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_vol 1 n. 2 - janeiro/junho de 2008

 

             

A Comunicação nas Organizações
e a nova (des)ordem mundial (1)

expediente  

 

Érico Melo de Abreu

Jornalista, professor da Universidade Federal de Alagoas, Mestre em Comunicação e Cultura

Resumo:
Vivemos uma época de grandes mudanças em todos os campos da existência humana, fenômeno que alguns autores custumam chamar de globalização. Uma revolução que tem seu fundamento na velocidade provocada ou multiplicada pelas novas tecnologias de comunicação. Neste texto, o autor analisa o reflexo dessas mudanças nas teorias que sustentam a comunicação no âmbito empresarial.

Palavras-chave: Comunicação Organizacional-Globalização

(1) Este texto, aqui atualizado e com algumas modificações, compõe originalmente o terceiro capítulo da dissertação de mestrado do autor Estratégias de Recepção e Apropriação de Informações On-line.


Novo mundo
Estamos presenciando um período de grandes transformações em todos os campos da existência humana. O nascimento de uma nova era, fenômeno que alguns pesquisadores costumam chamar de era da globalização ou da mundialização da economia. Uma revolução que tem seu fundamento na velocidade provocada ou multiplicada pelas novas tecnologias de comunicação, desencadeando uma ruptura histórica que muda todo o cenário político, econômico e social do planeta, alterando nossa percepção da realidade e exigindo novos modelos e novos conceitos em todos os campos do conhecimento.

”. É fascinante a época em que estamos vivendo. Achamo-nos num período de transição de uma conjuntura histórica. No mapa da terra tudo parecia definido, com o mundo bipolarizado ou então dividido em três mundos, o primeiro, o segundo e o terceiro. Estava tudo bem direitinho, tudo no seu lugar. De repente, isso não é mais verdade. Mais do que não ser verdade, parece que foi uma fantasia, uma grave fantasia para a humanidade. Hoje estamos sendo desafiados por processos e estruturas que estão se desenvolvendo em escala mundial e que são fortes. Eles dizem respeito à mundialização, à globalização, à formação de uma sociedade civil mundial.” (IANNI: 1999, p.13)
A rapidez com que o capital se desloca de um lugar para outro no mundo, ignorando as distâncias e as fronteiras ideológicas, reinventa uma nova temporalidade, moldando um tempo/espaço único e universal.
Mas o conceito de globalização não deve ser entendido apenas geograficamente, em relação ao território do globo terrestre, mas sim no sentido da globalidade de uma ação, ou seja, a sua realização simultânea em múltiplos pontos do espaço. O fenômeno da globalização não deve, portanto, ser compreendido unicamente como um fator de aceleração e densificação das trocas entre as diversas comunidades mas como uma dinâmica que submete essas trocas a um mesmo princípio temporal/epistemológico. Isto pressupõe uma total sincronicidade entre as várias cenas do processo e sua moldagem num mesmo tempo único e universal.

”Anular o espaço pelo tempo, através dos meios de comunicação e de transporte, é uma exigência interna da organização capitalista do mundo. Para isto são convocadas as mais diversas tecnologias, correspondentes às necessidades das diferentes fases da expansão capitalista. Em todas elas, desenha-se a ideologia desterritorializante dos livres fluxos mercantis, que procuram acabar com as territorialidades culturais, com o enraizamento, com as relações físicas e sagradas entre o indivíduo e o seu espaço circundante. No projeto industrialista, o espaço é apenas um dentre os muitos elementoss submetidos aos cálculos racionalistas do capital” (SODRÉ: 1988, p.26)
Robert Kurz (Folha de São Paulo, 03/01/1999), explica que o sistema capitalista em sua essência consistiu no desvinculamento da economia de todo o contexto cultural e de toda necessidade existencial humana. ”Se o tempo é uma forma inscrita a priori na capacidade cognitiva humana, não é menos verdade que a essa forma subjaz uma mudança histórica e cultural”, afirma.
Essa mudança temporal/espacial, aprofundada com o surgimento da internet, a mãe de todas as redes de comunicação global, o advento da interação mediada vai afetar profundamente as organizações, o mundo dos negócios e do trabalho, seja elas empresas, no sentido clássico de visarem unicamente o lucro, ou no seu sentido mais amplo, instituições civis e militares governamentais ou não, alterando particularmente a maneira como essas organizações se comunicam com os variados públicos com os quais de relacionam.

