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Universidade Federal de Alagoas - UFAL
 

27/06/2008
Opinião
Na ponta do fuzil

Crônica: João Paulo da Silva

Por João Paulo da Silva

Tem uma frase do Eduardo Galeano que diz: “Os policiais não combatem os crimes, porque estão ocupados cometendo-os.” O massacre ocorrido no último dia 14 de junho, no Morro da Providência, Rio de Janeiro, nos permite incluir o Exército na frase do escritor uruguaio.

A polícia e o Exército são os dois braços armados do Estado. E, ao contrário do que é dito, não existem para “servir e proteger” ou para “garantir a segurança do Brasil”. Quer dizer, desculpem. Cometi um engano. Existem pra isso sim. O problema é que nenhuma dessas duas forças está a serviço dos trabalhadores. E muito menos dos negros e pobres deste país. Um exemplo para ilustrar o fato: Quando os trabalhadores, a população miserável e os movimentos sociais saem às ruas exigindo melhores salários ou melhores condições de vida, são recebidos justamente pela polícia e – a depender da situação – pelo Exército. E esta recepção não vem na forma de boas-vindas. Vem no formato de tiros e cassetetes. Entretanto, não vemos nem a polícia nem o Exército baterem nas portas dos patrões quando estes reduzem salários ou cortam direitos dos trabalhadores. Portanto, o “servir e proteger” ou o “garantir a segurança” não pertencem ao povo negro e pobre.

A participação de soldados do Exército na execução dos três jovens negros por traficantes do Morro da Minerva demonstrou a verdadeira face das Forças Armadas. Deixou tão visível quanto uma fratura exposta. No entanto, alguém – por incrível que pareça! – pode argumentar: “Mas não foram os soldados que mataram os rapazes. Foram os traficantes.” Ora, e desde quando existe diferença entre aquele que puxa o gatilho e o que manda puxar? A corrupção e o papel nefasto da polícia, agindo em conjunto com os traficantes, subindo o morro para deixar corpo no chão ou formando milícias que aterrorizam a população das favelas, não são novidades. Agora, com o Exército sendo colaborador de extermínios como este em questão, podemos estar diante do último sopro de confiança depositado nestas forças. A fala de um operário e morador do Morro da Providência deixa claro: “Ninguém os quer mais na comunidade. Não temos mais confiança na roupa verde do Exército.”

Os três jovens voltavam de um baile funk quando encararam a ponta dos fuzis dos soldados. Eram estudantes e trabalhadores. Um deles, inclusive, iria começar a trabalhar nas obras que estavam sendo realizadas no morro. Não deu tempo. Depois de espancar, os boinas-verdes entregaram os garotos aos traficantes por seis mil reais. Três vidas, três estudantes, três trabalhadores, três pobres, três negros. A participação do Exército nessa higienização social é a consolidação da política de segurança fascista do governo de Sérgio Cabral, com o apoio de César Maia e Lula. E não adianta o presidente demonstrar indignação com o ocorrido. Ele mesmo, após um outro massacre realizado pela polícia do Rio no Complexo do Alemão em junho do ano passado, apoiou a ação criminosa do governador Sérgio Cabral dizendo que “a polícia não estava diante de nenhuma pessoa santa”. E as desculpas e indenizações não serão redentoras de ninguém.

Não bastando o circo de hipocrisia montado após a tragédia, os governos, o ministro Nelson Jobim e a imprensa burguesa saíram desesperados para apagar a chama que se acendeu na Providência. Todos querendo convencer a população de que o “incidente foi um caso isolado”. Claro que foi! O Complexo do Alemão e tantas outras chacinas promovidas pela polícia e pela Força de Segurança Nacional também foram casos isolados. Tal argumentação me faz concluir o destino de parte da madeira devastada na Amazônia. Serve para montar o grande número de caras-de-pau deste país. E aqui cabe um detalhe interessante: a imprensa que, após o crime dos soldados, se mostrou consternada com os assassinatos foi a mesma imprensa que aplaudiu de pé as ações fascistas do Bope no filme Tropa de Elite. Não tenho dúvidas de que os homens do Exército e da polícia são treinados com base na máxima política do Washington Luís: “a questão social é um caso de polícia”. E do Exército também.

Mas talvez a maior de todas as verdades seja aquela que todos nós já sabemos: os grandes isolados são os negros, pobres e miseráveis dos guetos e favelas deste país. São eles que vivem cercados por um verdadeiro Eixo do Mal. De um lado, o governo. Com sua política neoliberal de geração de desemprego e miséria. Do outro, o narcotráfico, que recruta a juventude miserável e sem perspectivas para a criminalidade. Por fim, na outra ponta estão a polícia e o Exército, exercendo a força e a violência com critérios racistas.

Em outro texto argumentei que não se resolverá o problema da criminalidade aumentando a repressão contra os grandes bolsões de miséria. Não precisamos de balas e terror. Precisamos de empregos, melhores salários e gigantescos investimentos nas áreas sociais. Lula sabe disso. Mas não está disposto a fazer. A conclusão é cruel: o máximo que se pode esperar de César Maia, Sérgio Cabral e Lula são mais e mais corpos. E, infelizmente, eles serão de trabalhadores, negros e pobres.

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