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Emilia Barbosa Barreto
Professora da Universidade Federal da Paraíba - UFPB
Resumo
Como se dá a interlocução entre a comunicação
e o desenvolvimento local? Entendendo que a comunicação
ocupa uma centralidade nas ações de desenvolvimento local
discutiremos como os processos de comunicação podem mediar/facilitar
o engajamento da população local nestas ações
coletivas a partir dos conceitos de mobilização, participação
governança, concertação, identidade e pertencimento.
Palavras-chave:Comunicação, Desenvolvimento local, mobilização
Neste artigo são sistematizadas reflexões que tentam apreender
como se dá a interlocução e entre os campos da comunicação
e do desenvolvimento local. Esses dois campos têm relações
não explicaveis de forma direta e simples o que nos levou a buscar
apoio em diferentes disciplinas.
Desenvolvimento local - um novo paradigma
A noção de desenvolvimento local foi concebida no começo
dos anos 60 para designar uma nova configuração do desenvolvimento.
Construída a partir da associação de palavras polissêmicas
como ?desenvolvimento? e ?local?, essa noção porta em si
um universo amplo de compreensão. Desse modo, sua utilização
não se dá de forma unívoca e inequívoca.
A pura e simples transposição de um conceito de desenvolvimento,
qualquer que seja, a uma escala considerada como ? local ? não
é suficiente para explicar essa nova concepção de
desenvolvimento, esse novo paradigma, distanciado do ideário tão
caro do econimicismo da ” grande modernização”,
da industrialização e do crescimento econômico pelo
aumento do Produto Interno Bruto- PIB, da produtividade, do nível
de investimentos, da adoção das novas tecnologias como unico
caminho possivel para garantir a passagem de uma sociedade tradicional
para uma sociedade moderna.
Os processos considerados de desenvolvomento local, por sua natureza e
particularidades econômicas, sociais,territoriais e culturais, entre
outras, supõe uma dinâmica de construção -
participação e gestão- ao mesmo tempo complexa, pela
pluralidade de seus conteudos e de interesses coletivos, e permanente
pela durabilidade que devem ter as ações. Por pressuposto,
admitimos que o desenvolvimento local é um processo em permanente
construção e reconstrução.
Assim sendo, as novas formas de conformação do”local”
enquanto territorio das práticas deste tipo dedesenvolvimento se
revelam, também, uma costrução. Como exemplo podemos
citar alguns casos das experiências de desenvolvimento local integrado
e sustentável -DLIS, estimulados pelo Sebrae, que criam e recriam
novas fronteiras do local unindo municipios, cidades, interesses diversos
em propostas de trabalho conjunto como ” Caminho dos Engenhos”,”Roteiro
do frio”, Pacto novo Cariri” além de cadeias produtivas.
A compreensão conceitual do local se mostra complexa considerando-se
que ela pode ser vista a partir de diferentes dimensões, cada uma
delas podendo atribuir-lhe um sentido próprio. As múltiplas
dimensões do local podem encontrar suas referências na esfera
cultural, econômica, social, espacial, política, entre outras.
Assim sendo, a noção de ” local” recobre simultaneamente,
noções vastas e restritas, limitadas e imprecisas, quase
sempre atreladas à escala espacial.
Em geral, temos a tendência de definir o local a partir da ótica
da exclusão, tomando como parâmetro a distância dos
centros dinâmicos não central, não global) ; a circunscrição
de um espaço estável, imutável e não modernizado.
Por outro lado, se as dimensões espacial e geográfica, embora
utilizadas predominantemente, se mostram claramente insuficientes para
configurar o ”local ”, qual dimensão deve ser privilegiada
para chegarmos a uma concepção mais precisa do local ?
Primeiramente, é preciso ressaltar que a parcialidade destas visões
se deve à não valorização de dois pontos fundamentais
para a percepção do local que são a identidade e
a natureza das problemáticas localizadas.
A partir desses dois pontos surgem reflexões complementares sobre
os graus de enraizamento e de estruturação das sociedades,
sobre a organização comunitária e ainda sobre o peso
das dimensões cultural, econômica, histórica, política,
entre outras, na formação das identidades locais .
Nesta perspectiva, o conceito de local deve levar em conta o fato de que
a existência do local, e do localismo, estão associados à
presença das identidades culturais vividas na base, fundadas a
partir dos fatos historicos, culturais, econômicos, sociais, políticos
, além de outros. Em conseqüência, nos parece que as
tentativas conceituais sobre o local devem considerar três eixos
prioritários sobre os quais repousa a noção do local.