Nova empresa
Na verdade, não sabemos ainda que configuração as organizações do futuro terão. Podemos, entretanto, registrar, descrever as mudanças e transformações que afetam as organizações de hoje, seja com a introdução de novas e diferentes tecnologias, seja alterando o comportamento das pessoas, seja mudando seus processos internos. No decorrer do século XX, explica Chiavenato, as organizações passaram por três fases distintas: a Era da Industrialização Clássica, a Industrialização Neoclássica e a Era da Informação.
A Era da Industrialização Clássica, período de 1900 a 1950, representa um período de meio século de intensificação do fenômeno da industrialização, que se iniciou com a Revolução Industrial. Nesse período, a estrutura organizacional típica caracterizou-se pelo formato piramidal e centralizador, departamentalização funcional, modelo burocrático, centralização das decisões no topo, estabelecimento de regras e regulamentos internos para disciplinar e padronizar o comportamento dos participantes. A cultura organizacional era predominante voltada para o passado e para a conservação das tradições e valores tradicionais ao longo do tempo. As pessoas eram consideradas recursos de produção, juntamente com máquinas, equipamentos e capital, dentro da concepção dos três fatores tradicionais de produção: natureza, capital e trabalho. Por essa concepção, a administração de pessoas era chamada Relações Industriais. ( CHIAVENATO: Ibid,p. 27)
A Era da Industrialização Neoclássica, que durou de 1950 a 1990, teve seu início com o final da Segunda Guerra Mundial, quando o mundo começou a mudar mais intensamente. A velocidade das mudanças começou a aumentar. As transações comerciais e financeiras passaram da amplitude local para a regional, da regional para a internacional e tornaram-se gradativamente mais intensas. A competição entre as empresas ficou mais acentuada. O velho modelo burocrático e funcional, centralizador e piramidal, utilizado para formatar as estruturas organizacionais, se tornou inflexível e vagaroso demais para acompanhar as mudanças que ocorriam no ambiente.
”As organizações tentaram novos modelos de estrutura que pudessem proporcionar-lhes mais inovação e melhor ajustamento às novas condições. Surgiu a estrutura matricial como uma espécie de quebra-galho para tentar consertar e reavivar a velha e tradicional organização funcional. Com a abordagem matricial, adicionou-se à organização funcional um esquema lateral de departamentalização por produtos/serviços para agilizar e funcionar como um turbo capaz de proporcionar uma estrutura com características de inovação e dinamismo e alcançar maior competitividade. De fato, a organização matricial promoveu uma melhor necessária na arquitetura mas não o suficiente, pois não removia o emperramento da estrutura funcional”. (CHIAVENATO: Ibid, p.27)
Nesse novo ambiente, a cultura organizacional deixou de privilegiar as tradições e passou a concentrar-se no presente, enquanto o conservantismo dava lugar à inovação. As pessoas passaram a ser administradas como ”recursos humanos”. Ao mesmo tempo, a tecnologia passou por intenso desenvolvimento e começou a influenciar poderosamente a vida nas organizações e as pessoas que delas participavam. O mundo continuava mudando, só que agora a uma velocidade bem maior. Chegamos então ao que Chiavenato chama de Era da Informação, que teve seu início ao redor de 1990 e que seria a época que estamos vivendo hoje. Sua característica principal são as mudanças, que se tornaram rápidas, imprevistas, inesperadas. O grande arauto dessa era foi Peter Drucker, que anteviu essa poderosa transformação mundial ao escrever Uma era da descontinuidade: administrando em tempos de grandes mudanças (1995) e Sociedade pós-capitalista (1993). As novas tecnologias, principalmente o microcomputador e a sua utilização em rede, trouxe desdobramentos completamente imprevistos e transformou o mundo numa aldeia global.
”A informação passou a cruzar o planeta em milésimos de segundo. A tecnologia da informação provocou o surgimento da globalização da economia: a economia internacional transformou-se em economia mundial e global. A competitividade tornou-se intensa entre as organizações. O mercado de capitais passou a migrar volatilmente de um continente para outro em segundos, à procura de novas oportunidades de investimentos, ainda que transitórias. A estrutura organizacional em matriz tornou-se insuficiente para dotar as organizações de agilidade, mobilidade, inovação e mudança necessárias para suportar as novas ameaças e oportunidades dentro de uma ambiente de intensa mudança e turbulência.” (CHIAVENATO: Ibid, p. 28)
Os processos organizacionais tornaram-se mais importantes que os órgãos que constituem a organização. Os órgãos tornaram-se provisórios, os cargos e funções passaram a ser constantemente definidos e redefinidos em razão das mudanças no ambiente e na tecnologia, os produtos e serviços passaram a ser continuamente reajustados às demandas e necessidades dos clientes, agora dotados
de hábitos mutáveis e exigentes. O emprego começou a migrar do setor industrial para o setor de serviços, o trabalho manual substituído pelo trabalho mental, de criação, indicando o caminho para uma era da pós-industrialização fundamentada no conhecimento. A administração de Recursos Humanos foi substituída pela Gestão de Pessoas. A cultura organizacional sofreu forte impacto do mundo exterior e passou a privilegiar a mudança e a inovação voltadas para o futuro e para o destino da organização. ”As mudanças passaram a ser rápidas, velozes, sem continuidade com o passado, trazendo um contexto ambiental de turbulência e de imprevisibilidade” (p.29)
Nova Comunicação Todas essas mudanças têm alterado também conceitos e paradigmas na forma como as organizações comunicam-se com os seus públicos estratégicos. Primeiro porque nessa Era da Informação, assim como o resto da sociedade, as organizações começam a se estruturar e a atuar em rede. Embora a forma de organização social em redes tenha existido em outros tempos e espaços, segundo Castells (1999, p.497) o novo paradigma da tecnologia da informação fornece a base material para sua expansão penetrante em toda a estrutura social. Como rede, Castells define:

