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_vol 1 n. 2 - janeiro/junho de 2008

 

           

A fotografia e sua Interface com a arte pós-moderna

expediente  


Jakeline Siqueira de Melo

Jornalista especializada em mídia impressa: Jornal de Alagoas, OJornal, jornais de pequenos meios, news letter, professora substituta da Universidade Federal de Alagoas-UFAL e professora assistente I da Faculdade de Administração de Alagoas-FAA. Especialista em Docência do Ensino Superior e MBA em Design Estratégico pelo Centro de Estudos Superiores de Maceió- Fejal -Cesmac/Alagoas

Resumo:
Este trabalho trata da relação da Fotografia no contexto da arte pós-moderna. A arte pós-moderna explora todas as nuances possíveis no lidar com o seu observador, este passa de mero expectador para um intérprete, um interlocutor, receptador dessa arte e até mesmo ativista da idéia que a obra de arte expressa. Para essa relação de troca com seu público, o artista utiliza recursos audiovisuais cada vez mais sofisticados, entre eles; a fotografia. Nesse contexto, a fotografia passa de um simples recurso visual para ser uma ferramenta de suporte e interface com o público facilitando a interatividade entre artista, obra de arte e público.


Palavras-chave: 1.Fotografia 2. Recursos visuais 3.Arte pós-mderna


Evolução Técnica
A evolução técnica da Fotografia passou por muitas nuances, muitos inventores, e, ao longo da história por combinações de invenções: dos árabes no século X com Aihazen, que descreveu em manuscritos como observar um eclipse solar no interior de uma câmara escura, até na China onde eram desenvolvidas na mesma época técnicas de gravura que se adaptavam bem à impressão dos ideogramas da língua chinesa. Lembrando que, ao longo do tempo, o homem já vinha desenvolvendo suportes para registrar sua história (realidade vivenciada) e seu conhecimento, utilizando suportes como rochas nas cavernas, couro, madeiras, argila, papiro e seda. ”O nascimento da Fotografia está estreitamente ligado às tentativas de aperfeiçoamento dos métodos de impressão sobre papel, e, os chineses foram pioneiros nisso (...)” (SENAC, 2002).
No Renascimento (séculos XV e XVI) a câmara escura foi utilizada por Leonardo da Vinci para melhorar a reprodução da ”realidade” em seus desenhos e pinturas, e, em seus estudos de perspectiva. Nesta época, a câmara escura era um quarto sem luz, com um orifício numa das paredes que permitia projetar, na parede oposta, uma determinada imagem na posição invertida. Logo, este tamanho incômodo foi substituído por uma caixa portátil, e o orifício por lentes simples. Este esquema serviu de modelo para as primeiras câmeras fotográficas. Existem estudos que Aristóteles, séculos antes de Cristo, já havia demonstrado o princípio da câmara escura. Assim, também ocorreu com os estudos científicos para chegar ao negativo. A câmara escura apenas permitia ver as imagens, mas não conseguia fixá-las. Era preciso algum suporte.
O Negativo
Em 1604, o italiano Angelo Sala descobriu que o Nitrato de Prata ficava negro quando era exposto ao sol. Mas, foi em 1725 que o alemão Johan Heindrich Schulze descobriu que era a luz do sol e não o calor que transformava os cristais de prata em prata metálica negra. Shulze conseguiu captar as primeiras imagens, mas não conseguia interromper o processo, e, quando as imagens saíam da câmera escura desapareciam.
São muitos os estudos realizados até chegar ao que a fotografia é hoje. Foram muitas descobertas e, portanto não apenas um único