O primeiro é a noção de identidade em sua vertente
histórica, social e cultural. Em seguida, a noção
de territorialidade, compreendendo os espaços construídos
e vividos pelas relações materiais e imateriais que aí
se controem. Por ultimo, a noção de ligação
social que, segundo BOURDIN (2000, p.200) se funda na complementariedade
(divisão social do trabalho), na troca (diferenças na constituição
social e econômica) e no pertencimento
vínculos culturais, históricos, quotidianos, entre outros).
Comunicação e desenvolvimento local: alguns espaços
de interlocução
A comunicação, da mesma forma que o desenvolvimento local,
não constitui um fim em si mesma. A eles são atribuídos
objetivos específicos para cada caso. Em se tratando da comunicação,
segundo MORIN (1998, p.34-35) as pessoas se comunicam com a finalidade
de informar, se informar, conhecer, se conhecer, explicar, se explicar,
compreender, se compreender. Esta ordem apresentada pressupõe uma
hierarquia onde informar é o nível mais superficial da comunicação
e a compreensão, o mais profundo. Morin concebe a informação
como uma unidade, como uma partícula que só encontra seu
sentido a partir de um conhecimento que a coordene. Desta forma, é
o conhecimento que organiza, estrutura e contextualiza a informação.
Explicar,consiste na utilização de todas as possibilidades
empíricas e lógicas que possam levar ao conhecimento de
um objeto, enquanto tal. A compreensão introduz a subjetividade
no conhecimento e na explicação permitindo entender um sujeito
enquanto tal.
A comunicação ocupa uma centralidade nas ações
de desenvolvimento local. E a partir de um processo de comunicação
que se dá a mobilização da população
local para engajar-se na ação coletiva. A mobilização
da população não ocorre de forma homogênea.
Verifica-se a existência simultânea de vários níveis
de participação e engajamento num mesmo projeto. Esses níveis
de participação se ampliam e se fortalecem à medida
que os processos de comunicação instaurados na comunidade
voltados para a mobilização se aprofundam, passando da fase
de informação strcito senso para a fase de compreensão.
A mobilização e a participação se tornam mais
profícuas tanto mais a comunicação estratégica
seja capaz de criar e manter vínculos entre a comunidade e a ação
de desenvolvimento local . Além de partilhar a experiência
concreta da ação de desenvolvimento local se faz indispensavel
a partilha de sentidos e de vontades comuns.
A mobilização da comunidade é uma questão
também central no âmbito do desenvolvimento local. Considerado
por inúmeros teóricos como um fator indispensável,
o engajamento dos cidadãos é visto como uma garantia, como
o espírito guardião da continuidade de qualquer ação
de desenvolvimento local. A mobilização é também
a
fonte de uma verdadeira força que coloca em movimento os atores,
capaz de criar uma dinâmica, uma sinergia. O reconhecimento deste
poder é confirmado por vários autores que afirmam que mobilização
e participação da população local é
indispensável para fazer brotar e para assegurar a continuidade
das ações de desenvolvimento local. Segundo HOUEE (1992,
p. 51), o desenvolvimento local é antes de tudo uma questão
de consciência e de vontade coletivas. As ações, por
mais bem planejadas e adequadas que sejam, podem se tornar dispendiosas
e não alcançar seus objetivos caso não sejam fruto
do engajamento da comunidade.
Outras afirmações se sucedem no mesmo sentido. MINOT (2001,
p.58) considera indispensável a mobilização dos atores
locais em torno de um projeto econômico, social e cultural, para
a construção de uma dinâmica durável dentro
de qualquer território. DORTIER
(2000, p.181) constata em seu livro que os estudos sobre desenvolvimento
local colocam em evidência o papel dos atores e da necessidade de
mobilizar a comunidade para participar.
O papel preponderante da participação coletiva nas ações
de desenvolvimento local parece inequívoco. Diante desta certeza
torna-se necessário apontar as origens da mobilização
e o que torna possível a participação.
A participação implica em duas concepções
distintas. A primeira delas se fundamenta na homogeneidade, ou seja, nos
valores comuns, na cooperação extensiva a todos os níveis
sociais e na comunhão de interesses. A segunda considera a heterogeneidade,
a diversidade, os conflitos de interesse, a competição.
Logo, podemos concluir que as ações de desenvolvimento local
são construídas a partir da tensão entre uma porção
homogênea e outra heterogênea.