”um conjunto de nós interconectados. Nó é o ponto no qual uma curva se entrecorta. Concretamente, o que um nó é depende do tipo de redes concretas de que falamos. São mercados de bolsas de valores e suas centrais de serviços auxiliares avançados na rede dos fluxos financeiros globais. São conselhos nacionais de ministros e comissários europeus da rede pública que governa a União européia. São campos de coca e de papoula, laboratórios clandestinos, pistas de aterrisagem secretas, gangues de ruas e instituições financeiras para lavagem de dinheiro, na rede de tráfico de drogas que invade as economias, sociedades e estados no mundo inteiro. São sistemas de televisão, estúdios de entretenimento, meios de comunicação gráfica, equipes para cobertura jornalística e equipamentos móveis gerando, transmitindo e recebendo sinais da rede global da nova mídia no âmago da expressão cultural e da opinião pública, na era da informação” (1999, pp.498-499

Redes seriam portando estruturas abertas, capazes de expandir de forma quase ilimitada, integrando novos nós desde que consigam comunicar-se dentro da rede, ou seja, desde que compartilhem os mesmos códigos de comunicação. Para Castells, uma estrutura social com base em redes é um sistema aberto altamente dinâmico suscetível de inovação sem ameaças ao seu equilíbrio.

”Redes são instrumentos apropriados para a economia capitalista baseada na inovação, globalização e concentração descentralizada; para o trabalho, trabalhadores e empresas voltadas para a flexibilidade e adaptabilidade; para uma cultura de desconstrução e reconstrução contínuas; para uma política destinada ao processamento instantâneo de novos valores e humores públicos; e para uma organização social que vise a suplantação do espaço e invalidação do tempo.” (Ibid, pp. 498-499).
Nesse novo cenário, a comunicação passa assim a ser considerada imprescindível para a obtenção de resultados em todos os processos da gestão empresarial. É o que afirma Margarida Kunsch:

”Aquela comunicação tradicional, excessivamente fragmentada, centrada quase que exclusivamente na assessoria de imprensa ou demais voltada para as relações com o governo, se transforma e se amplia. Hoje há uma preocupação muito grande com a comunicação interna. Está provado que, se o colaborador-empregado não for conscientizado de que é agente importante do processo de comunicação, como gestor e facilitador, a empresa não conseguirá cumprir sua missão e atingir suas metas.” (1999, p.50)
Nesse sentido, Margarida, na obra citada, defende a necessidade de uma comunicação integrada, global, atuando de forma sinérgica, reunindo em parceria as áreas de comunicação institucional e mercadológica.

O que percebemos, no bojo dessas transformações e das propostas de ”acompanhamento” pela Comunicação Organizacional é a permanência da visão sistêmica da sociedade e das suas instituições, estando a Comunicação, especificamente, ainda embebida no conhecimento herdado dos primeiros estudos funcionais e positivistas.

