Quem escolhe cruzar o litoral pela rodovia AL-101 Norte, ao passar nos municípios de São Miguel dos Milagres e Porto de Pedras não deve perder a chance de olhar suas ruas e o interior das casas do local. Ali, em algumas delas será descoberto um trabalho que envolve habilidade, imaginação, sustentabilidade e bom gosto: o artesanato das palhas.
Nas pequenas cidades o mapeamento feito pelo censo do artesão alagoano 2008 indica que existam em torno de quarenta pessoas que têm como complemento de renda o artesanato. Boa parte delas trabalha com o ouricuri, o coqueiro, dendê, entre outros materiais, para fabricar de utensílios domésticos a peças de decoração.
Na comunidade do Toque em São Miguel dos Milagres a primeira lojinha visitada leva o nome da pessoa que levou a matéria prima para dentro de casa. A história que a nova geração narra é de que aprendeu de alguém que aprendeu lá atrás. Hoje Márcio Moura trabalha com a noiva, que é filha dessa nova geração de artesãs do local e já tratou de ensinar o ofício ao futuro marido. O casal tira por mês em torno de R$ 800, desenham muitos formatos e produziram até agora aproximadamente cem modelos de diversas utilidades.
Márcio conta que o turista gosta do material, mas tem dificuldade de levar algumas peças pelo tamanho, então escolhe as menores para não sair sem nada. Os preços agradam, dá para levar por R$ 5 uma bela caixinha, e quem tem R$ 50 leva um tapete ou uma luminária de até um metro e meio. Na casa de Laudinete Maria, a Lau, ela, o marido e as primas produzem por mês cerca de 200 peças ao total. As pousadas compram constantemente a sua produção que também está sendo repassada para uma loja de presentes em Pernambuco.
Em vários trechos do povoado Porto da Rua, as mulheres e crianças vigiam a palha secando no asfalto. A cada três meses um atravessador de Maceió compra dessas famílias o cento de vassouras por R$ 32 e os revende nas feiras da Capital pelo dobro do que pagou. Dona Maria Petrúcia e sua nora contam que pagam as contas de casa com a renda: “Compro roupa, pago água, luz e ainda sobra para ajudar na reforma de casa”, conta satisfeita a senhora que observa a filha de 11 anos seguir seus passos. Cada artesão produz em média 2.000 vassouras a cada três meses, é sempre assim segundo elas.
Supervalorização e desprezo – A quantidade de dinheiro gerada somente pelas palhas do Litoral Norte não estão especificadas nos números oficiais. O senso do artesão alagoano apresenta um número total e cadastrou até setembro deste ano 7.000 pessoas em todo o Estado. Segundo dados divulgados no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic), No Brasil são cerca de 8,5 milhões de pessoas neste segmento, gerando uma renda total de R$ 28 bilhões por ano, representando 2,8% do PIB nacional.
Enquanto a valorização desse mercado cresce no sentido de dar mais espaço aos produtores de arte locais, quem precisa das palhas – principalmente o ouricuri –, encontra dificuldades de conseguir a matéria prima nos povoados e municípios. Os sítios da região onde as palmeiras eram abundantes há algum tempo atrás, foram devastados por conta da especulação imobiliária e o plantio de roças. Atualmente os artesãos compram a palha do ouricuri pronta a R$ 2,50 o quilo. Para as produtoras de vassouras o valor da caçamba do produto ainda verde é de R$ 140.
“Se dão terra para os sem-terra porque não ajudam os sem ouricuri”, diz Dona Ilza dos Santos. Assim como ela, a preocupação da perda da matéria prima de quem faz desse segmento seu meio de vida é grande. Quanto mais espaço a palmeira que leva em torno de quatros anos para começar a produzir perde, os artesãos vêem seus dias de trabalho com essa palha, contados. A diminuição dos espaços faz o valor subir e como não contam com equipamentos e incentivos das prefeituras, as pessoas, assim como sua arte, podem passar a ser mais um grupo marcando o caderno de raridades brasileiras.