As formas como homogeneidade e heterogeneidade se articulam são
incalculáveis. As múltiplas variações e gradações
originadas por esta ambigüidade estrutural engendram de um lado,
os diferentes graus de adesão dos atores no curso da ação
e, de outro lado, a necessidade de processos e estratégias comunicacionais
de sensibilização diferenciados.
Na visão de DEFFONTAINES e PROD’HOMME (2001, p.159-160),
a dinâmica inicial do desenvolvimento local pode ser oriunda de
situações de crise, de um fato que cria condições
inaceitáveis para alguns, do sentimento de algumas pessoas de que
podem melhorar, da iniciativa individual ou coletiva que tomam consciência
diante de determinadas situações de que as facilidades acabaram
e ainda, através de diferentes estímulos às mudanças
provenientes de instâncias externas.
Mesmo considerando a diversidade das origens da dinâmica do desenvolvimento
local, a participação continua sendo um ato de adesão
a uma causa partilhada, na medida em que essa causa é antecipadamente
conhecida e compreendida pelos que a partilham. Queremos dizer que o engajamento
dos atores pode ser facilitado, mediado, construído por uma ação
de comunicação que corresponda aos estágios anteriormente
citados de informação, de conhecimento, de explicação
e de compreensão do sentido da ação que esta sendo
proposta. Portanto, para se chegar à mobilização,
primeiramente, se faz necessário inaugurar processos comunicativos
que forneçam informações e argumentos que subsidiem
os níveis subseqüentes de conhecimento, explicação
e compreensão da ação de desenvolvimento local em
questão. A comunicação, nesse contexto, se configura
como um instrumento importante no que se refere ao engajamento da comunidade,
com especial vocação para alimentar e estimular a reflexão
e o debate.
Governança e concertação
De origem inglesa, a palavra governança é utilizada, na
maioria das vezes, para definir uma maneira particular de gestão
política local reunindo varias dimensões, dentre as quais
a existência de uma cultura de solidariedade local é um primeiro
elemento. Outro aspecto de igual importância é a capacidade
de construir uma política voluntária de formação
profissional e de pesquisa. Este conceito recobre ainda a mobilização
de capital humano disponível nas instituições. O
que LIPIETZ (2000 p.193) chama de governança é a capacidade
de gerir um sistema territorial, o que corresponde ao que Gramsci chama
de sociedade civil (sindicatos, igreja, lideres de opinião, jornais,
etc). Lipetz se refere às instituições que se encontram
abaixo da chamada ”grande política” e que não
podemos considerar como mercado. Para ele a governança é
uma espécie de Aparelho de Estado difuso que funciona como proteção
para a sociedade.
Para BOURDIN (2000, p. 140-141), falar de governança é falar
da redução do papel do Estado favorecendo o fortalacimento
de outras
instâncias, tais como as coletividades locais e a sociedade civil.
Governança, para o autor, são as maneiras de gerir a ação
publica horizontal e vertical dentro do principio da coalizão.
Ele cita o caso da França onde a governança se exerce primeiramante
nas relaçõs entre os poderes locais e a sociedade civil.
BIAREZ (2000, p 82-83) situa a discussão do conceito de governança
como uma tentativa de compreender os multiplos processos empreendidos
pelos sistemes locais no âmbito das ações públicas
contratualizadas, tendo como pano de fundo a noção de partenariado.
Para os ingleses, a governança representa as possibilidades de
concertação entre grupos de interesses distintos para realizar
ações que não são exclusivas do domínio
privado.
A partir destas visões podemos concluir que a concertação
é um esforço de identificar, no local, outras instâncias
de poder capazes de agir e tão legitimas quanto as instituções.A
noção de governança repousa sobre a interdependência
das redes de atores públicos e privados e de seu potencial de articulação
para a ação.
Neste contexto, estratégias de comunicação, sejam
elas midiáticas ou não, podem contribuir para a criação
de um ambiente favorável à identificação de
parceiros, à articulação entre eles, além
de informar e fazer compreender o papel que cada um deve exercer no âmbito
da ação pactuada.
Conhecer e compreender as competências e responsabilidades de cada
um no processo de desenvolvimennto local possibilita a fluidez dos encaminhamentos
de propostas e de ações, a concertação entre
os parceiros, a otimização na utização dos
recursos materiais e imateriais, a cobrança direcionada do cumprimento
dos compromissos assumidos, a detecção das potencialidades
e fragilidades de cada parceiro no decorrer da ação, o redirecionamento
da ação no seu curso - dadas as condições
de envolvimento e participação de cada parceiro, entre outras
possibilidades.