Velhas teorias
Antigas e modernas escolas de Administração ainda têm como fundamento teórico básico a Teoria Geral dos Sistemas. Essa teoria explica que um sistema pode ser definido como ”um conjunto de objetos ou entidades que se inter-relacionam mutuamente para formar um todo único. Uma das distinções mais comuns é a que se estabelece entre sistemas fechados e abertos” (Littlejohn: 1982, pp.41-42). Um sistema fechado é aquele que não permite intercâmbio com o meio externo. Está condenado ao caos interno, à desintegração e à morte. Este tipo de modelo não existe na natureza e aplica-se aos sistemas físicos, que não possuem qualidades de sustentação vital. Um sistema aberto é aquele que troca matéria e ou energia com o seu meio ambiente. A Teoria Geral dos Sistemas trata de sistemas desde essa perspectiva aberta.
Entende-se, dentro dessa teoria, que a organização é um sistema de atividades conscientemente coordenadas de duas ou mais pessoas. (Bernard:1971, p. 12) Que a cooperação entre elas é essencial para a existência da organização. Segundo Idalberto Chiavenato, ”Uma organização somente existe quando: 1) há pessoas capazes de se comunicar; 2) estão dispostas a contribuir com ação conjunta; 3) a fim de alcançarem um objetivo comum”. (1997, p.23). Para Chiavenato, as organizações são sistemas complexos e altamente diferenciados: indústrias, empresas comerciais, empresas de serviços, universidades, hospitais, penitenciárias, clubes esportivos, igrejas, exércitos e polícias, organizações políticas etc.
Gaudêncio Torquato, um dos pioneiros no estudo da Comunicação Empresarial ou Organizacional no Brasil, explica que a empresa é um sistema aberto que reúne capital, trabalho, normas, políticas e natureza técnica. ”Uma empresa não apenas objetiva gerar bens econômicos, para uma relação de troca entre produtor e consumidor,
mas procura também desempenhar papel significativo no tecido social, missão que deve cumprir qualquer que seja o contexto político”. (1986, p.13). Ainda segundo Torquato, há muito a empresa moderna está se apoiando na Teoria de Sistemas.

”Se entendemos por organização o ordenamento, a disposição das partes que compõem um todo, ou, no dizer de Talcott Parsons, a unidade social direcionada à consecução de metas específicas, vamos constatar na extensão do conceito os fundamentos dos princípios sistêmicos. A Teoria de Sistemas, por sua vez, impregna-se do conceito de organização, na medida em que um sistema é um todo organizado, constituindo-se na possibilidade técnica e operacional de integração de partes, intercambiadas e interdependentes.(...) Como sistema, a empresa possui limites definidos, de um lado, pelos componentes administrativos necessários à geração de bens e serviços, de outro, recebe influências do meio ambiente, podendo-se aduzir, por inferência, que uma empresa não é apenas resultante de componentes concretos do microssistema organizacional, mas é conseqüência de forças, pressões, recursos e situações, nem sempre fáceis de detectar, presentes no corpo social. Quando se organiza, pois, uma empresa, na verdade, o que está-se organizando são seus circuitos internos e externos, ajustando-os e promovendo seu intercâmbio com outros sistemas” ( TORQUATO:1986, pp. 14-15)
A visão sistêmica coloca como fundamento das empresas a cooperação. As partes devem se articular e trabalhar em benefício do todo. São qualidades essenciais nessa visão a hierarquia - todos os sistemas complexos consistem em certo número de subsistemas. Portanto, o sistema é uma série de níveis de crescente complexidade (Littlejohn: 1982, p.44) e legitimidade. Etzioni, citado por Torquato (1986, p.15) estuda a legitimidade das organizações face a três tipos de poderes: remunerativo, normativo e coercitivo. A partir desse quadro, podemos examinar a empresa sob os prismas psicológico, sociológico e antropológico, bases fundamentais para a análise da questão da comunicação.

”Etzioni, apesar de observar o crescente papel da comunicação na vida das organizações, fixa-se num modelo rígido, que denota diferenças organizacionais, baseadas no tipo de poder. O poder remunerativo, que legitima a organização pela remuneração pecuniária, o poder normativo, que cria a legitimação pela obediência à norma e o poder coercitivo, responsável pelas coerções e castigos.” (TORQUATO:1986, p.15)