inventor, pois em diferentes lugares, quase simultaneamente, vários pesquisadores chegaram a resultados parecidos em seus experimentos.
A primeira imagem produzida foi feita pelo francês Joseph Nicéphore Niépce, em 1826. Este chamou a técnica de heliografia, que significa ”escrita com luz solar”. Com o betume da Judéia e essência de Alfazema, Niépce conseguia fazer suas imagens. Mas, até a Academia Francesa de Ciências comunicar oficialmente a invenção da Fotografia em 1839, foram realizados muitas pesquisas por diversos cientistas. Niépce conseguiu produzir os primeiros negativos, em 1826. Mas, foi em 1839 que surgiu a Daguerreotipia, onde o inventor Louis-Jacques Mande Daguerre, pintor de paisagens e desenhista de cenários para teatro, descobriu um processo químico na revelação da imagem que reduzia o tempo de exposição, tornando o processo fotográfico mais simples. Em 1830, o matemático húngaro Josef Petzval fabricou nova lente dupla, trinta vezes mais rápida do que as anteriores, diminuindo mais ainda o tempo de exposição à luz. E, em 1841, o inglês Fox Talbot inventou o primeiro sistema simples para a produção de um número indeterminado de cópias, a partir de uma mesma chapa, o que permitiu que a fotografia se transformasse em um ”veículo de comunicação”. Entre descobertas, de vários outros cientistas, houve brigas de pintores e artistas com a fotografia e seus conceitos, assim como de cientistas,como a briga entre Laroche e Talbot, que foi parar nos tribunais londrinos. Laroche(ganhador da causa) alegava que ”os processos químicos do Calótipo (a invenção de Talbot) e o seu novo sistema de Colódio úmido, eram, na essência, iguais”. SENAC(2002: P. 160). O Colódio úmido foi inventado por Frederick Scott Archer, que não tinha patenteado a idéia. Embora pouco flexível e complexo, o sistema foi utilizado para registro da guerra da Criméia em 1855, pelo fotógrafo Roger Fenton, surgindo a especialidade da Fotografia temática. E, para registro da primeira exposição fotográfica feita pelo francês Hippolyte Bayard, em 24 de junho de 1839, que anunciou seu processo dois meses antes do lançamento da Daguerreotipia. Bayard foi totalmente esquecido pela história.
Realidade fotográfica
Enfim, de descobertas e invenções, a Fotografia traz diversas especificidades, sempre com o foco na ”realidade”, o que o ”olho ver”,

o que a luz registra. A Fotografia registra o momento em que a memória poderia guardar, mas não com tantos detalhes e tantas verdades, detalhes importantes impossível da memória registrar, como cores e traços, expressões, que a arte retrataria, não tanto como a realidade fotográfica. Por mais perfeita que a pintura traduza a imagem real, sempre tem o deslize da mão do artista e, principalmente seu modo de enxergar o mundo, sua expressividade, sua subjetividade. E, é justamente no modernismo que a arte se liberta. Mas, é no pós-modernismo que ela se descobre como arte sem limites. É uma história de muitos inventores, portanto contraditória, como a própria arte pós-moderna, com vários ”donos”, e, sendo de todos e de ninguém. Mas, além desta verossimilhança com o pós-modernismo, o melhor é o casamento que a arte pós-moderna fez com a fotografia.
Interatividade
Já na semana da Arte Moderna, a Fotografia encontrou sua libertação, ela poderia ser utilizada à vontade sem a preocupação de ter que ”retratar” a realidade tal qual ela é. A fotografia passou a ser utilizada por muitos artistas da forma que mais lhe conviesse. Com a arte pós-moderna ou contemporânea essa liberdade da fotografia transformou-se mesmo em libertinagem. Final do século XX, década de 90, a fotografia tem sua liberdade total com o advento da câmara digital. Agora, pleno século XXI, a fotografia é suporte e ferramenta fundamental em trabalhos audiovisuais, ela passa a fazer parte do contexto com a arte que interage com o público, seja através de reproduções em tela, colagens, mesmo com jogos de luzes. Segundo Santos (1991, p. 41), ”No pós-modernismo a paródia e o pastiche, antes ocasionais, hoje em dia são quase regras(...)”. Em outra página (1991, p.11) o autor acrescenta que ”(...) tecnociência, consumo personalizado, arte e filosofia em torno de um homem emergente ou decadente são os campos onde o fantasma pós-moderno pode ser surpreendido”.
No artigo ”Leituras de Obras de Arte e Discussão”, Lucimar Frange ressalta o uso da fotografia nos trabalhos de Regina Silveira, e a designa ”uma artista multimídia”. Segundo a articulista, o trabalho de Regina é uma ”associação de imagens, sombras, símbolos, simulacros, ajuntamentos, associações questionadoras de realidades visíveis e veladas”. A fotografia, neste caso, entra como coadjuvante do material principal, mas sem a luz e as nuances que ela traduz seria