Identidade do ”territorio local”, pertencimento e visibilidade.
A noção de identidade traz em si um paradoxo. Por um lado,
trata, agrupa e se refere às caracteristicas que tornam sêres
e objetos idênticos, perfeitamente semelhantes, embora restando
distintos. No primeiro caso, a identidade é justamente o fato de
ser parecido com os outros. Por outro lado, a identidade é a marca
do que é unico e, portanto, se distingue, se diferencia dos outros
( LIPIANSKY, 199 , p 7).
Aplicar esta conceituação ao território local pressupõe
considerar que a identidade de um território implica em ressaltar
dentre suas caracteristicas aquelas que, ao mesmo tempo, o tornam ”parecido”
e ”diferente”, em comparação aos demais.
A partir desta constatação, podemos dizer que a busca de
afirmação identitária de um território porta
dois níveis de implicações. Um, busca as representações
simbólicas, as referências desse território que possam
agrupar a população em torno do que é comum, engendrando
o sentimento de pertencimento. O outro nível identifica as características,
sejam elas tangíveis ou intangíveis, que possam evidenciar
aquilo que torna o território diferente dos demais. Neste sentido,
uma política de comunicação que objetive a afirmação
da identnidade deve seguir dois eixos: uma comunicação voltada
para dentro do território com o propósito de reunir/ agrupar
os cidadãos, e uma comunicação voltada para o exterior
que deve permitir a esses cidadãos afirmar que eles são
diferentes.( CARDY, 1997, p.11)
Sabemos que a comunicação não é um objetivo
em si. Sabemos, igualmente, que ela se configura enquanto meio para atingir
um objetivo que lhe é exterior. Assim sendo, a impotância
da comunicação no primeiro eixo implica em reforçar
as dinâmicas endógenas a partir de elementos culturais, sociais,
históricos, econômicos, entre outros, com a seleção
de argumentos que reforcem a coerência interna do território
local, mesmo considerando as divergências existentes. Criar ou fortalecer
uma identidade é ao mesmo tempo, criar e reforçar os laços
existentes entre as pessoas e o território, sua ligação,
sua afetividade e a possibilidade de nele se reconhecer.
A comunicação sobre a identidade de um território
direcionada para fora, objetiva afirmar a existência deste território
para além dos limites fixados pelas suas fronteiras. Numa sociedade
midiática, os acontecimentos passam a existir na proporção
em que são publicizados pela mídia. Assim sendo, podemos
considerar que é essa dimensão midiática do território
que torna possível sua existência e sua visibilidade no exterior.
Podemos, igualmente, dizer que o espaço midiático pode ser
considerado como um lugar de criação e recriação
das representações simbólicas do território
local. As investidas do marketing territorial buscando atrair investidores,
despertando o interesse dos turistas, abrindo mercado para os produtos
locais, por exemplo, se inserem numa estratégia comunicacional
onde a mídia ocupa uma centralidade.
Considerações finais
O esforço feito para observar, apreender e compreender as possibilidades
de interação da comunicação com o desenvolvimento
local merece um aprofundamento. O que vimos representa apenas fragmentos,
talvez os mais explícitos, que pudemos perceber. A comunicação
pensada de forma estratégica pode contribuir para que as iniciativas
de desenvolvimento local possam ser compreendidas, apreendidas, assimiladas,
pela coletividade, assegurando a sua continuidade. A mobilização
e a participação requerem processos comunicacionais que
as alimente de forma continua.
A comunicação voltada para dentro e a mais difusa, predominantemente
midiática, voltada para fora, não são dissociadas.
Elas se inter-relacionam. Desse dialogo entre elas podem emergir relações
convergentes de complementaridade ou divergentes, tendendo ao conflito.
Os processos comunicacionais engendrados no local, sejam voltados para
dentro ou para fora, sejam midiáticos ou não, são
lugares de significação do território. Essas representações
simbólicas influenciam na condução do desenvolvimento
local, mais precisamente, no reconhecimento e na valoração
da ação em si e dos resultados que poderá trazer
para a coletividade.
Referências :
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cas français, Editions L’Harmattan, Paris, 1986.
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L’économie repensée, Editions Sciences Humaines, Auxerre,
2000.
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DORTIER, J., Quand l’histoire bouscule les doctrines, p.177-183,
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MINOT, D., ” Les initiatives locales, une ou des réponses
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MORIN, Edgar. L’enjeu Humaine de la communication, in La communication
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