A comunicação como um subsistema da organização
A comunicação, pela perspectiva sistêmica, é vista como um sistema aberto, semelhante à empresa, organizada por seus elementos - fonte, codificador, canal, mensagem, decodificador, receptor, ingredientes que vitalizam o processo. ”Processo que se divide em duas etapas, a primeira, de transmissão da mensagem; a segunda, de recuperação” (Toquato: 1986, p.15). Embora adotando claramente o modelo matemático-cibernético de N. Wiener, Torquato, já naquele momento, identificava outros elementos na formação do processo comunicacional: os ”condicionantes sociológicos e antropológicos”, que envolvem as fontes, os codificadores, os decodificadores, os receptores. ”São esses fatores que estão à disposição das organizações para o ordenamento e cumprimento de metas e objetivos”. (p.15) Juarez Bahia, in Introdução à Comunicação Empresarial, uma obra bem mais recente que as que citamos, apresenta uma visão sistêmica ainda mais esquemática e simplificada do processo comunicacional nas empresas. ”A representação (...) da comunicação pressupõe emissor ou fonte, mensagem e receptor ou alvo (1995, p. 25)”.
Todo sistema persegue o equilíbrio entre as partes que o formam, assim são as organizações. Essa integração é conseguida pelo processo comunicacional que aparece como uma ”energia” que perpassa os componentes do sistema, promovendo seu encadeamento e produzindo sinergia e vitalidade.

”O uso sinergético da comunicação, além de melhorar as condições dos atos comunicativos, clarifica os canais,

estabelece eficientes sistemas de coordenação, gera respostas mais imediatas e reduz substancialmente os custos dos programas. Mas, o que significa sinergia? Vamos buscar os ensinamentos de H. Igor Ansoff e tirar a conclusão de que por sinergia deve-se entender um desempenho combinado superior à soma das partes envolvidas no processo”. (TORQUATO: Ibid, p.41)

A eficiência é outro conceito presente na concepção sistêmica da Comunicação Empresarial. Segundo Torquato,
“Há sempre algum investimento quando acontece um ato comunicativo. A economia da comunicação, portanto, é parte do problema. Para entender-se melhor a situação, pode-se dizer que a eficiência da comunicação se mede pelo relacionamento entre a eficácia obtida e os custos necessários para sua obtenção: eficiência = eficácia/gasto. Essa medida de eficiência pode ser avaliada em termos de mensagem (todas as condições do ato comunicativo), de canal (análise de seu custo mínimo e adequação), meios físicos e conômicos” (Ibid, p.40)

Com a objetividade e a busca de resultados mensuráveis colocados no centro da moderna administração, quem trabalha com Comunicação Organizacional tem sido pressionado a apresentar resultados, objetivamente mostrar ou demonstrar os efeitos do seu trabalho. Em três áreas a comunicação pode ”agregar valor”: aumentando a produtividade dos empregados; posicionando a organização (sua marca ou marcas) de maneira efetiva com os públicos externos; e vendendo produtos ou serviços. Nem sempre essa medição tem sido fácil, sendo fonte de conflitos entre os profissionais da comunicação e os gerentes de outros recursos mais ”palpáveis”. Tradicionalmente o pessoal da Comunicação tem se limitado a produzir relatórios de atividades voltadas para metas, ou medições de mídia espontânea e algumas análises de feedback. Para responder àquelas questões: como você sabe que o que faz funciona? como justificar as despesas que você está propondo?, os comunicadores têm buscado trabalhar com planejamento e com pesquisas, com ênfase naquelas chamadas qualitativas. Essa tendência, entretanto, é mais percebida quando tratamos da publicidade, onde se gasta muito dinheiro e a pressão por resultados é maior. São, geralmente, estudos de avaliação do impacto das mensagens sobre os públicos. As atividades da chamada comunicação institucional são raramente avaliadas, exceto, como já dissemos, por pesquisas ocasionais de legibilidade, índices de leitura ou retorno de releases na mídia. Voltando à Teoria dos Sistemas, Torquato identifica três grandes subsistemas no interior das empresas: 1) O sistema sócio-político, onde se inserem os valores globais e as políticas do meio ambiente; 2) o sistema econômico-industrial, onde se inserem os padrões da competição, as leis de mercado, a oferta e a procura; e 3) o sistema inerente ao microclima interno das organizações, onde estão estabelecidas as normas e políticas necessárias às operações empresariais. ”Trazendo informações desses três sistemas ou enviando informações para eles, o processo comunicacional estrutura as convenientes ligações entre o microssistema interno e o macrossistema social, estuda a concorrência, analisa as pressões do meio ambiente, gerando as condições para o aperfeiçoamento organizacional.” (p.16)
Nessa mesma obra, Torquato faz um passeio crítico pelas teorias de enfoque funcionalista, sistêmico e estruturalista, destacando o ”modelo de agulha hipodérmica”, de Katz e Lazarsfeld (a mensagem seria aplicada através dos meios, que seriam a agulha, diretamente sobre cada componente da massa), a teoria do ”fluxo em duas etapas” (two-step flow), e a teoria da ”exposição seletiva” (as pessoas tendem sempre a evitar, de algum modo, a existência de incoerência em sua estrutura de pensamento).
Embora reconheça no modelo de Comunicação Empresarial perspectivas sociológicas e antropológicas, destacando a cultura organizacional como elemento determinante para o sucesso, e aponte para o caráter multidisciplinar dos estudos da comunicação, Torquato não escapa da visão sistêmica, concluindo que:
“...Como técnica, a comunicação direciona naturalmente seus estudos para a procura de mensagens adequadas, corretas, oportunas, claras, concisas, precisas, que possam ser assimiladas sem ruídos pelos participantes organizacionais. Para atingir tal meta, a comunicação
procurará ajustar seu discurso, estudando as habilidades e disposições das fontes e receptores, a natureza técnica dos canais, a complexidade e/ou simplicidade dos conteúdos, a oportunidade e regularidade dos fluxos, o tamanho dos grupos” (pp. 16-17)

