantins não contam com CNCDO e o Amapá não possui hospitais credenciados para as cirurgias. Os transplantes no Brasil são feitos pelo SUS, que paga todo o procedimento e tratamento.
O maior problema para conseguir doadores está desde os primeiros atendimentos aos pacientes internados nos hospitais e pronto-atendimentos, até a papelada que a família preenche para oficializar o processo. A atendente da equipe diz que há negligência em alguns hospitais que não contatam a Central para que haja a captação a tempo. O presidente da Associação dos Renais de Alagoas, José Wilton, fala sobre quantidade de reclamações dos parentes com relação ao socorro e ao tratamento médico deficiente oferecido as vítimas, que segundo ele são enormes. Por conta disso muitas pessoas se recusam a colaborar. Os dois representantes das entidades disseram já ouvir famílias declararem que só começam a ser bem tratadas depois que o paciente morre. A prova consta no Perfil, 69% do não aproveitamento de órgãos aconteceram por negação dos familiares.
Para a equipe da Central de Órgãos a situação é mais complicada porque sua atuação só acontece depois do parecer que tira as esperanças de sobrevivência do individuo. Outra informação transmitida por José Wilton é a de que não há campanha para arrecadação de doadores cadáveres. Os números referentes a essa modalidade de doador apontam que a quantidade de órgãos arrecadados desse grupo é quase cinco vezes maior do que os que apresentavam morte por parada cárdio-respiratória, encefálica ou por acidente vascular cerebral.
Assistência questionada – Mesmo com essas dificuldades o aumento nos números de órgãos doados significa um avanço, a conscientização da população aos poucos está acontecendo. Para quem ainda espera pelo transplante, o tratamento para manter-se vivo nas condições mínimas é sempre árduo. Em Maceió quem precisa de diálise procura os hospitais Sanatório, Santa Casa, Açúcar, Universitário, Ortopédico e algumas clínicas credenciadas. Nessas unidades as reclamações com relação ao atendimento e estrutura destinados para pacientes do SUS são graves, resultando em denúncias enviadas aos Ministérios Públicos, Conselhos de Saúde, Associação dos Renais e sindicatos, além do próprio Estado que admite a falta de recursos para equipar e manter os locais de atendimento. Um triste dado relatado por José Wilton é de que a cada dez pacientes que esperam pelo órgão, oito não resistem. Há 596 pessoas na fila para receber um rim e uma quantidade que representa metade dessa demanda tentando entrar na lista, ou seja, doentes ainda sem tratamento.
Em Alagoas só são realizados transplantes de rins, córnea e coração. Este último possui referência nacional e está comemorando 20 anos de cirurgias bem sucedidas. Há algumas exceções para fila de espera. Pacientes cadastrados que estejam em situação crítica passam à frente de outros com casos controlados. Estando em qualquer lugar do País ou em uma cidade diferente à do órgão doado, ele tem a chance de salvar-se. Ao todo já foram feitas cerca de 410 operações no Estado. Só o número de pessoas em Alagoas esperando por uma oportunidade nessas três especialidades passa de 1 mil. Na última semana de outubro mais uma vida foi prolongada. O comerciário João Batista de Brito de 62 anos foi submetido a um transplante de coração realizado na Santa Casa. A equipe comemorou a cirurgia, um procedimento cardíaco que não acontecia no Estado há três anos.