difícil para a artista conseguir resultados surpreendentes como o trabalho ”Paradoxo do Santo”, realizado em 1994, em Nova York, quando a artista ”brinca” com as sombras de uma imagem religiosa, e, com o foco de luz consegue reproduzir uma imagem maior, que faz referência ao militarismo. Portanto, um retrato da realidade expressa nas imagens e suas metáforas com a idéia das representações históricas e ideológicas do que representa religiosidade e poder. Bem ao gosto da arte contemporânea, que deixa o interpretante passear a seu modo pela obra de arte. Uma exposição dentro dos princípios pós-modernos, que segundo Lucimar Frange, mais uma vez em seu artigo ”Leituras de Obra de Arte e Discussão” relata que ”as imagens têm poder de fala, pois são formas e estruturas de pessoas, que se indagam, se afirmam, se negam. (...), somos modalizados e modalizantes pelas manifestações visuais”.(p.11).
A fotografia e seus princípios de câmara escura, escrever com a luz, retratar a realidade. Assim também como o seu poder documental, sistematizado, enfim, suas funções de ferramenta, suporte e, principalmente de modificar sua genética, agindo em várias nuances desde os mais modernos meios de interação como os mais tradicionais se encontra plena na arte pós-moderna. E, tendo em sua história o gen híbrido de toda essa loucura e formação da arte pós-moderna, casa com esta arte, e fecha e abre ciclos de vida na Arte, fazendo história. Muitos artistas a utilizam em suas performances, como em murais visuais para a dança, como colagens em seus trabalhos de tela, como suporte em documentários, como temática em trabalhos multimídias. A fotografia e a arte pós-moderna andam de mãos dadas, paralelas, cada uma com suas ”neuras”. Mas, lado a lado elas se complementam em suas diversas funções, que cabe a cada artista fazer o que mais lhe convier, como ressalta Lucimar: ”O profissional das Artes, artista, professor, pesquisador têm uma responsabilidade ao fazer-ver, fazer-ouvir, fazer-significar, fazer-querer, fazer-crer, fazer-ser. Pelas formas, pelos sons, pelos corpos nos comunicamos, e fazemos com que os outros se comuniquem”. (P.11). A fotografia também é comunicação com o interlocutor, com a realidade. Com o advento da fotografia digital é possível ver a ânsia de todos, seja a massa, seja artistas e comunicadores em ”fazer-acontecer” participando de alguma maneira da história, pois, assim como na Arte o homem pós-moderno tem dois caminhos (além dos impossíveis e inimagináveis). SANTOS (1991: p.11)”Dando Adeus às ilusões o homem pós-

moderno já sabe que não existe céu nem sentido para a história, e assim se entrega ao presente e ao prazer, ao consumo e ao individualismo. E, pode escolher entre a criança radiosa, o indivíduo desenvolto, sedutor, hedonista integrado à tecnologia, narcisista com identidade móvel, flutuante, liberado sexualmente(...) ou o andróide melancólico, o consumidor programado e sem história, indiferente, átomo estatístico na massa, boneco da tecnociência(...)”


Bibliografia
FRANGE, Lucimar Bello P. Leituras de Obra de Arte. Artigo coletânea prof. Antônio Lopes.
SANTOS, Jair Ferreira dos.O que é Pós-moderno.Editora Brasiliense.SãoPaulo:1991. 10ª edição.
SENAC. Fotógrafo: o olhar, a técnica e o trabalho.Vários autores. Rio de Janeiro. 2002.


 

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