Essas transformações têm provocado uma crise na área da disciplina chamada no Brasil de Relações Públicas, responsável, no âmbito das organizações, pelo menos dentro de sua concepção teórica, pela Comunicação Organizacional. Cabe, portanto, neste momento do nosso trabalho tratar um pouco dessa crise, além de esclarecer alguns dos conceitos com os quais pretendemos nos relacionar.

Comunicação Organizacional ou Empresarial?
No Brasil e também em vários outros países, Comunicação Empresarial ou Comunicação Organizacional são nomes usados indistintamente para designar o trabalho de comunicação realizado nas organizações em geral. Segundo Margarida Kunsch, o termo Comunicação Empresarial é empregado com maior freqüência no Brasil, na França, na Espanha e em Portugal. ”Nos Estados Unidos, a expressão Comunicação Organizacional é mais usada para designar a comunicação interna, cabendo à área de relações públicas a comunicação externa”. (Kunsch: 1997, p.68) Margarida afirma ainda que na América Latina muitos países estão adotando o termo Comunicação Organizacional em substituição ao de Relações Públicas.
Gerald Goldhaber, um autor cujos estudos são considerados clássicos, em seu livro Comunicação Organizacional (p.32), citado por Margarida Kunsch (1997:Ibid.,p.68), assim define a comunicação organizacional:

”... é considerada como um processo dinâmico por meio do qual as organizações se relacionam com o meio ambiente e por meio do qual as subpartes da organização se conectam entre si. Por conseguinte, a comunicação organizacional

por ser vista como o fluxo de mensagens dentro de uma rede de relações interdependentes”
Gary Kreeps, outro autor clássico, in Organizational communication, (pp. 11,12 e 21) também citado por Margarida (1997:Ibid, p. 68), a define como:
”(...) o processo pelo qual membros conseguem informações pertinentes sobre sua organização e mudanças que nela ocorrem. A comunicação ajuda os membros da organização, tornando-os capazes de discutirem experiências organizacionais críticas e desenvolverem informações relevantes que desmitificam atividades organizacionais e mudança organizacional.”
Para Margarida Kunsch, essas duas concepções concentram-se nos aspectos de relacionamento interno com o meio ambiente, não expressando a visão mais ampla que temos no Brasil de um envolvimento de áreas. A proposta de Margarida é que se adote no Brasil a expressão Comunicação Organizacional, ”que além de abranger todo o espectro das atividades comunicacionais, apresenta maior amplitude, aplicando-se a qualquer tipo de organização e não só àquilo que se chama ´empresa´ ” (Ibid, 69)
Ao fazer um apanhado da produção científica em Comunicação Organizacional, Margarida registra ainda que os estudos sobre a área evoluíram de aspectos de comunicação administrativa, envolvendo o processo, os fluxos, as redes - formal e informal - e os meios, para uma visão muito mais ampla, compreendendo o clima e a cultura organizacional e a vinculação com a comunicação externa, afirmando que a comunicação organizacional no Brasil, no que diz respeito à produção acadêmica já realizada ”...é muito repetitiva, com exceção de alguns poucos trabalhos inovadores que representam um avanço qualitativo” (Ibid. p.71). Em busca de uma teoria da Comunicação Empresarial ou Organizacional, entendemos que trata-se esta da aplicação prática dos conceitos teóricos desenvolvidos no campo da Comunicação, não constituindo, assim um campo teórico específico e independente. A Comunicação Organizacional seria então um aspecto da teoria da Comunicação que estuda a aplicação dos conhecimentos comunicacionais ao ambiente das organizações. Seria a interface ou o local de encontro das teorias da Comunicação com as teorias da Administração, da gestão das organizações.

Outros conceitos importantes
Para entendimento da aplicação da Comunicação nas organizações, precisamos rever alguns conceitos utilizados nessa área. Boa parte das empresas brasileiras organizam sua comunicação em duas áreas distintas: a Comunicação Institucional e a Comunicação Mercadológica que, como já indicam os nomes, tratam, respectivamente, da comunicação que diz respeito aos aspectos institucionais (imagem, valores, cultura, relações com a imprensa e outros públicos considerados estratégicos, ações de interesse da comunidade etc., ), e da comunicação com o mercado (onde se inclui a publicidade e a promoção de produtos e serviços). A comunicação com os funcionários, geralmente denominada Comunicação Interna, ora fica separada, como setor distinto, ora aparece nos organogramas como integrada à comunicação institucional.
Outro conceito que consideramos relevante para compreensão dessa área é o de ”público”, que o Dicionário de Comunicação, de Rabaça e Gustavo Barbosa, define como ”conjunto de indivíduos cujos interesses comuns são atingidos pelas ações de uma organização, instituição ou empresa, e cujos atos afetam direta ou indiretamente os interesses da organização”. (1978, p.382) Fábio França (1997) fez uma revisão do conceito de públicos. Nesse trabalho, além de relacionar a opinião de vários autores consagrados sobre esse conceito, inclusive sobre a tradicional divisão em público interno e público externo, França clarifica essas definições, por ele consideradas como gerais: Público interno - são as pessoas físicas que prestam serviços de natureza não eventual a uma empresa, sob a dependência dela e mediante o recebimento de salário. Esta definição tem como fundamento a legislação trabalhista brasileira, CLT que assim define os empregados de uma empresa em seu artigo 2. Público externo - são todas as pessoas que atuam fora da empresa, podendo ter maior ou menor participação na rede complexa de seus relacionamentos e de suas atividades. Fábio redefine o conceito de público propondo uma nova classificação, com base em dois critérios: primeiro, o grau de dependência da organização de seus públicos para sua constituição, existência e permanência no mercado; e segundo, a maior ou menor participação dos públicos nos negócios da empresa. Com essa proposta, os públicos ficam classificados como: públicos essenciais - que se subdividem em constitutivos e não constitutivos ou de sustentação, com seus subgrupos primários e secundários;

públicos não essenciais - que se subdividem em especiais, setoriais, sindicais e comunitários; públicos concorrentes - cuja natureza será definida pelo grau maior ou menor de inter-relação positiva na qualidade de parceiros ou negativa na qualidade de adversários; e públicos internacionais, considerados hoje como dos mais importantes quando a organização mantém relações globalizadas, realizando negócios internacionais ou quando pesquisam a existência de possíveis concorrentes no exterior que possam vir afetá-la (FRANÇA: 1997, p.146).
Entendemos que a classificação apurada do conceito de público é relevante para a definição de políticas de comunicação dirigidas a esses públicos. Neste estudo, entretanto, nos basta a classificação geral.
Jornalismo Empresarial é outro conceito que temos que considerar neste texto. Este nomeia as atividades, ou as técnicas, de publicação de revistas, jornais e boletins, news letters e, mais recentemente, veículos eletrônicos como televisão, vídeo, sites na internet ou intranet e publicações eletrônicas internas ou externas, além de manuais, relatórios, folhetos, folders, comunicados, apostilas etc. Francisco Torquato (1984, p.42) divide essas publicações em dois grupos, separando as que incorporam características jornalísticas, como jornais, revistas etc., e as que, por sua natureza, fogem a esse padrão, como os folders, os manuais etc. Não seriam estes últimos, portanto, considerados canais do jornalismo empresarial. As características jornalísticas de que trata Torquato, seriam aquelas básicas, como atualidade, periodicidade, caráter informativo/noticioso, informação colhida e tratada conforme o padrão e os gêneros clássicos do jornalismo. Ainda segundo Torquato, ”o jornalismo empresarial deve ser concebido e analisado como proposta especializada da atividade jornalística e não como função menor ou comparativamente menos importante que a função da grande imprensa” (1984, p.12). Para diferenciar a comunicação organizacional, que trabalha com o conceito de públicos, da comunicação de massa, criou-se o conceito de Comunicação Dirigida. O público da comunicação de massa seria, no entendimento sociológico do termo, destituído de características de uma sociedade ou comunidade. ”Não possuindo organização social, costumes, tradição, um corpo estabelecido de regras ou rituais, um conjunto organizado de sentimentos, nem de qualquer estrutura de status-

papéis ou liderança institucionalizadas” (TORQUATO: ibid, p.19). Os avanços nos estudos da Comunicação puseram em dúvida e invalidaram esse conceito, hoje não mais aceito, pelo menos nessa forma de entendimento inicial. Basta, entretanto, para o nosso trabalho, a síntese de que as mensagens dos meios de comunicação de massa (jornal, TV e rádio) seriam dirigidas para uma audiência relativamente grande, heterogênea e anônima, enquanto a comunicação dirigida trataria de públicos pequenos, mais ou menos homogêneos e identificados, dotados de valores e de uma cultura, nesse nosso caso, a cultura da organização à qual pertence.

O problema da recepção
Ao transportarmos as preocupações das pesquisas atuais dos chamados Estudos da Recepção para o universo da Comunicação Organizacional, percebemos que essas preocupações ainda não sensibilizaram esse universo. Embora tenha como elementos de sua lógica a eficiência e a eficácia na aplicação de recursos para obtenção de resultados, o mundo organizacional ainda não despertou para o desperdício de esforços jogados fora pela crença nos modelos tradicionais que adotam em suas políticas de comunicação.
Predomina, ainda, no âmbito das organizações, a visão do receptor passivo, objeto da ação dos meios, quando muito, ”influenciado” pelo ambiente externo. O campo produtor da mensagem acredita numa resposta simétrica, talvez com alguns ruídos, talvez ”prejudicada” por elementos estranhos ao mundo limpo dos sistemas. A quem elabora as políticas de comunicação das empresas não interessa, ou interessa muito pouco, o que seus públicos fazem com suas mensagens. Quando muito, realizam pesquisas para detectar dificuldades de acesso às mensagens, ignorando a questão do acesso ou da construção do sentido. Os questionamentos levantados pelo mundo acadêmico na área da recepção ainda não contaminaram o campo dos negócios. Segundo Margarida Kunsch, apesar de os estudos da comunicação organizacional terem evoluído persiste o descompasso entre a mundo acadêmico e o mundo das organizações:

”Se fizermos uma comparação entre o desenvolvimento da comunicação organizacional no mercado ou na área de

negócios e a produção científica (livros, teses dissertações), concluiremos que a defasagem é grande. As universidades brasileiras e, principalmente, as escolas de comunicação não souberam enxergar a importância e a necessidade de propiciar oportunidades para que os cursos de pós-graduação se voltassem para essa área. Talvez a vigência do regime autoritário, por longos 21 anos, tenha sido uma das causas. Além disso, tocar nesse assunto significava, nos meios acadêmicos, beneficiar o capitalismo empresarial.” (Ibid, p.69)

Esse descompasso talvez ganhe novos contornos pelas exigências do mercado globalizado. Com as novas tecnologias de multimidiáticas e interativas, com a estruturação das organizações em redes, com os recursos humanos privilegiando a inovação e o conhecimento, a visão sistêmica parece que caminha para um esgotamento dentro do campo organizacional. Os velhos modelos já não atendem às necessidades das organizações no ambiente onde a informação passa a ser a mercadoria mais cobiçada, o diferencial que pode determinar a morte ou sobrevivência de uma organização.
Trazer um novo modo de estudar a comunicação para o ambiente empresarial talvez ajude as organizações a compreender melhor o fracasso e o sucesso de seus programas de comunicação. A visão de que o processo comunicacional é complexo e que, como no campo dos negócios, pode-se minimizar as incertezas - e esse parece ser o objetivo da Ciência - mas não se pode eliminá-las.
Dentro dos chamados Estudos da Recepção, ou avançando para além deles, concluímos enfatizando a importância de se pensar os meios de comunicação na relação com os seus contextos sociais práticos nos quais os indivíduos produzem e recebem as formas simbólicas mediadas. ”O esquecimento destes contextos sociais é uma tendência que pode ser encontrada ao longo da história das reflexões teóricas e das análises práticas sobre a mídia” (THOMPSON: 1998, p.41)


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